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Arquivo para a ‘Filosofia da Informação’ Categoria

Consciência humana e senciência maquínica

27 jan

Consciência envolve aspectos espirituais humanos (na filosofia idealista chamada de subjetividade) e aquela que faz o homem ter uma verdadeira ascese que eleva seu caráter, suas atitudes e sua moral numa escala progressiva de aprendizagem, onde é admitido o erro, mas corrigido de forma humana.

Senciência é o fato que temos percepção consciente de nossos sentimentos, é a capacidade dos seres (humanos, pois não acreditamos que uma máquina mesmo sofisticada possa ter esta ascese), e nos seres ela passa a sentir as sensações e sentimentos de forma consciente.

Na figura uma representação do século XVII, um dos primeiros estudos foi o matemático inglês Robert Fludd (1574–1637).

Quanto menos conseguimos ter consciência de nossos sentimentos, menos temos senciência e menos capacidade de entender nossos sentimentos, a tentativa de traduzir as sensações (os tipos de risos, alegrias, tristezas, etc. para a máquina), sempre estarão subjeitas a algoritmos, mesmo que muito sofisticados, e por isso chamo de senciência maquínica, já que a consciência maquínica está descrita de diversas formas, por diversos autores.

A verdadeira consciência humana é assim aquela que nos permite alcançar níveis de ascese de diversas formas: altruísmo, colocar-se no lugar do outro, viver uma vida justa e apreciar a justiça, enfim uma verdadeira espiritualidade que nos eleve como humanos, e também é aquela que está ao alcance dos que sofrem com injustiças e barbáries humanas.

Para os cristãos aquilo que nos faz alcançar uma verdadeira ascese está descrito nas chamadas bem-aventuranças (Mt 5,1-12) que fala dos pobres, dos aflitos, dos mansos, dos que tem forme e sede de justiça, dos que tem capacidade de perdoar e falaz com clareza do desejo da paz: “bem aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados de filhos de Deus”, assim em todos circunstâncias que se vive em dias sombrios é preciso promover a paz.

Os contornos de intolerância e violência, não só na guerra da Ucrânia, mas em quase todo o planeta deve preocupar os que defendem a paz.

 

Caminho e método

22 jun

Todo percurso exige um caminho, um caminho traçado e dirigido a um objeto científico é um método, há definições mais complexas, mas em geral já estão vinculadas a uma metodologia.

Uma definição amplamente utilizada é “método científico refere-se a um aglomerado de regras básicas dos procedimentos que produzem o conhecimento científico, quer um novo conhecimento, quer uma correção ou um aumento na área determinada”

Este tipo de regra geral pode cair tanto no positivismo lógico, um determinismo sobre as ciências como num reducionismo empirista que vê o objeto sobre determinados parâmetros.

Tanto Karl Popper como Thomas Kuhn argumentariam contra esta visão de método, Popper a vê como um conhecimento provisório, com sucessivos falseamentos, já Thomas Kuhn elaborou a ideia de paradigmas em mudança que chama de revoluções científicas, seja por um por outro a ciência deve ter teorias que evoluam de acordo com o tempo.

Assim como o próprio percurso pode levar a falseamentos ou novas descobertas preferimos o termo caminho, mas para não cair em sofismas (teorias que negam uma episteme) é necessário tanto o foco no objeto investigado como a abertura para o novo, assim como na filosofia não deve começar por uma hipótese, mas por uma questão que se procura resolver.

Olhar para um objeto imaginando parecido a Outro ajuda, mas não resolve o problema, é preciso investigar suas variantes e suas armadilhas, enfim questionar sempre.

Tanto a ontologia como a fenomenologia, ambas estão interligadas filosoficamente, e ambas admitem a metafísica, tem esta referência em relação ao método e seu objeto, assim como rejeitam qualquer dogmatismo metodológico e teórico sobre o objeto investigado.

Também o caminho histórico não é determinista, a este respeito Hans Georg Gadamer escreveu questionando o historicismo romântico de Wilhem Dilthey e refazendo o círculo hermenêutico de Heidegger, mudaram assim a hermenêutica metodológica de Dilthey para o qual a hermenêutica leva a interpretação de mudanças culturais dentro de um contexto histórico,

Tanto Gadamer, como Antony Giddens e Boaventura de Souza Santos são teóricos preocupados são preocupados em desenvolver uma abordagem metodológica que verifiquem as condições fundamentais pelas quais ocorrem mudanças de paradigmas

Para isto deve-se observar o “caminho”, entender o percurso e estar aberto a um novo horizonte.

GADAMER, H-G. Verdade e método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.

GIDDENS, Anthony. Structuration theory, empirical research and social critique. In: _____. The constitution of society. Cambridge: Polity Press, 1984.

SANTOS, Boaventura de Souza. Introdução a uma Ciência Pós-Moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989.

 

Ascese e espiritualidade

26 mai

Não por acaso, Peter Sloterdijk apreende a modernidade como uma forma de secularização e coletivização da vida da exercitação, deslocando as asceses transmitidas desde a Antiguidade de seus respectivos contextos espirituais e dissolvendo-as no fluido espumoso das atuais comunidades biopolíticas (ou psicopolíticas) dedicadas ao treinamento e ao empresariamento da subjetividade.
Não é por acaso que um filósofo atual veja a modernidade como uma forma de secularizar e coletivar a vida de exercícios, deslocando as asceses transmitidas desde a antiguidade, em diversas culturas, para os contextos atuais dedicados a treinar e a comercializar a partir da prática cotidiana de exercícios através de memes, retóricas e de um treino coletivo de ideias (no sentido do idealismo).
A base de sua ascetologia é possível perceber como a educação desde a infância até os adultos está numa cadeia histórica de adestramentos através de procedimentos imunológicos e antropotécnicos seletivos, que anunciada por Sloterdijk a muito tempo tornaram-se escancaradas com a Pandemia, visam arrancar o sujeito de sua comunidade.
Fabricam-se assim os “atletas do Estados” ou as “empresas domésticas” na direção destes exercícios, o que ele chama de drama esferológico, e onde a infância tem que pagar um preço pela ausência das camadas protetoras, isto é, quando explodem os círculos mágicos, as bolhas de sabão sopradas pelos olhos extasiados das crianças, o que Sloterdijk escreve em Esferas I: Bolhas.
Esta espécie de ascese não tem nada de espiritualidade ou de uma verdadeira ascensão (de onde vem a raíz ascese) assim as bolhas de sabão são a metáfora deste universo efêmero, cujo exercício reforça o habitus, mas não constrói uma verdadeira ascese espiritual.
O autor não chega a desenvolvê-la, apenas a denuncia como uma ascese desespiritualizada, pois ele próprio não crê numa realidade superior, de verdadeira ascensão, como a que é descrita no livro de Byung Chul Han em sua “Sociedade do Cansaço”, onde vê como dois polos do Ser a vida ativa e a vida contemplativa, e recorre ao monge São Gregório.
Seu termo espiritualidade vem da análise de Foucault das formas radicais de governos dominantes de “governo de infância” a qual interpõe: “interpõe entre a experiência e a linguagem constitutiva da história e formadora do espírito”, é assim só uma subjetividade.
Byung Chul Han, provavelmente por sua influência oriental, vai noutro caminho de uma vida contemplativa efetiva, que está mais claramente expressa em sua obra: “O aroma do tempo” ( ), onde afirma: “A maior felicidade brota do demorar-se contemplativo na beleza, antigamente chamada theoria. Seu sentido temporal é a duração. Ocupa-se das coisas eternas e imutáveis, que descansam em si mesmas. Nem a virtude nem a sabedoria, só a entrega contemplativa à verdade aproxima o homem aos deuses” (HAN, 2016).
Na obra de Chul Han é possível entender uma ascese espiritualizada numa ascensão divina.
HAN, B.-C. O aroma do tempo. Um ensaio filosófico sobre a arte da demora. Lisboa: Relógio d´água, 2016.

 

A dor, a Alma e o Ser

14 abr

Numa das passagens mais marcantes, ao menos para os que imaginam um mundo além do corporal, Byung Chul Han introduz a narrativa como parte da cura: “A dor sem sentido é possível apenas numa vida nua esvaziada de sentido que não narra mais” (HAN, 2021, p. 46).

Reivindica e inclui até [Walter] Benjamim em “Imagens do Pensamento” que fala de mãos incomuns que transmitem a impressão que seria como “se narrassem uma história” (idem).

Também cita mães que com a “força curativa” sentam ao lado da criança e lhe contam uma história, e após explicar o fluxo narrativo com uma barragem para a dor, conclui: “é a dor que põe primeiramente em [seu] caminho”. (HAN, 20221, p. 47).

Vivemos hoje um tempo pós-narrativa, diz o autor, não é a narrativa mas a contagem que determina a vida, “a narrativa é a capacidade do espírito superar a contingência do corpo” (Han, 2021, p. 48), um corpo sem espírito é um corpo que ignora a própria alma. 

Nela “o corpo disciplinado que tem que repelir muitas dores que vem de fora, é pobre de sensibilidade” (pag. 49), uma intencionalidade totalmente diferente o caracteriza, ela não se ocupa consigo mesmo, mas com algo que vem de fora, e é essa “algofobia” que nos domina.

“Essa introspecção narcisista, hipocondríaca, é certamente, corresponsável por nossa hipersensibilidade (à dor), chama isto de “síndrome-da-princesa-da-ervilha” lembrando um conto de Andersen onde a presença de uma ervilha sobre o colchão da futura princesa provoca tanta dor que ela não consegue dormir a noite, e é este tipo de doença que acontece com muitas pessoas.

Este tipo de paradoxo da pós-modernidade é sentir cada vez mais dor, com cada vez menos, ao ponto que a dor não é compreensível, não tem lugar na vida e parece não fazer parte da existência e isto é uma forma de positividade do Ser, onde não há nenhuma negatividade, e torna o Ser não compreensível, ou menos sem qualquer sentido.

Assim diz o autor, “se a ervilha dolorosa some, então as pessoas começam a sofrer com os colchões moles” e conclui: “É justamente, a própria e persistente ausência de sentido da vida que dói” (HAN, 2021, p. 51).

O que pensar então de dores atrozes da guerra, de vítimas inocentes, de crescentes ódios políticos e ideológicos, tudo parece ruir num universo sem sentido, quando a dor compreendida e com lucidez sentida e vivida nos retornaria o equilíbrio do Ser, e a plenitude de nossa nossa existência, distante hoje, mas possível num futuro próximo.

HAN, Byung-Chul. A sociedade paliativa: a dor hoje. Trad. Lucas Machado. Petrópolis: Vozes, 2021.

 

A mansidão e o poder

02 nov

A mansidão é uma virtude fundamental para resolver conflitos, estabelecer novos espaços de diálogos onde ele se encerrou e abrir novos horizontes onde eles parecem impossíveis.

João Calvino tem uma frase muito nobre: “Será inútil ensinar a mansidão, a menos que tenhamos iniciado com a humildade”, de fato a grande razão para parecer que alguns estão certos e que outros não tem razão nenhuma parte muitas vezes da soberba de um dos lados (o oposto a humildade) e nestes parâmetros nenhuma dialogia será possível, ou aquilo que preferimos nenhum “novo horizonte” será traçado que estabeleça um ponto futuro onde pontos conflitantes poderão entrar em um processo de convergência.

A polarização é inevitável pode ser os argumentos de alguns, sim se chegando a determinado ponto de conflito isto é válido, mas devemos saber que a saída de fato de um conflito terá que ter em algum momento a bandeira de paz e ela não pode ser a bandeira da submissão dos vencidos, a pax romana, depois que Roma conquista seus territórios, ela é a submissão a conceito autoritário e que em determinado ponto retornará a guerra.

É verdade que o poder é sempre assimétrico, mas ele exercido com mansidão leva ao diálogo.

A polarização é lógica pode ser o argumento para justificá-la, lembro, porém, que a lógica difusa, a lógica paraconsistente e outras lógicas não são binárias, sim ou não, e que nunca há somente dois lados, esta é uma posição idealista que induz a dualidade, pode haver múltiplos lados, por isto a lógica realmente justa admite uma terceira hipótese.

Estes nunca serão vencedores e estarão sempre a beira do caminho pode ser outro pensamento, por mais paradoxal que possa parecer o ensinamento divino, em muitas religiões, é que a mansidão e a humildade levam as pessoas para o alto, uma das bem-aventuranças bíblicas diz (Mt 5, 5): “Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra” e então onde está o poder deles, na conquista através de valores perenes só pode levar a plenitude e a própria perenidade, o problema é ceder a valores ardilosos e injustos.

A construção de uma realidade perene, um tempo de paz e justiça, no momento que começamos a sair de uma pandemia é fundamental, ainda que pareça distante.

 

O inefável e a metáfora

20 jul

A viragem linguística é uma das hipóteses de interpretação da pós-modernidade, não a única, porém algo além da modernidade idealista já despontava na crise do início do século passado: a crise do pensamento, da sociedade (duas guerras mundiais), a guerra fria e agora a polarização.

postamos sobre a ligação da metáfora e o inefável em Paul Ricoeur e para ele a metáfora é um reagente  (réactif) que revela o simbólico na linguagem, que nos leva a pensar por seu excesso de significação e assim é um modo de compreensão disponível ao hermeneuta.

Porém há algo além que é a possibilidade de uma hipótese, quantas questões científicas precisam recorrer a metáfora antes de uma explicação final, no trabalho de John Searle, em Expressão e Significado faz uma pergunta importante sobre o significa quando dizemos S é P e queremos dizer S é R? E que na verdade o ouvinte entre S é P.

Sua questão é no fundo saber “como funcionam as emissões metafóricas, isto é, como é possível para os falantes comunicarem algo ouvintes falando metaforicamente, uma vez que não dizem o que querem significar? E por que algumas metáforas funcionam e outras não? (SEARLE, 2002, p.112).

Segundo o autor ao pensar não devemos dispensar modos diferentes de compreensão (mito, alegoria, metáfora, analogia) e menos ainda métodos diferentes para interpretá-las: exegese, história, psicanálise, antropologia, linguística e outras, a meu ver, parece um princípio mais o universal por não fica confinado em algum campo metodológico e sujeito aos seus “vícios”.

Porém o inefável é parte inerente ao progresso do conhecimento humano, e significa estar além do lógico e do físico, estando naquele campo cujo nome mais apropriado é o inefável.

O modo como se pode chegar a esta compreensão é o chamado de “via curta”, e foi fundamentado na hermenêutica proposto por Martin Heidegger, ele consiste No modo como pretende fundamentar sua hermenêutica pelo desvio do que chama de “via curta”, proposta por Martin Heidegger ele consiste em não buscar os métodos ou as condições da compreensão, mas a partir do ser do homem, o seu Dasein, cuja existência consiste em compreender.

Respondendo a questão de Searle, não importa se o ouvinte entendeu exatamente S é P ou S é R, pois se S é P e isto foi aquilo que disse uma fonte, o destinatário entendeu exato ou não deve-se a sua existência enquanto ser que compreende, a sua cosmovisão, que pode ser limitada.

Admitir o inefável, que em certo momento só pode ser dito de modo metafórico, análogo ou mesmo exegético é admitir a convivência de visões de mundo diferentes, e pode ser isto é mais palpável que a compreensão daquele fenômeno em certo momento só é possível pela metáfora.

SEARLE, John R. Expressão e significado: estudos da teoria dos atos da fala. Martins Fontes, SP: 2002.

 

 

O que é compreender

24 jun

Compreender se tornou na estrutura analítica ocidental um círculo vicioso que tende apenas a repetir aquilo que considera verdade partindo de algum aforisma histórico, o que Gadamer chama de historicismo romântico em sua crítica a Dilthey.

O esquecimento do ser ignora que o círculo hermenêutico que vai da interpretação até uma nova compreensão é a própria estrutura de um novo sentido, um sentido existência, que está no Ser.

Assim a circularidade da compreensão não é primeiramente uma exigência lógica, a partir de um método A ou B, mas o próprio desdobramento ontológico: “a reflexão hermenêutica de Heidegger tem o seu ponto alto não no fato de demonstrar que aqui prejaz um círculo, mas um círculo este tem um sentido ontológico positivo” (GADAMER, 2013, p. 355).

Heidegger (2014) em sua obra magna Ser e Tempo elaborou uma hermenêutica da facticidade a partir da analítica temporal da existência humana (Dasein), aqui facticidade é o modo de ser em seu Dasein que encontra, na existência temporal, a possibilidade de revelação, de clareira:

“A estrutura da temporalidade aparece assim como a determinação ontológica da subjetividade. Mas ela era mais que isso. A tese de Heidegger era o próprio ser é tempo” (Gadamer, 203, p. 345), eis a essência mais profunda da obra de Heidegger, que aponta para o círculo hermenêutico:

“O decisivo não é sair do círculo, mas nele penetrar de modo correto. Esse círculo do entender não é um círculo comum, em que se move um modo de conhecimento qualquer, mas é a expressão da existenciária estrutura-do-prévio do Dasein ele mesmo. O círculo não deve ser degradado em vitiosum nem ser também tolerado. Nele se abriga uma possibilidade positiva de conhecimento o mais originário, possibilidade que só pode ser verdadeiramente efetivada de modo autêntico, se a interpretação entende que sua primeira, constante e última tarefa consiste em não deixar que o ter- prévio, o ver-prévio e o conceber-prévio lhe sejam dados por ocorrências e conceitos populares” (Heidegger, 2014, p.433), mas dirigir-se as coisas mesmas.

O compreender visto assim pode parecer filosófico demais ou uma teorização sobre o pensar, não o é, pois, mesmo no esquecimento do Ser, estrutura atual de fragilidade do pensamento, este é o processo de aprendizagem que envolve desde o aprendizado da linguagem por uma criança até os mais elaborados métodos de descoberta e inovação, ou são apenas repetição de algo já feito, e assim sem a facticidade, pois é mera repetição.

 

GADAMER, H-G. Verdade e método Trad. Flávio Paulo Meurer, revisão da tradução de Enio Paulo Giachini. 13. ed. Petrópolis: Vozes; Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2013.

HEIDEGGER, M. Ser e tempo Tradução, organização, nota prévia, anexos e notas de Fausto Castilho. Campinas, SP: Editora da Unicamp; Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2014.

 

Um filósofo oriental lê a “clareira”

19 mai

Byung Chul-Han é um filosofo coreano-alemão que migrou para o ocidente e faz uma leitura impar da literatura ocidental, em particular o contexto das redes e das novas mídias, estudou em seu doutorado Heidegger e com isto sua “clareira”.

Explica o que é a clareira de modo simples: “A ´verdade´ de Heidegger ama se ocultar. Ela não se dispõe simplesmente. Ela tem de, primeiramente, ser ´arrancada´ do seu ´velamento´. A negatividade do ´velamento´ habita na verdade como o seu ´coração´” (Han, 2018, p. 74) e neste trecho cita a obra de Heidegger: “Sobre a questão do pensar”.

Ele penetra no que significa a informação, o grande insumo do Ser velado atual, “falta a informação, em contrapartida, o espaço interior, a interioridade que permitiria se retirar ou se velar. Nela não bate, Heidegger diria, nenhum coração” (Han, 2018, p. 74).

Esta ausência de contrapartida, é o que Chul Han chama de negatividade, é bom explicá-la bem, “uma pura positividade, uma pura exterioridade caracteriza a informação”, assim é o refletir.

Como seria então a informação da negatividade, no sentido de reflexão, é a informação “seletiva e aditiva, enquanto a verdade é exclusiva e seletiva. Diferentemente da informação, ela não produz nenhum monte [Haufen]” (Han, 2018, p. 74).

Assim, não há ‘massas de verdade” e sim “massas de informação”, é a “massificação do positivo” (Han, 2018, p. 75), assim informação distingue-se do saber, e este não “está simplesmente disponível”, diria nem simplesmente porque é complexo e nem disponível porque está oculto.

Porém o filósofo a confunde com experiência de vida, ao afirmar: “não raramente, uma longa experiência o antecede” (idem, p. 75), e afirma só uma face da informação: “a informação é explícita, enquanto o saber toma, frequentemente, uma forma implícita”.

Esclarecendo estes dois pontos confusos, primeiro a questão da experiência, o filósofo Platão foi o primeiro a anunciar que a sabedoria, como conhecimento da verdade não é fruto da idade, se assim fosse somente na velhice as pessoas mereceriam ser ouvidas, a outra questão é sobre a informação tácita, ela existe como conhecimento tácito, Michael Polanyi (1958), foi um dos primeiros a teoria, e Collins nos anos setenta retomou o conceito no âmbito da comunicação científica.  Para esta informação tácita, Chul Han também aponta isto, é preciso “silêncio”.

A clareira mais profunda o filósofo descreve citando Michel Butor, que deu uma entrevista ao Die Ziet, em 12/07/2012, que aponta para a verdadeira causa: “A causa [disso] é uma crise de comunicação. Os novos meios de comunicação são dignos de admiração, mas eles causam um barulho infernal” (Butor apud HAN, 2018, pg. 42).

Referências:

POLANYI, M. Personal knowledge – towards a post-critical Philosophy. Chicago: The University of Chicago Press, 1958.

COLLINS, H. M. The TEA set: tacit knowledge and scientific networks. Science Studies, v.4, p.165-186, 1974.

HAN, B. C. No enxame: perspectivas do digital. No Enxame: perspectivas do digital. Trad. Lucas Machado. São Paulo: Editora Vozes, 2018.

 

A porta larga dos equívocos modernos

16 fev

Um grande número de enunciados, proposições e teorias científicas ou não emergem em meio ao período de pouca luz na cultura ocidental, crescem teorias apocalípticas e uma visão cada vez mais maniqueísta da realidade, a visão de uma lógica dualista e sem terceira hipótese.

Ao mesmo tempo descoberta como a física quântica, a holografia, e uma nova cosmovisão do universo emergem, porém há quem acredite que a terra é plana e que nunca fomos a Lua.

São demasiados problemas específicos para serem tratados, mas a filosofia de um modo geral contemporânea mais que neoliberal, este é seu aspecto pragmático econômico, ela é idealista e mesmo filosofo-youtubers que discursam sobre filosofia a seguem.

Kant é complexo, mas seu ponto central é a dicotomia entre sujeito e objeto, como elas não podem ser separadas, ao menos em termos de teoria do conhecimento, ele criou os juízos analíticos e sintéticos.  Quem curamos a doença ou o doente, para Kant seria a doença, com olhar “de fora”.

O juízo analítico é aquele que o predicado está dentro do sujeito, e assim é ele que especifica sua lógica, e esta lógica vem de uma visão físico-matemática do conhecimento na modernidade.

Exemplifica usando figuras geométricas como o triângulo e o quadrado, claro este tem quatro lados, mas isto não é uma dedução e sim uma tautológica, definições circulares.

Já o juízo sintético ao contrário não pode estar contido no sujeito, assim acrescenta um raciocínio como algo completamente novo, ou seja, a novidade é o predicado.

Está muito simplificado, mas essencialmente desenvolve-se uma lógica onde Ser e Ente são coisas confusas e desmonta a possibilidade de uma ontologia, mesmo que seja parcial, e imaginava com isto jogar toda as “superstições” fora, o famoso “Sapere audi”, ousar saber.

Como a razão por si só não bastava, foi necessário introduzir a ideia do empirismo, que vinha das argumentações de David Hume (1711-1776, assim os juízos podem a priori, que já existem no sujeito, e a posteriori, adquirido experimentalmente.

Moritz Schlick (1882-1936), que fundou a escola neologicista do Circulo de Viena, criticou a base idealista de um conhecimento a priori, afirmando que uma vez que os enunciados têm uma verdade lógica, eles não são nem analíticos nem sintéticos, tal como argumentava Kant, pois era paradoxal; e que se a verdade depende do conteúdo factual, os enunciados são, portanto a posteriori e não a priori, uma vez que os fatos devem acontecer, Schlick foi assassinado pelo nazismo.

No círculo de Viena estiveram presentes Kurt Gòdel, Karl Popper, Hans Kelsen e outros.

Uma mesma proposição pode ser conhecida por agentes cognitivos tanto a priori como a posteriori, usando o mesmo exemplo de Kant, uma criação só sabe que o quadrado tem 4 lados depois que aprende a contar, enquanto para um adulto parece “indutivo”.

Assim o conhecimento é uma relação entre agentes cognitivos e as proposições, que primitivamente não são nem a priori nem a posterior, poderão ser conhecidas por fatos.

Em 1936 Husserl escreve sobre a “Crise dsa ciências europeias e a fenomenologia transcedental”, o conhecimento estava em plena crise, em meio a II guerra mundial.

O vídeo abaixo elucida o pensamento de Kant, com comentários de  Antonio Joaquim Severino;

 

O futuro e diálogos pouco abertos

03 fev

A ideia que estamos próximos a uma grande mudança está na boca de muitos apocalípticos e de alguns teóricos e até filósofos idealistas, embora a maioria reivindique abertura e diálogo, o que pensam sobre ele não é elaborado, fazem longos discursos e tecem narrativas irreais, porém querem ouvir a própria voz.
O verdadeiro diálogo entre tradição e mudança, felizmente há neste campo muita gente fazendo isto de modo apropriado, deve propiciar ao mesmo tempo uma releitura do passado, um respeito e a compreensão do porque dos fatos aconteceram desta ou daquela forma.
Esta é a leitura desde os pré-socráticos, passando pela alta e baixa idade média, o renascimento e o iluminismo, embora cada período se possa fazer a crítica, e até ela deve ser bem feita, é fácil fazer a releitura crítica porque este tempo passou e difícil deste tempo, porque ele chegou.
Difícil principalmente do iluminismo e da modernidade, a pós-modernidade ou ainda a tardia, ou sua continuidade, ainda tem difícil leitura porque a transição não se realizou e o problema que se coloca é a dificuldade de ultrapassá-la, quase todos concordarão que a modernidade já é mais tradição do que qualquer possibilidade de uma nova “revolução” dentro do seu pensamento, embora as tentativas sejam muitas.
Nietzsche chamava este dilema de “eterno retorno”, ele já percebia em seu tempo e há quem ache que isto é novo, e em parte tinha razão pelo horizonte que via no seu tempo, mas quando o novo não nasce o pensamento tradicional padece de envelhecimento e de mesmice.

Tenta-se dar-se um ar “novo”, ou “criativo”, mas não há nada que realmente mude a realidade.

Grandes problemas socioculturais de nosso tempo, morais e até religiosos não se mudarão sem uma perspectiva nova, embora redundante dir-se-ia um “novo” novíssimo, e para que de fato não seja pura imaginação, deve-se encontrar elementos já vivos que apontam o futuro.

Três elementos novos são visíveis: um planeta mundializado, é já possível ver-se como mundo embora ainda não se respeitem culturais diferentes, um esgotamento das forças da natureza, o domínio da natureza pelo homem foi o grande modo da modernidade, e o fim da fome e da miséria no planeta, embora com recursos disponíveis para tal, não se realizou.

Claro que há muitos outros fatores, mas eles são decorrentes da falta de diálogo com o futuro, a centralização de grupos autocráticos, a ausência de uma política e cultura em rede, embora os mecanismos para isto existam, são combatidas como “alienação” e até como responsáveis por problema que existem muito antes de qualquer pensamento sobre as novas tecnologias.

As novas gerações sabem o que é novo, alguns “velhos” tentam retomar o “protagonismo”.