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O infinito não é só “acreditar”
Nem sempre que temos conceitos morais e religiosos significam que superamos o medo, a angústia e as dificuldades da vida, orações e pregações fervorosas podem encobrir a verdade, isto afasta muitas pessoas da crença na felicidade e vida eterna porque não leem isto na vida real de quem crê.
Quando algo do infinito nos toca na vida, não apenas descobrimos a verdade, não apenas uma crença em alguém (algo é coisificar o eterno) que faz parte desde já em nossa existência, isto nos revigora e torna capazes de ajudar o mundo da paz, da esperança e do verdadeiro Amor.
Sabemos em nosso íntimo que ninguém pode sondar e saber verdadeiramente de nossa alma, no entanto, alguém perscruta nosso interior, quando amamos e fazemos algo bom pelos outros, por nós mesmos e pela humanidade, algo bom invade nosso ser e nos dá serenidade.
Esta força que desperta interiormente levou grande sábios, mestres e santos a descobrirem algo novo que os fez progredir numa verdadeira ascese, foram capazes de atitudes heroicas, mas curiosamente com peso menor que seria para os homens que não conhecem esse Amor.
Quando vivemos de fato esta dimensão, até mesmo certo tipo de religiosidade rotineira e burocrática nos abandona, queremos ver o Outro crescer, queremos ouvi-lo e amá-lo como é.
Assim superamos o medo com atitudes positivas em relação ao mundo e as outras pessoas, assim o que é realmente Verdadeiro, ou seja, o bem humano e o divino em nós, se manifesta também fora e não há nisto nenhum medo, nenhuma angústia porque é um Bem Verdadeiro.
O contrário, a constante oposição ao Outro, o sentimento de sempre salientar a diferença e a arrogância de ser superior em algo que fazemos bem ou melhor que os outros, embora pareça verdadeiro, leva junto um sentimento que nos afasta do Outro e da humanidade, não é a paz.
Se olharmos para as guerras, veremos sempre este princípio, ver o outro inferior e menor que nós, assim não são dignos de viverem, “merecem” toda maldade que no fundo está no nosso interior e não nestas pessoas, a maioria inocentes, ainda que dentro de cada povo ou nação há pessoas que não seriam dignas do nosso bem querer, não é eliminando-as que construímos a paz.
A paz verdadeira entre os homens nasce do coração sereno, que entende o infinito, e que almeja ainda que num futuro distante, uma vida melhor para todos, sem injustiças e guerras.
Substância e a essência do Ser
Substância é um conceito essencial tanto da metafísica como da ontologia, embora a modernidade queira caracterizá-la apenas como aquilo que é material, a etimologia diz sub instância, ou do latim literalmente é “o que está abaixo de”, mas pode ser também “derivado de”.
O dualismo como vê tudo como oposição e afirmação, uma substância primeira é aquela que não tem a disposição em contrário, por exemplo, um homem, uma árvore ou um animal, não existe seu oposto, porém ainda não é o que designa o Ser, já que estes mudam, nascem com alguma forma originário e depois modificando são o fundamento de algo “derivado”: uma acidente, uma sub-instância de homem, de árvore ou de algum animal.
No século XVII René Descartes propõe uma divisão entre corpo e mente, dividindo a substância em duas categorias: res extensa, que se refere à matéria física, e a res cogitans que se refere à mente ou ao pensamento, o dualismo simplificado como corpo e mente, neste século havia ideias contrárias: o monismo “atomista” de Leibniz e o natural de Spinoza.
O século XVIII esta ideia sofre duas reformas: a de Hume que critica a substância como algo essencial sendo apenas uma ideia criada pela mente humana, para dar sentido à experiência, e o idealismo kantiano, a substância não é uma coisa em si, mas uma categoria do entendimento humano.
Ainda nos limites do kantismo, permanecem duas possibilidades de conceber um ser ou um objeto, o sentido imanente, que permanece no âmbito da experiência possível, mas agindo somente através dos sentidos (conceitos ou princípios cognitivos) e o transcendente, que admite um deus imanente, que permeia toda a realidade e não se separa da matéria.
O transcendente é então o que leva o sujeito (daí chamar-se subjetividade) ao objeto (objetividade) permitindo o conceito ou princípio cognitivo.
A ideia de uma pessoa, ou três pessoas no caso cristão, é aquela que dá ao ser (não o separa do objeto e da experiência) a sua transcendência e assim permite uma ascese espiritual.
No caso cristão chamo a atenção para Jesus Ressuscitado que pede e assa um peixe e come, não por necessidade, mas por possibilidade, assim não afeta a substância embora a conceba.
Diz a passagem (Lc 24, 40-43): “E dizendo isso, Jesus mostrou-lhes as mãos e os pés. Mas eles ainda não podiam acreditar, porque estavam muito alegres e surpresos. Então Jesus disse: “Tendes aqui alguma coisa para comer?” Deram-lhe um pedaço de peixe assado. Ele o tomou e comeu diante deles”, se não tinha necessidade porque comeu, lembrem-se da última ceia.
Eu, o Outro e o Terceiro Oculto
O princípio da incerteza que vinha da física, a partir de Heisenberg, no início do século passado aos poucos colocou a Física em cheque, pondo o determinismo científico, o logicismo também em cheque devido o paradoxo de Gödel que determinava que um sistema matemático axiológico ou é completo ou consistente, não podendo ser os dois ao mesmo tempo, porém uma nova visão científica e ontológica se desenhava, a Ontologia Transdisciplinar.
Na semana de 13 a 17 de julho de 2008, a 9ª. Conferência anual do Instituto Metanexus, realizada em Madrid, Espanha, entre filósofos, biólogos, físicos, cosmólogos, neurocientistas, cientistas cognitivos, historiadores, educadores, teólogos e líderes de comunidades aconteceu com o tema “Subject, self, and Soul: Transdisciplinary approches to Personhood”, onde Barsarab Nicolescu foi convidado a abrir a Conferência.
Nela Nicolescu vai desenvolver a ideia do terceiro oculto, a filosofia já havia falado do Outro através de Lévinas, Ricoeur e o educador Martin Buber, que no livro “Eu-Tu” reconhece no outro um algo “divino”, mas para aí como os outros, para na beira do conceito de alteridade.
Nicolescu foi a frente, escreve como Heisenberg um modelo de ultrapassar o dualismo sujeito x objeto, característico da modernidade: “: “Nunca podemos chegar a um retrato exato e completo da realidade (Heisenberger, 1998, p. 258). A incompletude das leis da física está presente em Heisenberg, mesmo que ele não faça nenhuma referência aos teoremas de Gödel. Para ele, a realidade é dada como “texturas de diferentes tipos de conexões”, como uma “abundância infinita”, sem qualquer fundamento último” (Nicolesceu, 2008)
Citando ainda Heisenberg, afirma Nicolescu citando a consonância com Husserl, Heidegger, Gadamer e Cassirer (que ele conheceu pessoalmente), que é preciso suprimir qualquer distinção rígida entre Sujeito e Objeto.
O ideia do sujeito oculto em Nicolescu está além do limiar Eu e o Outro, está na concepção que vem da física que existe um terceiro estado na natureza, o Terceiro Incluído além do Ser e do Não-Ser, chama-os de Objeto-Transdisciplinar e Sujeito-Transdisciplinar, na física quântica já estava claro que a análise de um fenômeno do Objeto deve ser transdisciplinar devido um estado então desconhecido na natureza, agora também um Sujeito Transdisciplinar é descrito por Nicolescu (chama-o TD-Subject) que desvela o Terceiro Oculto.
Embora o tema fale da alma e chega a falar de espiritualidade, para uma boa leitura bíblica é preciso entender o desvelamento de Jesus após sua morte (aparição é um termo limitado) que se revela de modo surpreendente e divino aos discípulos, o Terceiro Oculto é Ele próprio.
Na passagem de discípulos que estão caminhando para Emaús e um Terceiro caminhante se infiltra entre eles, ao verem partir o pão logo vão lembrar de sua “conversa”: “ Então um disse ao outro: “Não estava ardendo o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho, e nos explicava as Escrituras?” (Lc 24,32).
NICOLESCU, B. “Subject, self, and Soul: Transdisciplinary approches to Personhood”, Metanexus Conferece, Madrid, 2008.
Física quântica, terceiro oculto e espiritualidade
Nicolescu Barsarab além de formular a teoria do terceiro incluído, fundamentando pela física quântica que o princípio de Aristóteles do terceiro excluído, existe A ou não-A sendo excludentes, entretanto a física quântica já havia revelado um terceiro estado T, como uma combinação entre os estado de “existência” e “não-existência” como um estado físico, este Ser existente ou não como terceiro estado permite falar de uma Ontologia Transdisciplinar.
Sucintamente, Nicolescu (2002) desenvolveu é que em vez de uma realidade esperando para ser descoberta usando o método científico, existem múltiplos níveis de Realidade (ele coloca Realidade em maiúscula e usa a letra T para transdisciplinaridade) organizados em dois níveis.
Um nível diz respeito à Realidade Subjetiva (TD-Sujeito), assim chamada porque trata da fluxo interno de perspectivas e consciência. Incluem-se psicologia e filosofia individual, família, comunidade, sociedade, história e ideologias políticas. O outro nível diz respeito à Realidade objetiva (TD-Object), assim chamado porque trata do fluxo externo de informações, fatos, estatísticas e evidências empíricas.
Os exemplos incluem economia (negócios e direito), tecnologia, ciência e medicina, ecologia e meio ambiente, planetário (mundial e global) e cósmico e universo (Nicolescu, 2002, 2016).
Cada nível de Realidade é diferente, mas “cada nível é o que é porque todos os níveis existem no mesmo nível”, a existência de um único nível de realidade, o fechamento disciplinar do conhecimento, também Edgar Morin alerta para isto, cria um novo tipo de obscurantismo, do fechamento disciplinar em áreas de conhecimento.
Diz Carta da Transdisciplinaridade de Arrábida no seu preâmbulo: “Considerando que a ruptura contemporânea entre um saber cada vez mais cumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido leva à ascensão de um novo obscurantismo, cujas conseqüências, no plano individual e social, são incalculáveis”, e diz no seu artigo terceiro: “A transdisciplinaridade é complementar à abordagem disciplinar; ela faz emergir novos dados a partir da confrontação das disciplinas que os articulam entre si; oferece-nos uma nova visão da natureza da realidade” (Arrábida, 2014).
A abertura para o sujeito, não se trata apenas da subjetividade idealista, é a própria abertura ao Ser e o que a Ontologia Transdisciplinar propõe é vê-lo na complexidade que se desvela.
Nicolescu, B. Manifesto of transdisciplinarity. New York, NY: SUNY Press, 2002.
Nicolescu, B. The Hidden Third [W. Garvin, Trans.]. New York, NY: Quantum Prose, 2016.
Freitas, L., Morin, E., Nicolescu, B. Portugal, Convento da Arrábida, 6 de novembro de 1994.
A dor e a Sociedade Paliativa
Pela leitura de diversos autores, mas principalmente por compreender justamente as “dores” da modernidade, Byung Chul Han escreveu a Sociedade Paliativa: a dor Hoje (Han, 2021) em que decreta: “A dor, é agora, um mal sem sentido, que deve ser combatido com analgésicos. Como mera aflição corporal, ela cai inteiramente fora da ordem simbólica.” (HAN, 2021, p. 41).
Entre diversos autores, é a partir de Paul Valéry em seu livro e personagem Monsieur Teste, que encarna o homem moderno e sensível que como sem sentido e pura “aflição corporal”, “Monsieur Teste se cala em vista da dor. A dor lhe rouba a fala” (HAN, 2021, p. 43).
Colocará em contraste com este personagem a mística cristã Teresa D´Ávila, como uma espécie de contrafigura, “nela a dor é extremamente eloquente. Com a dor começa a narrativa. A narrativa cristã verbaliza a dor e transforma também o corpo da mística em um palco … aprofunda a relação com Deus … produz uma intimidade, uma intensidade.” (p. 44).
Também reivindica Freud, “a dor é um sintoma que indica um bloqueio na história de uma pessoa. O paciente, por causa de seu bloqueio, não está em condições de avançar na história” (p. 45).
Sendo uma mera “aflição corporal” a dor se coisificou, perdeu um sentido ontológico e de certa forma “escatológico” (por ela tem uma história com início e fim), “a dor sem sentido é possível apenas em uma vida nua esvaziada de sentido, que não narra mais.” (p. 46).
A negação da cruz do homem moderno, não é apenas o desprezo pelo Outro, é a incompreensão de seu aspecto escatológico, a dor entrou na nossa vida e durará até que possamos entender seu significado de “libertação”, de “purgação” de nossos males que estão na nossa história, que são nossos pecados, a guerra é a incompreensão da dor, elimina-se o Outro com sendo culpado por nossa dor, da qual os culpados somos cada um de nós.
As injustiças têm seus próprios meios regulatórios, porém a marginalidade, a criminalidade, que surgem em meio a pobreza, as dificuldades sociais são dificuldades que lidar com a dor, há sempre um caminho para refazer uma história, para recomeçar uma vida, eliminá-la é o oposto.
A cruz é o significado mais profundo daquilo que aflige o homem, e a partir do qual pode se libertar, esconder ou fugir do problema leva em geral a dores maiores: alcoolismo, drogas, prostituição e aquilo que já é um mal do homem moderno: a corrupção em diversos níveis.
A cruz orgulho dos cristãos e escândalo dos gentios, também é bíblico “aquele que quiser me seguir, tome sua cruz e me siga (Mc 8, 34), metáfora da vitória e não da derrota, esta é a lição de vencedores.
HAN, BYUNG-CHUL. A Sociedade paliativa: a dor hoje. Trad. Lucas Machado, Petrópolis: ed. Vozes, 2021.
Corpus Christi e a espiritualidade
Há aqueles que acreditam na transubstanciação durante a consagração da hóstia e do vinho durante o culto religioso e aqueles que pensam tratar-se apenas de algo simbólico, outros ainda acreditam a mais pura adoração leva a salvação, e esquecem que ela deve ser levada ao mundo, então há a realização eucarística entre os homens e no mundo.
Não é de estranhar uma fé bastante fideísta (sem obras) e outra bastante mundana (só as obras bastam), isto ocorre dentro e fora das igrejas por razões óbvias, ali de faz eucaristia, ou seja, a comunhão dentro da igreja deve ser levada na alma para o mundo, tornando-se uma “alma mundo”.
Tanto para Plotino como para Agostinho de Hipona, a “alma” era a visão do Uno, ou seja, da verdadeira comunhão e ela não se faz sem Deus e não se realiza se não é levada a substancia, aliás é curioso que pão e vinho não são substancias da natureza, são feitas pelo homem do trigo e da uva, assim só se realiza na “alma mundo” pela ação dos homens em sociedade.
Embora o dia tenha sido instituído pelo papa Urbano IV, 1264, para ser celebrado na quinta-feira após o domingo da Santíssima Trindade, ele antes de ser papa conheceu uma menina chamada Juliana que sonhava com esta festa eucarística.
Porém é pouco contado na história que o feriado foi declarado depois de um “milagre” que ocorreu numa igreja de Bolsena, na Itália, de um padre que duvidava das visões de Juliana, na hora da consagração, momento na missa católica que se eleva o pão e o vinho, começou a verter sangue que mancho o corporal (toalha) sobre o altar.
A maioria das igrejas cristãs não católicos ou de ritos ortodoxos e orientais, celebra apenas uma ceia simbólica que lembra a última ceia de Jesus, Lutero na reforma protestante não usou mais o termo transubstanciação e sim consubstanciação, vinho e pão eles corpóreos de sangue e carne de Cristo, mas um dos líderes da reforma Ulrico Zuínglio convenceu os “reformados” que era apenas uma Ceia do Senhor simbólica como memorial de sua morte e ressurreição.
Seja qual for a fé professada, a comunhão com o Uno que é Deus e com os homens, sua realização na humanidade não pode ser feita sem uma verdadeira comunhão “entre” homens, nas igrejas de rito greco-romano isto é feita com a cerimonia do lava-pés, lembrando que Jesus lavou os pés dos apóstolos (João 13,1-17) (acima a pintura na igreja Santa Maria del Mar, Barcelona).
Silêncio e a resistência do espirito
A guerra é ruidosa não só nas armas e bombas, mas principalmente no falatório que ela desperta no qual é impossível ter serenidade, pensar e dialogar; faz parte fundamental da insanidade que ela representa o aspecto ruidoso.
A resistência do espírito, estamos seguindo a linha de Edgar Morin, é a “arma” possível neste momento e quiçá em futuros ainda piores, ela significa, em muitos momentos se calar, fazer um silêncio tão profundo que indague o Outro que não desiste de argumentar suas razões para a guerra.
Na filosofia Plotino, que influenciou profundamente Santo Agostinho, embora sejam pensadores diferentes um cristão e o outro apenas estoico, o silêncio é um estágio de profundo conhecimento da realidade, do uno, unidade que tudo abarca sem sair de si.
Para ele quando um aspirante à verdade (o que é a verdade de fato, não a lógica racional), ele tem que ter a experiência da unidade, essa experiência é total e silenciosa.
O filósofo brasileiro Giacóia Junior busca na citação de Espinoza a reflexão sobre esta perspectiva de relação entre o barulho e o silêncio quando afirma que “certamente que a sorte da humanidade seria mais feliz se estivesse igualmente na potência do homem tanto falar como calar-se. Mas a experiência ensina suficiente e superabundantemente que nada está menos em poder dos homens que sua língua (…) (cf. GIACOIA JUNIOR, 2014, P. 79).
Estar diante do silêncio é estar diante da verdade, e se a linguagem é morada do ser, vale a pena lembrar que o Verbo se fez carne (João 1,1) se não for aceito no sentido bíblico, pode ser pensado como sentido ontogênico ou filogênico, como afirma Barthes em seu livro O Rumor da língua, afirma que: “é a linguagem que ensina a definição do homem” e que não pode ser considerada “um simples instrumento, utilitário ou decorativo, do pensamento. O homem não preexiste à linguagem, nem filogeneticamente nem ontogeneticamente” (BARTHES, 1988, p.185).
Assim a verdade é um Ser, a linguagem é morada do Ser e o silêncio é seu ápice.
BARTHES, R. O Rumor da língua. São Paulo: Brasiliense, 1988.
GIACOIA JUNIOR, O. “Por horas mais silenciosas” in: NOVAES, Mutações. São Paulo: Ed. SESC SP, 2014.
A verdade e as boas obras
Não há verdade ontológica onde não ocorre o desvelamento do ser, e isto depende de sua realização mais profunda em contato com sua essência e deve produzir frutos para a vida, para o bem-estar pessoal e social e para os que creem para uma eternidade.
Os sofistas na antiguidade criavam verdades que podiam até ser lógicas, mas o objetivo era o do poder e de ter benesses junto aos que detinham fortuna e influencia, e isto não foi eliminado da vida cotidiana até os dias de hoje, grande parte da política é a negociação dos bens públicos, da fraude e para isto usam a não-verdade, e isto não é monopólio de um grupo.
Não há como manter esta lógica sem o autoritarismo, o cerceamento da liberdade e a calar a voz dos que sofrem com a ganância pelo poder e pela riqueza, grande parte da crise atual vem destes valores, ainda que culpem as mídias, elas estão também sob o controle destes poderes.
As mídias seguem a lógica ôntica na diferença ontólogica, desenvolvemos brevemente esta questão do modo como Heidegger e outros seguidores das diversas correntes ontológicas a veem, no âmbito da interpretação e do diálogo a lógica não podem ser ôntica, deve seguir a verdade ontológica que segue da fusão de horizontes no círculo hermenêutico (ver o post anterior).
O dualismo e a polarização seguem a verdade ôntica, culpar as mídias que nada fazem que não tenha sob controle de alguma forma, podendo ser até de algoritmos, o próprio homem, assim a lógica dual ôntica usada é instrumental e de certa forma sofismática porque visa o poder.
No domingo inicia-se para os cristãos a semana santa, a verdade ontológica que foi manifestada como ser na pessoa de Jesus tinha que ser destruída pelo discurso do poder, até mesmo o poder religioso da época que não podia acreditar que a verdade é lógica do Ser e do homem, quando ele manifestava suas boa obras, quase sempre confrontava o poder.
É preciso ser contra a corrente para inverter a lógica da facilidade, do dinheiro fácil através da corrupção, do poder pelo poder e do desserviço a sociedade.
A verdade ontológica
Existe diferença entre a lógica que é fundamentada na razão puramente humana, e a ontológica fundamentada na realidade do Ser e sua existência, assim não é uma verdade final, mas escatológica, isto é, realiza tendo um início e um fim onde a existência se explica.
De modo meramente filosófico, a verdade ôntica e a ontológica sempre se referem de maneira diferente, ao ente em seu ser e ao ser do ente, e a relação entre elas é chamada diferença ontológica, pouco explorada na filosofia está embutida em qualquer teoria que trate do Ser.
A relação de latência entre ser e ente e entre presença e ser torna evidente que o fundamento da diferença ontológica é a presença, segundo Heidegger (pg. 102):
Desvelamento do ser é, porém, sempre verdade do ser do ente, seja este efetivamente real ou não. E vice-versa, no desvelamento do ente já sempre reside um desvelamento de seu ser. Verdade ôntica e verdade ontológica sempre se referem, de maneira diferente, ao ente em seu ser e ao ser do ente. Elas fazem essencialmente parte uma da outra em razão de sua relação com a diferença de ser e ente (diferença ontológica).
Trata-se de desvelamento porque re-velar é tirar uma camada do véu, porém encontrando outra que igualmente cobre a verdade, a razão humana e a própria ciência caminha assim, a princípio da falseabilidade de Karl Popper, ele alega que o fato de uma asserção poder ser mostrada falsa é um dos princípios para o estabelecimento de uma ciência segura.
Há uma relação circular entre verdade ôntica e verdade ontológica decorrente desta facticidade circular da presença [que é uma das traduções do Dasein de Heidegger] e esta relaciona-se com os entes compreendendo o ser, e relaciona-se com o ser compreendendo os entes.
“Com a diferenciação, que é em si mesma clara, entre ôntico e ontológico – verdade ôntica e verdade ontológica, temos efetivamente os elementos diferentes de uma diferença, mas não a própria diferença”, dito de maneira explicita a relação das coisas com os seres, é diferente da relação dos seres entre si, há uma verdade ontológica que deve ser desvelada para a relação.
Assim, como a verdade ontológica e ôntica, assim como a diferença ontológica, contribuem para mostrar o caráter relacional do eu? Conflitos e relacionamentos envolvem este Ser que é relacional, mas sua compreensão vista como instrumental, coisificada ou de interesse nada é.
HEIDEGGER, M. Sobre a essência do fundamento. In: Heidegger: conferências e escritos filosóficos. Trad. de Ernildo Stein. São Paulo: Abril Cultural, 1984 (Os Pensadores).
Infinito, paz e transformação
A nossa de infinito, de até mesmo o paradoxo que representa a profunda mudança que ocorrem em fenômenos astronômicos como os buracos negros, onde até mesmo a física quântica é questionada, nos leva a uma nova cosmovisão de matéria e espiritualidade.
Edgar Morin fala em “resistência do espírito” em função do momento dramático que vivemos de crise civilizatória e ameaça de escalada nas guerras, sem um apelo realmente concreto pela paz o risco dos atuais conflitos escalarem e de surgirem novos é imenso.
Esta resistência requer tanto o posicionamento pessoal quanto o coletivo, defender de fato e viver a paz, praticá-la em nossos relacionamentos cotidianos, ao lado dos que passam por nossas vidas.
A paz depende de pessoas que plantem a paz, diz a leitura bíblica Jo 12,24: “em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas, se morre, então produz muito fruto”, assim é preciso que semeie a paz aqueles que de fato a desejam, porém não no discurso, mas nas atitudes do dia a dia.
Não significa que não desejamos as mudanças, e que elas não sejam necessárias, também neste aspecto o grão de trigo deve cair na terra e “morrer”, mas esta morte vista justamente com o que desejamos: transformação, não desaparecimento ou morte terminal.
O olhar para o infinito, para o divino e o eterno é ir além de nossa materialidade, de nossos impulsos cotidianos e humanos, reservar um tempo para leitura, contemplação, meditação e recarregar nossas energias, a atitude pacífica depende deste equilíbrio humano/divino.
Sem uma ascese verdadeira e humanamente correspondida, ficamos naquilo que Peter Sloterdijk chama de “vida de exercícios”, fazemos os exercícios para tal, mas não temos uma ascensão humana (uma verdadeira ascese).
Aumentar nossa vida interior, transmiti-la nos relacionamentos eis a verdadeira ascese.