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Co-imunidade: curarmo-nos
Estamos a espera de um milagre, aqueles que não acreditam ou fazem pouco caso da ciência, esperam agora que os cientistas encontrem a vacina, enquanto vacina para as antigas infecções gripais estão começando a estar disponíveis nos postos de saúde no Brasil.
A lição do ponto de vista médico é que esta doença que tomou aspectos de pandemia nos ensina já são definitivas, que a saúde das pessoas é mais importante que a doença, que podemos todos nos ajudar se cada um fizer bem sua parte, e que ninguém fará nossa parte por nós, o governo e as autoridades sanitárias podem conscientizar, mas dependem de atitudes individuais, culturais.
O filósofo |Peter Sloterdijk trabalhou num sentido mais ampla a ideia de imonologia e co-ímunidade, a ideia que não podemos nos livrar de todos os vírus e microorganismos que sempre fizeram parte da vida, e que agora se atacados e trabalhados pelo conjunto da sociedade podem ter seus efeitos reduzidos, embora eles pareçam cada vez mais agressivos, a influenza alguns anos atrás parece uma gripe comum perto do corona vírus e seu alcance e agressividade.
Herdeiro da fenomenologia, mas misturado a Nietzsche, e co-herdeiro de Heidegger com Byung Chul Han, criou uma nova e surpreendente antropologia para o além do humano, ao definir o homo sapiens como resultado de uma inacabada e infinita autopoiesis (do grego auto próprio e poiesis, criação), assim vamos em cada embate com a natureza nos auto “criando” e revendo.
A revisão deste momento é interessante e será inacabada porque os resultados para a economia e a própria estrutura social futura ficarão indefinidos e dependentes de decisões, porém o combate conjunto de povos e nações a pandemia cria uma nova “ação conjunta”, que Sloterdijk chama de co-imunidade, isto é, criar defesas conjuntas e uma imunologia além do humano.
Em relação a Heidegger ultrapassa o ser-aí para o ser-com, não apenas porque cria uma visão antropológica da relação humana, mas que mostra a eficiência de ação conjunta onde cada um faz sua parte, e a imunidade do todo, depende do rearranjo em rede de cada parte individual.
Em resposta a uma pergunta feita em 2018 a ele (do programa Fronteiras do pensamento) explica sua imunologia assim: “Não nos esqueçamos: a palavra “imunologia” é uma metáfora emprestada por juristas aos biólogos. Eu dou um passo adiante, estendendo o conceito de immunis (que em latim significa “livre dos deveres”) à dimensão religiosa.”.
Comparando-a ao sistema de Luhmann afirmou, continuando o pensamento anterior:
“Enquanto para Niklas Luhmann o sistema legal seria o sistema imunológico do sistema social, a esferologia afirma que a religião é o sistema imunológico original da sociedade”, e este seria a antropologia para além do humano, entrando numa dimensão de transcendência religiosa.
Ao relacionar o problema da imunologia com a ecologia, ele a elabora em relação a natureza:
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Enternecer
Em tempos de #FicarEmCasa, uma boa leitura é indicada, ou ver um bom filme, mas nada de grandes dramas, sensacionalismo ou violência, as leituras que recomendo também que sejam para nos acalmar, nos pacificar e tornar a convivência próxima possível, numa palavra: enternecer.
Um dos livros indico para aproveitar o aconchego do lar, “O prazer de ficar em casa” (só tem em português e infelizmente está esgotado, best seller sem querer), onde a autora brasileira Leticia Ferreira Braga, sem saber os eventos atuais, escreveu em 2007, como melhorar a autoestima e o autoconhecimento, como organizar um consumo mais consciente e explorar os recursos naturais, o esforço para tornar o ambiente que vive mais agradável e também prático, sem luxo e simples.
Para quem gosta de pensar mais fundo, já indicamos e comentamos aqui diversas vezes, “A sociedade do cansaço” de Byung Chul Han, o coreano-alemão sabia que a humanidade caminhava a passos largos para um ativismo e tecnologismo exagerado (ele exagera também quanto ao uso da tecnologia que pode ser um bom recurso na situação atual), porém seu pensamento sobre a dificuldade de contemplação do homem moderno é uma boa reflexão, é preciso enternecer.
Pequenos hábitos de rotina no ambiente doméstico ajudam, fazer melhor a limpeza, até recomendável para o coronavírus, mas cuidado com o toc, evitar assuntos chatos e polêmicos, rir das próprias dificuldades, incluindo as limitações pessoais e dos familiares, enfim enternecer.
Se pudesse resumir uma atitude necessária para o ambiente familiar ficar senão aconchegante suportável é fazer o que não é agradável tornar-se, o que é duro suportável, o que é difícil tornar se possível de realizar, enfim suavizar-se e rever hábitos rudes e bruscos.
É quase uma reeducação cultural, ou fazemos isto ou a casa explode e explodimos junto.
Uma noite escura da humanidade
Uma noite cai sobre a humanidade, mas é preciso notar que esta noite vinha acontecendo o vírus que atingiu todo o planeta é um catalisador e apesar de ser letal e trazer muitos cuidados pode nos acordar de uma noite que vinha acontecendo: noite da cultura, noite de Deus, noite da ciência reduzida a especialidades e métodos questionáveis e principalmente noite do homem.
A vida desenfreada e muitas vezes sem sentido, a busca pela eficiência e produtividade, a ideia que o crescimento econômico traz felicidade e principalmente a exclusão do Outro, agora parecem se inverter com a necessidade de ficar em casa: #StayAtHome.
Esta noite provocou uma cegueira coletiva, a cultura é “qualquer coisa serve”, rabiscos e borrões se tornaram arte, expressões puramente genitais sem qualquer afetividade de tornou sexo, e a cultura religiosa que ajudava as pessoas a encontrarem paz de espírito se tornou pura superstição, apelo a riqueza e ao dinheiro, ou a mera pobreza de outro lado, sem qualquer coisa que a faça entender o sentido profundo do desapego e do viver na essência da vida.
A noite religiosa ou noite de Deus é um apego dos homens aos seus círculos fechados agora, se forem prudentes, também impedidos de se reunir, a manipulação grosseira, a leitura fundamentalista da bíblia, que são a pior cegueira contemporânea, também reduz o homem a ser-para-a-morte e não o ser-para-a-vida.
Contemplar o mistério do universo além daquilo que já conhecemos, pouco sabemos da massa e energia escura que compõe 94% do universo, e que este pode ainda ter uma além de sua “bolha”, pode abrir os olhos daqueles que acham que sabem tudo porque aprenderam a ciência, ou porque leram a bíblia com seus olhos de cegueira cultural e seu círculo de “eleitos” fechado e pequeno.
Jesus ao curar o cego assusta os fariseus que querem que o cego se cale, a ciência ajudou um pouco este abandono de superstições e ajudou a iluminar a inteligência humana, também posta a prova pelo vírus, é o que lemos na passagem bíblica lemos em Jo 9:7-9:
E [Jesus depois de por-lhe barro no olho] disse-lhe: “Vai lavar-te na piscina de Siloé” (que quer dizer: Enviado). O cego foi, lavou-se e voltou enxergando. Os vizinhos e os que costumavam ver o cego — pois ele era mendigo — diziam: “Não é aquele que ficava pedindo esmola?” Uns diziam: “Sim, é ele!” Outros afirmavam: “Não é ele, mas alguém parecido com ele”. Ele, porém, dizia: “Sou eu mesmo!”, e os religiosos queriam proibir-lhe de falar.
Além do universo
Ainda vivemos a crença de espaço e tempo absolutos, as grandes descobertas da física de nosso tempo já provaram a existência da dimensão espaço-temporal e uma quarta dimensão aonde muitos fenômenos físicos se explicam, a física padrão elaborou isto, mas agora pode-se ir além.
Havia uma discrepância entre as medidas de expansão do universo feita com base no fundo de micro-ondas cósmico, o ruído que restou do primeiro Big Bang e a expansão de estrelas vermelhas como a medida recente feita pela em 2001 tinha o número de 72 quilômetros por segundo por MegaParsec (km/seg/Mpc), sendo um parsec equivalente a 3,26 anos-luz de distância.
As estrelas vermelhas são um estágio de evolução dos sóis quando ocorre um evento chamado de glash de hélio, no qual a temperatura sobe cerca de 100 milhões de graus e sua estrutura é rearranjada, o que acaba diminuindo sua luminosidade, mas fiquemos tranquilos levam milhões de anos para acontecer.
As medições iniciais no tempo de Planck eram de 67.4 km/seg/Mpc e recentemente uma equipe da Nasa liderada por Wendy Freedman acertou para 70 km/seg/Mpc o que aparentemente fazia uma média e conciliava entre as duas medidas, mas na prática pareciam dois fenômenos diferentes.
A hipótese de Lucas Lombriser, físico da UNIGE de Genebra, publicada no próximo número da Physics Letters B, mostra o universo não apenas em expansão mas uma bolha dentro de um outro universo de densidade menor, e com certeza revolucionária a Física e mudará nossa cosmovisão.
A ideia assustadora e ao mesmo tempo fascinante que estamos numa bolha dentro de um espaço maior só que om menor densidade “de matéria” (como nós a conhecemos que é chamada bariônica) pode apontar para enigmar novos como os buracos negros e a matéria escura.
Não há cegueira somente na terra plana, no universo copernicano e na cosmovisão de um planeta ainda se rearranjando com suas forças sociais internas, o universo em expansão é muito maior e ponde estar dentro de um “caldo cósmico” que até então era impensado, Lombriser o pensou.
A ideia de multiuniversos foi lançada por Stephen Hawking e agora parece quase real, veja o vídeo:
O vírus e suas lições
De repente a sociedade que não podia parar, a “sociedade do cansaço” do ritmo alucinante, dos espetáculos diários, tem que retomar uma visão que já não conhece mais, parar ou ao menos diminuir o ritmo, ficar em casa, conviver com os familiares que são quase estranhos.
O fato é que o universo, a natureza e nela a natureza humana tem suas leis, e estas podem ser além de um Big Bang, podemos estar dentro de uma bolha e cujas leis vem de “fora” dela.
Vi uma hashtag disparar e me surpreendi primeiro, mas depois fui aos poucos entendendo, principalmente jovens usavam #stayfuckatHome como resposta a “StayAtHome, claro não é fácil para quem nunca teve este hábito cultivado, agora ter que enfrentá-lo.
Não consegui com as ferramentas mensurar ambas as hashtags, mas o universo conspira e nos leva a parar e a ficar em casa, pois eventos são cancelados, não há o que fazer na rua, mesmo o comércio dá seus sinais de parada, e é claro que continuam a pensar no lado econômico.
Bom devemos salvar a economia, mesmo que isto signifique uma rápida explosão de um vírus, enfim o universo deu sua lição, não é a economia que vive para o homem, mas o homem que vive para que haja economia, e se ela tem suas próprias leis, que elas não contrariem a natureza e o homem, parece que temos um cheque mate.
As lições para o universo online são duplas, por um lado o presencial retoma um curso que nunca deveria ter saído, o mundo relacional presencial e os círculos fraternais e de outro a necessidade de relações que são públicas ou privadas terem ferramentas online adequadas.
O conflito existe nas duas pontas, nem fazemos as relações presenciais satisfatórias, são fugidias, autoritárias ou o que é pior indiferentes, e nem sabemos como nos comportar no mundo online (o virtual existe antes da internet e do universo digital), e sempre os que criticam usam mal e não compreendem a “lógica” deste universo que pede relações diferentes das presenciais.
Agora temos que marcar reuniões online, usar chats e vídeos e finalmente iremos além da pregação religiosa e ideológica para relações não-presenciais que sejam de fato “relação”, por que virtual vem do latim “virtus” que é parecido a “potencial” quer dizer devemos “cultivar” o virtual para se tornar de fato relação real (virtude vem de virtus), o presencial não garante a “relação”.
A grande lição, haverá muitas outras, é que devemos compartilhar e codividir responsabilidades para superar a crise pandêmica, que já é social e econômica, e depende da atitude de cada um.
O Big Bang pode ser outra coisa
E a Teoria da física padrão, cuja descoberta da partícula de Higgs recentemente no colisor de Hádrions fez os físicos vibrarem, agora tudo parece ter outro sentido e uma nova visão desta.
Haviam duas fortes evidencias sobre o Big Bang e a expansão do universo desde a primeira bolinha da qual saiu tudo (a constante de Hubble H0 e a medida de supernovas distantes), e agora que agora que o universo estaria numa bolha de 250 milhões de anos luz.
Nesta “bolha” onde a densidade da matéria é metade de todo o resto do universo concilia as medidas anteriores, a hipótese é de Lucas Lombriser, físico teórico da universidade de Genebra (UNIGE) e responde em qual velocidade o universo se expande.
A abordagem publica na revista “Physics Letter B”, resolve a divergência entre dois métodos de cálculos independentes que chegavam a valores diferentes em cerca de 10%, um desvio estatístico que é irreconciliável, e não precisa de nenhum novo modelo físico.
Pela teoria do Big Bang ocorreu a 13,8 bilhões de anos atrás, a proposta foi feita pela primeira vez pelo físico e presbítero belga Georges Lemaître (1894-1966) e demonstrada pela primeira vez pelo astrônomo americano Edwin Hubble (1889-1953) , observando que galáxias distantes estavam se afastando e recolocando-as junto podia-se calcular o tempo da primeira explosão.
A constante de expansão chamada de H0 foi medita num valor de 67,4 segundo dados fornecidos pela missão espacial Planck, que tem como hipótese que o universo é homogêneo e isotrópico, mas agora pode-se pensá-lo com uma bolha com densidade de matéria metade de todo o universo, ou seja, a 13,8 bilhões de luz ela explodiu dentro de um “outro” universo menos denso.
Afirmou Lombriser: “Se estivéssemos em uma espécie de gigantesca “bolha”, onde a densidade da matéria fosse significativamente menor que a densidade conhecida para todo o universo, isso teria consequências nas distâncias das supernovas e, finalmente, na determinação o H0”.
Assim a constante de 250 milhões de anos para a bolha concilia os valores da constante H0 para o Big Bang com a constante com o cálculo do afastamento das supernovas que tem influência de todo o universo incluindo a parte fora da bolha com metade de densidade, conciliando as medidas.
Lombriser, Lucas. Consistency of the local Hubble constant with the cosmic microwave background. Physics Letters B. Volume 803, 10 April 2020, Disponível em:
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0370269320301076?via%3Dihub
As mudanças do século XX
As mudanças do século passado, mas cujas estruturas sociais e econômicas ainda estão presentes, foi marcado pelo fim liberalismo econômico mas que era sustentado por grandes impérios, além dos coloniais na Africa e Asia (o fim do império na India, por exemplo), também os costumes sociais e econômicos foram mudando e ainda encontram-se presente no século XIX.
Seria mais oportuno falar do econômico, num momento que os impérios financeiros parecem estar derretendo nas Bolsas de Valores, o chamado mercado do Urso, do medo gerindo os negócios, mas pelo dia 8 de março que foi dia da mulher, optamos por falar da questão.
Desde o romance de Ibsen no século XIX, a Casa de Bonecas, onde por trás da estrutura afável e liberal de um casamento se escondia o machismo do marido, por sinal o momento em que ele assume um Banco de Investimentos, se escondia a opressão da esposa.
Também apontamos o desenvolvimento da questão feminina através de Doris Lessing premio Nobel da Literatura e que tinha uma posição equilibrada mas dura, longe de modismos e do politicamente correto, ela viveu e apontou a questão da mulher, mesmo branca sofreu na Africa do Sul com a questão do racismo por defender os negros.
Chegamos a economia dos “Commons” de Elinor Ostrom, ignorada pela esquerda por não ser contra o capital, e ignorada pela direita porque afirmava que a governança dos bens comuns pode ser produtiva e bem gerenciada, ao contrário do que prevê o “Tragedy of Commons”.
A mudança de postura e de cultura, é verdade que precisamos de leis e politicas para combater o machismo, porém a mudança cultural defende do olhar sobre a mulher, hoje independente, no mercado de trabalho porém ainda sofrendo as consequências de sua emancipação.
Ainda que se afirme que a visão religiosa seja machista, e muitas vezes o é, não é o que a Bibilia apresenta no novo testamento, lembrando que a cultura judaica da época era machista e o velho testamento reflete isto, entretanto a posição de Jesus sobre as mulheres era diferente.
Assim aparece no texto de João (Jo 4, 8-9): “Os discípulos tinham ido a cidade para comprar alimento. A mulher samaritana disse então a Jesus: “Como é que tu, sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou uma mulher samaritana? “, e o texto esclarece que os judeus não se davam com os samaritanos, e a posição da mulher era inferior, aceita por elas.
Não é verdade a exegese que diz que ela sequer era religiosa, pois vejam o texto (Jo 4,19b-20): “Senhor vejo que é um profeta! Os nossos pais adoraram neste monte, mas vós dizeis que em Jerusalém é que se deve adorar”, o machismo vem, portanto, das instituições e não da Bíblia.
Ascese e ascensão
A ascese significa então um processo virtuoso pelo qual por passos e exercícios pode-se adquirir uma espiritualidade colocando a alma diante de obstáculos e situações onde possa superar-se e seguir um caminho de ascensão.
Alguns casos em que há entraves psicológicos, a autoajuda pode ser uma panaceia ou mesmo ser contrária a criação de uma verdadeira ascese, criando superstições e novos problemas e novos vícios entrando num ciclo vicioso que precisará de alguma ajuda profissional.
Momentos de crise e depressão favorecem estes ciclos, mas uma verdadeira ascese é um outro caminho pelo qual sentimos que damos passos cada vez mais elevados e conseguimos transpor os obstáculos naturais e ou impostos pela vida, doenças graves, situações econômicas, etc.
O apelo a solução mágica destes problemas não significa uma espiritualidade nem religiosidade, mas um oportunismo com a pessoa que sofre algum problema conjuntural de vida, pode em muitos casos configurar até mesmo crimes de extorsão e assédio pessoal ou moral.
A ascese é um esforço humano necessário, o dia a dia da vida exige uma forma de viver bem e que se coloque a alma num conforto necessário para a solução de problemas cotidianos, então não se trata apenas de religiosidade ou de mero virtuosismo, a vida nos pede modos de viver bem.
Em qualquer forma de pensamento ou cultura, o esvaziar-se para elevar-se é necessário para um bom andamento de uma perfeita ascese, o epoché grego não era outra coisa senão este processo inicial para adquirir novos pensamentos e permitir a elevação de patamar de consciência, de inteligência e de espiritualidade.
No cristianismo, uma das passagens bíblicas, que fala de modo particular da ascese de Jesus, é aquela que ele toma consigo Pedro, Tiago, João e os leva para “um lugar a parte”, diz o evangelista Mateus Mt 17,1-4: “E foi transfigurado diante deles: o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz. Nisto apareceram-lhe Moisés e Elias, conversando com Jesus. Então Pedro tomou a palavra e disse: ´Senhor, é bom ficarmos aqui, Se queres, vou fazer aqui três tendas: uma para ti, outra para Moisés e outra para Elias”, querendo permanecer nesta ascensão.
O fato é que depois “descem” do Monte Tabor (foto acima), isto é, não se permanece sempre num espírito elevado, mas há outra coisa importante nesta ascese que é o fato da presença de Moisés e Elias, claro ambos já haviam morrido a muito tempo, entretanto a presença de “homens” com Jesus.
Também pode haver a interpretação que é a “Trindade Santa” seja num caso ou noutro, o importante é saber que é possível uma ascese “humana” que nos eleve ao divino embora não seja perene.
Some cases in which there are psychological barriers, self-help can be a p
Asceticism, spirituality and epoché
A ascese que vem do grego áskesis que significa “exercício espiritual”, e muitas vezes ela significa a renúncia ao prazer e até mesmo alguma das necessidades primárias, por exemplo, não comer e fazer jejum, pode estar ligada a espiritualidade ou simplesmente a alguma cultura.
O epoché significa a suspensão de juízo, conforme já explicado na fenomenologia é um “colocar entre parêntesis”, que significa abandonar mesmo que convicto algum conceito ou teoria, com vistas a penetrar num fenômeno, e ter consciência de alguma “coisa” a qual investigamos.
Poderia ser um ponto de convergência entre espiritualidade e conhecimento, claro em um ambiente que isto fosse propício, e que cada um dos lados ali estivesse preparado para uma verdade “suspensão de juízos”, coisa que é rara, ainda mais em tempos de convicções confusas.
Supondo que seja possível, e o exercício que Husserl propõe, os gregos o fizeram para chegar ao conhecimento, a episteme e sair da doxa, quais são as condições necessárias para esta realização, então pensar num exercício para isto significa criar uma ascese para a “epoché”.
Pode-se ampliar assim a epoché fenomenológica para elevação espiritual, não é uma mudança de seu verdadeiro percurso por ela deve encontrar o Ser criando uma fenomenologia transcendental (ou reflexiva como afirmava Gethmann) e este caminho Heidegger é que trilhou mais fundo.
Voltar-se ao que é vivido, ao originário, à fonte, ao nascimento daquilo que é tal como é (o voltar- se a coisa como propus Husserl), constituindo uma elevação por exercício que tem como consequência o conhecimento pessoal, mas está longe de ser apenas uma autoajuda.
Tomar o ser humano e tomá-lo em consideração, não é só no sentido de acumular novas informações, mas tornar-se mais Ser, o homem novo como propôs Husserl, libertar-se do movimento automatizado e imediato do cotidiano, da ação impulsiva e pouco reflexiva.
Há muitas falsas asceses, que por serem meros exercícios não trazem consigo nem uma espiritualidade, nem uma forma de autoconhecimento de fato.
Entre a redução fenomenológica e a variação eidética
O se perguntar sobre a consciência Husserl irá propor um método radical para “vasculhar” o fenômeno, recuperando e modificando um conceito grego que é a redução fenomenológica (epoché).
Suspensão significa que não apagamos de nossa consciência o juízo que temos a respeito das coisas, porém a perspectiva husserliana é “por entre parênteses” o que é mais realista, porque não podemos apagar, ao menos completamente, a memória, no entanto esquecer o que pensamos sobre o que apreendemos sobre o mundo vivencial.
Assim Husserl consegue não fazer uma atitude elevada, como o cogito cartesiano que não apaga o ego, mas uma “atitude natural” para rever como relacionamos com as coisas do mundo.
Assim aprender algo significa captá-las como elas são, assim a fenomenologia procura enfocar o fenômeno no sentido de como ele nos aparece, sem usar o que já conhecemos previamente e suas aplicações de como já foi visto, tendo como objetivo atingir a sua !originalidade!, a sua “pureza” de fenômeno,
Significa deixar de lado todos os preconceitos, teorias, definições e tentarmos adquirir um novo conceito sobre as o mundo da vida, os fenômenos ao nosso redor e o sentido da “coisa”.
Com a epoché não se pretende propriamente duvidar da existência do mundo, nem, muito menos, suprimi-la. O mundo ao redor se apresenta só na consciência.
Para Husserl, os objetos do mundo já estão colocados para nós nas diversas perspectivas e adotamos quase imediatamente um sentido para ele, em geral o que não conhecemos atribuímos uma essência e esta deverá permanecer inalterada porque demos um sentido originário a este objeto.
O segundo conceito fundamental de Husserl é a variação eidética, justamente o que diferencia sua visão do eidos da cultura idealista contemporânea, onde chama de noema o que é do próprio objeto, o que é a coisa, que os antigos chamam de quididade, enquanto chama de noese do grego νόησις , significa a apreensão imediata que pode não ter a necessária dianóia, isto é, o pensar sobre a coisa que a liga ao noema.
Então a fixação nos objetos e a incompreensão de seu sentido por outro lado, é em parte do mundo contemporâneo, esta dessincronia entre noema e noese.