A retomada ontológica e o esquecimento trinitário
A ideia de uma substância espiritual absoluta, infinita, única e eterna (veja o post) longe de ser uma ideia de Deus, longe de ser o desvelamento da Trindade Santa, é um esquema idealista da racionalidade para um Deus abstrato, porém compatível com o hegelianismo, o deus idealista.
A crítica severa de Sloterdijk ao humanismo faz sentido agora ainda mais com as perspectiva do pós-pandemia, colocando a “vontade de poder” das duas guerras e um possível cenário futuro, como “síntese do humanismo e do bestialismo” (Sloterdijk, 2000), é claro temos outras possibilidades, as variadas teses ideológicas que muitos apostam ou uma terceira excluída: a fraternidade planetária e uma via solidária.
Assim como a retomada ontológica propôs uma lógica e uma epistemologia nova, que vem da epoché (colocar todos conceitos entre parêntesis) husserliana, junto a uma teologia nova, esta sim trinitária, onde existe uma terceira pessoa na Trindade, que é o Espírito Santo, mas não é simples.
O teólogo cristão e católico Karl Rahner escrevia sobre o “esquecimento trinitário” (Rahner, 1961), mesmo antes do Concílio Vaticano II (1962-1965), que marcou uma virada no pensamento católico, primeiro concílio ecumênico que gerou algumas polêmicas e que até hoje não é bem aplicado,
O Concílio Vaticano II marcou uma profunda mudança na relação da igreja com a sociedade, devia abrir uma nova perspectiva da participação dos popular (dos leigos), uma nova visão da missão da igreja e em especial apresentação da atualização e inserção da igreja no seu tempo com vários aspectos litúrgicos e pastorais.
Muitos cristãos em geral entendem bem o Pai e o Filho, mas o Espírito Santo é um mistério, não síntese e nem apenas a relação com Deus Pai (Aquele que ninguém viu) e nem o Jesus (O Deus visível), o Deus vivo, histórico, mas sem deixar de divino e o Espírito Santo.
A teologia clássica tratava o “mistério” da Trindade com a ideia de uma “substância espiritual absoluta, infinita, única e eterna”, assim Deus seria uma única substância, essência ou natureza, explicado como três subsistemas e pessoas distintas: Pai, Filho e Espírito Santo, nestas ideias do sistema hegeliano (e de Feuerbach) se encaixam bem.
Já a compreensão do Ser como ato e potência (própria de Tomás de Aquino), e potência assemelha-se ao virtual, coloca as pessoas divinas como relação e se integram numa nova síntese que vê Deus como comunhão pericorética* de amor, teólogos de diferentes tendências como von Balthasar, Rahner e Kasper caminharam nesta direção e a questão ontológica é um viés comum. (* mais que relacionamento, interpenetração)
O Concílio Vaticano segunda já refletia já a virada de uma perspectiva metafísica de uma teologia que prioriza uma compreensão mais histórica, fenomenológica, hermenêutica e existencial da realidade, mais em sintonia com a cosmovisão e a cultura atual.
A compreensão do ser como ato (tão própria do Aquinate) e das pessoas divinas como relação, se integram numa nova síntese que entende Deus como comunhão pericorética de amor.
A compreensão por outro lado de potência como virtus, possibilidade virtuosa do Amor que é essencial para entender que o pecado é não-amor e não mera oposição maniqueísta do mal.
RAHNER, K. Advertencias sobre el tratado dogmático “de Trinitate”. In: Escritos de Telogía IV, Madrid: Taurus, 1961.