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O que é o meio divino
Em tempos de crise profetas, oráculos, “sábios” de Platão e todo tipo de falsa sabedoria vem a tona, como é importante e muitos buscam um sinal “divino”, vale a questão o que é o meio “divino” para os que não creem e para os que buscam na fé um motivo para ter esperança.
Para quem crê, cabe bem a passagem de João 3:13-1: “Se não acreditais, quando vos falo das coisas da terra, como acreditareis se vos falar das coisas do céu? E ninguém subiu ao céu, a não ser aquele que desceu do céu, o Filho do Homem. Do mesmo modo como Moisés levantou a serpente no deserto, assim é necessário que o Filho do Homem seja levantado, para que todos os que nele crerem tenham a vida eterna”.
As “coisas da terra” assim não estão então tão distantes, afirma a leitura ninguém subiu ao céu, exceto aquele que desceu, o Jesus filho de Deus e aos que não acreditam o Jesus terreno, homem histórico, que depois foi levantado numa cruz, para finalmente re-aparecer ressuscitado.
Voltemos a terra, explicando justamente o Meio Divino (Chardin, s/d), Chardin que escreveu: “no seu esforço em direção à vida mística, os Homens cederam muitas vezes à ilusão de oporem brutalmente o espírito e a carne, o corpo e a alma, como se tratasse do Bem e do Mal. Apesar de certas expressões correntse, esta tendência maniqueísta nunca foi aprovada pela igreja… “ (p. 117).
Assim entender a complexificação da vida humana, a concentração em grandes centros urbanos, a agitação, o excesso de ruído e principalmente a visão meramente econômica da vida levaram ao pensamento “natural” do idealismo, da visão puramente econômica e da onipotência do estado.
Assim olhai as coisas do alto, não significa “sair do mundo”, ainda que haja ordens puramente contemplativas e sejam sérias, ao falar da Cruz, Chardin mostra que “todo homem persuadido de que perante a imensa agitação humana [escreve isto na década de 30 já o dissemos] abre caminho em direção a uma saída, e que este caminho é subir” (p. 113), o destaque é do autor.
Aponta este caminho de subir, a escolha de princípios fundamentais, neste caso é a vida, e estão entre corajosos que triunfarão afirma o autor, e os zombadores que fracassam, pois não se elevam nem mesmo na vida concreta.
Assim o autor afirmará a realidade do Cristo histórico, que nos mostra como uma vida “no mundo” pode ser uma subida mística e concreta, “a apaixonante e insondável realidade do Cristo histórico” da qual tiramos muitos exemplos, e assim é a vida humana de um Ser Divino.
Assim, em tempos de pandemia, não só o gesto de se prevenir usando as condições de higiene, como os gestos sociais de auxílio aos que não tem emprego e aos idosos e familiares de contaminados pelo covid-19, assim como ajuda na família são exemplos de vida divina concreta.
E meio nesta noite de crise deixam sua lição de Amor mais profunda, dar sua Vida pelos homens.
A face do Outro na Pandemia
Embora o chamado isolamento horizontal tenha recebido o nome (no caso brasileiro) de “isolamento social”, um nome que seria mais próprio e menos agressivo seria o recolhimento familiar, em outros países também chamado de confinamento, como na França.
O reconhecimento do Outro nos familiares leva também a uma melhoria no relacionamento social, exceto os casos de famílias onde a relação familiar já se encontrava em situação de conflito extremo, a tendência será a de praticar atos de solidariedade e tolerância.
Isto é necessário para um bom convívio social, e para encontrar o rosto do Outro, que não é o mesmo, termo muito difundido na filosofia, Paul Ricoeur, Emmanuel Lévinas, Habermas, Agamben e Byung Chul Han, certamente esqueço vários já que o tema é presente na filosofia atual.
O instinto de auto defesa, que deve estar aliado a uma mudança do comportamento social, pode fazer do vírus um catalisador de uma mudança cultural, a do pensamento está em curso e a religiosa depende essencialmente daquilo que pensam aqueles que proclamam a fé e que deveriam sair da sacralidade de seus pensamentos para a substancialidade do mundo.
Teremos que socorrer pessoas para poder socorrer empresas, o trabalho e a própria educação, em todo mundo ferramentas de EaD (Educação a Distância), vídeo conferencias e os chats, que partindo das famílias podem ser reeducados, estão sendo largamente utilizados, o Brasil teve uma reunião inédita do Supremo Tribunal Federal por Skype, reuniões de condomínio, etc.
Alguns países como a Dinamarca e a Finlândia já anunciam a reabertura de escolas primárias, mas com alguns pais tendo restrição e medo de enviar os filhos, os adultos poderão se virar com formas de educação a distância, ao menos por enquanto.
Como será a reeducação religiosa com templos fechados, um pastor tocava sax para seus fiéis, outro colocou fotos dos paroquianos em sua celebração, mas um passo ainda maior precisa ser dado para que apareça a fé além da solidariedade social (muitas campanhas de alimentos para os mais pobres) que é o ato de misericórdia, o único capaz de fazer enxergar o rosto do Outro sem preconceitos e “exclusão social” daqueles que tem uma visão diferente da religião.
A eclipse de Deus e a pandemia
Martin Buber, que era judeu, dá o nome ao seu livro “A eclipse de Deus” (1952), pois para alguém que acredita, e se crê Deus não está morto, porém inegavelmente algum véu “sólido” o eclipsou na modernidade, que o faz parece em “dissolução”, conforme afirma Buber.
Concordo e é sempre minha análise, que a incompreensão da conjuntura do pensamento atual, já falamos da noite do pensamento nesta semana, Buber também afirma que foi a emergência do pensamento Idealista de Kant que afirma que “Deus não é uma substância exterior, mas apenas uma relação moral em nós”, e Hegel que vê Deus como uma abstração.
Entretanto a síntese hegeliana é tão poderosa, é o ápice do idealismo para diversas leituras que se pode fazer dele, a sua abstração vai confundir o trinitário divino, com uma “abstração absoluta”, usando as categorias em-si, de-si e para-si, onde o “para” não é um além, mas um voltar a si.
Não excluo duas vertentes fora deste contexto, porém o hegelianismo “jovem” de Marx encontrou Feuerbach, também a necessidade de negação do absoluto, e partindo da teologia atéia de Feuerbach (de certa forma também kantiana), o idealismo religioso de Steiner, Bruno Bauer e outros, que os chama de “são” Bruno, Steiner, etc.
O ‘Deus está morto’ de Nietzsche, é decorrente justamente de sua formação fideísta e fundamentalista, vindo de família luterana tentará negá-lo (a Deus) por toda sua vida, porém é importante lê-lo porque desvenda aquilo que chama muita gente a uma fé fundamentalista e pouco “substancial”, isto é desligada da realidade.
Chegamos ao fundo do posso no existencialismo moderno, e a crise pandêmica nos leva de volta a ele, a busca de uma razão para a existência, que procura saber se a insistência na “necessidade religiosa” não aponta algo inerente a natureza humana.
Este é o problema que “atormenta” Buber, que escreveu também Eu Tu onde ele praticamente afirma a existência de um Deus horizontal presente na relação humana, não sendo cristão é curioso pois descobre aquele que está “entre dois ou mais que estão em meu nome” (Mt 18,20), como uma relação com Deus, para os cristão é Jesus.
O problema central, que é o a Trindade, Deus pai, Jesus e o Espírito Santo, não será tratado por Buber, mas ao comentar o existencialismo de Sartre, como parte da crise existencial da modernidade, afirma: “Será que o existir, como o entende Sartre, não significa realmente estar aí ‘para si’, encapsulado em sua subjetividade, ou será que significa estar aí perante determinado X – não um X qualquer, ao qual se devesse atribuir determinada grandeza, mas o X por excelência, o indeterminável e perscrutável?“, questiona Buber.
O problema existencial é que sem o Deus “substancial” e ele existe se acreditamos que Jesus é Deus não é separável do Deus trino, e a fé é inseparável deste “meio Divino”.
A crise do pensamento ocidental e a pandemia
Velhas análises ainda fundamentadas no idealismo, que estudam o modelo do estado, os problemas econômicos e os modelos antropocêntricos não dão conta da nova realidade, a pandemia mundial foi causada por um vírus e pegou toda sociedade desprevenida, só em parte isto é verdade, no aspecto da saúde.
As análises líquidas continuam com discursos sobre obviedades, somos um só planeta, o problema é de todos, temos que rever valores, etc. porém aquelas que apontam para o futuro ainda vivem na penumbra de um pensamento sobre ideais que se esgotaram, mas não os discursos.
Edgar Morin que de longa data vem apontando para uma cidadania planetária, se aproximando dos 100 anos e mantendo uma cabeça lúcida, numa entrevista ao L´Observateur de 18/03 afirmou: “O confinamento pode nos ajudar a desintoxicar nosso modo de vida”, e na mesma entrevista aponta que “essa crise nos mostra que a globalização é uma interdependência sem solidariedade”, e que produziu uma unificação tecno-econômica do planeta.
Na mesma linha Byung Chul Han escreveu na Sociedade do Cansaço, que estamos todos na vida activa e ignoramos a vida contemplativa, no entanto a pandemia nos retirou do ativismo e ainda não sabemos o que fazer com o “ócio” de ficar em casa, há até discurso religioso que a chama de túmulo, mas falaremos nisto ao falar da noite de Deus e da religiosidade instrumentalizada de hoje.
Aos que não acreditam nesta análise, lembro que programas de sucesso como “reality show” agora são de fato realidades porque cada um a vive na sua casa, e “master chef” agora tem que acontecer na prática nas famílias porque restaurantes estão fechados.
Quanto ao aspecto tecno apontado por Morin não podemos esquecer que além dos noticiários globais, agora para o trabalho, para a educação e até mesmo para o lazer as videoconferências agora são realidades, ainda há quem pragueje contra elas, mas é esquizofrenia porque elas agora são necessárias e até para manter o comércio são imprescindíveis, até para as compras online, também os shoppings estão fechados.
A desintoxicação de nosso modo de vida não veio por um plano de governo, nem por uma grande mudança cultural, embora a pandemia sugira isto, mesmo nas nossas casas ainda procuramos as irrealidades da vida contemporânea, a pandemia, entretanto provoca uma mudança desta visão.
O oriente e alguns países, cito o caso de Portugal, estão tendo sucesso por causa de uma certa disciplina no #ficarEmCasa, quando Peter Sloterdijk em As regras para o parque humano falou sobre a falência da “domesticação humana”, não imaginava que um vírus podia demonstrar sua tese, sairão da crise mais cedo e terão menos mortos países com maior disciplina social.
Por ultimo as Redes Sociais (não confundir com as mídias tecno que falamos acima), a dinâmica da propagação do vírus segue a lógica das redes, e assim se estes estudos forem levados a sério poderemos estar mais prontos na defesa das vidas, não por acaso o infectologista Carl Latkin é um dos cientistas com maior publicação nesta área.
O sentido da dor e da Cruz
A morte nos causa dor, medo e até mesmo desespero; diante de uma pandemia ela revela aspectos de tragédia, ansiedade e apreensão, e tudo que podemos fazer para evitar uma dor maior fazemos, mas alguns vão além e se preocupam e se doam para reduzir a dor alheia.
Este é um significado humano, porém o divino vai além que significa ser capaz de doar a própria vida, ou pô-la em risco por amor ao Outro, só neste limite é que entendemos de fato o significado.
Teilhard de Chardin depois de admitir que a cruz significa uma “evasão para fora deste mundo” (p. 114), vai nos explicar que é justamente ela (no caso presente o medo da morte pela pandemia, “que exatamente o caminho do esforço humano, sobrenaturalmente retificado e prolongado. Por termos compreendido plenamente o sentido da Cruz, já nos não arriscamos a pensar que a vida é triste e feia. Simplesmente tornámo-nos mais atentos à sua indizível seriedade” (pag. 115).
Por isso pensamos nos dias felizes que podíamos andar livremente e saborear os ares da cidade, ver as praias agora proibidas de serem frequentadas, os almoços alegres em família, mas é por esta perda que olhamos agora com outros olhos cuja cegueira não podia permitir.
Como seria belo um domingo de Páscoa com toda família, ou simplesmente sair para ver dias alegres de outono no hemisfério sul ou início de primavera no hemisfério norte, mas é esta dor e esta terrível pandemia que nos faz “trocar os óculos”, também no aspecto espiritual.
Assim ressalta Chardin: “ a cruz não é uma coisa in-humana, mas super-humana. Vemos bem que a origem da Humanidade atual a Cruz estava erguida à frente da estrada que leva aos mais altos cumes da criação”, teremos que repensar a vida caseira e a social depois desta pandemia.
Convida-nos Chardin ao mistério: “aproximemo-nos mais. E reconheceremos o Serafim inflamado do Alverne (foto), aquela cuja paixão e cuja compaixão são “incendium mentis”*. Para o cristão, não se trata de desaparecer na sombra da Cruz, mas de subir na luz da Cruz” (pag. 116).
Aproveitar esta noite da pandemia para por luz na “noite da cultura”, na “noite de Deus” e na “noite dos sentidos” que parecia fazer-nos suprimir toda sensibilidade à vida humana e ao Outro.
Vivamos bem estas três “noites” para alcançar uma Páscoa (passagem) para toda humanidade.
*incendium mentis – David Grummet diz que em Chardin é “fogo do amor divino em nossa alma”.
Chardin, T. O meio divino. Lisboa: Editorial Presença, s/d.
Economia de “guerra” e pandemia
O único modelo econômico que temos de uma situação em que as forças produtivas da sociedade se desorganizam pela impossibilidade de ir ao trabalho ou pelo esforço concentrado em uma outra atividade é a economia de “guerra”, entretanto há uma diferença porque não é guerra entre povos, o inimigo agora é um vírus que tem o poder de fazer um estrago igual ao de uma guerra.
John Kenneth Galbraith escreveu depois dos atentados de 11 de setembro, acreditando numa possível guerra, que “em uma economia de guerra, a obrigação pública é fazer o que for necessário: para apoiar o esforço militar, para proteger e defender o território nacional, e especialmente para manter o bem-estar físico, a solidariedade e a moral da população”.
Claro o esforço militar pode ser trocado aqui pelo esforço médico, porém já acontece porque nem todas forças produtivas estão desorganizadas, a reorganização do oeconomicus, o sentido inicial na Grécia antiga que deu origem a palavra economia, ou seja, era a economia doméstica.
Porém a economia social deve se reorganizar, ainda me período de pandemia, setores paralisados como o turismo doméstico, a indústria de mecânica leve e pesada e a de bens de consumo podem ser repensadas em torno do “esforço de guerra”, em vários países a indústria automobilística foi chamada a fazer e restaurar equipamentos hospitalares, e hotéis são usados para abrigar alguns desabrigados, enfim é possível já repensar algumas coisas.
Também são um esforço importante os voluntários que atuam em comunidades carentes, fábricas de roupas podem fazer vestimentas (nos EUA) e máscaras para auxiliar a população, provavelmente isto deve continuar depois da pandemia, como mostram os países orientais, o uso de máscaras é comum no Japão e alguns países do oriente.
Também espaços familiares devem ser repensados, pessoalmente sempre construí um escritório fora ou isolado no ambiente doméstico, viralizou uma reportagem americana que a esposa do repórter entra no escritório dele corrente para retirar as crianças.
Também não fazíamos compras mensais, claro que a estocagem tem um lado perverso de poder aumentar ou mesmo desaparecer alguns produtos, como aconteceu no Brasil com o leite, e já o botijão de gás aparentemente há alguma especulação em jogo, mas devemos reorganizar a economia do “bairro” onde as pessoas possam se deslocar menos e fazer as compras mensais.
O principal é superar um modelo “economocêntrico” e pensar num biocêntrico, prefiro ao antropocêntrico porque os pets e a natureza também devem ser pensados na relação social.
Há um lado “pascal” não apenas pelo período que vivemos, e sim pelo número de mortes e a luta para diminuir este número, naqueles que tem sensibilidade há um sentimento de morte, porém a luta pela vida, o essencial que é o pão de cada dia e a ressurreição que virá dá este entorno pascal.
Uma cosmovisão em mudança
O modelo ptolomaico mudou a visão aristotélica de mundo criando um modelo de movimento em espiral para astros e planetas conhecidos na época, mudando a cosmovisão, mas foi Copérnico que mudou a visão que tirava a Terra do centro do universo e colocava o Sol, este modelo ajudou a cosmovisão antropocêntrica se opondo a cosmovisão teocêntrica.
A grande polêmica de Galileu com a visão teológica não era a visão cosmológica, mas a questão da interpretação e leitura bíblica pelo “vulgo”, não por acaso a primeira versão popular chamou-se de “vulgata” e ao aprofundar a leitura bíblica pelo “povo”, algumas interpretações exegéticas foram postas de lado, porque eram “temporais”.
Porém Galileo perante o Santo Ofício de fato afirmou “E pur si muove” (traduzindo o italiano e então se move) que poderia hoje olhando todo o universo dizer “E pur tutto si muove”, tudo está em movimento e a dinâmica não resiste mais a cosmovisão clássica Ser e Não Ser, há um terceiro excluído que pode ser pensado que é Não Ser ainda é Ser, a física quântica e o modelo das cordas indicam um terceiro estado, que já é utilizado em aplicações quânticas.
Assim os modelos teóricos e a cosmovisão idealista junto com seu modelo de universo ruíram já a algum tempo e mesmo o Modelo da Física Padrão que explicou a física das partículas parece em cheque com os estudos da matéria e energia escura que são nada mais que 95% do universo.
A visão de ver o mundo por choque de oposição aos poucos vai ruindo, ao admitir um terceiro excluído (assim o chama o professor da Sourbone Florent Pasquier, veja a figura) admitindo não uma síntese (fruto da oposição idealista tese e antítese), mas uma terceira possibilidade que conjuga com as outras duas.
Ela deve afetar o mundo religioso, é um grande apoio para um momento de unir mentes e corações para o combate da pandemia mundial, e pode ser o germe de grandes mudanças.
Uma referência bíblica para o assunto é o momento na cruz que Jesus grita a Deus, que já não o chama de Pai, diz a tradição que em aramaico língua da sua mãe Maria, e sente-se separado do Pai, ora na visão trinitária em que Jesus é também Deus, é um paradoxo separar-se do Pai.
Jesus na cruz está repetindo o Salmo 21 “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes”, e parece ser o grito de toda a humanidade diante da pandemia, e é possível também uma leitura do “terceiro excluído” onde aprendamos que a oposição tem hora e a resposta deve ser de todos.
Porém a explicação mística é justamente o terceiro excluído, a natureza humana de Jesus está religando-a ao Pai, se quisermos a visão noosférica de Chardin, ao Universo, diz a leitura que fez-se uma grande noite.
O sinal de e Lázaro e a pandemia
A pandemia veio nos alertar que não é a vida que importa mais a economia, postamos nesta semana que não é a oeconomicus da casa e da agricultura (dos alimentos diríamos hoje, pois o processamento de alimentos já faz parte da história), é a da especulação dos bancos e bolsas.
Ora é a vida que regime a economia e não o contrário, talvez um darwinismo econômico pudesse dizer na origem era o dinheiro e depois veio o homem, nada mais insensato, porém é claro que se uma economia vai a ruina a manutenção da vida fica no limite, fica assim nas guerras, vem a fome.
Porém o sinal da pandemia ainda mal lido até mesmo pelos economistas, e mais perdidos ainda alguns líderes e mesmo religiosos é o sinal de Lázaro (sua tumba ao lado), mais de meio milhão de infectados e a morte chegando não é razão suficientemente para a economia ainda mais forte do planeta querer parar.
A leitura atenta da bíblia revela que Jesus sabia da morte de Lázaro (Jo 11: 4-7) e não foi antes porque os judeus relutavam em mudar o estilo de vida da “lei” e da tradição, e queriam apedrejá-lo, porém Jesus explica aos discípulos que não queriam voltar a Judéia por medo, que isto deveria acontecer para que o povo de lá entendesse que era necessário uma mudança.
Que mudança o mundo espera, sim que vençamos a pandemia, mas o esforço global, a ideia de parar e reviver a economia doméstica que inclui a relação e o bem estar dos que nos são próximos requer uma “conversão”, uma mudança de atitude cultural, cuidar do que está ao nosso lado e se cuidar para não ser “infectado”, o sinal de Lázaro é que a morte vem, mas a cura também virá.
O importante é o que faremos depois para que nova crise não se instale, já tivemos a influenza e no Brasil a vacinação está começando, mas será que estaremos preparados para outra pandemia, sem entender que hospitais e a saúde econômica do povo, em especial, do povo simples é essencial, não entenderemos nada.
Lázaro não ressuscitou (mais tarde ele morreu de morte natural), ele apenas reviveu e Jesus afirmou que esta doença “não mata”, quer dizer a humanidade não será exterminada, mas a lição dura deve ser apreendida é a vida que rege a economia e não o contrário, e façamos nossa parte #FicarEmCasa e aplaudir os agentes de saúde.
Não querer curar-se
Um sistema em crise, seja por razão social, econômica ou política, ele tende a tornar-se mais confuso e tóxico até que encontre um caminho onde possa sanar-se, quando a razão é uma catástrofe natural ou uma doença não é muito diferente, porém estas afetam a vida diretamente.
Não querer curar-se e defender a vida é uma atitude de autossabotagem sejam por razões conscientes ou inconsciência explica a psicologia, é aquela atitude de criar obstáculos e empecilhos que atrapalham as tarefas para encontrar caminhos, neste caso a cura e a preservação das vidas, e assim acha que não há como atingir os objetivos de cura ou de co-imunidade, a imunidade conseguida pelas ações conjuntas.
Do ponto de vista cultural é ignorância, e neste caso a visão dos especialistas e agentes de saúde devem ser a visão “técnica” que prevaleça, sobre inclusive a econômica, trata-se assim de uma cegueira, dizer é só uma gripe ou estamos sem saída (autossabotagem inconsciente) é um fenômeno de dirigir a mente a pensamentos equivocados, e isto existem culturalmente.
Conta a narrativa bíblica que um homem ficou 38 anos numa cama e não conseguia chegar a uma piscina natural chamada de Siloé (em hebraico significa enviado) e preciso da intervenção de Jesus para dizer-lhe toma sua cama e anda (João 5:7-9), milagre mas também ruptura com a paralisia e neste sentido é também uma metáfora.
Mas há aqueles que julgavam enxergar e não enxergam, o cego de nascença que é curado na bíblia é alguém que não tinha um sistema cognitivo preparado para enxergar, e o fato que ele passa a ver é um milagre mas também uma outra metáfora, a que por cegueira cultural e contextual não é possível enxergar, ao sair deste contexto é possível que se possa ver.
Agora querer curar-se ou não é uma atitude psíquica, querer ver e tendo o sistema fisiológico para enxergar é preciso esforço e superar a autossabotagem que faz da cegueira uma zona de conforto.
A cura com-o-Outro
O psicólogo Carl Jung dá uma sentença ampliada daquela que muitas já disseram, entre eles Gandhi: “Não se pode ferir o outro sem ferir a si próprio”, assim também acrescentou Jung: “aquele que cura o outro, cura a si próprio”, em tempos de pandemia é bom pensar isto.
Os insensatos dizem, os mais velhos e doentes são o grupo de risco isto iria acontecer mesmo, porém mais pessoas infectadas e maior é o contágio social, e mais pessoas fora do “grupo de risco” são atingidas, estamos no momento exponencial nas Américas, é hora de cuidar-se.
As economias estão ruindo é verdade, mas junto com ela os modelos idealistas que já estão em crise a muito tempo, a agonia veio em função da fragilidade em que se encontravam, não se trata deste ou daquele modelo, todos os modelos atuais são centrados na “economia’ e no desenvolvimento, inventou-se durante um tempo o desenvolvimento sustentável, mas a natureza mostrou que este modelo é insustentável e os recursos são esgotáveis.
Voltemos a doença, fonte da cegueira atual, e prolongamento da crise cultural e noite de Deus, os apelos e profecias não faltam em todo canto, querem sinais e milagres como na cultura judaica do tempo de Jesus, porém o sinal está aí e é a cegueira que nos impedem de enxergar.
A crise era das mídias, ou das redes que são coisas distintas, agora são a salvação para manter os contatos com a devida distância, manterem empresas e escolas funcionando, não eram o mal.
Claro que não, a perda das relações independem dos meios (as mídias) que usamos, e colocar-se em rede agora parece mais claro é colocar primeiro diante dos mais próximos, cuidar e se ocupar deles, coisas que lembramos de serem feitas pelos nossos avós, que pareciam fechados e atrasados.
Salvar a economia mesmo que as pessoas morram, eis o fundamento de um mundo onde no fundo é a economia que todos estavam preocupados, talvez uma minoria pensasse realmente no bem estar e no equilíbrio da vida vivida na essência, sem luxo e com um certo “conforto”.
Por força das circunstâncias temos que pensar assim, afinal o oecomicus (em grego: Οικονoμικός), do escritor Xenofonte é um diálogo socrático que trata da economia doméstica e da agricultura, sim a economia evoluiu, mas não devia ter perdido suas origens, afinal ninguém foi aos shoppings, mas aos mercados para comprar a comida e poder #ficarEmCasa.
O tempo será curto, mas as crises ensinam pela tensão que as pessoas vivem, claro há gente que não acredita e pensa que é só uma gripe e vai passar logo, felizmente apesar de alguns governos irresponsáveis, a vigilância sanitária e os grupos médicos e governos locais estão trabalhando.
Não temos só que nos curar, é preciso curar e cuidar do outro, pois as consequências serão para todos, a descoberta desta interdependência é saudável para um mundo que começava a se fechar em nacionalismos e mentalidades autoritárias.