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Posts Tagged ‘peace’

A paz dos pacíficos

29 abr

Há diversos equívocos sobre a paz, alguns foram apontados por Kant tais como pactos que escondem futuros conflitos, a justa revolta contra regimes totalitários, porém não há como se construir a paz sem pacíficos, as ideias que se deseja a paz prepare-se para a guerra é um equivoco ou com os violentos haja como violento, etc. escondem pequenas e grandes guerras.

Todo exercício de poder é assimétrico aponta Byung-Chull Han (O enxame), no livro que faz um ensaio exatamente sobre as novas mídias, e que diz que só há simetria se há respeito.

Então o respeito as culturas, a diversidade de opiniões e ideias, de liberdade religiosa, de opções pessoais de diversos tipos, claro que não impliquem no desrespeito ao Outro, é um ponto de partida para a paz, assim é preciso que haja pacíficos para se construir a paz.

A ideia de mais armas, de mais agressões que possam intimidar adversários escondem que não há princípio pacífico nestas atitudes, que não há respeito como pede Chul Han, e para aqueles povos, países e nações que tem princípios pacíficos, como Finlândia e Índia por exemplo, é preocupante ver atitudes belicistas evoluindo.

Por outro lado, a vitória de Makron na França é um alento principalmente devido a derrota de um pensamento totalitário no país que é fonte da democracia republicana moderna.

A paz deve ser também a base de qualquer pensamento religioso, admitir que há algo ou alguém superior deveria nos despir de orgulho de se julgar superior a alguém, a algum povo, raça ou gênero, mas a história mostra que não foi sempre assim, lembro aqui o Paz da Vestfália que foi um pacto para que as religiões não incentivassem o ódio entre os estados, com isto a ideia de estado laical.

Em várias passagens bíblicas Jesus faz a primeira saudação aos seus discípulos: “A paz esteja convosco”, claro fala da paz dos pacíficos, e no versículo das bem-aventuranças diz que serão chamados de “filhos de Deus” (Mt 5,9), ou seja, não são cristãos se não desejam a paz.

Também para seus discípulos Jesus que aparece ressuscitado em sua terceira aparição e pergunta insistentemente a Pedro (Jo 21, 15-17): “Depois de comerem, Jesus perguntou a Simão Pedro: “Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes?” Pedro respondeu: “Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo”. Jesus disse: “Apascenta os meus cordeiros”. E disse de novo a Pedro: “Simão, filho de João, tu me amas?” Pedro disse: “Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo”. Jesus lhe disse: “Apascenta as minhas ovelhas”. Pela terceira vez, perguntou a Pedro: “Simão, filho de João, tu me amas?” e Pedro chega a ficar triste e diz “tu sabes tudo”.

Sim Jesus sabia que mesmo entre religiosos haveria dificuldade de entender a paz e a unidade.

 

Twitter, Cibercultura e Paz Perpétua

27 abr

A compra do Twitter por Elon Musk por U$ 44 bilhões, o bilionário da Space X e da Tesla, tornam as mídias de redes sociais cada vez mais atreladas ao campo político e balança o império das mídias tradicionais.

Uma das ideias básicas de Musk é tornar a rede menos controlada (a função de moderador) e com mais possibilidade de texto, no lançamento em 2006 era de 140, em 2017 foi ampliado para 280 e provavelmente acrescentará textos maiores, Musk é proprietário da ferramenta Revue.

A NetFlix perdeu 200 mil assinantes (pouco para 100 milhões de assinantes, mas uma tendência), CNN enfrenta fortes problemas com um discurso editorial (7 em cada 10 telespectadores) tenta mudar o enfoque, é a grande mídia sofrendo com o avanço das novas mídias, e tudo indica que a guerra no campo bélico e ideológico vai se deslocar para o campo cibernético, os drones praticamente aposentam a ideia de uso de tanques e aviões com autonomia de voo e de voo tornaram a guerra desigual em força e material bélico mais igual.

Mas a liberação da arbitragem no Twitter preocupa, embora a proposta de algoritmo de código aberto seja interessante, mas a grande questão são as ideias sobre a guerra de Musk.

Claro tudo isto é condenável pelo número de vítimas civis que causam, pelas tragédias humanas que ali se desenvolvem também entre militares que estão num campo de batalham onde muitos não gostariam de estar.

A Paz Perpétua de Kant trazia a proposta de um preceito da razão sobre o poder, porém um estranho ditado aparece no meio de seu texto (analisaremos o texto no próximo post), que é prudentes como as serpentes e suave como as pombas, no texto bíblico (Mt 10:16)é possível também se traduzir “simples como as pombas, porém a interpretação kantiana é divergente:

“…Sede prudentes como a serpente»; a moral acrescenta (como condição limitativa): «e sem falsidade como as pombas” (Kant, 2008, p.34), e o próprio Kant aponta que “as duas coisas não podem coexistir num preceito” uma contradição evidente, a Paz Perpétua é mais complexa, claro.

Este é o problema das novas mídias, é preciso usar o recurso muito usado na política de certa “falsidade”, ou dubiedade quer seja para despistar os opositores, quer seja para iludir o povo.

Não há como estabelecer a paz se não há respeito de culturas e valores conflitantes, claro dentro de limites humanitários razoáveis, o primeiro é a própria vida posta em cheque na guerra e o segundo é possibilitar a sobrevivência e autodeterminação dos povos para decidir seu destino.

KANT, I. A paz perpétua. Trad. Artur Mourão. Portugal: Universidade da Beira Interior Covilhã, 2008

 

A guerra, o Brasil e a Finlândia

26 abr

Enquanto a guerra vai se escalando no leste europeu, os objetivos russos vão se tornando claros, o controle maior das fontes de energia e material disponível para a guerra, isto inclui a Siderurgia de Azovstal, onde há civis e a batalha se intensificou.

Há o alegado despiste de dizer que o leste faria um corredor por terra até a Criméia anexada na guerra de 2014, porém isto nunca foi problema para a Rússia por causa de sua frota aérea, e ela tem outro exclave que é Kaliningrado, e também é por isso que a Ucrânia passou a bombardear os armazéns de petróleo russo.

O governo brasileiro ditatorial de Vargas chegou a flertar com o Nazismo, porém em julho de 1939 em visita dos Estados Unidos ao chefe do Estado-Maior do Exército brasileiro, general Góes Monteiro, o governo americano prometeu cooperar com o reequipamento militar e econômico do Brasil na construção da Companhia Siderúrgica Nacional (a antiga CSN).

Na época foi dado ao Brasil um crédito de 17 milhões de dólares junto ao Eximbark, e uma base americana foi instalada no Rio Grande do Norte, estratégica para voos militares para Europa.

Também a Finlândia tinha antes deste período indústrias pesadas que poderiam auxiliar na guerra, a Suécia também tinha e forneceu material tanto para a Alemanha como para os aliados, porém em 1939 Stalin, então presidente da União Soviética resolve invadir a Finlândia.

O parlamento da Finlândia está decidindo agora a entrada na OTAN, e a Rússia ameaça com retaliações, na última semana Maria Zarakhova, porta-voz do Ministério das Relações Extensores da Rússia afirmou: “Nós demos os nossos avisos, tanto publicamente como pela via dos canais bilaterais; eles (os dois países) sabem disso, então não há surpresas. Eles foram informados sobre tudo, sobre o que (uma eventual adesão à Otan) vai acarretar”.

Isto provoca uma nova escalada na Guerra e envolve também a Suécia que deseja aderir a OTAN.

O embate entre russos e finlandeses, iniciado em 30 de novembro de 1939, chamada de Guerra do Inverno (foto), embora com um exército e poderio menor os finlandeses resistiram a guerra e mantiveram a moral da tropa, já havia o pacto recém foi feito o pacto Molotov-Ribbentrop (ministros da Rússia e Alemanha, respectivamente), onde a Finlândia ficaria neutra, porém perdia parte de seu território, uma boa parte de seu parque industrial e se comprometia a manter neutralidade na guerra, mas a Rússia rompeu com a Alemanha e invadiu a Finlândia.

O tratado de paz foi assinado em 12 de março de 1940, cedendo 10% do território finlandês à Rússia e 20% de sua capacidade industrial a União Soviética.

Mais poderio militar e indústrias bélicas significam que não há fim previsto para a guerra, o maior envolvimento da OTAN significa a proximidade de uma escalada global, mas mantem-se a esperança de paz através de acordos, cada vez mais difíceis.

 

Razão, crença e a guerra 2

22 abr

A relação da ciência e da crença na lição de Bourdieu: “O empreendimento paradoxal que consiste em usar de uma posição de autoridade para dizer com autoridade, para dar uma aula, mas uma aula de liberdade … seria simplesmente inconsequente, ou mesmo autodestrutivo, se a própria ambição de fazer uma ciência da crença não supusesse a crença na ciência” (Bourdieu, 1994, p. 62), pode ser melhor expresso pelo princípio da transdisciplinaridade.

Estabelece a Carta da Transdisciplinaridade de Arrábida em um de seus princípios: “Considerando que a rutura [ruptura no Brasil] contemporânea entre um saber cada vez mais cumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido leva à ascensão de um novo obscurantismo, cujas consequências, no plano individual e social, são incalculáveis”. (Freitas, Nicolescu e Morin, 1994)

A ideia da ciência fundamentada num cálculo (incluindo o econômico) ou a físico que permite avançar no mistério do infinito universo, com wormholes (caminhos de minhoca), buracos negros e matéria escura, não podem prescindir do mistério que está além daquilo que o homem já conquistou.

Do lado político a crença no estado moderno que substituiria Deus e poderia estabelecer uma paz perpétua (o projeto filosófico de Kant) assim como a ciência como cume da “razão” já mostraram seus limites, também a fé fundamentalista, que já o era com os fariseus no tempo de vida terra de jesus, tem limites de ignorar a ciência, mesmo querendo uma ciência da crença, o paradoxo apresentado por Bourdieu.

Nem a paz perpétua de Kant nem os avançados estudos científicos permitiram evitar a guerra e o mundo está de novo a beira de uma nova catástrofe humanitária, e também é que que se ressalte também o fundamentalismo religioso não consegue aboli-la como o “Decálogo de Assis para a Paz” assinada em Assis em 4 de março de 2002, ainda que a defendam isto até hoje.

Os fariseus queriam o envolvimento de Jesus com a guerra contra Roma, que acontecerá nos anos 70 da era cristã, com a destruição de Jerusalém e de seu templo Santo como era previsto nas profecias, não porque Jesus o desejava, mas pela guerra que os homens desejavam.

Após a Pascoa judaica, e a Paixão e Ressurreição de Jesus que foi nossa Páscoa, Jesus aparece aos discípulos e o apóstolo que não acreditava Tomé estava com eles, a primeira saudação de Jesus é: “A paz esteja convosco” (Mt 20, 21), sopra o Espírito Santo sobre eles e diz a Tomé que queria provas materiais de sua ressurreição: “Põe o teu dedo aqui e olha as minhas mãos. Estende a tua mão e coloca-a no meu lado. E não sejas incrédulo, mas fiel” (Mt 20,27) e após dirá que s]ao felizes os que acreditam sem terem visto.

KANT, I. A paz perpétua: um projecto filosófico. Trad. Artur Mourão. Ed. Universidade da Beira Interior. Portugal: Covilhã, 2008.

FREITAS, L., Nicolescu, B. e Morin, E.  Carta da Transdisciplinaridade. Portugal: Convento de Arrábida. 1994.

 

Razão, crença e a guerra

21 abr

A evidência de duas guerras mundiais, onde a racionalidade foi desafiada pelas barbáries dos campos de concentração, das atrocidades cometidas, e inclui-se também a bomba de Hiroshima, dão provas que é preciso examinar com profundidade aquilo que construiu o que chamou-se de razão passando pela crítica da razão pura de Kant e  pelo seu desenvolvimento da razão prática.

Na abertura do livro “Desencantamento do Mundo”, Pierre Bourdieu introduz sua análise das estruturas econômicas e temporais assim: “Aqueles que colocam a pergunta ritual dos obstáculos culturais ao desenvolvimento econômico interessam-se de modo exclusivo (isto e, abstrato) pela “racionalização” das condutas , econômicas e descrevem como resistências, imputável somente a herança cultural (ou, pior ainda, a tal ou tal de seus aspectos, o Islã por exemplo), todas as omissões para com 0 modelo abstrato da “racionalidade” tal como a define a teoria econômica.” (BOURDIEU, 1979, p. 11).

A história recente de nosso processo civilizatório desenvolve o aspecto físico (e portanto apenas material) e o cálculo matemático, em especial as racionalizações das estruturas econômicas, ao citar Max Weber explica o autor: “o caráter próprio a época capitalista [escreve Max Weber] e – um na raiz da outra – a importância da teoria da utilidade marginal (assim como de toda a teoria do valor) para a compreensão desta época consistem em que. do mesmo modo como a história económica de um sem-número de épocas do passado) foi chamada acertadamente de «a história do não econômico”, nas condições presentes da vida, a aproximação desta teoria e da vida era, é, e pelo que se pede julgar, será cada vez maior e devera determinar 0 destino de camadas cada vez mais amplas da humanidade. E deste fato histórico-cultural que deriva 0 significado heurístico da teoria da utilidade marginal” (BOURDIEU, 1979, p. 17).

Sua análise é bastante extensa e quase completa (explico a frente) para ser sintetizada aqui, porém o aspecto que nos interessa da cosmovisão cultural “não-econômica” que é o da crença e pode ser explicitado numa frase sua sobre como vê a relação da ciência e da crença: “O empreendimento paradoxal que consiste em usar de uma posição de autoridade para dizer com autoridade, para dar uma aula, mas uma aula de liberdade … seria simplesmente inconse- quente, ou mesmo autodestrutivo, se a própria ambição de fazer uma ciência da crença não supusesse a crença na ciência” (Bourdieu, (1994, p. 62), que significa que é preciso conjugar razão e crença.

A guerra atual envolve estas crenças econômicas (e ideológicas, e incluem crenças religiosas), e não é assim nem uma razão prática, nem teórica, a paz é possível se limitarmos as crenças ao princípio comum de defender a paz para o processo civilizatório (já que o conceito de progresso é também uma crença em determinado sentido da “histórica econômica”).

BOURDIEU, P.  O desencantamento do mundo: as estruturas econômicas e estruturas temporais. Trad. Silvia Mazza, São Paulo: Editora perspectiva, 1979.

BOURDIEU, Pierre. Lições da aula. São Paulo: Ática, 1994.

 

Os passos de caranguejo e a guerra

20 abr

O livro de Umberto Eco: “A passo de Caraguejo: guerras quentes e populismo mediático” (edição portuguesa de 2012) é de mais de uma década atrás, mas atualíssimo, Eco faleceu em 19 de fevereiro de 2016, mas estivesse vivo teria muito a dizer, porque sua visão é profética.

Falava do retrocesso global, este é o passo do caranguejo, o ressurgimento do criacionismo, o rádio pelo iPod (agora em desuso), via no renascimento das nações não um período afirmativo de identidades culturais e sim “depois da queda do Muro de Berlim, a geografia política da Europa e da Ásia mudou radicalmente, tornando-se claro que estávamos a andar para trás. Os editores de atlas viram forças a … inspirar-se nos velhos modelos anteriores a 1914, como a sua Sérvia, o seu Montenegro, os seus Estados Bálticos e assim por diante” (ECO, 2022).

Via também o renascimento do criacionismo e tantas outras cosmovisões absurdas num processo de andar para trás como “os passos do caranguejo”, e quando menos esperamos a guerra e os novos modelos de expansionismo e colonização, e já alertava para o populismo midiático, hoje mais evidente.

Porém numa visão mais profunda Max Weber apontava já no início do século passado “o desencantamento do mundo”, forçado a uma visão excessivamente racional, onde via o modelo social: “não aquilo que pesa sobre os indivíduos, mas o que se veicula entre eles”, assim o que parece fora do mundo objetivo, o mundo das ideias é aquele que se veicula entre os homens.

Pierre Bourdieu volta ao “desencantamento” (Bourdieu, 1979) para analisar os pressupostos do iluminismo e de Kant como ponto de partida destas ideias, a ideia que é no saber científico, consolidado pela Revolução Francesa e seus modelos de estado que conjugado com a técnica, proporcionaria uma mudança drástica no estilo de vida humano, trazendo uma paz duradoura.

Porém além das ignoradas guerras coloniais, também duas guerras mundiais foram deflagradas, e os maus acordos no final de cada uma delas levou a outras, o que de delineia agora é uma repetição de erros, onde a razão de cada estado quer prevalecer sobre o outro, e o racionalismo sem alma (e desencantado) nos mostra um mundo de horror, ódio e intolerância.

Bourdieu alertava para o mecanismo da democracia direta não se tornar elemento da opressão simbólica, e que a maior parte das palavras que dispomos para o social estão entre o eufemismo e a injuria, é como querer perpetuar o estado de segregação e opressão vigente.

BOURDIEU, P.  O desencantamento do mundo: as estruturas econômicas e estruturas temporais. Trad. Silvia Mazza, São Paulo: Editora perspectiva, 1979.

ECO, U. O passo do caranguejo: guerras quentes e populismo midiático. Trad. Sérgio Mauro. São Paulo: Record, 2022.

WEBER, M. A ética protestante e o “espírito” do capitalismo. Trad. José Marcos M. de Macedo. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

 

A guerra pode seguir uma escalada

19 abr

Enquanto as forças humanitárias cultivam a esperança, a escalada da guerra parece seguir um curso cada vez maior e com consequências “imprevisíveis”, nas palavras de Putin em respostas ao armamento americano da Ucrânia, as vozes da paz parecem ter pouco eco entre governantes. 

O envio de novas tropas russas, agora a região do norte e o envio americano de mais armas a Ucrânia mostram que a escalada da guerra na região está longe de terminar, as negociações estão cada vez mais difíceis, uma vez que a Rússia quer estabelecer novos territórios dentro da Ucrânia, além da Criméia já anexada no conflito anterior de 2014.

Segundo o ministro da defesa russo Igor Konashenkov, o exército russo fez 315 ataques na madrugada de domingo para segunda, nas regiões de Kharkiv, Zaporizhshia (onde há uma usina nuclear), Donestsk e Dnipropetrovsk e no porto de Myloslayv, regiões já com avanços russos (mapa acima).

Ontem várias regiões da Ucrânia foram alvos mísseis de longo alcance, incluindo Kiev e Lviv

Os olhares agora voltam-se para outras regiões, manobras militares russas no Norte e no espaço aéreo a China também se movimenta, uma coisa já compreendida do presidente que foi agente da KGB no período soviético, é que ele despista apontando falso objetivos e alvos, mas não blefa.

Assim é certo que enquanto fala do problema da Bósnia (parte da antiga Iugoslávia que se fragmentou em vários países, e teve uma sangrenta guerra recente com a Sérvia), volta seus olhares (e possíveis alvos) para Finlândia e Noruega, enquanto tenta manter o controle das ilhas Curilhas reivindicadas pelo Japão, que as perdeu na partilha entre os aliados na II Guerra Mundial.

A China passou a patrulhar sua costa no Pacífico, com seus caças militares enquanto a Russia mantém mísseis antiaéreos nas ilhas, que tiveram uma extensão de posse em 1855 (Tratado de Shimoda) e 1945 (II Guerra Mundial).

 

Horrores da guerra se sucedem

12 abr

Um país já enormemente arrasado, que sofreu bombardeios em prédios de hospitais, escolas e até hospícios, ainda se convive com narrativas dizendo que o objetivo não era tomar o poder em Kiev, embora o número de vítimas militares de ambos os lados seja enorme, é de assustar este tipo de visão da guerra, que em si já é injustificável e desumana.

Prepara-se uma batalha ainda maior em Mariupol, onde os civis ficaram encurralados sem poder receber ajuda humanitária, e até comboios da Cruz Vermelha foram impedidos de seguir adiante, os poucos que vivem e resistem na região estão sem forças, sem alimentação e encurralados (há agora suspeita de guerra química).

O objetivo é dizer que se ganhou algo, e sendo situada ao leste, a cidade portuária de Mariupol pode representar um troféu de consolação para quem o objetivo da guerra é a conquista e o poder, assim toda região leste do Donbass até a Criméia que já é território russo, seria tomada.

Porém o que temem analistas militares é que isto encorajada o governo russo a seguir adiante, e países como Suécia, Finlândia, Romênia e Moldávia estão de prontidão, seria uma escalada que ai ficaria claro o objetivo expansionista com muitas semelhanças aos da II Guerra Mundial.

Há um lado econômico, sem dúvida e neste ponto a moeda russa o rublo não caiu o que as sanções esperavam enquanto o dólar vai despencando, há de ambos os lados o desejo de uma nova ordem mundial, e isto requer uma análise mais profunda, de economistas e estrategistas.

A crescente escalada armamentista cria e acelera a polarização mundial, com inúmeras influências locais, a França está novamente polarizada entre a extrema-direita de Marine Le Penn e a centro-esquerda de Emmanuel Macron, e isto com certeza se espalhará por todo planeta.

Assim não há paz se não se cultiva a paz, se não se trabalha e pede por ela, em plena semana santa que se vive a Paixão de Cristo, a paixão da civilização humana parece mais evidente do que nunca, uma crise de alimentos a vista, uma crescente radicalização e polarização, longe da paz.

Difícil pedir bom senso, pedir menos armas e mais diálogo, olhar para o perigo nuclear que agora nos dá um arrepio na espinha, não em todos, infelizmente.

Sim é preciso uma análise mais profunda da guerra, mas como afirmava Hannah Arendt o totalitarismo sobre escolhas feitas fora do contexto histórico, ou seja, sem qualquer bom senso.

Aqueles que creem em algo, resta pedir que seja possível “afastar este cálice” e isto seria divino.

 

Vidas inocentes também importam

07 abr

A guerra de todos os horrores e desumanidades tem sua face maiscruel na morte de inocentes, por isto a morte de civis é condenada, embora deva se condenar a própria guerra, não há guerra justa, a única oposição justa a guerra é a paz.

Por mais que isto seja um fato, é importante pensar na morte dos inocentes, onde há sempre uma certa dose de intencionalidade, para prever possíveis desdobramentos e alerta para mais horrores, quando e trata de totalitarismos (veja o posto anterior) há sempre um horizonte sombrio e preocupante.

Por isto a morte de inocentes em si deve ser apurada e punida, trata-se de ato totalitário, absurdo.

Se pensarmos na guerra do Vietnã, onde se usou as bombas incendiárias Napalm (foto), onde morreram algo próximo a 1 milhão de pessoas (há estimativas que falam até de 3 milhões de pessoas), e também 300 mil combojanos e mais de 20 mil laocianos, então também no Ocidente tem em sua conta vidas de inocentes.

Também a guerra do Iraque, a crise no Oriente médio e as guerras africanas devem ser vistas.

A morte e o bombardeio de hospitais, maternidades e até manicômios na Ucrânia, é claro que estes dados devem ser comprovados, indicam a crueldade desta guerra atual, e isto é importante não só para um julgamento em tribunais de guerra, mas para pensar nos possíveis desdobramentos.

Em um clima de final de pandemia, uma provável escassez de alimentos, o desequilíbrio de forças militares com tecnologias e uso de armas nucleares, químicas e biológicas é muito preocupante.

Porém se observa isto também no microcosmo, nas ações sociais e individuais, a ausência de sentimento e compaixão pelos indefesos, a falta de humanismo verdadeiro e o descaso com a vida, pois a pandemia não acabou e crescem vários tipos de negacionismo.

Olhar sincero para uma humanidade que sofre e se vê ameaçada por um futuro ainda mais duro, é obrigação de todo humanismo sincero, e um olhar especial para os inocentes é mais necessário.

Sem um grande de humanidade que olhe para o Outro que sofre, não teremos futuro promissor.

 

A narrativa do totalitarismo

06 abr

Não se trata apenas da guerra que é o ápice da ação totalitária,a tentativa de submeter povos e governos a uma verdade unilateral, a uma forma de ver o mundo que despreza outras e mais do que fazer uma história do autoritarismo é preciso entender suas origens e sua narrativa.

Foi assim que Hannah Arendt encarou a questão ao escrever em 1951 “As origens do totalitarismo”, ela parecia convencida que após o final da segunda guerra o problema não acabava ali, ali fala do inferno, do pesadelo, da Metamorfose de Kafka, da cebola e até da feiura de um omelete entre tantas outras coisas, quando chegavam às suas mãos as histórias de Auschwitz.

Ao tentar descrever a experiência totalitária o dilema que se deparava Arendt era que essa experiência não podia ser explicada, não pela filosofia política ou pelos conceitos tradicionais, não é como a culminação de um processo do desenvolvimento de algo a partir de um passado.

Lembro uma frase impactante de Lygia Fagundes Telles, falecida estes dias quando completaria 99 em 16 de abril, escreveu: “Não há coerência ao mistério nem peça lógica ao absurdo”, os ditadores e suas narrativas só tem lógica numa propaganda sistemática, e numa claque que de outros fanáticos que o apoiam e com ele se identificam.

Esta forma de narrativa que Arendt escreveu encontrou oposição em contemporâneo como Voegelin sobre o qual ela respondeu: “eu não escrevi uma história do totalitarismo, mas uma análise em termos históricos dos elementos que se cristalizaram no totalitarismo” (ARENDT, 2007, p. 403).

Escreveu também na “Crise da República”, que a primeira diferença fundamental entre o totalitarismo e as demais categorias presentes na história está no fato de que o terror totalitário “se volta não só contra os seus inimigos, mas também contra os seus amigos e defensores”; uma segunda diferença seria sua radicalidade, que o torna capaz de eliminar não somente a liberdade de ação dos indivíduos como faziam as tiranias através do isolamento político., eliminando não só opositores como também aliados pouco confiáveis, há um claro paralelo na guerra atual.

Em sua nota de número 81, Arendt escreveu: “O total de russos mortos durante os quatro anos de guerra é calculado entre 12 e 21 milhões. Num só ano, Stálin exterminou cerca de 8 milhões de pessoas somente na Ucrânia. Ver Communism in action, U. S. Government, Washington, 1946, House Document n o 754, pp. 140-1”, novamente a semelhança com a Guerra atual não é por acaso, e depois de Butcha estes dias Mariupol (foto) poderá ter drama semelhante.

O último tópico do livro de Arendt é: “Ideologia e terror: uma nova forma de governo”, quem tem interesse em evitar totalitarismo é só ler, é provável que alguém tome consciência deste terror.

ARENDT, H. Origens do Totalitarismo. Trad. Roberto Raposo. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.