Pós-modernidade e política
As ligações de Jean-François Lyotard (1924-1998) com a análise da pós-modernidade é imediata, mas menos imediatas são as manifestações de 1968 nos EUA e Europa, o próprio Lyotard foi militante do grupo “Socialismo ou Barbárie” na França, e menos imediata ainda são as rupturas com o modelo idealista dos filósofos Nietzsche, Schopenhauer e Kierkgaard a mais de um século atrás.
Em 1979 Lyotard lançou o clássico livro: “A condição pós-moderna”, onde já propunha a crise política, chamando-a de sofista no sentido que reformula o problema da democracia da seguinte forma: a política do discurso a moda dos sofistas fundada na opinião democrática, e política de dimensão universalista de Kant, consagrada no modelo de Estado hegeliano e no contrato social.
O ponto de discórdia com Habermas é que Lyotard considera insatisfatória e frágil a articulação entre o que é de direto e de fato, a articulação que a torna por um lado abstrata demais e, por outro, factual demais, nem o consenso do contrato que é frágil, e nem aquilo que poderia se considerar a praticidade dos “fatos” com utopia ausente.
Digo assim por Lyotard: “O consenso tornou-se um valor ultrapassado, e suspeito. A justiça, porém não o é. É preciso, pois, chegar a uma ideia e a uma pratica de justiça que não estejam ligadas à do consenso.” (Lyotard, 1979, p. 106)
Mas a crítica de Lyotard não para aí, funda-a num jogo de linguagem chamado de dupla analogia, entre o “prático-político” e outro “cognitivo” da ciência que seria “de fato”.
Assim a primeira parte funda-se em fazer uma crítica ao critério sistêmico de comunicação proposto por Luhmann, mas não deixa de fazer referências as teorias da relatividade e quântica, os “sistemas abertos”, as teorias das catástrofes e do caos, entre outras.
A segunda parte da solução lyotardiana vem da legitimação de um caminho do direito, visando criticar os fundamentos metodológicos da teoria do consenso, vindas de Bachelard, Kuhn, Feyerabend e Serres, que são tentativas de revitalização do caminho “científico” de trabalhar os fatos tendo como consequência dois tipos de pragmatismos complementares.
Ainda que discorde da pragmática, aquilo que chama de “a legitimação pela paralogia” que é a participação de “comunidades sociais”, há o equívoco entre combinar a ciência e a política, há um aspecto positivo de fazer a crítica no qual o poder do Ocidente não pode se considerar superior ao jogo de linguagem narrativo, que encontramos nas culturas primitivas, uma vez que uma metanarrativa que foi emprestada desde Platão à filosofia (Lyotard, 1979, p. 51).
O universo do discurso pós-verdade é portanto uma paralogia, inventado pela razão cínica dos tempos atuais, não há senão aquilo que Lyotard chama em outro livro Le différend, os diferendos, que são os diferentes em uma lógica de conflito, com discursos feitos em diferentes lógicas.
Lyotard, J.F. Le Condition postmoderne. Paris: Minuit, 1979.