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Posts Tagged ‘teologia’

Revelação e desvelamento

23 jun

Enquanto na filosofia, o desvelamento é a clareza atingida pela inteligibilidade metafísica ou ontológica, que não se restringe só pelos aspectos materiais, empíricos ou quantitativos da realidade, o desvelamento na teologia é a revelação e inteligibilidade pela fé.

Ambas buscam o conhecimento do todo, desde seu aspecto originário, passando pelos meios (os caminhos e métodos que propõe) até entender racionalmente ou pela “revelação” do conhecimento harmônico (elucidação) das verdades divinas ou aquelas contidas nas Escrituras (justificação).

Assim a Teologia, enquanto é o estudo que representa um esforço da razão (e também da espiritualidade) para maior compreensão daquilo que está dito por meio das Escrituras, porém é sempre re-velação porque o conhecimento divino é infinito, enquanto o humano é finito.

Assim a palavra des-velar (tirar o véu) é adequada ao esforço racional, porém sem o recurso da metafísica e da ontologia fica presa à re-velação, que é o conhecimento racional pragmático.

O esforço de compreender os novos dados do telescópio James Webb por exemplo, já está dando aos físicos e astrofísicos novas compreensões do universo, porém é cada vez mais difícil entender qual o momento inicial ou qual a substância inicial que ele se formou, a resposta parece ir para além de seus limites ao conduzir as hipóteses: sem este lá e não há início ou há outros multiversos além do nosso universo.

Assim o des-velar é aquele conhecimento que vai em direção à essência do que somos e para onde nos dirigimos e que leis ético-metafísicas nos governam e deveríamos obedecê-las.   

Pois o des-velar pode nos indicar que mais que uma substância inicial (uma mónada primordial ou uma energia cósmica inicial) e que pode haver um Ser e uma intenção na criação.

Se o olho é a lâmpada de nosso corpo e nos re-vela a realidade, devemos ir além dela para des-velar os segredos da eternidade, pois o nosso conhecimento é limitado.

Esta sabedoria é aquela que afirma, na leitura bíblica que nós sabemos até quanto valem dois pardais, mas o divino (Mt 10,31-32): “Quanto a vós, até os cabelos da vossa cabeça estão contados. Não tenhais medo! Vós valeis mais do que muitos pardais.”

Há uma onisciência divina e mesmo que caminhemos por veredas o processo civilizatório prosseguirá. 

 

O que há além do humano

03 mar

Certamente existente a natureza, os planetas e todo o universo, quando mais visto pelos engenhos humanos: as viagens interplanetárias e o megatelescópio James Webb, mais complexas e desafiando a inteligência humana.

Mas há algo no homem no além humano que está na sua consciência e nos seus sentimentos e afecções, há uma complexa centelha divina, diz o poeta que o faz procurar fora o que está dentro.

Imaginar que isto poderá estar numa máquina é apenas um dos aspectos do controle e da vontade de poder humano, cujo tema desenvolvemos na semana passada, o transumano cria uma ficção e uma fantasia humana de que o próprio homem criaria algo para ultrapassá-lo, a grande fantasia do desenvolvimento dos recursos da Inteligência Artificial atual, tudo que estiver lá o homem que pôs.

É o desejo humano de ser seu próprio criador e quem sabe atingir uma divindade terrena, porém ao contrário do que busca, a tecnologia não tem só a finalidade de destruir e também de auxiliar, pode por devaneio impelir forças extra-humanas de destruição.

Fomos criados pois o homem não existiu sempre na terra, e mesmo a hipótese de termos vindos de outros astros celestes, a fantasia dos alienígenas, que até podem existir, serão criados por algo que tem uma consciência infinita e maior que a nossa, teve que existir um princípio criador celeste e ontológico, com lógica do ser (onto).

Esta fantasia mística faz sentido, por que qualquer ciência, filosofia ou teologia que se preze vai especular sobre a criação humana, e qualquer escatologia vai pensar sobre o nosso destino.

Há um momento na vida terrena de Jesus, a figura histórica é incontestável, em que Ele se revela como divino aos seus discípulos, que ficam tão maravilhados que querem construir três tendas e ficarem ali, o evento chamado de “Monte Tabor” (foto), onde estavam com Jesus apenas três discípulos.

(Mt 17,1-3): “Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e os levou a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. E foi transfigurado diante deles; o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz. Nisto apareceram-lhe

 

Poder e interioridade

24 fev

Esclarecido no post anterior a diferença entre alma e espirito, o conceito usado por Hegel para desenvolver a ideia (metafisica, para ele “subjetiva”) de poder usa uma analogia da digestão, que Byung Chul Han aproveita:

“O poder é, para Hegel, já efetivo no nível mais elementar da vida. A digestão, desse modo, é já o processo do poder no qual o ser vivo leva consigo,  aos poucos, seu outro a identidade” (Chul Han, O que é poder?, p. 102), chega a dizer que o ser vivo gera identidade com o outro, porém ignora que em sua gênese há um processo metafísico.

Nietzsche vai desenvolver esta questão como vontade de poder, neste caso confundido com a dominação que já tratamos aqui e que é uma categoria sociológica, porém o poder como uma metáfora, a nosso ver mais adequada, é aquilo que geramos em nossa interioridade digestiva.

Como digerimos a imagem do outro como nossa identidade ou não, pois reconhecemos diferenças não só no genótipo, mas principalmente nas diferenças de sentimentos, julgamentos e decisões, de modo mais amplo de acordo com a nossa cosmovisão.

Assim o desejo de paz ou de guerra com o diferente, a tolerância ou intolerância em diversidades de pensamento sobre o mundo e as coisas não deve estar na categoria do certo e do errado, claro assim o errado deve ser punido, mas o que é errado deve estar circunscrito nos limites do humano, assim se matar é errado, a guerra é um erro grave onde um povo pode exterminar outro.

A renúncia a este poder metafísico, gerado em nossa interioridade ela nossa visão de mundo, deve sempre estar interiorizada (digerida) também como uma vontade, um comando, do tipo não-posso.

A lição bíblica sobre esta questão, descrita como as “tentações de Cristo”, estão na passagem Mt 4,1-11.

Na passagem após jejuar e renunciar ao poder de transformar as pedras em pães e disser que se lançasse sobre a cidade de Jerusalém, o diabo o tenta com o poder e mostra-lhe os reinos do mundo: “e lhe disse: “Eu te darei tudo isso, se te ajoelhares diante de mim, para me adorar”. Jesus lhe disse: “Vai-te embora, Satanás, porque está escrito: ‘Adorarás ao Senhor, teu Deus, e somente a ele prestarás culto’”. Então o diabo o deixou. E os anjos se aproximaram e serviram a Jesus” (Mt 4. 9-11).

 

Poder e alma

23 fev

Não há no discurso sociológico algo que de fato desvende o que é o Espirito, a grande razão ela qual a filosofia veio re-trabalhar a questão do Outro (Levinas, Ricoeur e até mesmo Habermas e Chul-Han a retomaram) é que a visão idealista é centrada no “eu”, também o pensamento vulgar foi por este caminho: o “mistério”, a chave do sucesso, etc.

Para se ter uma relação com a alma é preciso saber não a ex-sistência (ex-fora e cistere – cisterna), mas que Deus é, sua essência é Ser em sua plenitude e assim nele há a plenitude ontológica e assim a alma, do grego anima, é o que Ele insere no homem para dar-lhe vida.

Assim seu poder é ontológico, Byung Chul Han chega a relacionar Heidegger com sua concepção de poder, e também de religião com poder, mas sua leitura é dualista neste ponto, ou religião ou ontologia, é verdade que existe uma teo-ontologia, porém há uma relação forte entre elas, desde Tomás de Aquino.

A relação que Chul Han estabelece está descrita assim: “Embora Deus seja a ´subjetividade´, esta não se esgota na identidade abstrata, sem conteúdo, do ´eu sou eu´. Ele não permanece em um silencio e hermetismo eternos´” (Han, 2019, p. 120), citações que ele retira de Lições de filosofia da religião de Hegel, e não é de estranhar que pense, ele é próximo ao budismo e a ascese é humana.

Já escrevemos no post anterior que Deus é poder na visão hegeliana, e Chul Han a descreve a partir da ideia idealista: “pois Ele é um poder de ser Ele mesmo” (Han, 2019, p. 121), e assim não há relação de criação (e não imanência) com tudo que existe, incluindo o homem e sua alma.

Diferente do Espirito desenvolvido por Hegel (Fenomenologia do Espírito), sem a relação com a alma não há um Deus trinitário, além do divino-humano Jesus, o Espírito Santo, terceira pessoa.

Através de uma verdadeira ascese o homem conhece um verdadeiro poder, que não é uma dominação sua descrição sociológica, mas uma relação ontológica com sua ascensão, por ela diz a leitura bíblica o homem se eleva verdadeiramente.

Diz uma passagem da leitura divina, na qual Mateus revela como uma lição de Jesus (Mt 4,25):

“Com efeito, de que adianta a um homem ganhar o mundo inteiro, se se perde e se destrói a si mesmo?”, ou seja, se destrói sua alma.

HAN, B.C. O que é poder?. Trad. Gabriel Salvi Philipson. RJ: Petrópolis, Vozes, 2019.

 

Ser, consciência e clareira

03 fev

A clareira do Ser foi uma tema importante na retomada ontológica feita por Heidegger, ela é inseparável da metodologia fenomenológica a qual seu professor Husserl foi o principal desenvolvedor moderno, porém fica uma aporia, conforme afirmam na Dialética do Esclarecimento de Adorno e Horkheimer, se há de fato uma autodestruição do esclarecimento na modernidade e porque isto se deu.

Não se trata simplesmente então a retomada do Ser, mas como isto pode se dar a partir do método fenomenológico, então duas questão devem ser levantadas: o colocar entre parênteses os nossos pré-conceitos frutos do esclarecimento, o que é chamado por Husserl de epoché fenomenológico, e a questão da intencionalidade da consciência, nela o Ser se desvela, ali residem a maioria de nossos problemas e insatisfações.

A cultura (ou o que restou dela como diz Dalrymple, já postamos aqui) contemporânea vai de contramão neste sentido, aquilo que alguns autores chamam de excesso de positividade, aquela lógica descrita até mesmo como “mistério”, afirmação dos desejos e das necessidades, resumindo a vida vista como utilidade apenas e não como essência ou plenitude.

Assim devemos fazer um “vazio”, um silêncio na alma para que tenhamos a plenitude do ser, afastar os desejos e necessidades imediatistas para poder entender de fato as verdadeiras necessidades e alimentos do Ser que levam a alegria e a plenitude, o simples impulso leva as compulsões temporárias e como tal satisfazem apenas a necessidade imediata, o que é próprio do Ser permanece oculto.

Isto é possível com estas duas medidas: fazer um vazio (epoché) colocando entre parênteses o que é nosso pré-conceitos, reelaborando-os num círculo hermenêutico que permite de fato um novo “conceito”, após a fusão dos horizontes

Por isto, diz a ontologia, que o Ser permanece oculto, está além do que é imediato e aparente, não deve ser buscado “Fora”, mas “dentro”, é preciso verdadeira interioridade, sem manipulações e barreiras, aquilo que muitos pensadores, místicos e espiritualidades atingem, e alcançam uma plenitude, mesmo que temporal, e que é será alimento para uma verdadeira ascese, e esta poderá atingir seu cume.

Para a filosofia e teologia cristã não é possível atingir a verdadeira plenitude sem anunciar e viver seus valores, diz a leitura (Mt 5,14): “Vós sois a luz do mundo. Não pode ficar escondida uma cidade construída sobre um monte. Ninguém acende uma lâmpada e a coloca debaixo de uma vasilha, mas sim num candeeiro, onde brilha para todos que estão na casa”, porém isto deve ser feito com respeito e fraternidade e nunca com proselitismos e julgamentos.