Autores e diálogos
Li um texto de 1968 de Roland Barthes “A morte do autor” no qual ele problematiza o conceito, propondo-o como “a destruição de toda a voz, de toda origem”, ele diria também do homem (de hoje) num momento conturbado de conceitos e de acontecimentos verdadeiramente e “estranhos” que estão se construindo “barricadas nos textos”, o que dizia de seus contemporâneos (Alain Badiou e Jacques Derridá afirmaram que sem este conceito não se pensa criticamente nenhum objeto), e o que diria hoje, certamente que sua tese estava certa, e hoje mais ainda.
É sabido que Foucault deu umas alfinetadas em Barthes, mas em Sade, Fourier, Loyola elas foram devolvidas ao inserir no jogo discursivo o leitor e reformula a questão da autoria em outra dimensão: o corpo, este objeto de consumo de tantas teorias hoje, somente em Barthes encontra alguma solidez (não líquida).
Para Barthes o texto é um corpo, um objeto de prazer dotado da capacidade de penetrar na vida do leitor em fragmentos, gerando coexistências entre leitor e autor, ou textualmente:
“O prazer do texto comporta também uma volta amigável do autor. O autor que volta não é por certo aquele que foi identificado por nossas instituições (história e ensino da literatura, filosofia, discurso da Igreja); nem mesmo o herói de uma biografia ele é … é um simples plural de ‘encantos’, o lugar de alguns pormenores tênues, fonte, entretanto, de vivos lampejos romanescos, um canto descontínuo de amabilidades, em que lemos apesar de tudo a morte com muito mais certeza do que na epopéia de um destino; não é uma pessoa (civil, moral), é um corpo.” (BARTHES, 2005).
Barthes propôs em 1977 (Leçon) uma distinção dos termos: literatura, escrita e texto, que é particularmente interessante conceitualmente, a escrita tem algo que é a manuscrição uma inscrição na qual se supõe um suporte, um utensílio, em segundo lugar (embora seja apenas de caráter didático) o sentido cognitivo, pelo qual se designa a instalação e o terceiro as formas “linguageiras” dotadas de significação que tomam um sentido artístico.
Para problematizar a questão da “pluridimensionalidade” proposta por Barthes para a literatura ele inicia a chamada “crítica genética”, problematizando o aspecto enunciativo do termo, tem como objetivo reconstituir uma história do texto em estado nascente, buscando encontrar nele os segredos de fabricação da obra, e assim é explicado o que é um texto e sua relação com a literatura.
É aqui que se estabelece o diálogo pela língua, sem a compreensão da genética de um texto, pode haver solicitude ou diálogo, mas não sairia da superficialidade e nem atingiria aquele nível desejável para muitos autores contemporâneos de assumir os pré-conceitos e estabelecer novos horizontes.
Barthes faz uma valiosa reflexão acerta da escuta distinguindo-a do ato fisiológico do mecânico de “ouvir”, dando-lhe um estatuto de ato psicológico que só se define por seu objeto e por sua intenção, categoria tão cara á hermenêutica embora não seja exatamente a mesma, guarda similaridades.
autor faz uma valiosa reflexão acerca da escuta, distinguindo-a do ato fisiológico e mecânico de “ouvir”, conferindo-lhe um estatuto de ato psicológico que só se define por seu objeto e por sua intenção.
É famosa a frase de Barthes: “Toda a recusa duma linguagem é uma morte” e um interprete deste autor explicita a diferença entre ouvir e escutar: “[…] uma escuta poiética (‘bruta’, como o quer Barthes) visa não aprisionar sons de uma maneira hierarquizante, como num insípido objeto de análise fria” (El Haouli, 2002), é este aspecto de diálogos hierárquicos que dominam muitos que julgam fazê-lo mas não o fazem, apenas desejam a submissão passiva do Outro às suas categorias.
BARTHES, R. Sade, Fourier, Loyola, Paris: Seuil, 1971. [tradução: Sade, Fourier, Loyola. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
EL HAOULI, Janete. Demetrio Stratos: em busca da voz-música. Londrina: Gráfica e Editora Midiograf, 2002.