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Os grandes impérios na antiguidade

30 abr

Há sempre uma narrativa histórica e outra bíblica, as datas coincidem, mas as batalhas não.

Um dos grandes impérios da antiguidade foi a Assíria, do século VII a.C. (aproximadamente 721 a.C. até o século 630 a.C. o início de sua queda, eles dominaram grande parte da arábia, conquistando as terras babilônicas, que dominavam o povo hebreu e os caldeus, o Egito, os medos e elamitas.

A narrativa bíblica concentra-se principalmente no período de Sargão e Senaquerib (745-661 a.C.) é desta época que o profeta Isaías narra as palavras de Senaquerib para Ezequias: “eis o que direis a Ezequias: Assim fala o grande rei, o rei da Assíria de onde te vem tanta Confiança , o rei ironiza-o pela aliança que possuía com o Egito e conquistará também aquele povo.

Em Isaías 37, há a seguinte narrativa sobre os anos de sofrimento, seguido da vitória, “este ano se comem restolhos; o ano que vem, aquilo que nascer sozinho; no terceiro ano porém, plantarei e colhereis; plantareis vinhas e comereis seus frutos” e depois mais a frente narra uma batalha na qual “o anjo do Senhor apareceu nos campo dos assírios e feriu centro e oitenta e cinco mil homens”, mesmo para os dias de hoje um número bastante alto.

O certo é que no ano de 630 a.C. os assírios se retiram do Egito e depois da Babilônia, que dominará também as terras hebraicas em Isaías 39, inicialmente o rei da Babilônia, Merodac-Baladã, envia ao rei Ezequias que estava doente mensagens e presentes, mas depois alerta o profeta Isaías ao rei Ezequias: “Escuta a palavra do Senhor dos Exércitos! Aproxima-se o tempo em que se levará para a Babilônia tudo aquilo que há em teu palácio, tudo o que se acumularam os teus pais até este dia”, e assim aconteceu nos 50 anos do exílio da Babilônia.]

Quem libertou os judeus. Foi o rei Dario, que governou o Império Persa e que era inimigo da Babilônia, através do profeta Daniel a quem venerou por suas profecias, concede ao povo judeu reconstruir seu templo e retornar a sua terra.

O império Persa durou até o ano 330 a.C. sendo bastante conhecido pela historiografia oficial por causa das guerras “médicas” entre os gregos e os persas, mas veja que historicamente os medos eram um povo ao leste da Assíria, enquanto os gregos a oeste e já no continente europeu, acontece que foram simultâneas no período de 500 a 448 a.C. mais de 50 anos.

Entre guerras e desafios, oráculos e profetas auxiliaram o povo a caminhar nestes períodos.

A lição histórica possível é grandes impérios ruíram por sua soberba e opressão, a lição espiritual é não se intimide o vosso coração, o mal morre por sua própria maldade.

 

O grande e o pequeno

29 abr

Na política, na filosofia e até mesmo na religião a ideia de Grande é sempre vista como poder.

Pode parecer estranho o uso do termo Grande de Sloterdijk ao se referir a grandes teorias políticas, econômicas e imperialistas, mas ele é mais adequado para aquilo que era finalidade dele falar no seu livro “Se a Europa despertar”, pouco lido inclusive na Europa, apesar dele ser reconhecimento como um dos maiores pensadores vivos.

Diria que ser pensador já é Grande, usando seu próprio termo para a filosofia, já que como ele afirma: “não é um tempo próprio para pensar”, temos que escolher entre ditadores e narrativas, ao invés de tomarmos o fio da história para uma civilização equilibrada e feliz.

Até mesmo no mundo religioso isto é confundido, Jesus não proclamou nem insistiu em qualquer corrente política de seu tempo, apesar de ter o grupo rebelde ao seu lado, Simão o zelote e Judas Iscariotes eram zelotes, grupo que era rebelde ao império romano.

Grandes impérios sucumbiram e desapareceram, um que até é esquecido e pouco analisado pelos historiadores são os mongóis, dos séculos XIII e XIX (veja no globo acima) sendo um dos maiores em extensão e hoje reduzido a um pequeno país dividido e dominado pela China.

A Europa não despertou, Makron disse em tom dramático a semana passada na Sorbonne: “A nossa Europa, hoje, é mortal. Ela pode morrer, e isso depende unicamente das nossas escolhas!”, o discurso está certo, mas a intenção errada, porque pouco depois fala de suas armas nucleares.

O Grande na espiritualidade, em tempos de religiões desespiritualizadas, são de narrativas em torno da religiosidade que pouco ou nada fala deste Grande “megalopata”, como chama-o Sloterdijk, e sim da capacidade de solidariedade, de amor verdadeiro levado a prática, de acolher e buscar os pequenos e sofredores que vivem a margem da sociedade desumana.

Francisco de Assis, era filho de Pedro Bernardone, rico e prospero comerciante que o filho o rejeitou, Catarina de Sena era analfabeta e seus seguidores escreviam por ela obras sábias e santas, teve influência na volta do papa Gregório XI de Avignon para Roma, sendo embaixadora de Florença, uma cidade em guerra com o papa e que ela pacificou.

O ocidente vivia um grande cisma, e ela foi junto ao papa até Roma, enviando numerosas cartas a príncipes e cardeais, para promover obediência ao Papa Urbano VI (sucessor).

Os pequenos homens e pequenos reinos fizeram a história, veja a Grécia antiga, os gauleses durante o império romano, o Grande quase sempre imperial, belicista e cego apesar de uma imposição brutal temporária, sempre sucumbiu ao desejo legítimos de povos e nações.

SLOTERDIJK, P. Se a Europa despertar. Trad. José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2002. 

 

Um sentido para o grande e o novo

26 abr

Apresentar algo Grande e Novo digno da ideia não significa criar uma novidade e formar com ela uma bolha, significa algum sinal mínimo de originalidade, note-se que o termo não dispensa a origem, e significa algo que de fato traga uma transformação positiva.  

O continente da Velha Europa está em crise, e custa a admitir isto, e a guerra não representa o novo e sim a velha conquista imperial, o saque de povos vizinhos e as narrativas mentirosas que esconde imperialismos.

Sloterdijk estabelece algumas exigências para um político da atualidade: “Profissão: político. Residência principal: opacidade. Programa: pertencer- se. Moral: pequenos trabalhos de desafios. Paixão: ter uma relação com a ausência de relação. Evolução: autorrecrutamento a partir de conhecimento, que se torna iniciativa” (Sloterdijk, 1999, p. 65).

Talvez seja clara a opacidade, ausência de transparência e discursos difusos e até contraditórios conforme a ocasião, o programa é claro, afirmação de sua personalidade e o recrutamento de iguais, a moral não é qualquer coisa que exija desafio, e a boa moral não é outra coisa, muitas vezes a capacidade de sofrer e doar-se pelos outros e de fato, pelo povo.

Em 1999 Sloterdijk sentenciava: “é evidente que numa época que a forma do grande é mudada, patologias de filiação de todo tipo tornam-se epidêmicas … já o atletismo de Estado mais antigo muitas teve de lidar com as fronteiras de seu poder de generalização …” (pag. 66).

No livro “A nova ciência dos networks” Laszlo Barabasi escreve um exemplo muito importante, sem o perseguidor de cristãos Saulo, que ao ter uma experiência mística sai da bolha judaica e vai para o mundo grego e depois o romano, o cristianismo seria ainda hoje uma seita, e hoje parece retornar a ela por falta de um espírito aberto.

Saulo, agora Paulo não vai combater em fronts do império e sim levar um novo espírito ao reino imperial romano e será perseguido por este espírito e não por usar qualquer tipo de arma, e anunciar o reino da paz.

Em atos dos apóstolos 9,31, após uma reapresentação de Paulo para a comunidade cristã que o temia é dito: “A Igreja, porém, vivia em paz em toda a Judeia, Galileia e Samaria”, e finalmente Paulo exerce o bom combate: sem guerras, acusações ou intolerâncias.

 

Pré-ocupação e pré-conceitos

25 abr

Não se trata de jogar com as palavras, elas tem o sentido claro sem o hífen, questões que ocupam nossa mente e se tornam desafiadoras, e os preconceitos quando estimulados social e estruturalmente colocam pessoas, indivíduos, etnias e povos em descrédito.

Porém há outro sentido para aqueles que se preocupam com a saúde mental e a saúde social onde seja possível conviver com a diferença, com o Outro e com o contraditório, trata-se de uma saúde espiritual, no sentido de fazer uma resistência do espírito a um ambiente hostil.

O objetivo de deixar uma pessoa em descrédito através do preconceito, não pode ser confundido com a intolerância e o desamor do pré-conceito presente na estrutura do pensamento dualista: subjeito x objeto, natural x cultural, corpo x mente, nela residem boa parte da resistência ao diálogo e a abertura ao Outro diferente.

Alguns autores consideram que o preconceito como discriminação (Erving Goffman por exemplo), são mais relevantes do que o próprio estereótipo feito sobre determinados indivíduos, porém também estes autores entendem que existem características anti- dogmáticas que podem articular a relação existe entre preconceito, estigma e discriminação (o próprio Goffman faz isto).

A partir da perspectiva que o pré-conceito é interente ao homem e à sua percepção de verdade (Gadamer, 1997) o modo de conceber e entender próprio da realidade acerca de um determinado fenômenos, deve passar primeiro por um pré-entendimento ou pré-conceito deste mesmo fenômeno, ou seja, dificilmente vamos a realidade sem nenhum conceito a respeito dela, para isto é preciso um epoché fenomenológico, diz a boa fenomenologia.

Digo isto antes da pré-ocupação, porque em geral grande parte dos fenômenos naturais e existenciais passam por um filtro preconceituoso, no sentido de pré-entendimento, e assim o nó e o véu sobre a realidade fica estabelecido, é preciso uma atitude para ir a frente, deixando que a ocupação (e não seu pré estabelecimento) adquira o lugar certo no devido tempo.

A esperança (e para quem crê é a fé) entra nesse vácuo entre os dois estágios, a pré-ocupação que pode estar envolta de pré-conceitos da realidade, e a verdade estabelecida pelo fenômeno em si, alguns pensarão o fato, mas o fenômeno ou a coisa em si, é própria e o fato depende sempre de uma narrativa sujeita ao pré-conceito.

Resumindo, não se preocupe antes da hora, deixe que o fenômeno e a realidade fale por si na hora exata de sua “ocupação” ou em termos ontológicos de sua “presença”, seu da-sein.

GADAMER, H.G. Verdade e método. Tradução Flávio Paulo Meurer. 3ª. ed. Petrópolis (RJ): Vozes . 1997.

 

A volta às nações e ausência do Todo

24 abr

Em tempo de hipercomunicação, a mídia social faz sentir a ausência do Todo, que Peter Sloterdijk chama do Grande: “a forma do grande no mundo industrial insiste no conhecido estresse megalopata em dimensões ampliadas – mas então devem preocupar-se as pessoas da rua, que antes teriam apoiado um Ministro das Relações Exteriores” (Sloterdijk, 1999, p. 61), o que ele não imaginava era que isto teria uma reação contrária: a volta do patriotismo.

Porém somente forças inesperadas perceberam este efeito, enquanto a sociedade atual: “sofrendo crises de náusea frente a sua classe política, no momento não pode fazer mais do que conceder uma pausa de reflexão para questões fundamentais” (p. 62).

O autor percebe a falta de “alguma coisa”, o destaque é dele, mas prefere “interpretá-lo como o espírito da era agrária” e dos grandes impérios (pg. 60), e em sua visão agnóstica, “para ela chegou o momento crítico com a “morte de Deus” “ (idem), novamente o destaque é do autor.

Assim na ausência de uma figura escatológica, num mundo que rejeita a ideia do sagrado, do divino e de um Deus humano-divino dos cristãos, “a forma do Grande é mudada, patologias de filiação de todo tipo tornam-se epidêmicas” (pg. 66), não só na política, mas também religiosas, todos acreditam terem encontrado um “grande” e o colocam hereticamente no lugar de Deus, até mesmo nas religiões um deus imaginários da riqueza, do ócio e até da luxúria, por mais contraditório que possa parecer.

O livro do final do milênio passado, entende o problema certo mas no lugar errado, sob o tema de “revolução conservadora” (novo destaque do autor) experimenta-se a “duas ou três gerações nos movimentos catolizantes da resistência na Europa central e do sul, provavelmente pela frente uma grande carreira intercultural – sob estandarte religioso, culturalista, regionalista” (pg. 67).

Volta a uma análise correta: “no Grande moderno – as identidades estado-nacionais quase religiosas que desde o século XIX marcaram formas políticas de vida na Europa e mais tarde no mundo inteiro” (idem), lembre-se o nazismo e agora em várias formas de guerras “nacionais”.

O fenômeno moderno deste Grande, da grande pátria seja em Israel ou na Rússia, na China ou nos EUA, não é outra coisa senão a ausência de um Grande Maior, o divino que leve os homens a quebrar fronteiras, a conviver com o diferente e a entender a necessidade de uma nova civilização que veja o planeta como Terra-Pátria.

Para o grande religioso, pode-se perguntar onde está Deus, mas a figura divina-histórica de Jesus e sua visão além-abraamica que ultrapassa a destes povos em conflito, proclamava um lema universal: “Quem me vê, vê aquele que me enviou” (Jo 12,45).

 

O animal político e o ser ontológico

23 abr

Imaginamos pela maioria das narrativas que a política grega é um grande modelo para a sociedade contemporânea, mas a correção de Sloterdijk é a mais acertada possível: “A verdade sobre a forma de mundo imaginada por Platão e Aristóteles é certamente a de que cidade e império são figuras da era agrária” (Sloterdijk, 1999, p. 43).

Vessel Hollow

É difícil acreditar porém “se Platão definiu o saber do político como arte pastoril em referência a bípedes sem penas, então fica claro coo motivos agro-ontológicos avançaram até na definição fundamental da essência do poder nas cidades – agricultura e a criação de animais são os reservatórios de contemplação, dos quais discursos politológicos devem extrair sua plausibilidade, mesmo se o olhar passe do jardim da academia para a ágora” (pg. 44).

A importância escapa até mesmo de Sloterdijk, já que na sociedade moderna industrializada europeia a “experiência camponesa” que culpa até mesmo Heidegger o seja, e os “motivos extra-agrários” saíram “das oficinas dos artesãos, a saber dos ferreiros, para avançar na consciência do mundo político-filosófica, e dos portos, de um o comandante, em grego kybernetes, pôde tornar-se uma sugestiva figura de poder” (pag. 44).

Também a convivência com a natureza é retomada em Sloterdijk e seu discípulo Chul-Han: “desde sempre constituiu um risco para a cidade o fato de ela usar mais do que criar o homem; mais do que isso, ela o impele aos últimos florescimentos como reproduções simples demais; tanto no sentido biológico quanto no cultural, ela é mais estufa do que campo e jardim” (pag. 45).

Antes do desenvolvimento do psicopolítico de Chul-Han já pode-se encontra-lo em Sloterdijk: “dominadores, políticos e chefes são, segundo essa lógica, sobretudo detonadores de uma crueldade funcional – que obviamente fazem bem em ciar para si, sob nomes como razão de Estado, bem comum, justiça, planejamento, entre outros, um rosto aceitável, se possível sincero” (pag. 47).

Sloterdijk desenvolve aqui o conceito verdadeiro de “humanidade” “se rompe aqui em grupos que se intensificam através de tensões, e grupos que ficam estagnados no sofrimento, a dor, na grande civilização, adquire um terrível rosto duplo; ela age em alguns como estimuladora, em outros como obstruidora; para a minoria, a carência tem efeito educador; para a maioria, age como destruidora de almas” (pag. 48), vale esclarecer que Sloterdijk não é religioso.

Para concluir este post, ela detecta doença contemporânea: “liga-as agora a estranheza íntima de senhor e servo” (pag. 48) e “o paradoxo da inclusividade exclusiva cobra então o seu preço; pessoas começam a caçar pessoas, matam-nas em grandes números, exterminam hordas e tribos inteiras, vendem-nas e compram-nas … “ (pag. 49).

Pouco ainda caminhamos na saída do zoom, as exclusividades e não-inclusividades estão ai.

SLOTERDIJK, Peter. No mesmo barco: ensaio sobre a hiperpolítica. Trad. Claudia Cavalcanti. São Paulo: Estação Liberdade, 1999.

 

Hiperpolítica e a guerra

22 abr

Quando Peter Sloterdijk escreveu “Todos no mesmo barco: ensaio sobre a hiperpolítica” estávamos no limiar do terceiro milênio, Manuel Castells escrevia a Sociedade em Rede e Edgar Morin escrevia sobre Cabeça Bem feita, repensar a reforma, reformar o pensamento, eram tentativas de acordar e fazer a humanidade caminhar para um futuro menos sombrio.

Sloterdijk escreveu ainda “Se a Europa despertar”, chama-a de Império do Centro e atenta para seu passado colonialista e a necessidade de um novo futuro e repensa a guerra, um tema tão deligado no país que deflagrou a II Guerra Mundial.

São todos pensamentos que tentavam redirecionar um futuro sombrio da possibilidade de uma nova guerra, em Todos no Mesmo Barco, Peter Sloterdijk revisita o projeto político que nasceu na antiguidade clássica, a tentativa de organizar o Estado, e diz: “Como podem “falar” a tão grandes números de pessoas e convencê-las a se sentirem participantes daquilo que é “grande” – até chegar à disposição de ir ao encontro da morte em exercícios de milhões contra forças de igual ordem de grandeza, a fim de assegurar aos “próprios” sucessores aquilo que os ideólogos chamam de futuro” (Sloterdijk, 1999, p. 31).

Ao contrário do otimismo de Castells e Morin, não apenas justificável, mas desejável, de um futuro mais civilizado e humano, Sloterdijk alerta que essa hiperesfera conectada, vejam que as mídias sociais eram apenas nascentes para estes três grandes pensadores, era para o alemão, um futuro perigoso da hiperpolítica.

“Os primeiros gestos desse holismo instintivo são tentativas de descrever o cosmo como casa maior e os povos como famílias maiores” (Slotertijk, p. 32), e acrescenta que de fato, “o homo politicus e o homo methaphysicus se pertencem historicamente; propectores do Estado e prospectores de Deus são gêmeos evolucionários” (Sloterijk, p. 33), claro não é a visão de todos e muito menos dos homens do poder, os grandes estadistas que pensam nesse holismo já não existem e agora é império da força e do pensamento monolítico, autoritário e de ódio.

O projeto político dos gregos para ele pode ser chamado de “metalomaníaco”, mas alerta que este é o homem que “imiscui em grandes questões maiores para ter algo que correrá com os olhos e logo abandonará. Mas deverão chamar aqueles que, uma vez apreendidas as grandes coisas, não mais as abandonarão?  Proponho megalopatas” (pag. 34).

Também grandes impérios: o persa, o romano, os mongóis que chegaram a dominar meia europa, o turco-otomano e mais recentemente napoleão e as “esquecidas” colônias da Africa que nada mais eram do que extensão do Império do Centro, como Sloterdijk chama a Europa.

“Humanismo de Estado é desde então a busca por um centro justo – e desde a recepção romana dessa ideia grega essa busca carrega o seu nome até hoje conhecido: a Humanidade” (pags. 35-36).

Sloterdijk questiona esse modelo do homo politicus, o “pontifex maximus”, “como nos tornamos rajá? Como nos tornamos César? Como nos tornamos cônsul, senador, imperador? Como deve viver alguém para entrar nos livros de história como Metternich, lord Morlborough ou Bismark? (pag. 37).

A ideia da política como metanóia, este era o intuito inicial da Paideia por exemplo, não é mais verdade na guerra, Sloterdijk cita Goethe: “não se educa o homem que não sofre flagelos”.

 

Um poder escondido nos pequenos

19 abr

Em toda história se ignorou as camadas da sociedade que não tinham participação no poder, não em regimes autoritários onde isto fica evidente, ainda que os ditadores gozem de alguma popularidade devido seu poder de manipulação e uso da força, a maioria da sociedade deve e o processo se torna irreversível com o acesso através das mídias sociais, que podem ser redes.

O poder dos laços fracos, desconhecido pela maioria dos manipuladores e autoritários existe e mesmo que submetidos a um duro regime, nas sombras e nos meios informais ele acaba se manifestando, porém, o poder de propaganda e de massificação na grande mídia era imenso.

É verdade que parte da opinião dita popular também está sujeita a tradições e culturas de opressão e manipulação, já o era antes, e agora pode tornar-se perverso, mas quando usado para promover o bem comum, a igualdade e o respeito, poder ser a única força assimétrica.

A opressão supõe sempre um certo consentimento, por persuasão, por medo ou por alguma conveniência circunstancial ou histórica, porém ao longo do tempo, pode demorar anos, uma verdadeira opinião “pública” prevalecerá e a polarização das forças imperiais em jogo, irão se enfraquecer.

Como reconhecer o lobo e o cordeiro neste jogo, é simples, e a parábola bíblica explica (Jo 10,12):

“O mercenário, que não é pastor
e não é dono das ovelhas,
vê o lobo chegar, abandona as ovelhas e foge,
e o lobo as ataca e dispersa”.

O pastor conhece as ovelhas e elas escutam sua voz, diz outro trecho bíblico, e ele não age com o poder, mas como protetor e facilitador do caminho das ovelhas para não se perderem.

 

A força dos laços fracos

18 abr

A teoria das redes, não no enfoque das mídias de redes sociais, mas dos laços entre atores tem algumas propriedades curiosas e duas são muito especiais: os seis graus de separação e a força dos laços fracos (Weak ties) que parecem estranham aos que desconhecem a teoria.

Os seis graus de separação indicam que vistos como redes as relações entre atores sociais, na realidade, estão mais conectadas do que se imagina, e isto não é apenas no mundo das mídias sociais (o que é incorretamente colocado equivalente com redes sociais).

Um experimento clássico, chamado de Experimento de Milgram devido o trabalho do psicólogo Stanley Milgram, que enviou cartas para determinadas pessoas distantes, e identificou de laços de conhecimento pessoal existente entre duas pessoas quaisquer, e descobriu uma distancia média de 5,5 de pessoas até as cartas chegarem ao destino.

O experimento teve falhas, como cartas que não foram enviadas para frente parando em algum intermediário e o desconhecimento do objetivo de determinadas pessoas no experimento, por exemplo, não ter entendido que a carta deveria ir o mais próximo do destino final.

Já o experimento de laços fracos que foram feitos por Mark Granovetter (1973) leva em contato o contato mais fracos e distantes em redes sociais, pode dentro de determinados contextos significar que os laços entre duas pessoas que tem interesses similares são fortes, mesmo que passe por algum intermediário C, e isto torna C também parte do laço forte.

Assim o laço fraco será justamente o oposto, A e B tem interesses e rotas de ligação distantes, que pode significar interesses diferentes ou apenas distantes, entretanto na teoria das redes estes laços são importantes para o funcionamento da rede e sua dinamização, ao contrário do que diz o senso comum.

O que Granovetter pesquisou é que quanto maior a força do laço entre duas pessoas, maior a chance de que o círculo de amigos e laços seja comum e que a mensagem fique apenas naquele círculo, não atingindo outros círculos de relacionamentos e ampliando a rede.

Neste sentido limitar ou proibir redes socais significa diminuir e tornar a rede social (que não é necessariamente feita via mídia) limitada, entretanto, existem redes que praticam determinados crimes e não devem ser legitimadas e quando possível proibidas.

Isto é discutido dentro da questão do poder, porque a teoria das redes contradiz a ideia de um poder cada vez mais forte e centralizado como solução para problemas sociais, porque ainda que proibidas, as redes sociais continuam funcionando conforme estabelece a teoria dos seis graus de separação e a distancia entre atores é menor do que supõe o poder centralizado, que ele é muitas vezes isolado em sua “bolha” social ou ideológica.

As redes sociais dinamizam as estruturas de laços sociais e ignorá-las pode ser uma fonte de empoderamento de diversos grupos sociais e ajuda a crescer a verdadeira vontade popular.

 

GRANOVETTER, Mark S. The Strenght of Weak TiesThe American Journal of Sociology, vol. 78, n. 6, p. 1360-1380, may 1973.

 

Poder arbitrário e socialização

17 abr

Em seu livro “No enxame: uma perspectiva do digital” Byung Chul-Han esclarece que só uma relação é simétrica (os dois lados têm o mesmo poder ou a mesma potência) o respeito, se o respeito falta há sempre um exercício arbitrário do poder, mas olhemos outras definições.

Uma bastante utilizada é a de Norberto Bobbio: “ … toda probabilidade de impor a própria vontade numa relação social, mesmo contra resistência, seja qual for o fundamento dessa probabilidade (Weber, 1994, p.33), nela há sempre a possibilidade de “manipulação”, uso da recompensa, ameaça da punição e outras formas de assimetria que favorece a força.

Generalizando a diversas formas de poder, e contrárias a de Foucault (veja o post anterior), Lebrun diz que poder e dominação caminham justo, uma pessoa tem podere quando o outro é despossuído deste, coloca no mesmo barco: m Marx, Nietzsche, Weber, Raymond Aron, Wright Mills e outros.

Esta concepção vem da sociologia norte-americana conhecida por “Teoria do Soma Zero”, teoria que vem desde Hobbes, que definia o poder do “soberano” ou do Estado, como sendo “um contra todos” e a “favor de todos ao mesmo tempo”, mas de cima para baixo.

Assim este poder pura e simplesmente aplicado como obrigação ou proibição aos dominados passando por eles e através deles, da mesma forma, os dominados também se utilizam dele e se apoiam nele, mas os dominados possuem subjetividade (na relação ontológica é o dasein), e produzem novos conhecimentos sobre as relações de poder e se empoderam também, neste sentido é importante relacionar poder com potência, ou capacidade de ação.

O conceito de ato e potência em Tomás de Aquino é entretanto mais completo, porque está relacionado também com a verdade, não a temporal, mas a ontológica, presente no Ser:

“[…]algumas coisas podem ser, embora elas não sejam, enquanto outras na verdade são. O que pode ser (illud quod potest esse) se denomina ser em potência; o que já é (illud quod iam est) se denomina ser em ato. Porém, duplo é o ser: o ser essencial ou substancial da coisa, como ser homem, é ser simplesmente; o outro é ser acidental, como o homem ser branco; e isso é ser outro”. (AQUINO, T, 1976, p. 39.)

Assim o poder é visto de outra forma, que é também matéria e ser completo, para o Aquinate todos são componentes básicos da substância, a noção de ser completo é atribuída assim tanto à forma que significa o ato primeiro, a atualidade, que a forma possui por si mesma e não por um mediador, quando este ato primeiro é atribuído à matéria haverá uma atualidade, aquilo que hoje é confundido com virtualidade (a potência ou possibilidade do ser), pois assim todo ser o é em potência, assim todos podem ter poder de forma a realiza sua potência plena.

Isto significa que é preciso potencializar o homem, a sociedade e recuperar os desapoderados, assim sempre é possível a reeducação, a ressocialização e até mesmo dos que são socializados.

O poder se exercido sem arbitrariedade e com a dimensão de todos pode e deve servir ao bem comum, a justiça e a liberdade.

AQUINO, T. De principiis naturae ad fratrem Sylvestrum, [ed. H.F. Dondaine]. Ed. Leon., t.XLIII, Opuscula, vol.IV. Roma [Santa Sabina]: Editori di san Tommaso, 1976,

LEBRUN, G. O que é poder. São Paulo: Brasiliense, 1999.

WEBER, M. Economia e Sociedade. Brasília – DF: Editora da Universidade de Brasília, 1994.