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O estado de Kant a Hegel

30 mar

São diversos interpretes que apontam o fato que Rousseau intencionava escrever uma obra sobreGuerraPaz as “Instituições Políticas” nelas configurar o “estado” como algo “natural”, por exemplo, na própria obra do autor intitulada Confissões, que incorre no mesmo erro, já apontamos, de entender como natural o que é fato cultural, ideológico e político.

Pois foi deste modo que uma sociedade marcada pela divisão e pela violência promovida de modo especial pelo Estado, natural significa a contenção coercitiva da paz civil pelo Estado, segundo regras e leis, estabelecidas primariamente naquilo que Montesquieu chamou de “Espírito das Leis”, ou seja, natureza significaria guerra, sociedade significaria paz ou, mais precisamente segurança, que nem sempre é a segurança de todos.

Havia uma brecha na visão de Montesquieu, que considerava a igualdade virtual de forças em que todos se sentissem igualmente ameaçados, o suposto de Hobbes, mas que não indicasse uma tendência mais eminente de não se entre atacarem, ou seja, em se evitarem, e a paz, e não a guerra seria “a primeira lei natural”.

Esta passagem do “paleolítico” de solidões do estado de natureza ao “neolítico” do estado social que impeliu o ímpeto de apropriação egoísta dos bens naturais, embora chamado de estado social, não é senão a apropriação do público pelo privado, e vice versa, porque o privado não são senão aquilo que os próprios senhores do poder o definem.

É preciso assim retornar aos primórdios da sociedade e sua formulação da ideia do estado, na filosofia de Kant e sua reflexão sobre guerra e paz, o seu traço distintivo é como o sistema de ideias do seu pensamento, de modo intrínseco, atacou o binômio guerra e paz, para estabelecer um ponto de vista “das condições objetivas de estabelecimento de um estado de paz entre os povos, para ele o lugar da necessidade era ocupado pela guerra e não pela paz”.

Esta “realidade” ideal se opunha entre os lamentos piedosos ou exortações de ordem moral, como a condenação da guerra por Erasmo, onde seu horizonte antropológico-política tem a questão da Paz como finalidade imperativa, mas “deve” vigorar pela razão ideal moderna.

Negando a metafísica medieval, seu “projeto de paz perpétua metafísica” na crítica da razão pura, não é senão os limites da própria razão na chamada “doutrina do direito, um projeto cosmopolítico de paz universal, que será o que ficou conhecido como “Paz Perpétua”, que duas guerras mundiais provaram sua ineficácia.

Assim pode-se ler o conceito de natureza escondido em Kant: “Pode-se considerar a história da espécie humana, em seu conjunto, como a realização de um plano oculto da natureza em estabelecer uma constituição política perfeita interiormente, e quanto a este fim, também exteriormente perfeita, como o único estado no qual a natureza pode desenvolver plenamente, na humanidade, todas as suas disposições.” (Kant, 2003, p. 17)

O opúsculo de 1795 “Para a Paz perpétua. Um projeto filosófico” pode-se ter uma visão articulada das ideais de Kant sobre isto, mas será em Hegel que este projeto será acabado.

Não é exagerado, leia-se em Hegel: “a guerra de nenhum modo deve ser vista como um mal absoluto ou um puro acidente” (Hegel, 1974, § 328)

Em Hegel a guerra será uma empresa racional além da ideal, alguns governantes atuais que o digam, para alguns interpretes a ideia de Estado de Hegel é de uma filosofia de guerra, dando ao Estado uma concepção quase ou muito próximo do divino.

O filósofo que se propõe a criar uma visão “real” do estado “racional”, torna isto consciente por um conjunto de avatares da realidade, ao dizer: “A história é a figuração do Espírito sob forma de acontecimento” (Hegel, 1974,  § 348), e podemos citar como fatos “reais”: a Revolução Americana, Revolução Francesa, Império Napoleônico e até a Santa Aliança, sem falar das inúmeras guerras que pululam por todo o planeta, e um redesenho do Planeta, veja-se Armênia, Bósnia, Ucrânia, e tantos outros, feitos não pela razão mas pela “bala”.

KANT, I. A Ideia de uma História Universal de um ponto de vista cosmopolita. São Paulo: Livraria Martins Fontes, 2003.

HEGEL, G.W.F. A Fenomenologia do Espírito. São Paulo: Abril S.A., 1974

 

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