Epifania, Eucaristia e a filosofia
A passagem do menino-Deus na Terra é a sua manifestação aos homens, a Epifania, que poderia desaparecer após a morte e crucificação daquele que é pura manifestação do divino em meio a raça humana, poderíamos dizer a manifestação do Ser por excelência entre os seres e entes, temas caros a Husserl, Heidegger, Deleuze e Derridá.
Mas há entre os seres uma manifestação do Ser, que é aqueles que se reúnem em atitude de completa abertura e conseguem chegar a negação do ser, para ser com o outro, rompendo a lógica clássica, o não-ser é ser porque é ser com o outro, conforme pensaram Lévinas e Paul Ricoeur.
A parcela mística da presença de Jesus, para os que creem o homem-Deus, que na cruz assemelha-se ao hommo sacer, figura utilizada por Giorgio Agamben e Hanna Arendt e, recentemente, também Slavoj Zizek, figura usada para dizer o homem comum privado de sua humanidade, embora este não possa ser confundido com uma figura religiosa, poderíamos dizer se privou até mesmo disto, aqui a epifania se torna Eucharistia se pensarmos em coisa, não ser de fato, puro ente, ainda que guarde algum traço do Ser.
Eucharistia do grego εὐχαριστία, na explicação cristã católica a transubstancia do corpo de Jesus em pão e vinho no ápice de uma missa, mas gosto de lembrar o quadro de Rafael Sánzio no Vaticano, chamado “A disputa do sacramento” entre figuras cristãs e religiosas está lá uma disputa entre filosofia e teologia ou entre uma natureza divina e uma pura substância com um ostensório sobre um altar, coloca abaixo das figuras religiosas em meio a filósofos mundanos.
Se há uma tensão entre o ser e o ente, afirma Deleuze “o além celestial de um entendimento divino inacessível a nosso pensamento representativo, ou o aquém infernal, insondável para nós, de um Oceano de dessemelhança”, assim não são os seres e coisas, mas poder se pensamos um Puro Ser transformado em Pura Coisa, ou melhor puro “noúmeno”, a coisa para os clássicos, mal compreendida por Kant onde é pura dessemelhança.
Eucharistia é ser transformado em noúmeno, pessoa transformada em substância, algo definido pelos cristãos como “transubstanciação”, insondável mas não inalcançável.
Epifania é ao mesmo tempo noesis e noema (perceber e o que é percebido) e só será plena em nossos dias na Eucharistia, um Ser-Coisa devorado por homens famintos, mas é preciso a Fé.