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Covid 19 e futuros cuidados
A Covid 19 deixa algumas lições, uma delas é não subestimar os vírus, elespodem ter uma capacidade de mutação maior que o previsto e pode complicar resultados de imunidade, no campo da política social é preciso que os governos e órgãos administrativos tenham respeito a vida humana e as vezes é preciso sacrificar a eficiência e o desempenho em prol do bem maior.
Os aspectos de vida social ainda há muito a aprender e mesmo os resultados num quase final de covid, ainda estão por ser avaliados: ansiedades, depressões e irritações são aspectos que não devem ser subestimados e precisam ser vistos também como saúde pública.
Postamos a semana passada estudos que indicam uma possibilidade de “evolução” pandêmica para bactérias e fungos, procurei algumas reportagens e estudos a respeito e encontrei que há possibilidade de fato.
No campo das viroses agora há um debate sobre sobre um deficit de imunidade” causado pelo período de isolamento social, em todas faixas etárias, mas de modo especial nas crianças, isto tem favorecido doenças como hepatite e outras viroses de modo mais intenso.
Segundo um estudo francês, no qual um dos coautores é um médico francês François Angouvalnt, o fato de algumas pessoas não terem pego tantas viroses nos meses da pandemia foi um alívio em médio às tragédias de picos da Covid-19, mas deixou os sistemas imunológicos sem treino para enfrentar patologias comuns e criou grupos populacionais mais vulneráveis a alguns vírus e bactérias que normalmente são tratados e resolvidos como casos simples.
O estudo acompanhou algumas evoluções desde 2020 destas doenças e observou a evolução na população de Paris e causou apreensão uma maior vulnerabilidade.
Particularmente no Brasil o número de mortes por covid está em torno de 70 mortes diárias e em queda, enquanto o número de infecções abaixo de 10 mil, tudo indica um fim de pandemia até o final do ano, mas com uma nova onda de frio no sul e sudeste deve-se manter os cuidados.
O poder e a violência
Historicamente povos pacíficos ou com pouca estrutura de defesa foram dominados por povos imperialistas muitas vezes justificando por valores sociais ou causas nobres, porém a pratica no final é de dominação, desenvolvida por Max Weber.
Na história recente, as ideias do “soberano” de Hobbes e o “príncipe” de Maquiavel iniciaram a ideia de Estado ainda no período que haviam reis (no Inglaterra e outros países ainda há), e depois foram reelaboradas por Kant e Hegel, onde os conceitos de cidade-estado e cidadania da antiguidade clássica foram recuperados e atualizados, porém esta é a ideia do poder moderno.
A ideia de democracia no sentido americano da palavra foi desenvolvida por Alexis de Tocqueville, que é ao mesmo tempo um elogio ao modelo americano, porém possui lacunas de interpretação que permitem uma análise critica.
A ideia que todo poder emana do povo, apesar de ser um modelo ideal no sentido lato da palavra, é mesmo o projeto final do idealismo, porém Sloterdijk constata que o modelo de “domesticação humana” falhou, são duas guerras nos países ditos “avançados” e uma a espreita.
As análises mais recentes, que tratam do poder “de fato” presente em formas de dominação e controle ideológico das populações (ideologia aqui é num sentido amplo) parte da análise de Michel Foucault que há formas dispares, heterogêneas e em constante transformação de como este poder é exercido, assim está em toda parte e não em uma instituição ou em alguém, onde ele desenvolve os conceitos de biopoder e micropoder.
Byung Chul Han, discípulo e na linha de Peter Sloterdijk, desenvolve a forma mais avançada que temos hoje que é o psicopoder, não apenas pelo controle de notícias e fake News, mas de modo especial pelas relações que se desenvolvem socialmente onde não reciprocidade, aquilo que Chul Han chama de “simetria”.
Diz ele não há simetria em nenhuma forma de poder e nem na comunicação (assim toda comunicação é uma forma de dominação e poder), somente há simetria onde há “respeito”. e assim a forma mais “violenta” de política hoje é desrespeitar o adversário de várias formas.
Esta é a violência cotidiana, que ela avance para sua forma mais cruel que é a guerra não é senão uma consequência, assim a violência começa nas ações de violência psíquica no dia-a-dia.
Assim estabelece Chul-Han: “o poder é uma relação assimétrica. Ele fundamenta uma relação hierárquica” (HAN, 2019, p. 18) e ele é a base de toda violência social e política, um poder que seja realmente democrático deve reelaborar a simetria ou a reciprocidade entre cidadãos e o estado.
HAN, B. C. No enxame. Petrópolis: Vozes, 2019.
Pandemia em queda, poderá haver outra ?
A Pandemia segue em queda, lenta devido tanto pela taxa de vacinação quanto ao relaxamento das medidas protocolares, no Brasil foram registrados 144 mortes e 15 mil infecções, é a taxa mais baixa desde maio.
A pergunta é se novas pandemia podem surgir e quais os cuidados para prevenção, que é bem melhor que deixar acontecer para depois soar o alarme.
Na China algumas viroses graves são monitoradas, em geral vem de animais para humanos, a do musaranho, um pequeno roedor é uma delas, um estudo divulgado dia 4 de agosto detectou o Langya henipavirus (LayV) que causou lá infecções me 35 pessoas, entre 2018 e 2021, nas províncias de Shandong e Henan, causa sintomas como febre, fadiga, anorexia, mialgia e náusea.
Porém a previsão a médio e longo prazo é que haja um processo “evolutivo” para fungos e bactérias, isto porque os defensivos agrícolas e os remédios para bactérias causam uma evolução nos organismos, e no caso dos fungos não há muitos estudos e o uso de defensivos é cada vez mais intensivo.
Nos Estados Unidos foi encontrada uma bactéria rara chamada Burlkolderia pseudomallei, que pode deixar algumas pessoas extremamente doentes, em especial doentes com problemas de diabetes e renal, os médicos estão em alerta, mas não há ainda casos relatados.
O alerta de fungos foi feito por uma reportagem do National Geographic, que diz que conhecemos pouco destes organismos e são muito resistentes a tratamentos e com isto no caso de uma pandemia poderia sair do controle.
Os estudos para prevenção devem também ter financiamentos, eles são a base para evitar as pandemias junto com a divulgação imediata de casos que podem ser crônicos.
A origem e a crise do humanismo
As duas guerras e a tensão atual Rússia x Ucrânia e China x Taiwan, que não são outra coisa que a tensão agora entre dois tipos de sistemas coloniais o imperialismo capitalista e o imperialismo ideológico, que não é apenas marxista ou comunista, porque isto exige uma discussão sobre o tema.
Sua proposta, segundo o próprio Sloterdijk, foram bem compreendidas pelos participantes, entretanto na reação dos filósofos havia um conteúdo “fascista” nelas, qual seja da seleção genética da humanidade, ou na indução desta mudança.
Também tive esta reação numa primeira leitura, no meu caso a crítica a “Cartas sobre o humanismo” de Heidegger, um dos temas centrais que aborda, além do questioamento que faz da concepção do humanismo, a sua grande contribuição está em compreender a relação ôntica sobre a ontológica, invertendo a precedência que Heidegger faz do ontológico sobre o ôntico.
Na prática significa uma revisão do motivo da clareira, como a incorporação de sua história natural sobre a social (Sloterdijk, 1999, p. 61), significa que há uma dimensão natural sobre o ontológico.
Pessoalmente prefiro não submeter uma dimensão a outra, digo que elas cooperam, algo parecido àquilo que escreveu Henri Bergson em sua “Evolução criadora” (1907), porém aderindo ao místico, e é claro que isto depende de uma cosmovisão com algum fundo religioso.
A revisão que Sloterdijk faz da “Política” de Platão (Sloterdijk, 1999, p. 47-56) desenvolve as origens do humanismo na Antiguidade, no seu ver, ligada ao exercício de uma inibição, a do hábito de leitura capaz de pacificar, domesticar, desenvolver a paciência, em oposição aos frenéticos divertimentos do “desinibido homo inhumanus”.
A metáfora platônica supõe que essas diferentes naturezas se encontram no Ser, ou seja são ontológicas, e como matéria-prima para formar o cidadão grego (o político), há o artifício de separá-las de modo a ter a configuração desejada para sua função na polis.
É preciso lembrar que também os gregos já falavam da areté, o exercício da virtude, para usar um termo de Sloterdijk “uma vida de exercícios”, porém a visão do filósofo alemão é que este projeto fracasso, e na nossa análise que inclui a mística, significa que há um abandono do areté.
Assim, não faço aqui uma defesa cega de Sloterdijk, apenas constato que sua crítica ao humanismo é a este projeto “pacificador” do homem, daí o porque das “regras do parque humano”, sua sugestão da natureza ôntica, não significa necessariamente a manipulação genética.
Está por trás desta questão a pergunta se o homem é bom ou mão, como fizeram os contratualistas iluministas ao definir o papel do estado, então a pergunta de Sloterdijk procede.
Em meio a ameaça de guerras com perigo civilizatório a questão permanece, e a resposta é o tipo de humanismo que queremos, e os modelos em jogo ainda não são alternativas ao modelo do estado como aquele que “pacifica” o parque humano, daí o recurso da guerra.
Sloterdijk, Peter. Regeln für den Menschenpark – Ein Antwortschreiben zu Heideggers Brief über den Humanismus. Frankfurt/M, Suhrkamp, 1999. Tradução brasileira: Regras para o parque humano – uma resposta à carta de Heidegger sobre o humanismo. Tradução de José Oscar de A. Marques. São Paulo, Estação Liberdade, 2000.
Povos que mudaram o rumo da história
Durante séculos na planície iraniana os povos semitas e acadianos dominaram e estabeleceram ali sua civilização, os medos e os persas se estabeleceram posteriormente e até o período entre 500ª.C. e 448 a.C. os persas estabeleceram um domínio e iniciaram conflitos com os gregos, as chamadas Guerras Médicas.
As cidades-estado da Grécia se uniram e conseguiram impor seu modelo cultural e d sociedade aos povos e iniciam um processo cultural novo chamado de Antiguidade Clássica, a polis grega, a arte e o modelo civilizatório se estabeleceriam, tendo inclusive um retorno cultural num período posterior chamado renascimento.
Em tempos de crise civilizatória é bom que povos que tinham não apenas uma grande força militar, mas também um grande apelo cultural conseguiu mudar os rumos da história e fortalecer o processo civilizatório em rumo democrático e cultural mais amplo.
Grandes impérios como os persas, o romano, o império mongol (figura) e mais recentemente o austro-húngaro e o otomano também entraram em crise e sucumbiram, infelizmente não sem guerras e sobre grandes perdas de vidas civis e uma análise crítica sobre as guerras é sempre importante.
Estes impérios desapareceram sem deixar vestígios e apenas registros históricos, as marcas da crueldade, da decadência e da impiedade das forças bélicas destes impérios desapareceram.
A parte desta história forças mobilizadoras da paz e do diálogo tiraram a humanidade de flagelos ainda maiores que poderiam ocorrer e se não conseguimos evitar as guerras, podemos maximizar os esforços para que vidas humanas civis sejam poupadas.
A história também ensina que povos que não foram impérios e mesmo numerosos podem e devem influir no rumo da história a partir de uma experiência civilizatória, como a polis-grega e o mundo hoje carece de modelos que possam unir a humanidade num esforço solidário de paz.
Covid 19: origem e futuro possível
Um estudo recente, publicado pela revista Science, com pesquisadores de 18 países, revela que a origem do vírus da Covid 19 foi mesmo no mercado de carnes de Wuhan que comercializa carnes de caça e de tipos impróprios ao consumo humano: como raposas, morcegos e cães.
Os estudos haviam sido publicados on-line como prepints (publicações provisórias em sites de compartilhamento) em fevereiro e tiveram agora a publicação oficial na na revista Science.
Um dos pesquisadores que publica o estudo Kristian Andersen, esclareceu a agência de notícias Associated Press que não refutaram a teoria do vazamento de laboratório, mas “acho que o que é importante aqui é que existem cenários possíveis e plausíveis e é realmente importante entender que não significa igualmente provável” em função do mapeamento dos casos iniciais do vírus.
Na semana passada o diretor-geral da OMS Tedros Adhanom voltou a afirmar que a pandemia “está longe de terminar”, porém ressaltou que a situação atual é “muito diferente de um ano atrás” com lições importantes como vacinar os grupos certos e que esta avaliação “não é teórica, isso é real” apontando para vários países onde o número de internações é crescente.
Os dados atuais da Covid demonstram que ainda está longe do fim, no Brasil tem uma média móvel de casos abaixo dos 40 mil e o número de mortes ainda acima de 200, com uma ligeira que da de 10% em relação a semana anterior.
Na China, os habitantes de Xangai que estão sob uma longa e dura etapa de Lockdown já se irritam e manifestam cansaço das limitações impostas pelas autoridades, em Wuhan local de origem novos 4 casos fizeram disparar um novo lockdown e a China segue na política criticada de zero casos.
No Ocidente a política é confusa e varia de país para outro, podendo-se dizer que não há um protocolo padrão e quando há, raramente é observado pela população e fiscalizado, o mecanismo de testagem é particular e ineficiente.
Dia Internacional da Amizade
A data do Dia Internacional da Amizade, foi instituída pela ONU para lembrar a solidariedade entre os povos, o respeito a diversidade e faço uma repostagem especial de um conteúdo deste blog a este respeito:
O filósofo Platão definiu a amizade como “a predisposição recíproca que torna dois seres igualmente ciosos da felicidade um do outro”, Agostinho de Hipona afirmava que “o ser amigo nos funde na amizade do ser; os amigos são uma só alma” e Aristóteles parece fundir os dois pensamentos: “a amizade é uma alma com dois corpos”.
Foi Aristóteles em Ética a Nicómaco dedicou dois livros ao estudo da philia e da amizade, que definiu a amizade em três tipos: por interesse, aquela por prazer, por interesse e a amizade verdadeira, a primeira é fácil de identificar por é a busca do prazer recíproco, a segunda por que são úteis entre si, e a terceira, é possível entre homens bons porque desejam o bem por si mesmo e não colocam o prazer nem o interesse acima da amizade.
No capítulo IXI o filosofo peripatético afirma:
“Talvez possamos dizer que nada há de estranho em romper uma amizade baseada no interesse ou no prazer quando nossos amigos já não possuem os atributos de serem úteis e agradáveis; na realidade éramos amigos desses atributos, e quando eles desparecem é razoável não continuar amando.” (ARISTÓTELES, IX, 3, 1165b) .
No capítulo “O sócio e o próximo” do livro “História e Verdade” de Paul Ricoeur ele vai discorrer sobre a diferença entre estas relações, discorre sobre a caridade: “A caridade não precisa estar onde aparece; também está escondida na humilde e abstrata agência dos correios, a previdência social; muitas vezes é a parte oculta do social ”, Paul Ricoeur, Le socius et le Prochain (1954).
Somos lembrados pelo filósofo que assim como as instituições podem ter apenas relações de societárias, pode-se passar por elas também relações interpessoais, de afeto e de solidariedade e que tornam elas menos frias e menos burocráticas, onde se vê não um cliente ou um serviço a mais, mas um próximo pelo qual pode-se interessar.
Não por acaso é um capítulo de História e Verdade, porque a verdade só é estabelecida entre amigos verdadeiros e que são próximos, e se são sócios serão apenas para estarem mais próximos.
O site Twinkl fez referência a este post em função deste dia e agradeço a lembrança.
Vaidade e verdadeiros tesouros
Para muitos o mundo, a história e até mesmo a felicidade pessoal se desenvolve em torno de riqueza, falsos tesouros e algum reconhecimento público, na verdade, tudo é vaidade e nela se consomem grande parte das energias humanas, sem encontrarem verdadeira alegria, não aquela da euforia, do frenesi ou da catarse, mas aquela do gáudio e da paz interior.
Socialmente significa colaborar para que todo o bem a nossa volta se propague e todos possam estar felicidades não com grandes empreendimentos, festas vultuosas ou mesmo outroas alegrias passageiras, tudo isto é juntar tesouros falsos.
Há uma alegria nas verdadeiras perenes, aquela conforme diz um versículo bíblico “onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam” (Mt 6,19), mas aquelas que existem nos laços entre pessoas boas, como definia Aristóteles para o tipo de amizade verdadeira.
Acumular valores verdadeiros, amizades verdadeiras e bens verdadeiros que não são aqueles que só a riqueza material confere, significa mais que ter uma vida virtuosa, é uma estrada que leva a paz interior e a uma felicidade equilibrada que está além daquilo que passa e por isto tem gosto de eternidade.
Em tempos de guerras, ódios e falsas polarizações (não se tratam de polos entre aquilo que é verdadeiro e falso eternamente, mas sim rivalidades temporais), experimentam apenas o gosto de uma felicidade passageira, narcótica e se uma embriguez passageira e curta.
É melhor cultivar valores e sentimentos que tenham durabilidade, e eles precisam de amor e dedicação com asceses espirituais, do que apegar-se ao passageiro que depois exigirá um tipo de renúncia mais difícil e sofrida justamente porque não tem sabor de eterno.
Homens sábios, santos e grandes filósofos buscaram este tipo de gaudio (uma felicidade mais equilibrada e duradoura) porém é impossível consegui-la com apegos temporais: vaidades, ganâncias, opressões e sentimentos de baixa moralidade porque não podem ter durabilidade justamente pelo que representam: sua limitação em um lapso temporal.
Numa sociedade da performance, do ativismo e da baixa ou pouca capacidade de perceber, viver e contemplar o que realmente é belo e eterno, só os que vão além da vaidade e do prazer temporal, podem alcançar este tipo de gáudio, as jóias preciosas da vida eterna.
A amizade e a espiritualidade
A filosofia idealista coloca amgio e amizade em uma relaçãofilosófica ideal, Aristoteles no entanto adverte: “o amigo se faz rapidamente, já a amizade [e um fruto que amadurece lentamente”, o mesmo pode-se dizer da espiritualidade, reconhcer que temos uma parte espiritual e que ela é em parte humana, exige um exercício de espiritualidade.
Foi Sloterdijk, um dos grandes pensadores da Alemanha atual, que alertou que vivemos numa “sociedade de exercícios”, porém alerta que ela é desespiritualizada.
A alta espiritualidade antes de atingir o divino, deve passar por etapas anteriores na relação com o Outro, aquele que não é espelho, que não tem os mesmos valores que nós e esta relação pode evoluir ou obstruir, sendo mais difícil quando há uma obstrução manter uma relação de respeito e de cordialidade, pois a amizade e o amor ficam mais distantes.
É possível amar quem a tudo obstrui, sim é possível primeiro manter o respeito, depois separar aquilo que são valores e exercícios reais de espiritualidade e o que é só interesse.
Neste ponto a amizade tem uma relação muito próxima ao espiritual, pode-se dizer que há além da amizade, a reciprocidade, um fluxo contínuo de relação entre pessoas boas, aquilo que Aristóteles definiu como amizade verdadeira, ela só existe entre homens bons (e justos).
Somente com homens bons a sociedade se salva, diz uma curiosa passagem bíblica sobre Sodoma (Gn 18,20-32) na qual Abraão pergunta a Deus se com um número pequeno de homens justos a sociedade se salvaria, e vai reduzindo o número porque sabe que alí há poucos.
Não há sociedade justa sem homens justos, não há amigos sem exercícios de amizade, e só a partir de uma verdadeira reciprocidade uma amizade pode chegar ao nível do espiritual.
Para quem crè diz o versículo bíblico, explica o mestre diante desta questão (Lc 1,5-8): “Se um de vós tiver um amigo e for procurá-lo à meia-noite e lhe disser: ‘Amigo, empresta-me três pães, 6porque um amigo meu chegou de viagem e nada tenho para lhe oferecer’, e se o outro responder lá de dentro: ‘Não me incomodes! Já tranquei a porta, e meus filhos e eu já estamos deitados; não me posso levantar para te dar os pães’; 8eu vos declaro: mesmo que o outro não se levante para dá-los porque é seu amigo, vai levantar-se ao menos por causa da impertinência dele e lhe dará quanto for necessário”.
Se alguém quer atingir a reciprocidade deve dar passos em respeito e amizade primeiro e o nível mais alto de espiritualidade é respeitar e amar os inimigos.
Os conceitos idealistas da amizade
Postamos que se trata de um exercício de retórica, porém como qualquer filosofia há uma origem seminal de determinado pensamento, Nietzsche parte da metafísica platônica afirmando que o jogo entre amigos da filosofia possuia um vício de concepção que seria a vontade da verdade, ora foi justamente ela que há uma crítica aos sofistas a relativizam.
Partindo deste princípio Nietzsche vai afirmar que o filósofo deve praticar certa “arte da desconfiança”, sendo o seu principal instrumento o martelo (Niettzsche em “Alem do bem e do mal”).
Deleuze afirma que Foucault teria declarado que “Heidegger sempre o fascinou, mas que somente podia compreendê-lo por meio de Nietzsche, com Nietzsche (e não o inverso)” (Deleuze, 1986, p. 120-121) e ainda que “seguramente, ao lado de Heidegger, mas de uma maneira totalmente diversa, aquele que mais profundamente renovou a imagem do pensamento” (Deleuze, 1990, p. 130-131).
Voltando a questão inicial que é a amizade verdadeira, afinal se é ela e não outra coisa que permite fazer uma ampla relação entre os diversos conceitos de amigos na filosofia, sendo ela própria por definição (filo-amigo) sofia (sabedoria).
É assim que Deleuze e Guattari desenvolvem a questão da amizade, considerando os diversos pensadores, o amigo é para ele sendo mais textuais é um “traço de personagem conceitual” que tem a ver com “personagens psicossociais” (Deleuze, Guattari, 1991, p.68)
Conforme dissemos é um esvaziamento do conceito de amigo, transformado em um objeto de reflexão subjetiva, por isto dizemos que são conceitos idealistas, mesmo abordando autores claramente não idealistas como Heidegger e Nietzsche.
Voltamos ao conceito aristotélico que diferencia a amizade por prazer ou por utilidade, da amizade verdadeira e portanto a questão da verdade é essencial, e mesmo Platão a considerou, embora divida o mundo das ideias (eidos para os gregos) e mundo sensível.
Também o conceito de próximo (aquele que está dentro de um afeto amplo de amizade) e o sócio (aquele ao qual nos associamos por determinada felicidade), conceitos de Paul Ricoeur são pontos a nosso ver essenciais para a reflexão sobre amizade.
DELEUZE, Gilles. Pourparlers Paris: Minuit, 1990.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Qu’est-ce que la philosophie? Paris: Minuit, 1991.