Pluralidade, polifonia e tonalidade
Embora Byung Chul Han em sua leitura de Heidegger e sua tonalidade afetiva, descreva apenas de passagem a democracia plural, ao comentar a “polifonia” que Derrida opondo-se à “totalidade não exclui a tonalidade. A justaposição de notas seria equivalente à monotonia de um coração perturbado, que certamente seria distinto do coração atonal” (Han, 2023, pg. 16).
Para desenvolver melhor a questão do estado e de sua pluralidade, aproxima Heidegger da “arte de viver … limitada onde o mundo começa a se povoar com os corações dos outros, onde não nos encontramos mais na proximidade do estético” (pag. 17).
Vai explorar o conflito dos corações de Hegel que pretendia resolver dialeticamente e não aparece em Heidegger (pg. 18), sua “poética” não se identifica “à política do coração” (idem).
Após o fracasso do sujeito do prazer faustiano (Hegel cita Fausto de Goethe), Hegel ao opor o particular com o universal não se reencontra na “ordem universal”, esta abertura imediata do coração para o universal, a universalização do coração faz que a autoconsciência “enlouqueça” e causa uma colisão frontal entre o universal e o particular que fende a consciência (pg. 18).
Gerar esta “singularidade da consciência, que quer imediatamente universal” resultam em esquizofrenia (pgs. 18-19), é um trecho fundamental de Byung-Chul Han capaz de explicar até mesmo as grandes guerras e o momento bélico mundial.
Ela mostra o que acontece com os corações com o “pulsar do coração” para o universal, que se transforma em “fúria de uma presunção desvairada”, postula “o desvario da ordem mundial” (pg. 19), o coração efetivado é repressivo, se efetiva ao reprimir outros corações.
A circuncisão do coração do particular por parte do “espirito” (reivindicado por Hegel), suprassume o particular em favor do universal, “saber a lei do coração como lei de todos corações, e a consciência do Si como a ordem universal reconhecida” (Han citando Hegel, pg. 20).
Heidegger opõe a lei da casa (oikos), do fogo doméstico para além da economia dialética, ela “não deve pisar no palco dos discursos” (Han, pg. 21), esta “disputa sem guerra” (na visão de Hegel) não tem nenhuma semelhança familiar com o conflito dos discursos (pg. 21).
“O coração de Hegel, que na terceira parte da Enciclopédia se torna a sede das sensações, carece de toda objetividade e universalidade” (Han, pg. 22), nela o “coração cego de Hegel só sabe expressar algo “singularizado, contingente, unilateralmente subjetivo” … “é uma reação meramente subjetiva a sensação externa” (pg. 22), e Han dá o antídoto, chamando-o de dom.
O Ser com dom é o “singular por excelência, que, na sua singularidade, é unicamente o uno unicamente unificador, antes de todo o número”, a impossibilidade do número anula a economia da troca (pg. 25).
O que deve ser retomado deve ser dado como um dom, é preciso manter este dom afastado da economia da troca, soltá-lo do circulo econômico da troca”, isto é princípio do afetivo.
Han, B.C. Coração de Heidegger: sobre o conceito de tonalidade afetiva em Martin Heidegger. Trad. Rafael Rodrigues Garcia, Milton Camargo Mota. Petrópolis: Vozes, 2023