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Ação sem conexão, a vida “activa”
Ao criticar a “Sociedade do cansaço”, do eficientismo que Byung Chul Han retoma em seu ultimo livro, no post seguinte comentaremos, ambos apontam o dedo para o activismo, ou a palavra que Sloterdijk gosta: “agitacionismo”.
A noção de praxis que Sloterdijk defende não é a noção de praxis como um agir que considera o mito central da modernidade – o “agitacionismo”, que é, no fundo, apenas uma inversão da poesis e da teoria –, mas como um “deixar-fluir”, um tipo de contemplação activa.
Desmistificar esta noção de praxis como correlativo necessário da razão-acção, a filosofia prática teria de tomar consciência de que se deixou iludir pelo mito da acção e de que a sua aliança com o constructivismo e o activismo a impediu de se dar conta de que o conceito mais elevado do comportamento não é a acção, mas o deixar-acontecer, o ser capaz de largar as coisas que passam por si e que agem através de si, para ser mais fiel as palavras do autor.
Para entender o que ele quer dizer com Critica da Razão Cinica, uma de suas obras mais hermética, ele diferencia o cinismo clássico do moderno, que vem da origem do trmo grêmio “kŷőn“, do cinismo moderno que se tornou uma “falsa consciência iluminada”.
O iluminismo pressupunha que se vivia nas trevas onde se praticava o mal, mas que este mal seria fruto da ignorância, assim sua tentativa de iluminar aqueles desprovidos da luz da razão, mas isto criou uma “falsa consciência”, uma visão deturpada da realidade,
O iluminismo pressupunha as trevas onde se praticava o mal, que era tido como o fruto da ignorância. A crítica tentava iluminar os antros desprovidos da luz da razão. Daí o conceito básico de ideologia como “falsa consciência”, como uma visão deturpada, e por isso, falsa, da realidade, e para que não se pense que isto é só filosofia, também o pensador “engajado” Slovoj Zizek, vai dizer que ela está inscrita nas próprias coisas.
De modo diferente era o que também propunha Husserl, do qual é herdeiro toda a afiliação da fenomenologia moderno, voltar a consciência das coisas mesmas.
O cinismo moderno, também se tornou uma forma de ideologia no qual uma máscara continua a se transformar em ação construindo grandes teorias que tanto “no sentido figurado” como “no sentido literal agem como se não soubesse ou desconhecessem a realidade, tudo é narrativa só para usar a palavra atual.
Daí a crítica da razão cínica defender um procedimento crítico-ideológico-clássico que tornou-se obsoleto, sendo que esta crítica agora contraponha uma leveza de humor ao excedo de teoria.
Dirá o autor: “[…] O grande pensamento da Antiguidade tem a sua raiz na experiência de serenidade entusiasmada, quando, no auge do ter-pensado, o pensador se põe de lado, deixando-se penetrar pela ´revelação´ da verdade”, é bem próximo do distanciamento proposto por alguns autores “activos” porém com as diferenças da serenidade “entusiasmada” e da vista do “Ser”.
Esta visão é a que na antiguidade se tinha do cosmos, diz o autor: “baseia-se para os Antigos em “passividade cósmica” e na observação de que o pensamento radical pode recuperar o seu inevitável atraso em relação ao mundo dado podendo, em virtude da sua experiência do ser, atingir o mesmo nível que o “todo.”
SLOTERIJK, P. Crítica da razão Cínica, trad. Marco Casanova. BR, São Paulo: Estação Liberdade, 2012.
A trindade na perspectiva antropotécnica
Toda a filosofia de Sloterdijk deve ser precedida de uma boa leitura de Heidegger, tentando simplificar o que é per-si impossível, explicamos a categoria “ser-em” que será bastante utilizada no seu discurso sobre a relação trinitária, de onde desvela a “cossubjetividade imbricada da díade Deus-alma” (Sloterdijk, p. 490), onde o “surrealismo teológico oculta-se, como mostraremos, o primeiro realismo das esferas” (idem).
Sloterdijk não usa epígrafes apenas para decorar o texto, no capítulo 8 “mais perto de mim que eu mesmo: propedêutica teológica para a teoria do interior comum”, na epígrafe explica: “… quer dizer ´ser-em´[In-sein] ?… Ser-em … significa uma constituição ontológica da existência (Dasein)” citando o § 12 de Ser e Tempo de Heidegger.
Esclarece na outra citação da epígrafe que “talvez o Em seja o reino pressentido de toda a vida (de toda moral) de Deus”, citando Robert Musil no seu livro “O homem sem qualidades”, que o é hoje o homem moderno.
Antes de penetrar na questão da trindade, explica que o amor humano “não existe de maneira nenhuma antes de se produzir” … “na perspectiva da modernidade individualista – duas solidões que se desenraizam pelo encontro” (pag. 491), e irá retornar a incidente do paraíso perdido perguntando se não foi ele “um doloroso fosso de estranhamento?” (idem).
Foi Agostinho, esclarece nas “Confissões” que levou “a dialética do reconhecimento a partir do desconhecimento” (pg. 492), em sua “obra-mestra críptica” De trinitate (em particular os livros VIII e XIV) “que tratam da acessibilidade de Deus através dos traços deixados no interior da Alma” (p. 493), e embora trace suas contradições com o discurso teológico, afirma “ele pode ser considerado como o grande lógico da intimidade da teologia ocidental” (idem).
A longa análise que vai da página 494 até a 524 em que penetra nas contradições do discurso religioso, passando por citações bíblicas, Nicolau de Cusa, o duque João da Baviera, um Cardeal erudito e não autorizado na literatura da tradição cristã, chega a um veredito final, este sim importante, que é como o dualismo platônico provocou “efeitos secundários … em doutrinas deste tipo [que] rompem também o sentido de ser-em” (pg. 524).
Ilustrada com a pintura de Juan Carrero de Miranda “A fundação da Orden da Trindade” (óleo de 1666), o autor passa a fazer a repartição “topográfica dos Três no Um”, destaca no quadro a “quase-quaternidade clássica abrange a Trindade e o Universo” (destacamos com um pequeno círculo vermelho), seria bom que a fizesse.
Dentro de sua esferologia, Sloterdijk explica que “ecos característicos da filosofia da natureza, mesmo que se trata há muito tempo, da coabitação de entidades espirituais”, assim estamos mais próximos de outras cosmovisões “animistas” do que imaginamos, numa teológica dualista.
Analisando o discurso do Pseudo-Dionísio Aeropagita, esclarece que “o páthos da diferença dos diferentesno interior do Um já era conhecido do neoplatonismo, e a “justificação mútua dos princípios das pessoas da Trindade” (pag. 130) se beneficiará dele.
Conhece bem a pericorese dos padres capadócios (São Gregório de Nissa, São Basílio e São Gergório de Nazianzeno) (pag. 540-541) além de Agostinho usado fartamente, não deixa de citar João Damasceno (pag. 538, 544-546) e cita Tomás de Aquino.
SLOTERDIJK, P. Esferas I: Bolhas, trad. José Oscar de Almeida Marques, São Paulo: Estação Liberdade, 2016.
O pensamento trinitário em autores não cristãos
Compreender o mistério de serem três pessoas, mas um só Deus, é claro que seja penetra na mística cristã em sua profundidade, porém se imaginamos que aí pode estar a chave da relação humana onde duas pessoas se põe numa relação simétrica, isto é, de respeito e amor mútuo, um é indissociável do outro, pode-se entender que é possível um autor não cristão entender a questão.
Percorreremos três autores, Giorgio Agamben, Peter Sloterdijk (em conjunto com seu discípulo Byung Chul Han) ambos não cristãos e como não poderia deixar de ser um cristão, Piero Coda, que nos introduz de uma forma nova neste mistério, típico de um carisma do século 20, que propõe a unidade da família humana, aquilo que parece difícil e de certa forma trágico (o próprio autor o afirma), é na verdade uma abertura teológica nova.
Para compreender Agamben, é preciso entender que parte de uma hipótese bastante interessante, mas ao nosso ver não suficiente, que a história da cultura ocidental resulta de um paradigma resultante da teologia cristã, que vê a história contínua de separações e cruzamentos entre esses dois paradigmas: o político e econômico, formando um sistema bipolar.
Isto está descrito em duas obras suas: “Estado de exceção” (2003), que de fato sempre ronda o ocidente entre auctoritas e potestas* e, na obra O reino e a Glória (2011), que pode assumir a fórmula: Reino, Gloria e Oikonomia. (*em sentido oposto, o legítimo e o poder).
Porque a obra de Agamben de fato é válida, porque a Oikonomia, que tem sua origem na antiguidade clássica, que significa organização da casa pode e seria até interessante que de fato fosse a “organização” dos bens domésticos, porém a própria origem grega significa já não-cristã.
Onde é que elas se confundem, no grego, oikos (casa) e nomos (lei, regra, norma), foram usadas por Xenofonte e Aristóteles (na Grécia Antiga politeísta) este termo designava o “o conjuntos de preceitos que regem, ou devem reger, a atividade do ‘senhor da casa’ na obtenção dos recursos necessários à vida da família”, e na teologia cristã todos sendo irmãos, estamos na mesma “casa”, mas para aí, pois o argumento que Agamben usará do monoteísmo não é válido para os gregos.
Embora Agamben compreenda que no livro L da Metafísica de Aristóteles já está marcadamente presente a distinção entre Reino e governo, mesmo livro que outro crítico do monoteísmo Erick Peterson escreveu contra a teologia política.
Deus aparece ali como o motor imóvel de todas as coisas que significaria em última instância uma “categoria” cristã, que de fato poderia ser para alguns autores, mas certamente não é o Deus cristão, há nEle um rico movimento chamado pericorése.
Porém este não é o Deus cristão, não há uma interpretação trinitária de fato em Agamben, mas uma adaptação da visão Aristotélica, dualista, o ser é e o não ser não é, para a visão do trinitário.
A grande contribuição de Agamben está na sua obra magna: Homo sacer: o poder soberano e a vida nua, onde aborda o conceito de vida nua, como aquela que se encontra em uma zona cinzenta da vida política, entre o zoé e bíos, o conceito de homem como animal político de Aristóteles explicado, aprofundado e atualizado.
AGAMBEN, Giorgio, Homo sacer. O poder soberano e a vida nua I. Trad.: Henrique Burigo. Belo Horizonte: UFMG, 2007.
Idealismo e sua religião
Iniciada com a crítica ao idealismo, em “A ideologia alemã” (1932), onde discorre sobre Feuerbach, B. Bauer e Stirner, que chega a chamá-los de são Buer e são Stirner, pela pretensão de serem teologias.
Se a essência do idealismo é a separação de objeto e sujeito, faço uma inversão proposital, a essência do pensamento religioso para Ludwig Feuerbach é separação do sujeito e os objetos sensíveis, pois para ele a consciência do objeto pode ser, embora distinta da consciência de si, uma consciência que coincide logo em seguida ao se tratar do objeto religioso, devido sua “transcendência” é exatamente o que o faz retornar-se a consciência de Si, explico.
Para Feuerbach, e o objeto sensível está fora do ser (embora a ontologia aqui seja só um apelo), o objeto religioso está nele, é um objeto intrínseco, e tão pouco o abandona, a sua consciência moral o abandona, é um objeto íntimo, e mesmo o mais íntimo, é o mais próximo de todos.
A sua crítica a Teologia, usando o idealismo pressupõe essencialmente um juízo crítico, a “diferença entre o divino· e o não-divino, entre o que é e o que não é digno de adoração”, assim com este dualismo é possível jogar toda a essência do divino na vala comum do Idealismo.
A consciência de Deus é a consciência em si do homem para ele, eis o idealismo Hegeliano tornado religião: o conhecimento de Deus que é o conhecimento de si do homem, não há um para-si de Deus ao homem.
A negação do sujeito é considerada como irreligiosidade, e sua relação com objetos sensíveis, uma negação do sujeito, eis a religião ateia de Feuerbach, a qual Marx se voltará chamando-os de Velhos Hegelianos, e procura fazer aqui nova a sua inversão, agora do objeto ao sujeito, eis a nova versão “religiosa” dos Jovens Hegelianos, como Marx, mesmo criticando a principal tese ateia de Feuerbach: “o pensamento vem do sujeito”, e não do objeto
“Não se trata mais do Céu para Terra” disse Marx, mas agora “da terra para o céu”, ou seja, do objeto para o sujeito, da força de trabalho e da produção, para sua divinização (do objeto, do dinheiro, da economia, etc.).
Se para Marx, a fetichização era a separação do trabalho de seu instrumento de trabalho e da mercadoria, fetichização pode ser a reificação (res – coisa) ou a objetivação para estes jovens “hegelianos”, onde vê a separação entre o sujeito e o objeto, no fetichismo religioso é a separação do consumo (pecaminoso) do indivíduo (visto numa autoconsciência) ao qual o religioso deve “assistir” e viver seu “concreto”.
A relação justa com o dinheiro, com o trabalho, com a saúde e educação, não é senão uma superação da visão idealista religiosa, sua consumação num homem em relação harmônica com o mundo, e neste caso, também a beleza, a poesia e vida saudável teria uma perspectiva, para os religiosos “puros” não.
Falta a esta religiosidade uma ascese que de fato os “eleve”, embora pareçam tão ligados aos temas contemporâneos, na verdade tem um deus idealista e não pretensamente realista como desejariam, seu concreto é o deus estado moderno sua economia, ou o direito positivista e sua visão estreita de justiça, resulta em uma ascese desespiritualizada.
Buscar as coisas do alto, esta é a ascese verdadeira.Iniciada com a crítica ao idealismo, em “A ideologia alemã” (1932), onde discorre sobre Feuerbach, B. Bauer e Stirner, que chega a chamá-los de são Buer e são Stirner, pela pretensão de serem teologias.
Se a essência do idealismo é a separação de objeto e sujeito, faço uma inversão proposital, a essência do pensamento religioso para Ludwig Feuerbach é separação do sujeito e os objetos sensíveis, pois para ele a consciência do objeto pode ser, embora distinta da consciência de si, uma consciência que coincide logo em seguida ao se tratar do objeto religioso, devido sua “transcendência” é exatamente o que o faz retornar-se a consciência de Si, explico.
Para Feuerbach, e o objeto sensível está fora do ser (embora a ontologia aqui seja só um apelo), o objeto religioso está nele, é um objeto intrínseco, e tão pouco o abandona, a sua consciência moral o abandona, é um objeto íntimo, e mesmo o mais íntimo, é o mais próximo de todos e então está ligado sempre.
A sua crítica a Teologia, usando o idealismo pressupõe essencialmente um juízo crítico, a “diferença entre o divino· e o não-divino, entre o que é e o que não é digno de adoração”, assim com este dualismo é possível jogar todo a essência do divino na vala comum do Ideal.
A consciência de Deus é a consciência em si do homem para ele, eis o idealismo Hegeliano tornado religião: o conhecimento de Deus que é o conhecimento de si do homem, n]ao há um para-si de Deus ao homem.
A negação do sujeito é considerada como irreligiosidade, e sua relação com objetos sensíveis, uma negação do sujeito, eis a religião ateia de Feuerbach, a qual Marx se voltará chamando-os de Velhos Hegelianos, e procura fazer aqui nova a sua inversão, agora do objeto ao sujeito, eis a nova versão “religiosa” dos Jovens Hegelianos, como Marx, mesmo criticando a principal tese ateia de Feuerbach: “o pensamento vem do sujeito”, e não do objeto
“Não se trata mais do Céu para Terra” disse Marx, mas agora “da terra para o céu”, ou seja, do objeto para o sujeito, da força de trabalho e da produção, para sua divinização (do objeto, do dinheiro, da economia, etc.).
Se para Marx, a fetichização era a separação do trabalho de seu instrumento de trabalho e da mercadoria, fetichização pode ser a reificação (res – coisa) ou a objetivação para estes jovens “hegelianos”, onde vê a separação entre o sujeito e o objeto, no fetichismo religioso é a separação do consumo (pecaminoso) do indivíduo (visto numa autoconsciência) ao qual o religioso deve “assistir” e viver seu “concreto”.
A relação justa com o dinheiro, com o trabalho, com a saúde e educação, não é senão uma superação da visão idealista religiosa, sua consumação num homem em relação harmônica com o mundo, e neste caso, também a beleza, a poesia e vida saudável teria uma perspectiva, para os religiosos “puros” não.
Falta a esta religiosidade uma ascese que de fato os “eleve”, embora pareçam tão ligados aos temas contemporâneos, na verdade tem um deus idealista e não pretensamente realista como desejariam, seu concreto é o deus estado moderno sua economia, ou o direito positivista e sua visão estreita de justiça, resulta em uma ascese desespiritualizada.
Buscar as coisas do alto, esta é a ascese verdadeira.Iniciada com a crítica ao idealismo, em “A ideologia alemã” (1932), onde discorre sobre Feuerbach, B. Bauer e Stirner, que chega a chamá-los de são Buer e são Stirner, pela pretensão de serem teologias.
Se a essência do idealismo é a separação de objeto e sujeito, faço uma inversão proposital, a essência do pensamento religioso para Ludwig Feuerbach é separação do sujeito e os objetos sensíveis, pois para ele a consciência do objeto pode ser, embora distinta da consciência de si, uma consciência que coincide logo em seguida ao se tratar do objeto religioso, devido sua “transcendência” é exatamente o que o faz retornar-se a consciência de Si, explico.
Para Feuerbach, e o objeto sensível está fora do ser (embora a ontologia aqui seja só um apelo), o objeto religioso está nele, é um objeto intrínseco, e tão pouco o abandona, a sua consciência moral o abandona, é um objeto íntimo, e mesmo o mais íntimo, é o mais próximo de todos.
A sua crítica a Teologia, usando o idealismo pressupõe essencialmente um juízo crítico, a “diferença entre o divino· e o não-divino, entre o que é e o que não é digno de adoração”, assim com este dualismo é possível jogar toda a essência do divino na vala comum do Idealismo abstrato.
A consciência de Deus é a consciência em si do homem para ele, eis o idealismo Hegeliano tornado religião: o conhecimento de Deus que é o conhecimento de si do homem, n]ao há um para-si de Deus ao homem.
A negação do sujeito é considerada como irreligiosidade, e sua relação com objetos sensíveis, uma negação do sujeito, eis a religião ateia de Feuerbach, a qual Marx se voltará chamando-os de Velhos Hegelianos, e procura fazer aqui nova a sua inversão, agora do objeto ao sujeito, eis a nova versão “religiosa” dos Jovens Hegelianos, como Marx, mesmo criticando a principal tese ateia de Feuerbach: “o pensamento vem do sujeito”, e não da relação com o objeto
“Não se trata mais do Céu para Terra” disse Marx, mas agora “da terra para o céu”, ou seja, do objeto para o sujeito, da força de trabalho e da produção, para sua divinização (do objeto, do dinheiro, da economia, etc.).
Se para Marx, a fetichização era a separação do trabalho de seu instrumento de trabalho e da mercadoria, fetichização pode ser a reificação (res – coisa) ou a objetivação para estes jovens “hegelianos”, onde vê a separação entre o sujeito e o objeto, que no fetichismo religioso é a separação do consumo (pecaminoso) do indivíduo (visto numa autoconsciência) ao qual o religioso deve “assistir” e viver seu “concreto”.
A relação justa com o dinheiro, com o trabalho, com a saúde e educação, não é senão uma superação da visão idealista religiosa, sua consumação num homem em relação harmônica com o mundo, e neste caso, também a beleza, a poesia e vida saudável teria uma perspectiva, já para os religiosos “puros” não.
Falta a esta religiosidade uma ascese que de fato os “eleve”, embora pareçam tão ligados aos temas contemporâneos, na verdade tem um deus idealista e não pretensamente realista como desejariam, seu concreto é o deus estado moderno e sua economia, ou o direito positivista e sua visão estreita de justiça, que resultam em uma ascese desespiritualizada.
Buscar as coisas do alto, esta é a ascese verdadeira.Iniciada com a crítica ao idealismo, em “A ideologia alemã” (1932), onde discorre sobre Feuerbach, B. Bauer e Stirner, que chega a chamá-los de são Buer e são Stirner, pela pretensão de serem teologias.
Se a essência do idealismo é a separação de objeto e sujeito, faço uma inversão proposital, a essência do pensamento religioso para Ludwig Feuerbach é separação do sujeito e os objetos sensíveis, pois para ele a consciência do objeto pode ser, embora distinta da consciência de si, uma consciência que coincide logo em seguida ao se tratar do objeto religioso, devido sua “transcendência” é exatamente o que o faz retornar-se a consciência de Si, explico.
Para Feuerbach, e o objeto sensível está fora do ser (embora a ontologia aqui seja só um apelo), o objeto religioso está nele, é um objeto intrínseco, e tão pouco o abandona, a sua consciência moral o abandona, é um objeto íntimo, e mesmo o mais íntimo, é o mais próximo de todos e então está ligado sempre.
A sua crítica a Teologia, usando o idealismo pressupõe essencialmente um juízo crítico, a “diferença entre o divino· e o não-divino, entre o que é e o que não é digno de adoração”, assim com este dualismo é possível jogar todo a essência do divino na vala comum do Ideal.
A consciência de Deus é a consciência em si do homem para ele, eis o idealismo Hegeliano tornado religião: o conhecimento de Deus que é o conhecimento de si do homem, n]ao há um para-si de Deus ao homem.
A negação do sujeito é considerada como irreligiosidade, e sua relação com objetos sensíveis, uma negação do sujeito, eis a religião ateia de Feuerbach, a qual Marx se voltará chamando-os de Velhos Hegelianos, e procura fazer aqui nova a sua inversão, agora do objeto ao sujeito, eis a nova versão “religiosa” dos Jovens Hegelianos, como Marx, mesmo criticando a principal tese ateia de Feuerbach: “o pensamento vem do sujeito”, e não do objeto
“Não se trata mais do Céu para Terra” disse Marx, mas agora “da terra para o céu”, ou seja, do objeto para o sujeito, da força de trabalho e da produção, para sua divinização (do objeto, do dinheiro, da economia, etc.).
Se para Marx, a fetichização era a separação do trabalho de seu instrumento de trabalho e da mercadoria, fetichização pode ser a reificação (res – coisa) ou a objetivação para estes jovens “hegelianos”, onde vê a separação entre o sujeito e o objeto, no fetichismo religioso é a separação do consumo (pecaminoso) do indivíduo (visto numa autoconsciência) ao qual o religioso deve “assistir” e viver seu “concreto”.
A relação justa com o dinheiro, com o trabalho, com a saúde e educação, não é senão uma superação da visão idealista religiosa, sua consumação num homem em relação harmônica com o mundo, e neste caso, também a beleza, a poesia e vida saudável teria uma perspectiva, para os religiosos “puros” não.
Falta a esta religiosidade uma ascese que de fato os “eleve”, embora pareçam tão ligados aos temas contemporâneos, na verdade tem um deus idealista e não pretensamente realista como desejariam, seu concreto é o deus estado moderno sua economia, ou o direito positivista e sua visão estreita de justiça, resulta em uma ascese desespiritualizada.
Buscar as coisas do alto, esta é a ascese verdadeira.
O cosmos e a ira divina
O modelo de universo racional/idealista era de um cosmos funcionando como um relógio, a realidade e o cosmos se mostraram além da ideia dos modernos (o eidos grego é outra coisa), se mostrou como um modelo quântico onde existe um terceiro incluído (modelo de Barsarab/Lupasco) e no qual o tempo e o espaço não são mais absolutos e matéria é energia.
Assim o antigo modelo de harmonia foi modificado pela física atual, chamada de Física do Modelo Padrão que a partir da física das partículas desenvolveu um modelo unificado para as forças que atuam sobre a matéria, e inclui as forças fundamentais forte, fraca e eletromagnética e gravitacional unificando-as a teoria quântica dos campos, a mecânica quântica e da relatividade especial.
A recente descoberta da Bóson de Higgs, incorretamente nomeada partícula de Deus supondo que ela seria responsável pela atribuição da matéria aos corpos, este modelo explicou a atração magnética dos planetas, a luz e os diversas formas e dividiu a matéria em muitas partículas.
Após a criação o universo e sua expansão determinadas leis desenvolveram corpos, planetas e sistemas planetários em formação e ocaso, estudos atuais mostram o desenvolvimento das estrelas vem de gás interestelar e poeira cósmica e hidrogênio que a baixas temperaturas entram em colapso e formam moléculas que dão origem a protoestrelas, estas sob pressão e rotação formam as estrelas.
Além do nosso conhecimento este universo em expansão age de forma muitas vezes surpreendente e hoje sabemos que não apenas aquilo que ocorre no planeta tem influência interiores como também exteriores, as explosões solares e a aproximação de corpos celestes por exemplo, enfim somos um minúsculo grão de areia num universo muito mais complexo e errante.
Todo este corpo celeste age com sua harmonia própria e não necessariamente como são pensadas as leis atuais que conhecemos então sempre é possível uma surpresa, por exemplo, hoje se procura o nono planeta (Plutão foi rebaixado para planeta anão) que teria uma órbita externa ao nosso sistema planetário e estaria agora em aproximação do sistema, afetando por exemplo o Cinturão de Kuiper, e teria uma orbita de translação de 14 mil anos e existiriam outros corpos externos do Sistema Solar.
Dentro desta nova lógica do universo, movimentos aorgicos (do inorgânico sobre a vida orgânica) não apenas é possível como facilmente explicável, o ambiente em torno da biosfera é um organismo vivo e este está dentro de um universo mais amplo e sujeito as suas leis.
Aquilo que acontece na esfera humana também tem seus equilíbrios instáveis e desequilíbrios, assim não se podem mais pensar em tudo como uma “harmonia”, no sentido cartesiano, e sim como aquilo que tende a favorecer ao funcionamento do universo como um todo e para o qual as forças tendem a empurrar perante suas próprias leis e determinações aos olhos humanos podem ser a ira divina, ou a “perfeita harmonia divina”, porém diferente daquela explicada como movimento preciso de relógio.
A carta de Paulo aos Corintios (Cor 1,1, 22-25) dizia que os gregos pediam sabedoria e os judeus sinais, mas que para Deus isto era insensatez humana, o universo esconde o amor e a ira divina.
A noosfera: da matéria primária ao pensamento
Teilhard Chardin descreve assim a complexificação a partir dos primeiros desenvolvimentos da vida, a passagem crítica da vida das células para uma vida ultracomplexa:
“Provavelmente jamais descobriremos (a não ser que, por sorte, a ciência de amanhã consiga reproduzir o fenômeno no laboratório) – a História por si só, em todo o caso, jamais descobrirá diretamente os vestígios materiais desta emersão – aparição – do microscópico para fora do molecular; do orgânico para fora do químico, do vivo para fora do pré-vivo.” (Chardin, 1965, p. 63)
Embora possa parecer que a natureza teria feito esta preparação sozinha, chama a atenção a originalidade essencial da célula produzindo algo inteiramente novo, e compondo uma multiplicidade orgânica num mínimo espaço, embora o processo possa ter levado anos, cada célula foi longamente prepara para ser algo original.
Será através de discretas, mas decisivas mutações que ocorreram durante milhares e milhões de anos, que a complexidade de células e seres vivos foram se formando sendo possível perceber “os irresistíveis desenvolvimentos que se ocultam nas mais frouxas lentidões, a extrema agitação que se dissimula sob o véu de repouso, o inteiramente novo que se insinua no íntimo da repetição monótona das mesmas coisas” (Chardin, 1965, p. 8).
Foi pela complexificação da vida que surgiu o humano, na origem Deus o fez de matérias inorgânicas, metaforicamente a Bíblia diz do barro, porém é certo que o universo nasceu antes.
Assim o mundo da physis (Chardin vê sua física no sentido grego da palavra) estaria ligada a biologia, e pensa:
“Poderíamos hesitar um só momento em reconhecer o parentesco evidente que liga, na sua composição e nos seus aspectos, o mundo dos proto-vivos ao mundo da física-química ? Quer dizer, não estaremos ainda, neste primeiro escalão da vida, senão no âmago, pelo menos na própria orla da ´matéria´?” (Chardin, 1965, p. 66)
Ao nascimento da vida humana, após bilhões de anos depois da formação do universo, uma grande e decisiva mutação ocorrerá, o nascimento do pensamento e da consciência, e do que Chardin chama de interiorização, que em termos religiosos significa a alma individual que é também ligada ao coletivo, o princípio da associação desde as primeiras células.
Ao pensamento e à consciência desenvolve-se a noção de pessoa, esta experiência foi dada graças ao desenvolvimento cerebral do homem, e aos desenvolvimentos do que Chardin chama de Noosfera, a última etapa depois da Biosfera, a criação e desenvolvimento da vida.
Desenvolver e explicar a cosmogênese chardaniana é um longo processo que nem mesmo em vida ele desenvolveu completamente, muitos avanços da astrofísica atual (muitas descobertas tentam explicar a origem da vida) ajudam a compreensão, o que importa é ressaltar que o panorama de evolução do próprio cosmos, não apenas a Terra, está ligado ao desenvolvimento da consciência e da capacidade humana de ligar-se a harmonia da vida.
CHARDIN, T. O fenômeno humano. BR, São Paulo : Herder, 1965.
A primeira mutação aórgica
Como se originou exatamente a vida é ainda uma especulação, uma das teorias mais elaboradas foi feita por Lynn Margulis (1938-2011) primeira esposa de Carl Sagan famoso pela série Cosmos, a teoria dela chamada de Endossimbióse.
Nesta teoria as mitocôndrias e cloroplastos tornam-se organelos em uma célula, os primeiros por energia química e o segundo por fotossíntese, embora a teoria nunca foi comprovada em laboratório é interessante, Teilhard Chardin as chamava de “cadeia de moléculas carbonadas” (O fenômeno humano) e ATP (adenosina trifosfato) molécula transportadora de energia nos seres vivos, há outras teorias é claro.
Fundamentalistas de plantão fiquem calmos, também no Genesis da Bíblia está que Deus fez o homem do barro e depois soprou-lhe nas narinas, assim também a vida surgiu em determinado momento (Genesis 2,7), e o texto anterior diz que “mas subia da terra um vapor que regava toda a terra” (Gn 2,6), esse vapor bem que podia ser o CO2.
Talvez nunca saibamos exatamente como isto aconteceu, porém é certo que a Terra e a Natureza vieram antes que os organismos vivos e certamente depois deles (ou da maioria deles) apareceu o homem, porém a mutação aórgica não parou ai.
As mutações gênicas, embora raras podem acontecer, elas podem fazer surgir novos genes numa determinada população, por mecanismos de adaptação natural, se determinadas características forem favoráveis à sobrevivência e à reprodução em determinado ambiente, portanto se o ambiente muda as mutações podem tornar-se estáveis no novo ambiente.
A terra passou por diversas mudanças ambientais, e talvez a que estamos passando seja a que mais profundamente afeta a estabilidade do meio ambiente, pássaros e animais foram extintos e florestas e ambientes naturais devastados, assim é de se esperar que alguma mutação ocorra, porém será o ambiente o primeiro a mudar e reagir, assim fenômenos naturais podem ocorrer.
Isto levam muitos anos para ocorrer, mas de repente rompem-se numa cadeia de mutações, assim a descreve Teilhard Chardin: “os irresistíveis desenvolvimentos que se ocultam nas mais frouxas lentidões, – a extrema agitação que se dissimula sob um véu de repouso, – o inteiramente novo que se insinua no íntimo da repetição monótona das mesmas coisas” (Chardin, 1965, p. 8).
Em tempos de riscos pandêmicos, olhar ao universo da cosmogênese que vivemos é essencial.
CHARDIN, T. O fenômeno humano. BR, São Paulo : Herder, 1965.
Nomeando elefantes (ou bois) e visão de mundo
Falecido em fevereiro do ano passado, o americano e filósofo cristão James W. Sire (1933-2018) fez uma ampla pesquisa por trás da questão da visão de mundo, disse que levou 30 anos, publicado em 2004, provavelmente começou a se debruçar sobre o tema em 1974.
Também sua visão de mundo deve ser relida, quero dizer que de 1974 a 2004 o mundo passou por transformações que ele não aprofundou, a queda do Muro de Berlim, o fim da guerra fria que parece agora renascer, a queda de ditaduras que parecem voltar em todo o planeta e mais recentemente ainda a pandemia.
Não li o livro, mas um de seus capítulos que encontrei na Web e também alguns de seus comentaristas que me ajudaram a formular uma ideia, ainda que imprecisa, do seu principal livro “Nomeando elefantes: visão de mundo como um conceito” (Naming the Elephant: Worldview as a Concept, editora IVP Academic), e o capítulo que referencio é o Definições de Cosmovisão: de Dilthey a Naugle, que já no título é sugestivo de algum idealismo o que o texto confirma logo no início, está disponível no google Books, sendo leitor de Dilthey está ao meu ver no fio da questão.
Diz no início do capítulo 2 que a origem do termo Weltanschauung teve origem com Kant (1724-1804) (pasmem! idealistas), “mas somente de passagem”, e cita textualmente Dilthey: “to denote a set of beliefs that underlie and shape all human thought and action” (Sire, 2004, p. 23), em tradução livre: denotam um conjunto de crenças que sustentam e moldam todo o pensamento e ação humanas, elas estão no cerne do que desejo analisar.
Embora apropriada a análise, talvez a mais completa sobre o termo, falta a leitura de Heidegger que atualizou e desenvolveu o tema num sentido mais amplo que o de Kant e Dilthey, e Hans Georg Gadamer irá criticar justamente a concepção de Dilthey como idealista.
Para fazer o caminho do conceito de Weltanschauung cita Nietszche, Wittgenstein, com digressões a Platão e Descartes, Foucault e até Rorthy de passagem, e ai começa a discorrer sobre autores cristãos evangélicos (reformados é o nome no exterior), James Orr, Abraham Kuyper, Herman Dooyeweerd, Ronald Nash até chegar ao que chama de nova síntese que seria David Naugle, entretanto, jamais foge do idealismo, diz passar da ontologia a hermenêutica (não seria o contrário) e diz que esta visão sintética é caracterizada por um “sistema semiótico de signos narrativos” (Sire, 2004, pag. 42) citando Naugle do qual fez tal síntese.
Entretanto a verdadeira síntese escondida atrás do texto, de clara visão nominalista veja-se a ideia de sistema semiótico, se revela ao citar o texto bíblico “Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim, referindo-se a passagem bíblica de Jo 14:1, pois ignora em seguida o texto que diz: “na casa de meu pai há muitas moradas”.
A ideia de signos, mitos e símbolos embutidos em narrativas que representam uma visão de mundo não é desprezível, e é mesmo importante, entretanto qualquer visão que se prenda unicamente a narrativa não faz o trabalho de retirar a visão antropológica e a real visão “histórica” do acontecido, sendo a visão do historicista de Dilthey idealista e irreal.
Há outra passagem mais significativa, a chamada volta do filho pródigo (Lc 15,10:32), que alguns autores e exegetas idealistas não gostam do nome, procurando idolatrar o filho mais velho que ficou em casa com o pai, sendo este mais conservador portanto, mas também o filho pródigo teu seu defeito, foi ao mundo fazer experiências, o fato que retornou é louvável, mas que visão de mundo ele trouxe de seu desvio, na verdade o pai de ambos é que é o misericordioso com os filhos conservador e rebelde.
É preciso recuperar esta visão de verdadeira misericórdia, e as leis dizem mais ainda: “pedi e vos será dado” (Mt 7,7) e porque parece que Deus não nos atende, é simples algo a ser corrigido.
Sire, J. W.Naming the Elephant: Worldview as a Concept, editora IVP Ademic, EUA: Illinois, 2004.
A cura do Outro
Gandhi afirmava que “não se pode ferir o outro sem ferir a si próprio”, porém Carl Jung tem uma receita ampliada “aquele que cura o outro, cura a si próprio”, em termos de pandemia é bom pensar nisto, cuidar o distanciamento, as regras de higiene, etc.
Alguns dizem isto nunca vai acontecer comigo, são pessoas já com comorbidades, etc. sim eles estão no grupo de risco, mas a pandemia agora com as novas cepas ampliaram o “grupo de risco”, pode-se dizer toda a sociedade está vulnerável.
E junto com a pandemia, as economias estão ruindo, mas os modelos idealistas continuam aí, temos a resposta a tanto tempo, não se esqueçam que elas já foram testadas, assim não se trata deste ou daquele modelo, todos modelos atuais estão centrados na “economia” como centro de qualquer política e não no ser humano, isto valeu ainda mais profundamente nesta crise.
A usina de Fukushima por exemplo, houve tremores naquela região recentes, mostrou novos vazamentos, a água usada para resfriá-la será jogada no mar e então irá pelo mundo agora.
Se tivermos outros acidentes naturais, terremotos estão sempre acontecendo aqui e ali, e se forem perto de outras usinas, e se outro tipo de crise planetária, diferente da pandemia vier, e isto não é só pessimismo, é uma possibilidade que todos sabemos que existe.
Sim agora o problema é a doença, fonte da cegueira atual, ela é também um prolongamento da crise cultural e noite de Deus, vejam os diversos tipos de religiosidade que cresce, os apelos e profecias não faltam em todo canto, a meu ver alguma poderá ser verdadeira inclusive, mas não se trata disto e sim de perguntarmos como vai a vida “saudável” no planeta, e ai entra o Outro.
Diziam que a crise era das mídias, ou das redes que é uma coisa bem distinta, agora são a salvação para manter os contatos com a devida distância, hora não eram os celulares que faziam isto e porque não fazem agora, manter empresas e escolas funcionando, não é tão mal, o uso sim.
Claro que não, a perda das relações independe dos meios (as mídias) que usamos, e colocar-se em rede é ainda melhor, agora parece mais claro é colocar-se primeiro diante dos mais próximos, cuidar e se ocupar deles, coisas que lembramos de serem feitas pelos nossos avós, que pareciam fechados e atrasados, mas eles sabiam o que significava ser próximo, ser amoroso e ser fiel.
Salvar a economia mesmo que as pessoas morram, eis o fundamento de um mundo onde no fundo é a economia que todos estavam preocupados, talvez uma minoria pensasse realmente no bem-estar e no equilíbrio da vida vivida na essência, sem luxo e com um certo “conforto”.
Lembre-se que o oeconomicus em grego, tratava-se da economia doméstica e da agricultura, é verdade que a economia evolui muito, porém não devia ter perdido as origens, organizar a economia “doméstica” das pessoas e produzir alimentos, parece o essencial nesta crise.
Não temos só que nos curar, é preciso curar e cuidar do outro, assim nos ensinam nossos heróis da medicina, pois as consequências serão para todos, a descoberta desta interdependência é saudável para um mundo que começa a se fechar em nacionalismos e mentalidades autoritárias.
Empatia forçada e verdadeira
O fato de sorrir sempre e ter necessidade de se mostrar feliz pode ser altruísmo e até mesmo heroísmo de muitas pessoas, o que deveria nos dar confiança e empatia deveria ser a transparência, que nem sempre é empática.
Claro isto não significa ser mal-educado ou grosseiro, nem desvio de personalidade, mas o alívio do dualismo interior diante da verdade, mesmo quando ela não é simpática, faz a pessoa ter maior coerência interna, que não se confunde com identidade.
Identidade pode ser pessoal, em grupo ou cultural, algumas vezes é confundida com ser conivente ou conveniente, mas na raiz isto é falsidade, portanto a empatia tem seu lugar diante da verdade e do ser, nem sempre da ética social que dita regras de conveniência e “legalidade”, o que passou a ser chamado de politicamente correto, mas bem poderia ser politicamente conveniente.
Desde a década de 30 se fala do brasileiro como o “homem cordial”, embora haja uma grande distância antropológica e histórica da politicamente correto, não seria isto apenas a atualização.
Empatia então deveria ser bom humor no sentido de capacidade de com serenidade entrar em problemas e questões polêmicas e com forte possibilidade de polarização, o mundo hoje precisa disto, e, portanto, confundi-la com hipocrisia, sorriso fácil ou apenas tolerância pode ser “cordial”, podendo não ser um sentimento verdadeiro.
Na verdade fazer ao outro o que gostaríamos que fosse feito para nós, não é o sistema empático, o que a neurociência mostra é que temos um conjunto de neurônios chamados neurônios-espelho que diz que imitar o outro é uma forma empática muito natural, que não é só a de fazer algo ao outro pelo simples fato que gostaríamos que fosse feito a nós, no fundo estamos “pedindo” algo que queremos, é saber como o Outro QUER que seja algo feito a ele, isto sim é empático.
A empatia significa o dom que todos tem, de poder sentir o que o outro sente, assim falar de Outro é a verdadeira forma tanto de encontrar um dom inato da humanidade, a neurociência revela, como também tornar esta verdade explícita, existimos e sentimos o Outro, só o negamos assumindo um falso eu, pois temos como “habilidade” natural a empatia, e só por um treino constante de negar-se ou por algum condicionamento social, perdemos a empatia.
A pandemia tornou muita gente amarga, insatisfeita e de certa forma acentuou o individualismo, em O sócio e o próximo (Le socius et le prochain), Paul Ricoeur explica esta diferença de relação.
Não há, portanto, eu verdadeiro sem o Outro, sem a empatia com o Outro, natural e não forçada, que feita assim é uma encenação e o Outro sentirá, a empatia é assim ontológica, parte do Ser.
A jovem Tati Fukamati explica num vídeo sua descoberta da empatia na neurociência, é uma boa iniciação para aqueles que desejam ser mais empáticos.