Verdade, além de teoria e prática
O conceito de teoria entrou em pouco crédito se deslocado da prática, porque o idealismo não tem outra possibilidade a não ser a de considerar que era a prática que determinava a verdade, ou o empirismo, pois o ideal como conhecimento, saber supremo da ideia, teria que ter algum método para discernir quando uma “teoria” é valida ou não, e só a experiência poderia dizer.
Há um domínio e um esclarecimento sobre a multiplicidade das coisas e, por outro lado, há um conhecimento de uma situação concreta como se fosse uma orientação mais adequada.
O que Gadamer procurou demonstrar em seu Verdade e Método, entre muitas outras coisas com a questão da historicidade e do método, foi que quando se trata das nossas capacidades técnicas, e elas incluem nossos pré-conceitos e nossa interpretação da realidade, o modelo de verdade não é nem deve ser único, e isto não significativa relativismo, mas capacidade de ver o horizonte posterior ao processo interpretação da realidade, ou seja, depois da fusão de horizontes
No aspecto de nossas capacidades técnicas, ela desempenha bem sua função, que é a de trazer relativa segurança e conforte diante de algumas necessidades que existem e outras que foram criadas no processo de fusão de horizontes.
Quando o campo em questão de nossa história e linguagem estão em jogo, nossa relação com a arte e com a religião, nossa consciência da morte, nosso autoconhecimento, e nossas escolhas e ações responsáveis diante de nossa vivência política, dentro as diversas outras experiências que nos afetam como seres humanos finitos, o modelo de verdade fracassa.
O que os gregos determinam como surgimento espontâneo de uma “arte” [τέχνε] própria para definir o sentido das palavras portadoras de verdade [συνβολον], a arte de interpretar [ερμηνευτικές τέχνες] tem na origem o nome “hermenêutica” que representa não apenas a nossa visão particular de um objeto, mas ao contrário nossa dificuldade de determinar precisamente o sentido de uma mensagem, enquanto a questão da técnica extrapola o techné: arte, oficio e técnica, que para Heidegger, mantém um vínculo estreio com a “episteme” ou seja, o conhecimento todo.
Enquanto o Aufklärung da modernidade acreditava que até os conteúdos da história, os quais se haviam tornado estranhos para nós, também nos poderiam ser acessíveis por meio de nossas atividades racionais, isto é, de uma reflexão teórica, o idealismo a moda dos “velhos” hegelianos, os novos não deixaram de ter referencia a historicidade, e Gadamer vai refletir sobre Dilthey, que teve o mérito de abandonar o psicologismo, sem deixar o historicismo romântico de lado.
Assim falando especificamente da arte, defendeu que para compreender adequadamente suas próprias obras, mais importante que captar a unidade entre o conteúdo do texto e a tradição, é aceitar o esforço de compreensão que só surge onde há a possibilidade de rever algum mal- entendido, ou alguns pré-conceitos, em outras palavras, a interpretação é da natureza do compreender, pois dela faz parte a possibilidade quase sempre do mal-entendido.
Para da hermenêutica contemporânea, com alguns equívocos, Schleiermacher afirma que a tarefa de compreender um texto se deve converter também em um esforço para compreender outra individualidade, que depois vieram tantas questões sobre o Outro.
Capacidade de ir além dos pré-conceitos e reinterpretar a própria verdade é parte do esforço de superação de barreiras onde a irracionalidade e o ódio constroem muros intransponíveis, Gadamer dá este exemplo em Verdade e Método: “Quem abandona-se a particularidade torna-se ungebildet (estranho, “sem forma”), por exemplo, se alguém ceder a raiva cega, sem senso de medida”.