Consciência histórica efeitual, a dor e o Outro
Nesse sentido, fala-se numa inversão da consciência, mas a consciência em Hegel e em todo iluminismo, segue como sendo a experiência se traduz num movimento dialético da consciência consigo mesma., ou seja em última instância, no saber absoluto percebe-se uma identidade de sujeito e objeto, mas na lógica da fusão e não da distinção entre sujeito e objeto. Isso retira toda a possibilidade e a legitimidade da experiência, já que o homem tem de estar no próprio conteúdo para aceitá-lo e a consciência adquirir certeza de si mesma;
Na lógica de Gadamer, “a essência da experiência é pensada aqui, desde o princípio, a partir de algo no qual a experiência já está superada. Pois a própria experiência jamais pode ser ciência“, ademais, Heidegger adverte que Hegel não pensa a experiência como dialética; pelo contrário, visualiza a dialética a partir da experiência, dir-se-ia não é a consciência do mundo, mas o mundo da consciência.
Se da experiência jamais se faz ciência por haver “uma oposição insuperável com o saber e com aquele ensinamento que flui de um saber teórico ou téncico”, objeto de vários estudos nossos, pois fica-se sempre diante de uma abertura para outras experiências. Deve-se aceitar o fato de que certezas e dogmas não perduram eternamente e são passíveis de alteração. A única certeza plausível é impossibilidade de se conhecer tudo. Quanto mais experimentado é um indivíduo, mais consciência tem das infinitas possibilidades do ser humano e mais tem consciência do seu Ser.
Assim o caminho feito Gadamer possui elementos para concluir que a experiência é a consciência da própria finitude humana e das limitações, uma referência a filosofia clássica, em Ésquilo é bastante ilustrativa: “aprender com o sofrer”, ou seja, de forma dolorosa, o homem torna-se ciente da sua separação da divindade e da temporalidade de sua existência.
Toda experiência, por mais que se pense consumada ou exaurida, constitui sempre abertura. Nem mesmo o próprio homem possui uma essência. O ser significa um poder ser si mesmo, pois tem por características a indefinição e as infinitas possibilidades. Dessa forma, torna-se incoerente falar da experiência no sentido teleológico, à semelhança de Husserl e Bacon, e da forma descaracterizada de Hegel.
A tradição precisa alcançar a experiência, assim como linguagem é complementar e dela vem à fala, que é um tu, deve-se diferenciar a experiência do tu da experiência verdadeiramente hermenêutica, vejam-se trabalhos de Paul Ricoeur e Emmanuel Lévinas, enquanto a primeira pode se dar sob a forma de conhecimento de pessoas, tornando o tu um objeto de análise, ou reconhecendo-o como pessoa, porém ainda permanece com referência ao próprio intérprete, a hermenêutica permite o outro como interprete é portanto um passo a frente no conhecimento da verdade.
A experiência hermenêutica é aquela que assume a consciência da história efeitual. A tradição precisa ser compreendida verdadeiramente como um tu. Toda alteridade tem algo a dizer e deve ser respeitada sua condição de outro. Não se pode impor pretensões ou concepções prévias. A abertura se dá de forma mútua, isto é, entre quem “escuta” e aquele que “fala algo”, inclusive com a possibilidade de que seja contrário ao intérprete, conforme Gadamer:
“A consciência hermenêutica tem sua consumação não na certeza metodológica sobre si mesma, mas na pronta disposição do homem experimentado ao que está preso dogmaticamente. É isto que caracteriza a consciência da história efeitual, como poderemos pronunciar mais detalhadamente a partir do conceito de experiência”.