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A visão teológica de Agostinho de Hipona

24 jun

A maior parte da literatura ocidental vê a vida de muitos santos que eram filósofos e teólogo, a partir do iluminismo com uma visão unilateral e materialista, visão particular do realismo que se concentra apenas naquilo que é “substancial” ou seja, aquilo que existe por si mesmo sem necessitar de uma força “externa”, porém examinando a vida de Agostinho, Boécio, Tomás de Aquino e muitos outros encontramos uma profundidade teológica inseparável da filosófica, sua superação do maniqueísmo é importante, porém sua visão trinitária ainda é pouco conhecida.

Parte desta separação é em virtude da “especialização” crescente em todas os campos de estudo, em alguns sequer há algo de espiritual (só chamado subjetivismo idealista), assim como a física, a matemática e a química, porém cada vez mais esta visão se amplia à uma nova cosmovisão, como no caso da física quântica, na temática fractal (fracionária + natural) e até as propriedades químicas de elementos como a água, são estudadas como tendo “algo”.

O primeiro grande filósofo da chamada patrística, o início da escola medieval, Agostinho de Hipona teve forte influência de Plotino, neoplatônico que escreveu sobre o “uno” e a “alma”.

Suas obras as Confissões e Cidade de Deus são as mais lidas e citadas, já postamos aqui que sua obra mais profunda De trinitate é surpreendente pelo tempo que foi escrita (mais de 16 anos, portanto com profundas e demoradas reflexões), como pelo seu conteúdo, diz logo em suas páginas iniciais referente ao Gn 1,26 (Gênesis) no tema o nome feito a imagem de Deus (imago Dei):

“façamos o homem à nossa imagem e semelhança, façamos e nossa foram ditas no plural, e não podem ser compreendidas a não ser como relação. Não para que se fizessem deuses, ou à imagem e semelhança de deuses, mas para que o Pai, o Filho e o Espírito Santo fizessem à imagem do Pai, do Filho e do Espírito Santo, para que subsistisse o homem como imagem de Deus. Ora, Deus é Trindade” (Agostinho, A Trindade, VII,6,12).

Isto está em consonância não só com a Bíblia como também com o neoplatonismo, onde o ser humano é composto por um porção corpórea/material e uma porção espiritual, uma parte inferior o anima e uma superior denominada com certa largueza de sentido como animus, spiritus ou mens, assim o substancial da alma exerce sobre “toda alma” uma função espiritual (Agostinho, A Trindade, X,4,6), e ambas são inseparáveis, embora complementares.

É próprio da filosofia contemporânea separar estes dois “ingredientes” da alma, e há até quem os confunda criando uma ideia de que a “providência divina” é somente material e a espiritual caberia ao próprio homem, criando algo inverso: o substancial é espiritual e o essencial etéreo.

Há autores que criam uma imagem divina como somente a presente na mente (Ludwig Feuerbach  que escreveu A Essência do Cristianismo, o mais famoso,  mas há muitos “teólogos” com esta visão) são falsas, o próprio Agostinho a contesta (más leituras dele):

“logo, a trindade da mente não é imagem de Deus somente porque a mente recorda, compreende e ama a si mesma, mas porque pode também recordar, compreender e amar aquele por quem foi criada. Quando assim o faz, torna-se sábia. Por outro lado, se não o faz, mesmo que recorde, compreenda e ame a si mesma, é estulta. Portanto, que se recorde de Deus, à imagem de quem foi criada, e que o compreenda e o ame” (De Trinitate, XII,12,15).

Assim, para os cristãos, não apenas o “recordamos” também o compreendemos e o amamos.

Agostinho, Santo. A Trindade (De Trinitate). Trad. Agustino Belmonte: rev. e notas Nair de Assis Oliveira. São Paulo: Paulus, 1994.

 

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