Arquivo para julho, 2024
Visões liquidas
Analisando a visão “romântica” de William Dilthey (1833-1911) acerca da história, Hans-Georg Gadamer (1900-2002) enfatiza primeiro seu acerto que “o que chamamos de sentido da vida se constitui, muitas antes de toda objetivação científica, no interior de uma visão natural da vida sobre si mesma” (GADAMER, 2006, p. 31).
Porém vai criticar Dilthey, que “toda expressão de vida implica um saber que a forma a partir de seu interior”, e retomando a análise a partir de Hegel questiona sua visão de espírito objetivo, se o “meio ético em que ele vive e o qual compartilha com os outros constitui algo de “sólido” que lhe permite orientar-se a despeito das contingencias um tanto vagas de seus élans subjetivos” (Gadamer, 2006, p. 32), o destaque do sólido foi feito pelo autor.
O autor lembra de Dilthey o seu “Investigar as formas sólidas” (um dos temas da Coletânea de escritos), que implica que tanto a contemplação como a reflexão “implica sempre em experiência prática”, então contesta Gadamer: “aos olhos de Dilthey, a objetividade do conhecimento científico, não menos do que a reflexão meditativa da filosofia, seja um desdobramento das tendências naturais da vida” (GADAMER, 2006, pp. 32).
Na mesma coletânea, lembra Gadamer, Dilthey dizia que “nossa tarefa … será explicar como os valores relativos de uma época podem adquirir uma dimensão de algum modo absoluta” e apesar de ser uma preocupação com o absoluto, o caminho entre o relativismo e a totalidade é bem outro, uma vez que “ser conscientemente um ser condicionado” de Dilthey não é uma crítica explícita ao idealismo.
Toda esta filosofia diz Gadamer parte de certo intelectualismo diria, de visionário “líquido” e aponta para uma “motivação intelectualista da objeção ao relativismo, intelectualismo incompatível não só com a implicação última de sua filosofia de vida, mas, também com o ponto de partida por ele escolhido, ou seja, a imanência do saber á vida mesma” (GADAMER, 2006, p. 36).
Esclarece o ponto de vista de Dilthey “que exige que sua filosofia se estenda a todos os domínios em que a “consciência, por meio de uma atitude reflexiva e dubitativa, encontre-se liberta do domínio de dogmas autoritários e aspire a um saber verdadeiro” ‘ (Gadamer, 2006, p. 34) fazendo citações do próprio Dilthey entre aspas, de sua Coletânea de Escritos.
As questões do espírito na filosofia hegeliana permaneceram sempre no conceito vago do absoluto, e jamais compreendeu a questão da contemplação, de um saber além, a sua transcendência é aquela que vai do sujeito ao objeto sem qualquer plano divino ou superior.
Este foi o dilema de Tomé fazer a experiência, embora tenha convivido com Jesus após sua morte não consegue manter sua convicção precisando tocar nas chagas do mestre.
GADAMER, H-G. O problema da consciência histórica. Trad. Paulo Cesar Duque Estrada. RJ: Rio de Janeiro: FGV, 2006.
A coragem e o Ser
O imprudente não é corajoso, na antiguidade Platão e Aristóteles a definiram de modo parecido, para Platão a coragem “saber o que não temer” enquanto para Aristóteles é a virtude moral que se encontra no meio-termo entre a covardia e a imprudência.
Porém quando a coragem se torna covardia, certamente não é quando é prudente e sabe os perigos que cercam determinada atitude, mas se é uma virtude ela não pode estar distante da verdade, assim significa que não pode renunciar a verdade, sob pena de renunciar ao seu Ser.
Mas a verdade não é uma visão dos dados, dos fatos ou um posicionamento diante da realidade, a filosofia e a física moderna incluem uma terceira hipótese entre Ser e não Ser, e assim é possível o “meio-termo” aristotélico sem que ele seja a capitulação da verdade.
O tema angústia e medo, que ocorre quando há ameaça a própria existência, levando-as muitas vezes a permanecer na dispersão da preocupação, em Heidegger, essa dispersão, que é o modo de existir da maioria das pessoas, só pode ser vencida através de uma “decisão antecipatória” que leva o Dasein a acolher nele só o que é finito, moral ou imediato.
Outros autores, como Kierkegaard que criticou os que haviam pensado uma solução desta preocupação em um deus “imaginado” pela razão, e neste sentido está correto já que isto não é depositado na fé, criticam os que haviam pensado em uma transcendência do “Deus acima de Deus”, que seria uma espécie de coragem do Ser, e isto seria a potência do ser com raízes na transcendência, estão certo porque não sendo algo divino “a confiança em Deus” transformam em potência situada além, e assim torna-se a confiança em si mesmo.
Há algo na existência humana que é uma espécie de medo máximo: a morte, há aqueles que buscam a fonte da eterna juventude, o prolongamento da vida, porém a finitude humana é algo que causa um medo fatal, e diante da morte muitos poucos são aqueles que não invocam a presença divina, a presença da mãe ou algum outro recurso transcendente.
O filósofo coreano-alemão Byung-Chul Han esclarece bem isto: “A perda moderna da fé, que não diz respeito apenas a Deus e ao além, mas à própria realidade, torna a vida humana radicalmente transitória” porque viver bem cada momento presente é estar na eternidade.
Nem todos creem porque precisam ver o eterno, porém Tomé que viveu com Jesus precisou tocá-lo ressuscitado para crer que há o eterno, há o infinito além do humano, o Ser-aí que somos.
Líbano, eleições no Irã e leste europeu
As eleições no Irã já ocorreram dia 28/06 indicando que o prognóstico correto de ligeiro favoritismo para o reformista Masoud Pezeshkian o mais votado com 44,40% sobre o ultraconservador Saeed Jalili com 40,38%, o segundo turno deverá ocorrer no próximo dia 05/07 e as eleições significam muito para o Ocidente e para o futuro da relação com Israel.
As eleições foram antecipadas devido a morte do ex-presidente Ebrahim Raisi em maio no acidente de helicóptero no norte do país, o regime está submetido a uma junta de clérigos sob o comando do Aiotalá Ali Khamenei, que sucedeu ao famoso líder Khomeini e o presidente se submete a esta junta de clérigos.
Porém a tensão na região do Líbano, onde é visto pela população e diversos governos como um ataque próximo por parte de Israel, é parte neste xadrez onde o Irã é visto como aliado do grupo Hezbollah que tem base neste país, alguns países já pediram aos seus cidadãos que não viajem ou saiam do Líbano com urgência.
A possibilidade de um governo reformista no irã e a crescente pressão sobre Israel pode ajudar a mudar o cenário da região de guerra e tensão em escalada e com um futuro muito sombrio.
A tensão no leste europeu também cresce, a escalada da guerra atingiu a Criméia sob governo russo e a retaliação atingindo as fontes energéticas da Ucrânia, a Russia sob o tom devido o crescente apoio do Ocidente a Ucrânia e acusa diretamente a França de enviar tropas, o que significa na prática uma declaração de guerra.
Nos EUA a pressão também cresce, no debate presidencial o tema foi relevante, as eleições no país ocorrerão no início de novembro, e no primeiro debate Biden se viu desgastado e agora se fala em substituição dele como candidato.
A Rússia sob o tom, comentando até a patética tentativa de golpe na Bolívia, vista pelo Kremlin como aliada russa, porém houve uma troca de 90 prisioneiros entre os dois países (foto) num raro momento de trégua em meio a toda uma zona de fronteiras sob forte contingente militar.
A paz sempre é possível, é preciso corações e mentes capazes de ultrapassar o ódio e a violência.