O dualismo de Kant
Apesar de Kant ter feito uma crítica de Descartes ele não penetra na questão corpo e consciência (ou mente como querem muitos), mas naquilo que ele considerou o núcleo do pensamento cartesiano a “representação” das coisas (fenômenos):
“Toda a nossa intuição não é mais do a representação de um fenómeno ; as coisas que nós intuímos não são, em si próprias, como nós as intuímos, nem as relações entre elas são em si próprias tais como nos aparecerem;”
É pelo que ele chama de “coisa” que pode se confundir como o fenômeno, mas trata-se da tese que o ser humano tem uma espécie de software na sua cabeça que interpreta o mundo: o cérebro não é um recipiente para onde são “atirados” os objetos do mundo, ele processa “naturalmente” a cultura do mundo e a vê-lo de certa maneira.
Se vivesse em nosso tempo diria que é uma pintura, e não uma fotografia, e ainda assim diria que as duas são “representações” pois não é possível conceber a realidade objetiva, apenas subjetiva, isto é, na mente do sujeito, então é ainda dualista.
Sua espécie de dualismo, é a oposição entre os conceitos de “intuição derivada”, por um lado, e “intuição originária”, por outro lado, não uma cultura originária, mas intuição.
Já a “intuição derivada” é, segundo Kant, a “intuição sensível” do ser humano; e a “intuição originária” é a “intuição intelectual” que Kant diz que é divina e não cultural.
Não fiquem felizes os religiosos, embora a maioria entenda isto como “transcendência” e que deu na religiosidade “vaga” dos dias de hoje, aquela que afirma que qualquer intuição é do “Espírito Santo”, sem ter relação com a objetividade, eis o Kant puro.
O grande problema kantiano que refletirá na filosofia, aquela que Marx dizia dos velhos hegelianos, onde o Homem e Deus estão em realidades totalmente separadas e sem alguma possibilidade de interação ontológica, eis o Deus “morto”.
O pensamento kantiano que considero mais essencial é aquele que:
“E se tirássemos do centro o nosso sujeito ou mesmo só a constituição subjetiva da sensibilidade em geral, toda a constituição, todas as relações dos objetos no espaço e no tempo, bem como o espaço e o tempo desapareceriam porque, como fenómenos, não podem existir em si próprios, mas apenas em nós.”
Quando a física moderna descobre que espaço e tempo não são absolutos, o centro de gravidade de Kant fica “balançado” e o a objetividade é questionada pois o sujeito passa a ser parte do fenômeno, então não é só representação, mas parte “ontológica”.