RSS
 

Arquivo para agosto 30th, 2024

Vida interior e felicidade

30 ago

Vivemos a pura exterioridade, o homem moderno não conhece a vida interior, está projetado sobre as coisas e as ações, acredita que pode arrancar dela aquilo que falta interiormente.

Byung-Chul Han em seu ensaio “Vita Contemplativa” cita um conto de Walter Benjamin “Não esqueça o melhor” no qual lembra um rapazinho pastor, “a quem é permitido, em “um domingo”, entrar na montanha de seus tesouros, mas com a instrução enigmática: “não esqueça o melhor”. O melhor significa o não fazer.” (Han, 2023, pg 33).

Fazendo uma leitura do Ser na modernidade, Han escreve: “A crise do presente consiste em tudo aquilo que poderia dar sentido e orientação à vida e está se partindo.  A vida nãos e apoia em nada resistente que a sustente.” (pg. 87), lembra citando Hanna Arendt que afirma “encontrar incerto abrigo na escuridão do coração humano” que ainda tem a capacidade de dizer: “de recordar e dizer: para sempre” (idem) e lembra neste aspecto a imortalidade.

Ao contemplar o ser que tem uma dimensão temporal: “Ele cresce longa e lentamente. O curto prazo atual o desmonta.” (pg. 89) e cita Niklas Luhmann sobre a informação (atual): “Sua cosmologia é uma cosmologia não do ser, mas da contingência” (pg. 89 citando Luhmann).

Mas lembra a imortalidade traduzida nesta crise como: “A busca pela imortalidade, pela glória imortal, é, segundo Arendt, “a fonte e o centro da vita activa.” O ser humano conquista sua imortalidade no palco do político” (pg. 145), mas a verdadeira imortalidade é o eterno.

Então escreve Han: “Em contrapartida a vita contemplativa não é, segundo Arendt, o persistir e durar no tempo, mas a experiência do eterno, que transcende tanto o tempo como também o mundo circundante.” (idem pag. 145).

Arendt admira Sócrates, escreve Han, “que renuncia voluntariamente à imortalidade” (pg. 146) e assim lembra que mesmo o escrever torna-se vita activa, e cria uma imortalidade passageira, a qual Han lembra que também Arendt buscou ao escrever.

Mas não se trata de abandonar o complemento da vita contemplativa que é a vita activa, o que acontece é que o “animal laborans” (como Arendt chama o moderno): “está arruinando todas as capacidades humanas, sobretudo a ação” (Han, 2023, pg. 149).

Lembra que a capacidade de ação brota do pensamento “que não é irrelevante para o futuro humano, pois se considerássemos as diferentes atividades da Vita activa em relação à questão sobre qual delas seria a mais ativa e em qual delas a experiência do ser ativo se expressaria de maneira mais pura, então o resultado seria que o pensamento todas as atividades no que diz respeito ao puro ser ativo” (Han, 2023, pgs. 149-150).

Assim não é de nosso exterior que brota nossas más ações, mas antes estão no nosso interior.

Han, B.C. Vita contemplativa. Trad. Lucas Machado. Petrópolis: Ed. Vozes, 2023