Crise, ontologia e kénosis
Desenvolvida a ideia da crise em uma visão mais profunda, e usando o método da decadialética de Mario Ferreira dos Santos, é possível buscar um caminho pela: “abstração de um dos opostos, cuja positividade passa a ser negada ou reduzida a outra.” (SANTOS, 2017, p. 75)
É preciso também, como indica o filósofo caminhando em seu método: “salvamo-nos do ceticismo e do dogmatismo, que são duas posições de crise sobre a possibilidade gnosiológica do homem.” (p. 79)
Queremos ir além do pensamento para apontar a superação da crise, não que o pensamento em essência de Mario Ferreira não seja suficiente em essência, mas uma atualização é necessária, para superar o que ele chama pensamento de crise, para estruturar uma filosofia da crise: “e, consequentemente, de se ter uma visão crítica da crise do existir finito.” (idem)
A diferença essencial é que Mário Ferreira vai para um caminho de síntese o que ele chama de Filosofia Concreta, que aponta no livro em diversos trechos como uma leitura complementar para entender seu pensamento, o que se propõe aqui é uma retomada ontológica radical.
Assim propõe para além da ontologia a Kénose, segundo Valodomer Koubetch, “Kenose: Kénosis, kenótico, de kenoo, esvaziar, extenuar, reduzir a nada; estado de humilhação” e isto é necessário porque devemos admitir que não temos a resposta pronta, não temos o discurso ou se preferirmos a narrativa única para o pensamento de crise, e nos amparamos no auxílio dado pelo filósofo brasileiro, para falar na Filosofia da Crise, identificando –o em essência.
Pode-se então enumerar a saída como uma ontologia trinitária, se há uma tensão entre polos opostos de discursos descritos na decadialética, pode-se pensar numa lógica do Outro, do não-eu, ou radicalmente do vazio kenótico onde pode emergir no duplo vazio, um terceiro estado.
A comparação coma trindade é inevitável, pois no discurso teológico a realidade de Jesus Cristo, Filho/Verbo de Deus que, sendo Deus, a Segunda Pessoa da Trindade, aniquilou-se, humilhou-se e assumiu a condição humana, fez sua kénosis, abrindo uma nova realidade.
Pode-se esgotar o discurso do diálogo, do dialogismo e da polifonia, porém todos não são suficientes se não há a possibilidade nas tensões opostos de abrir uma Kenosis, se feito por dois discursos ou duas pessoas convictas, emerge um terceiro não-eu-tu como uma ontologia trinitária, uma superação do dualismo, não sem tensão ou sem contraditório, mas novo.
SANTOS, Mario Ferreira. Filosofia da Crise, 1ª. ed. São Paulo: É Realizações, 2017.