Arquivo para agosto 15th, 2024
O poder temporal e o perdão
O poder temporal raramente encontra espaço para o perdão, porém isto não significa que nunca passe pelo pensamento humano e pela filosofia, ainda que em sua essência perdoar seja divino, e isto significa ir além do que humanamente é pensável.
Para o filósofo Jacques Derrida: “quando o perdão está a serviço de uma finalidade, seja ela nobre ou espiritual, como a redenção ou a reconciliação, ou seja, cada vez que ele tenciona restabelecer uma normalidade, social, nacional, política ou psicológica, por um trabalho de luto ou terapia, não é puro […] O perdão deveria permanecer excepcional e extraordinário, colocando à prova o impossível, como se ele interrompesse o curso ordinário da temporalidade humana”, assim permaneceu dentro de limites humanos.
Não há dúvida que crimes contra a humanidade, atrocidades e barbáries são além do limite da “temporalidade humana” e assim o poder terreno também o é, uma vez que é temporal, mesmo ditadores que permaneceram toda vida no poder tiveram um fim trágico ou de morte temporal, e alguns foram esquecidos, outros até banidos da memória popular.
Assim é de se considerar como algo fundamental o perdão além do poder temporal, e ele poderia ser um regulador para períodos de crises e de guerras, em quase todas não se pode medir o grau de atrocidades cometidas, tanto da parte dos “vencedores” como “perdedores” e o racional (e divino) seria considerar que se enfiaram numa contenda que jamais deveriam entrar.
Assim também nossas mágoas e desavenças pessoais e sociais, o quão seria útil e saudável um momento de serenidade e sentar-se a mesa de diálogo e poder tratar de soluções impensáveis, ou no dizer de Derrida “colocando à prova o impossível”, o momento parece este.
Se tivermos a coragem de ouvir aquele “inimigo” que jamais ouviríamos, de dar a mão a alguém cuja mágoa ou desavença é muito grande, poderíamos retornar um caminho destrutivo que parece sem volta, e cuja superação depende apenas de uma atitude: perdoar.
Até mesmo aqueles que nunca nos pedirão perdão, perderam a serenidade e humanidade de ver o outro além de julgamentos e discórdias, há sempre um outro ser ali, ontologicamente só negamos o Ser, se negamos a ouvi-lo e dar-lhe algum crédito, talvez precise disto.
Perdoar é divino, quem dá este passo entende que há outra realidade além do que imaginamos ser real e possível, o impossível também está ao alcance de quem perdoa.