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Arquivo para a ‘Linguagens’ Categoria

Resistência ética e do espírito

16 fev

A resistência ética, ou a resistência do espírito que fala Edgar Morin, é o reconhecimento “de um retorno aos dogmatismos e aos fanatismos, e uma crise da moral enquanto se espalham os ódios e as idolatrias” disse o filósofo.

Não é possível estabelecer a ética quebrando as regras mais elementares da ética que o respeito pela dignidade do Outro, não é possível fortalecer a moral se espalhamos todo tipo de imoralidade da política aos costumes e não é possível falar de espírito se o que existe é só uma pura idolatria em diversos sentidos, do cultural ao religioso.

Não se trata mais apenas das guerras, que em si já são uma catástrofe, porém “as qualidades da nossa civilização deterioraram-se e as carências aumentaram, em particular no desenvolvimento dos egoísmos e no desaparecimento das solidariedades tradicionais”, disse Morin em entrevista ao jornal italiano La Reppublica (24/01/2024).

O apelo ao fanatismo político polarizou a sociedade, quem defendia a democracia a agride com as formas mais arbitrárias de poder, no campo religioso quem defende práticas e ritos religiosos esquecem de fazer o bem ao semelhante e de respeitar os diferentes credos, cada um ter razão a sua maneira, segundo sua própria moral e o resultado são escândalos morais.

Como aquele fariseu que pratica o jejum e faz negócios escusos e maltrata seus funcionários, ou como aqueles que mesmo conhecendo os preceitos religiosos procura justificar suas faltas com argumentos ou leitura religiosa factual e não contextual.

Uma ascese que não inclua mudanças de atitudes e de comportamentos, uma resistência do espírito a tudo que parece justificável de imoral e duvidoso espiritualmente, deve ser um caminho para uma ascese verdadeira que faça uma verdadeira resistência do espírito.

As tentações de Jesus no deserto, em que foi lhe oferecido honra, glória e poder para ceder ao mal, mais que uma alegoria é um caminho para que conquistas sejam feitas de modo modesto, justo e sem ofender aos que estão por algum motivo dependentes de nós para o sustento.

Apelos a riqueza, ao poder e ao luxo em nome de religiosidade são as idolatrias mais claras e o reverso de qualquer resistência do espírito ou de resistência moral a decadência civilizatória.

As guerras não são outra coisa que as tentações do poder e da opressão a povos, grupos ou culturas que serão subjugados pela força bruta, pela humilhação e até mesmo pela morte de inocentes.

A esperança de paz, de moralidade e ética está em conservar uma resistência do espírito.

Morin, E. A resistência do Espírito, Italia: La Reppublica, 24-01-2024.

 

Ética e resistência

15 fev

O formalismo idealista hegeliano estabelece uma eticidade, uma vez que vê na finitude do homem uma fatalidade, no dizer de muitos pensadores sua mundaneidade, entretanto as categorias usadas na fenomenologia, onde se volta a coisa em si nela há a essência do Ser.

Foi Emmanuel Levinas que abriu esta essência para a relação com o Outro, e a chama de uma resistência ética, declara-a como uma epifania, no sentido filosófico de aparição, que é uma abertura a exterioridade ao ser infinito, onde esta resistência pode se manifestar.

Assim diferente da ideia da abertura do Ser ou da transcendência idealista, relação do sujeito com o objeto, sua exterioridade é aquela que o Ser interior manifesta-se diante do infinito, sua abertura ao Outro requer um exame de consciência: amamos ou odiamos, perdoamos ou nos ressentimos diante do diferente, favoreço a ética e ao comportamento moral, ou a relativizo.

O professor brasileiro Brüseke esclarece: “É curioso a freqüência com a qual está sendo levantada a preocupação ou até o receio de que a mística enfraqueça a moral social” (Brüseke, 2000).

Assim a transcendência de Levinas é uma verdadeira abertura do Ser ao mundo exterior e a vida de maneira ampla e totalitária (claro não no sentido autoritário da palavra), ela pode dar ao Ser uma verdadeira ascese, um reencontro consigo mesmo diante de uma metanóia, uma mudança completa de mentalidade.

Aberto a vida, não significa aberto aos prazeres e circunstâncias momentâneas, mas encontrar um caminho para nossa “ascensão”, um crescimento cotidiano ainda que com obstáculos e percalços, a falsidade de caminhos “fáceis” é que eles não fazem o “exercício” da ascese verdadeira, apenas o contornam com paliativos (ler a Sociedade Paliativa de Byung Chul-Han).

A resistência, categoria também usada por Edgar Morin para o mundo contemporâneo, é mais que um opor-se ao “mal”, ou uma resiliência interior, é uma resistência da esperança, de crer que um caminho alternativo é possível, que a guerra não é uma saída, e que teremos futuro.

A filosofia e a ciência não são opostas ao crescimento espiritual da humanidade, em certa medida até podem ser complementos saudáveis para uma fé equilibrada e uma ciência que seja de fato humanizada, não se trata de dominar a natureza e sim de cooperar com ela.

Deve partir de atitudes e decisões pessoais, colocadas em reflexão e vivida socialmente.

Brüseke, F. A ética da resistência. Cadernos de pesquisa interdisciplinar em Ciências Humanas. Florianópolis, SC, v. 1, n. 8, 2000.

 

Fragilidade humana diante do Infinito

14 fev

Uma das obras importantes para entender a viragem linguística do ponto de vista da ontologia é a obra de Emmanuel Levinas, destacando aqui uma obra que toda a questão da impossibilidade de objetivação do Outro e da limitação humana diante de debilidades como os vícios, as dificuldades éticas e a guerra.

Levinas tira parte de sua experiência do que viveu na segunda guerra mundial, onde foi mantido preso pelo regime nazista, além de ter seus pais e irmãos executados, viu as atrocidades da então dita “razão esclarecida” que se mostrou violenta e totalitária, estas experiências estão em tensão em seu pensamento, e são importantes num contexto de ameaça de uma nova guerra mundial.

A ontologia tem seu papel dentro da metafísica segundo o autor, mas não seu primado como o de filosofia primeira, a transcendência do âmbito do “si” e do “ser”, uma vez que este movimento desvelou-se (as categorias de re-velar é um novo velamento) retornando o movimento ao si mesmo, ao idêntico, ao ser e e sua preservação, não ao reconhecimento do Outro.

Em contraposição a Heidegger, para quem a relação do ser com outrem é subordinada a uma relação com o ser em geral e nada interfere no surgimento do eu, Levinas entende que o eu não se deve ao Ser, mas ao Outro, e assim esta relação é fundamental como em Paul Ricoeur.

O autor propõe em Totalidade e Infinito uma nova escolha para a compreensão do ser em que a exterioridade não seja sacrificada, assim a relação com o Outro e com o “mundo” exterior é reflexo e caminho para a interioridade, nela encontra uma relação com o todo e infinito.

Esta relação do eu com o rosto do Outro que apresenta uma resistência ética, para o autor, é pela sua epifania, pela sua “aparição” (categoria fundamental na fenomenologia), que a exterioridade do ser infinito pode se manifestar como resistência.

O seu pensamento é mais complexo, mas podemos entender que a debilidade e limitação do eu, se mantida em tensão com a exterioridade e com o Outro, desvela o infinito e nossa relação com ele, que não pode ser outra que o reconhecimento de sua “transcendência”.

Levinas, E. Totalidade e infinito. Lisboa : 70, 1988.

 

A verdadeira ascese

13 fev

Não há definições claras, nem na psicologia, nem na sociologia e na moral daquilo que seja uma verdadeira alegria equilibrada, ou se desvia para uma euforia que é manter a alegria em níveis elevados, o que não é possível todo o tempo, ou sua compensação, que é diminuir para níveis nostálgicos e baixos que não pode mais que um contentamento.

Também na filosofia de falou sobre alegria e euforia, para derivada do grego (euphoria) que significa sustentar facilmente o que carrega (phoros), porém o termo aparece em termos modernos em 1875 pra referir-se ao contentamento experimentado pelos viciados em morfina, sendo também característica daquilo que se chama transtorno bipolar.

Tudo depende do desejo de elevação humana a um estágio em que estando mais alto seja sustentável (carregado – eu + phoros), assim pode-se supor uma subida, uma ascese.

Peter Sloterdijk conceituou a sociedade atual como tendo uma ascese desespiritualizada, claro que sua espiritualidade não se refere a um culto ou crença definida, porém questiona que esta subida é hoje sem sustentação espiritual, sem uma verdadeira ascese.

A metáfora que Sloterdijk usa das esferas, mais uma vez com alusões explícitas a Heidegger, se referir às construções das esferas íntimas e imunológicas, é a da casa (Haus ou Gehäuse), não é apenas um lugar que oferece proteção, mas também constitui uma esfera psíquica, espiritual e intelectual para esta “ascese”.

Não há subida sem esforço, e muitas vezes sem sacrifícios, e não há subida se não for para o alto, assim uma ascese não é um exercício um treino, mas uma vida prática de ascender.

Portanto a alegria sem esforço para a vida, para o pão de cada dia, para o progresso humano e não apenas material é falsa ascese, não tem sustentação, desmorona após o “exercício” e se pode-se comparar a subida de um monte, deve-se lembrar para ao descer suportá-la no alto.

Discursos, apoteoses e vertigens são buscas quase intermináveis nos dias de hoje, frases de efeito não produzem vida, não dão alegria e paz duradoura as pessoas, posse de sabedoria falsa, de alegria e elevação falsas, porque desmoronam no dia seguinte diante da realidade.

Promessas de paraíso terrestre, enriquecimento e bens de consumo não passam de euforia, de falsa ascese, a posse de um bem não significa necessariamente a felicidade e a paz interior, o que todos homens almejam, mais ainda nos dias de hoje, um pouco de paz e alegria durável só é possível com uma verdadeira ascese, sem abdicar dos bens da vida e do respeito mútuo.

A alegria passará e uma quarta-feira de cinzas virá e então enfrentemos as dificuldades com coragem e determinação, uma ascese verdadeira sabe cada passo que deve dar.

 

Estratégia russa e israelense

12 fev

De um lado uma potência a esquerda, que não negocia com opositores e não abre mão do poder, de outro uma potência ocidental onde a guerra pode ajudar a manter no poder as forças de direita em coalisão.

As guerras são políticas e não podemos vê-las apenas pela ótica de ditadores e genocidas, ainda que qualquer guerra se fundamente na ilegitimidade de matança de civis e mesmo dentro dos parâmetros de acordos internacionais sobre a guerra, eles sejam ultrapassados.

Qualquer narrativa que haja esconde o ódio e a vingança contra opositores, a ira e a violência como fundamento, usando para isto discursos de virilidade, ideologias do pensamento único e até mesmo apelos humanísticos que são ultrapassados a partir da primeira batalha.

A análise crítica é que não haverão recuos, em recente discurso Putin declarou que não há possibilidade de derrota na Ucrânia, isto é, usaria as catastróficas armas nucleares ou recursos próximos disto, porém atenua dizendo que não há interesses de invasão na Polônia e Letônia.

Apesar de terem eleições próximas, o único opositor russo que Putin respeita, outros já estão presos ou desaparecem presos ou mortos, não há possibilidade de qualquer mudança no poder.

Em Israel, o presidente Netanyahu ameaça mandar tropas a Rafah, campo de refugiados na fronteira com o Egito, que tem um tratado de paz com Israel a 45 anos, também o presidente americano Biden pediu que não sejam enviadas tropas para lá, mas a proximidade das eleições israelenses exige um aceno para a direita mais radical em Israel.

A diretora executiva da UNICEF, Catherine Russel, disse que os civis em Rafah devem ser protegidos, pois não tem para onde ir: “cerca de 1.3 milhão de civis estão encurralados, vivendo nas ruas ou em abrigos. Eles precisam ser protegidos. Eles não têm nenhum lugar seguro para onde ir”, disse segundo a imprensa internacional.

A lógica da guerra é que favorece os ditadores e não permite que qualquer princípio mais humano e democrático seja respeitado, é a ausência de serenidade e tolerância a opositores.

 

A cura de mentes e corações

09 fev

É cada vez mais comum o apelo aos bens materiais, ao fecharmos em si e uma falsa ideia sobre o que é a felicidade, almas e corações feridos que buscam a felicidade onde não está, podem ter uma consolação temporária, mas não é gaudio, felicidade equilibrada e paz.

Outro livro de Sêneca bastante fundamental para seu pensamento é da tranquilidade da alma, o homem moderno vive a exterioridade, erroneamente chamada de objetividade ou materialidade, porque as coisas (os entes) são parte de aspectos ontológicos e devem ser pensados e cultivados adequadamente na interioridade, que não é a subjetividade, mas alma.

Disse o filósofo Romano, que postamos ontem sobre a Ira, agora sobre a alma:

“Se o homem tivesse a oportunidade de olhar para dentro de si próprio, como se torturaria, confessaria a verdade e diria: “Tudo que tenho feito até agora, preferia que não tivesse sido feito; quando penso em tudo o que disse, invejo os mudos; tudo o quanto desejei, a maldição de meus inimigos; tudo o que temi. Ó deuses justos! Melhor não tivesse desejado. Fiz muitas inimizades, e o ódio substituiu a amizade (se é que há amizade entre os maus), e nem sou amigo de mim mesmo.

Embora escrito no início da era cristã, o autor Da tranquilidade da alma, reflete a dificuldade que é para o homem comum e também para o sábio manter a sua serenidade, perante um espetáculo de injustiça e de baixeza (vejam como é antigo isto), do qual é testemunha todos os dias, é justamente o contraponto da Ira, do ódio e do confronto.

O texto começa com uma carta imaginária escrita por Sereno (claro é de propósito o nome): “eu te direi o que está me acontecendo, e tu encontrarás um nome para essa doença”, e ao final afirma: “Às vezes, a minha alma se eleva com a magnitude do pensamento, torna-se ávida por palavras e aspira às alturas. Assim o discurso já não é mais meu [grifo nosso]. Esquecido das normas e dos critérios rigorosos, elevo-me e falo com a boca que não é mais minha”.

A partir de então refletirá sobre a maneira de contornar obstáculos que impedem a paz.

Embora o discurso seja moralista e ético, e não é menos importante por isto, a elevação que Sêneca almejou não pode encontrar outro lugar senão numa ascese espiritual, também está em outras culturas, o budismo é um elevação no caminho das virtudes, Ghandi usou a paz como um exercício política para liderar a Índia, e no caso do cristianismo são as “curas” de Jesus.

Diz o texto Bíblico, ao verem a cura de um surdo-mudo (Mc 7,37): “Ele faz bem todas as coisas. Aos surdos faz ouvir e aos mudos falar”, e também curou leprosos “impuros”.

Sêneca. Da Tranquilidade da Alma (wordpress.com) . trad. Lucia Sá Rebello e Ellen Itanajara Neves Vranas. Porto Alegre, RS: LP&M Pocket. 2009.

 

Sobre a Ira e a Esperança

08 fev

O filósofo romano antigo Sêneca (4 a.C.–65 d.C.) fez um belo ensaio Sobre a Ira que embora esteja em três livros, pode ser dividido em duas partes, é dirigido ao seu irmão mais velho Gálio, a primeira parte trata de questão teórica (I-II.17) e fala dos horrores da Ira e suas definições, a segunda parte dá dicas de como acalmar as pessoas, tanto crianças coo adultos, usados casos reais como exemplos.

Embora os textos sejam muito interessantes e inteligentes há uma lacuna essencial que não se pode obter seu uma ascese espiritual, a Esperança que o contexto se modifique por ações que extrapolam o nível pessoal, social ou de grupo, elevar o nível de saúde espiritual de um grupo.

Segundo o filósofo, um grande homem não deve irar-se nunca e, quando não for possível evitar a ira, ele deve tentar se acalmar o mais cedo possível, é famosa sua frase:

Nenhum homem se torna mais corajoso por meio da ira, exceto alguém que, sem ira, não teria sido corajoso: a ira, portanto, não vem para ajudar a coragem, mas para tomar seu lugar” (I.13).

Porém na vida social existem situações em que homens bons e justos estão sujeitos ao poder de autoritários, presunçosos e arrogantes que humilham, exploram e maltratam humildes.

A isto o estóico rebate com outra frase; “Que nada lhe seja permitido enquanto estiver irado. Por que razão? Porque irá querer que tudo lhe seja permitido.” (III.12), dito de modo atual, se perdemos a calma ao apontar um equívoco podemos perder a razão em reagir ao erro.

A esperança é fundamental quando toda uma situação social, política ou mesmo religiosa se torna difícil e aponta para um caminho que parece sem o da destruição, do erro e do medo, não se trata de estar em conformidade, escrevemos no post anterior sobre a disposição que precede a intenção, mas a intenção de acalmar de propagar a paz e evitar a ira torna tanto a esperança quando a possibilidade de correção de rota viável, a ira não, inicia ou amplia o confronto.

É preciso acreditar que a união de forças que desejam a mudança positiva tem uma luz que é superior ao conjunto das forças humanas, porque podem melhor a “disposição”, o clima a favor de atitudes sensatas e construtivas e elevar o padrão moral num círculo virtuoso.

 

Existe um Ser interior

07 fev

A filósofa Hannah Arendt já havia desenvolvido o tema de Vita Contemplativa, e o ensaísta coreano-alemão Byung Chul-Han amplia este tema em seu livro com o mesmo nome, porém vamos apontar apenas as novidades ali, entre elas aquilo que retoma de Heidegger que é a disposição.

No Ser e o Tempo, Heidegger trabalha o verbo stimmen, usando a conjugação stimmung (que é traduzida por disposição) e usa também Gestiment-Sein (ser disposto), mas que no alemão é algo como estar afinado, estar em sintonia com algo e isto modifica o conceito de intenção.

Ao pé da letra disposição, um estado de espírito precede qualquer intencionalidade referida a objetos: “A disposição já abriu, porém, o ser-no-mundo como todo, e torna principalmente possível um dirigir a [algo]” (Heidegger apud Han, 2023, p. 66).

Assim a relação com o mundo exterior, com os objetos, com os entes e com tudo que vem de fora ao Ser, significa que estamos dispostos a, diz o texto: “A disposição nos abre o espaço unicamente no qual nos confrontamos com um ente. Ela desvela o Ser” (Han, idem).

Esta visão transforma o que somos e pensamos, em termos espirituais aquilo que a alma esta disposta e para o que se dirige a partir da interioridade, diz o texto: “A dimensão contemplativa que nele habita o transforma em um corresponder. Ele corresponde àquilo que “se dirige a nós como voz [Stimme] do ser”, ao se deixar de-finir por ela” (Han, 2023, p. 67).

Assim o pensar torna-se outra coisa do que articulação lógica ou discurso narrativo: “Pensar significa “abrir nossos ouvidos”; ou seja, escutar e ouvir atentamente. Falar pressupõe escutar e corresponder. “Philosophia é o corresponder verdadeiramente consumando que fala atenta ao chamado do ser do ente. O corresponde ouve a voz do chamado […]” (Han, 2023, pgs. 67-68).

Tudo isto parece excessivamente filosófico e o é de fato, porém significa conforme afirma o autor que há algo de-finido, e temos muitas definições pré-dispostas, é algo que está condensado em nossa mente e nossos pensamentos “no âmbito pré-reflexivo”, quer dizer dentro de nós.

Assim é o que temos dentro, em nossa interioridade que nos ajuda ou limita, diz o autor citando novamente Heidegger: “Se a disposição fundamental fica de fora, então tudo é um aglomerado forçado de conceitos e cascas de palavras” (Heiddeger apud Han, p. 68).

Assim não é o exterior e aquilo que tomamos fora de nós que nos define, mas o que temos dentro e por isso a interioridade é fundamental para qualquer análise.

HAN, Byung-Chul. Vita contemplativa: ou sobre a inatividade. Trad. Lucas Machado. Petrópolis, RJ: Vozes, 2023.

 

Hipocrisia e poder

06 fev

Na análise de correntes políticas e ideológicas, a noção e o problema da hipocrisia é negligenciado, assim pode por defesa da democracia defender atitudes autocráticas, por combate a corrupção justificar elementos de corrupção ativa e passiva, aliás, a ativa que é o fato de se oferecer compensação ilícita (e não se diz o que é ilícito) e a passiva é quando um funcionário público recebe uma compensação indevida (quando é que pode) de terceiros.

O termo hipocrisia em grego antigo (hypocritás) é parecido ao atual, trata-se de quando um ator social intencionalmente age de modo simulado, em atos ou palavras, que escondem como pensa ou como de fato age, a regra hoje é dizer o contrário para confundir a opinião pública.

Como termo usado por autores contemporâneos, lembro Maquiavel, como críticas da razão política, e Foucault, que a vê como elemento central das relações de poder, embora sua análise se desloque para o campo psicológico.

A psicopolítica de Byung Chul-Han desloca-se para o campo midiático, o autor acredita que o poder da mídia digital facilita este tipo de relação, embora não a chame diretamente de hipocrisia, mas dá uma receita interessante no seu livro “O que é poder”, “⁠A perda moderna da fé, que não diz respeito apenas a Deus e ao além, mas à própria realidade, torna a vida humana radicalmente transitória”, assim não há nada perene, uma vez que tudo muda.

A base da hipocrisia moderna é induzir o homem a acreditar numa vida de facilidades, o que Byung Chul-Han chama de excesso de positividade, aboliu-se a dor e o sacrifício, “Esquece-se que a dor purifica. Falta, à cultura da curtição, a possibilidade da catarse. Assim, sufocamo-la com os resíduos [Schlacken] da positividade, que se acumulam sob a superfície da cultura de curtição”.

Isto torna o homem mais feliz, a resposta é o contrário do que a sociedade promete, a depressão, a bipolaridade e o tédio são as doenças contemporâneas, “A depressão é o adoecimento de uma sociedade que sofre sob o excesso de positividade”.

Homens e mulheres se libertos desta sociedade do desempenho, dos exercícios, de uma ascese desespiritualizada, sem atitudes de desconfiança e persecutórias, tornam-se mais afáveis: “Homens e mulheres comuns, tendo a oportunidade de uma vida feliz, se tornarão mais gentis e menos persecutórios e inclinados a encarar os outros com suspeita”.

É possível restabelecer a confiança mútua, as relações saudáveis, a empatia e a fraternidade tornando a sociedade mais sadia e menos conflituosa.

HAN, B.C. O que é poder. Trad. Gabriel Salvi Philipson. RJ: Petrópolis, Vozes, 2019.

 

Esperanças de paz

05 fev

As eleições russas acontecem em 15 e 17 de março, mas o provável adversário político de Putin, o ex-deputado Boris Nadejdin teve a sua candidatura rejeitada nesta sexta-feira, 2 de fevereiro pelo vice-presidente da comissão eleitoral Nikolai Bulaiev, que afirmou motivos de irregularidade e que vai apontar outros problemas técnicos.

É rotina nas eleições russas este procedimento, e algumas vezes os opositores somem ou são presos por algum motivo ou infração menor, os ditadores controlam a máquina de estado para forjar uma democracia que não existe na prática e crescem governos nacionalistas também.

Um dos motivos é que algumas pessoas da lista foam consideradas mortas, Nadejdin ironizou:

“Você e eu somos os mais vivos dos vivos. Se alguém imaginar que vê almas mortas nas minhas listas de assinaturas, essa não é uma questão para mim, talvez eles devam procurar a igreja, ou um exorcista”, segundo notícia no Telegram, uma eleição justa pode mudar o panorama da guerra na Ucrânia.

A paz no Oriente Médio também é possível, Israel quer a libertação de todos os reféns e o Hamas quer o fim da guerra, reiterou neste sábado (03/02) que a completa retirada das forças israelenses da Faixa de Gaza são pré-requisitos para acordo da liberação dos reféns.

Novos ataques contra alvos Houthis no Iêmen, foram feitos pelos Estados Unidos e Reino Unido neste fim de semana, acredita-se que a organização, um grupo de múltiplas milícias, seja armada e financiada pelo Irã, que nega as acusações.

Segundo o departamento de defesa americano, há diversas milícias financiadas pelo Irã, entre elas o Hezbollah e os Houthis, após dois americanos serem mortos na interceptação de um barco levando armas para rebeldes no Iêmen, o departamento de defesa americano divulgou uma foto (acima).

Há sempre conjunturas e situações que podem por fim a uma guerra, é preciso condenar e não relativizar o poder de tiranos e governos belicistas para que o mundo caminhe para a paz.