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O inefável e a interpretação
Antes de fazer o post de hoje, não podemos deixar de registrar as Olimpíadas de Tóquio, cujo abertura acontece hoje e alguns protestos: cinco seleções: Estados Unidos, Suécia, Chile, Nova Zelândia e para surpresa o Reino Unido, se ajoelharam antes de suas partidas de futebol em protesto antirracista, já as jogadoras do feminino da Austrália se abraçaram lembrando a nação aborígene que vive lá e significando a união nacional.
Mas talvez a mais importante manifestação ficou relegada a segundo plano, os manifestantes são chamados de “ultranacionalistas”, o que não é verdade, pois 43% da população era favorável ao adiamento da olímpiada, 40% era contra a realização e apenas 14% são favoráveis.
Era inefável a Pandemia e ela está aí ainda dando sinais de resistência apesar da luta da ciência para vacinas e sua superação, exatamente o povo mais resiliente não renunciou a um evento, e isto também é claro é um problema de interpretação do que de fato ocorre neste momento.
Algo inefável que não esteja sujeito a interpretação e mesmo metáforas seriam pouco para tentar explicá-las são as grandes questões da humanidade: o que somos no universo, para onde vamos e agora mais do que nunca: para onde iremos.
Muitas são as cosmogonias que tentam dar uma interpretação escatológica para estas questões, o certo é que existimos e não porque pensamos (penso, logo existo), mas existimos e isto nos permite o pensamento e a linguagem (sou, logo penso) e com ela é possível a interpretação.
A cosmogonia cristã, há muitas outras em diferentes culturas, é aquela cuja metáfora do grão de semente transforma em vida: a semente que cai entre espinhos, que cai em solo raso e que cai a beira do caminho, o terreno bom a fará germinar e dar frutos, é uma interpretação do inefável.
O texto bíblico da multiplicação dos pães, cuja interpretação terrena vê apenas a distribuição dos bens (Mc 6,1-15), não observa a interpretação inefável pois é Jesus que pergunta a Felipe (Mc 6,5): “Jesus disse a Filipe: “Onde vamos comprar pão para que eles possam comer?”, e depois de multiplicar os 5 pães de cevada e dois peixes, o inefável divino, os homens queria dar-lhe um poder terreno e diz a leitura (Mc 6,15): “Mas, quando notou que estavam querendo levá-lo para proclamá-lo rei, Jesus retirou-se de novo, sozinho, para o monte.”, é uma divina interpretação feita pelo próprio mestre.
O inefável e a metáfora
A viragem linguística é uma das hipóteses de interpretação da pós-modernidade, não a única, porém algo além da modernidade idealista já despontava na crise do início do século passado: a crise do pensamento, da sociedade (duas guerras mundiais), a guerra fria e agora a polarização.
Já postamos sobre a ligação da metáfora e o inefável em Paul Ricoeur e para ele a metáfora é um reagente (réactif) que revela o simbólico na linguagem, que nos leva a pensar por seu excesso de significação e assim é um modo de compreensão disponível ao hermeneuta.
Porém há algo além que é a possibilidade de uma hipótese, quantas questões científicas precisam recorrer a metáfora antes de uma explicação final, no trabalho de John Searle, em Expressão e Significado faz uma pergunta importante sobre o significa quando dizemos S é P e queremos dizer S é R? E que na verdade o ouvinte entre S é P.
Sua questão é no fundo saber “como funcionam as emissões metafóricas, isto é, como é possível para os falantes comunicarem algo ouvintes falando metaforicamente, uma vez que não dizem o que querem significar? E por que algumas metáforas funcionam e outras não? (SEARLE, 2002, p.112).
Segundo o autor ao pensar não devemos dispensar modos diferentes de compreensão (mito, alegoria, metáfora, analogia) e menos ainda métodos diferentes para interpretá-las: exegese, história, psicanálise, antropologia, linguística e outras, a meu ver, parece um princípio mais o universal por não fica confinado em algum campo metodológico e sujeito aos seus “vícios”.
Porém o inefável é parte inerente ao progresso do conhecimento humano, e significa estar além do lógico e do físico, estando naquele campo cujo nome mais apropriado é o inefável.
O modo como se pode chegar a esta compreensão é o chamado de “via curta”, e foi fundamentado na hermenêutica proposto por Martin Heidegger, ele consiste No modo como pretende fundamentar sua hermenêutica pelo desvio do que chama de “via curta”, proposta por Martin Heidegger ele consiste em não buscar os métodos ou as condições da compreensão, mas a partir do ser do homem, o seu Dasein, cuja existência consiste em compreender.
Respondendo a questão de Searle, não importa se o ouvinte entendeu exatamente S é P ou S é R, pois se S é P e isto foi aquilo que disse uma fonte, o destinatário entendeu exato ou não deve-se a sua existência enquanto ser que compreende, a sua cosmovisão, que pode ser limitada.
Admitir o inefável, que em certo momento só pode ser dito de modo metafórico, análogo ou mesmo exegético é admitir a convivência de visões de mundo diferentes, e pode ser isto é mais palpável que a compreensão daquele fenômeno em certo momento só é possível pela metáfora.
SEARLE, John R. Expressão e significado: estudos da teoria dos atos da fala. Martins Fontes, SP: 2002.
Vacinação acelerada e novas preocupações
A vacinação acelerou em julho conforme era a expectativa otimista, a queda de infecções e mortes cai num ritmo ainda muito lento e as novas ondas de infecção em países da região como Chile e Argentina acendem um sinal de alerta, o Perú já vinha em número alto e alguns países da Europa, como a Rússia, também mostram que a Epidemia está longe do seu fim.
A Argentina atingiu na quarta-feira (14/7) a marca simbólica de 100 mil mortes, alto para uma população de 44,5 milhões de habitantes, e entrou num novo lockdown, conseguindo já conter a nova alta, os números no final da semana voltaram a cair.
O Brasil como a Argentina chega ao número de vacinados de 16% e 11% respectivamente (ver o gráfico acima), enquanto a primeira dose no Brasil chega 44,5% e a Argentina 45%, os números próximos sugerem uma maior atenção para a possibilidade de uma nova curva ascendente, seria uma maior expansão da variante delta, fatores climáticos (Chile e Argentina são mais frios) ou ainda uma variante chamada de lambda, lá também a eficácia da Sputinik russa é questionada.
A variante lambda detectada no Perú assusta, chamada de C.37 seus estudos preliminares indicam maior letalidade e capacidade de driblar as vacinas é séria, o pesquisador Pablo Tsukayama, coordenador do laboratório de Genética Microbiana da Universidade Cayetano Heredia de Lima, detectou que a variante já é 100% dos casos infectados no Perú a partir de abril de 2021.
A falta de dados abertos prejudica a pesquisa, o próprio Ministério da Saúde do Perú não divulga e o professor Tsukayama é um dos que protestam a esta falta de acesso.
Outra questão que preocupa é a falta de dados científicos sobre a eficácia da vacinação para as novas variantes, há muita gente que dá declarações tentando contemporizar, porém não apresenta estudos científicos claros, por exemplo, sobre as variantes novas como a lambda.
Um destes estudos, apontado pelo jornal El País do dia 11 de julho passado, é do virologista chileno Ricardo Soto Rifo, que se concentrou na vacina CoronaVac, a principal usada no Chile, em um grupo de trabalhadores da saúde voluntário descobriu que a lambda apresenta “capacidade de infecção e de escape imunológico incrementada contra anticorpos neutralizantes”, o alcance de tal perda ainda está por ser esclarecida.
Outro estudo apontando no El País é o da vacina Pfizer e Moderna, é da Universidade de Nova York, apontando que os resultados foram “relativamente menores”, porém o professor Tsukayma faz uma constatação pouco animadora: “É praticamente impossível prever como um vírus sofrerá mutação”, porém diminuir a transmissão é possível por meio das vacinas e isto é o efetivo.
Interioridade e a relação social
Se a sociedade atual “isola” o indivíduo, e a pandemia o fez com maior profundidade, isto não significa que não seja necessário em uma vida urbana cada vez mais agitada, algum isolamento.
O drama cultural de nosso tempo é quando se “pressupõe exatamente a não satisfação (pela opressão, repressão ou algum outro meio) de instintos poderosos”, explicou Freud (ver o post sobre o Mal estar da civilização), ele expõe isto como uma “frustração cultural” que domina o campo dos relacionamentos sociais entre os seres humanos, mas Byung Chul Hang vai mais a fundo ao analisar o que é a dor.
O novo livro de Byung-Chul Han “A sociedade paliativa” vai descrever diante da dor a sociedade medieval como a sociedade do martírio, e a atual como Sociedade da Sobrevivência, e por causa da tentativa de viver na ausência da dor uma Sociedade Paliativa, tantos remédios antidepressivos, ansiolíticos e “analgésicos, prescritos em massa, ocultam relações que levam a dor” (Han, 2021, p.29).
Em uma análise curiosa para um budista, mas talvez pela consciência de que a Páscoa significa uma “passagem” pela dor para a vida eterna, o autor descreve: “em vista da pandemia, a sociedade da sobrevivência proíbe mesmo a missa de Páscoa. Também sacerdotes praticam o “social distancing” e usam máscaras de proteção. Eles sacrificam a fé inteiramente à sobrevivência … A virologia desposa a teologia.” (Han, 2021, p. 35).
Todos escutam os virologistas, diz o autor, a bela narrativa da ressurreição “dá lugar inteiramente à ideologia da saúde e da sobrevivência” (Han, 2021, p. 35), não se trata da vida e sim: “A morte esvazia a vida em sobrevivência”.
Utilizando Hegel o autor explica o verdadeiro sentido da dor: “A dor é o motor da formação dialética do espírito” (pg. 75), o percurso formativo é “uma via dolorosa: O outro, o negativo, a contradição, a cisão pertencem, portanto, à Natureza do espírito” (pg. 76) e assim a interioridade.
Explica o autor: “nisso ela distingue da vivência [Erlebnis], que não leva a nenhuma mudança de estado. Apenas a dor surte uma transformação [Veränderung] radical. Na sociedade paliativa, o igual se perpetua.” (pg. 77).
Jesus sempre após algum momento intenso de pregação ou de participação em algum evento social, retirava-se com os discípulos, era o momento da interioridade, porém muitas vezes as situações obrigavam a deixar o descanso de lado e voltar a ver o povo (Mc 6, 31-34):
“Ele lhes disse: “Vinde sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco” … Ao desembarcar, Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão, porque eram como ovelhas sem pastor” e Jesus voltou e foi ensinar outras coisas a eles.
Ele também teve momentos de dor anteriores a Páscoa, ao qual bebeu o cálice, e pouco descanso como na passagem acima.
HAN, Byung-Chul. Sociedade paliativa: a dor hoje. trad. Lucas Machado, Petrópolis: RJ: Ed.Vozes, 2021.
Caminhando para um futuro incerto
Palestras e livros motivacionais estão crescendo desde o início do século XXI, não importa muito a mensagem, o importante é levar as pessoas a uma força de ação que é a do desempenho.
Religiões tradicionais perdem adeptos para igrejas que trocam o discurso do pecado pela autoajuda e pelo desejo de reconhecimento e sucesso, a polarização política não deixa isto de lado um bom político deve demonstrar seus “feitos” e não sua isenção, equilíbrio e honestidade.
Longe de estar desdenhando a evolução tecnológica, ela é importante e podem auxiliar numa retomada co-imunológica, aquela em que descobrimos a mutualidade, o “exame” conforme descrito por Byung Chul Han apenas busca performance e ela pode incluir o desrespeito e as fake- News.
A sociedade repressora e disciplinar do século XX descrita por Michel Foucault (Vigiar e Punir) perde espaço para uma nova forma de organização coercitiva: a violência neuronal, enchem-se as fanpages, as lives exibindo performances e até mesmo exibindo violência, o que é preocupante é o excesso de informação pouco elaborada.
Interioridade, que é diferente de subjetividade, que é o que é próprio do sujeito, é aquele espaço interno que precisamos cultivar para tornar a nossa vida mais equilibrada, com pensamentos e atos mais positivos e que colaborem com o mutualismo, o sentimento de responsabilidade pelo outro, a consciência social, enfim, a coimunidade (a sociedade imunológica).
Chul Han aponta que a subjetividade, já presente em discursos de pensadores atuais, como a “sociedade pós-industrial” (Bell, 1999), “soeicdade do controle” (Deleuze, 1992), “capitalismo cognitivo” ou “economia material” (Negri e Lazzarato, 2001, Gorz, 2005) e “biopolítica” (Foucault, 2008) foram formas de expressão desta subjetividade, porém sem lançar mão da interioridade, todas citações de Byung Chul Han.
A sociedade é empurrada para um excesso de positividade como a chama Chul Han em sua Sociedade do Cansaço, o conceito disciplinar coercitivo (“tu deves”) imposto de fora, fez entrar em cena um novo enunciado (“nós podemos”), o qual, em seus aspectos mais imanentes, “remete a uma falsa liberdade ao impor aos indivíduos os imperativos do desempenho e autosatisfação.
A análise do autor parte do filme Cisne negro (Aronofsky, 2010) para explicar sua tese, a imposição de performance e desempenho mediante a autossuperação é incorporada pela protagonista que é levada as últimas consequências.
A sociedade do cansaço atual nada mais é do que a absolutização unilateral da “potência positiva” e o melhoramento cognitivo (neuro-enhancement) pode não representar nenhum problema moral, mas levará a um problema moral ainda maior na normatividade da sociedade do desempenho.
HAN, B. C. A sociedade do cansaço. Tradução de Enio Paulo Giachini. 2 ed. ampl. Petrópolis, Vozes, 2017. 128 pp
Tendência de queda e vacinação
Segundo o consórcio de veículos de imprensa o número de doses da vacina no Brasil chegou a 83.794.712 para a primeira dose, enquanto 28.108.088 a segunda, a este valor deve ser acrescido 2.465.295 doses únicas, num total de 114,3 milhões de doses aplicadas, espera-se que cresça para manter a curva de declínio que se observa nas infecções e mortes.
Em percentagens significa 14,4% que já receberam ou a segunda dose ou a Janssen que é dose única, enquanto a percentagem que recebeu a primeira dose fica próximo aos 40% isto está sendo importante para conter as variantes mais ofensivas, a delta e a delta plus, que já estão no país.
É preciso salientar que as análises clínicas indicam que a segunda dose é necessária para a nova variante, e uma faixa mais larga acima dos 60% começa receber a segunda dose, mas a aplicação da Janssen é a que deixa mais otimista porque o número de pode fazer a imunização crescer.
Quando atingiremos a chamada imunidade de rebanho que permitirá o relaxamento das medidas de proteção é a questão que todos queremos saber, Anthony Fauci, chefe do National Institute of Allergy and Infectious Diseases dos EUA, um dos médicos que lidera os esforços contra a covid-19 nos lá, faz a estimativa de que se deve chegar aos 70% da população, porém há outros que indicam que seria de 80 a 90%, pois o problema maior é a mutabilidade do vírus.
Pouco se comenta, mas as Ilhas Seychelles na Africa Oriental é o país mais vacinado do mundo, com 70% da população e o número lá ainda não caiu, há estudos tentando desvendar o mistério.
O Japão que tem números próximos ao Brasil, 17% para as duas doses e acima de 30% para a primeira dose já anunciou que não haverá público nas Olimpíadas que se iniciam daqui uma semana, e as viagens dos atletas serão monitoradas com todas medidas de proteção.
No ritmo da vacinação ainda são precisas todas as cautelas, sempre que houve algum relaxamento se verificou um aumento de casos e de mortes, esperamos que a curva se mantenha em queda
Um século de Vida: Edgar Morin
No dia de hoje (08/06/2021) o filósofo, educador, historiador e geógrafo francês Edgar Morin, nascido em Paris como Edgar Nahoum, adotou o codinome Morin depois que lutou na resistência francesa ao nazismo.
O jornal francês Liberation, publicou na quinta-feira (03/06) alguns trechos de seu novo livro que será lançado nesta semana, na França, “lições de um século de vida” (“Leçons d´un siècle de vie”, editora Denoel), com alguns trechos do livro, chamando-o de avô de todos os franceses.
No livro Morin diz que quando não estiver mais vivo, espera que as pessoas consigam se se “amar umas às outras e a si mesmas, em vez de continuar nessa regressão ocidental marcadas por neototalitarismo em gestação, e não deixa de citar a China.
No momento em que o mundo se fecha, e a questão identitária se torna relevante, pois divide os povos, Morin refletindo sobre suas próprias origens destacou em seu livro, conforme o Liberation: “Todo mundo tem a identidade de sua família, de sua aldeia ou cidade, a de sua província ou etnia, a de seu país e a maior, de seu continente. Cada um tem uma identidade complexa, ou seja, somos únicos e ao mesmo tempo plurais”, não se trata só de “tolerar” e sim de “amar” o Outro.
Alerta que “a história humana é relativamente inteligível a posteriori, mas sempre imprevisível a priori”, lembra a crise de 1929, a ascensão de Hitler e do nazismo, a desintegração da ex-União Soviética e o ataque às torres gêmeas do World Trade Center, suas reflexões sobre aquilo que chamou de “stalinia”, sobre a qual segundo o Liberation escreveu em seu livro: “Minha estadia de seis anos no universo stalinista me educou sobre os poderes da ilusão, do erro e da mentira histórica”.
Porém está longe de ser pensado como um conservador e mesmo um reformista, sempre sonhou com uma mudança estrutural na humanidade, que deve partir de uma mudança de mentalidade, do pensamento e da cultura, e reflete também sobre o populismo e o absolutismo religioso.
Aguardemos o livro, como sempre, trará novas reflexões, talvez até mesmo confissões de Morin.
No Brasil, em Brasília o Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasilia (CDS/ UnB) também lançara um livro com os 15 melhores artigos sobre Edgar Morin, já selecionados, em parceria com o SESC/SP, apoio da Cátedra Regional de Complejidad y Condición Humana de la Universidad CLAEH (Uruguai) (a imagem usada acima) e do EHESS/CNRS do qual Morin é pesquisador emérito.
Com 100 anos ainda revela uma lucidez inigualável nesta idade, e uma vitalidade e sabedoria únicas, félicitations Morin.
O todo, a parte e o Ser
Foi a partir desta teorização do todo que Werner Heisenberg deu início ao princípio quântico, quando formulou sua teoria não havia qualquer resposta de experiência científica, o que por si só já contesta o empirismo, e era uma “teoria” o que por si só contesta que a realidade é prática, mas foi a primeira tentativa, feliz porque depois a Física e a Ciência viriam em seu socorro, sobre partir do todo e não das partes como propunha o método cartesiano.
A verdade da física, porém vai se mudando ao longo do tempo, as novas descobertas sobre as novas descobertas de subpartículas (entre elas o bóson de Higgs), os 7 estados da matéria (junta-se aos três amplamente conhecido, o plasma (luz líquida), os estados de Bose-Einstein, gás fermiônico e superfluido de polarations, e pode haver um oitavo, assim já há uma para-física.
Porém já há, e sempre houve a meta-física (posterior a física), a modernidade quis reduzi-la a subjetividade (algo próprio do sujeito, mas preso apenas a sua mente), a ontologia atual, fruto da hermenêutica e da fenomenologia, recupera-se questionando o “velamento” do ser, e propõe uma clareira, a crise do humanismo não é outra coisa senão esta crise.
A pergunta filosófica sobre o tudo é “porque existe o tudo e não o nada” e isto supõe a ex-sistência, já a pergunta sobre o todo poderia ser, ela não é feita filosoficamente e sim apenas teologicamente, se existe “tudo” qual é a intenção que justifica a ex-sistência de tudo ?
A fenomenologia recupera a intencionalidade, uma subcategoria da consciência na filosofia medieval, com um sentido de estar dirigida a algo, ou de ser acerca de algo, assim ontológica.
Husserl a recuperou dirigindo-a a um objeto, categoria essencial no idealismo moderno, mas dirigindo-a algo que pode ser imaginário ou real, assim inclui-se a metafísica e o Ser.
Assim o fantástico da existência de tudo não é apenas sua existência, mas a intenção pelo Todo.
Qual é o todo e se existe é Ser, assim só Ele pode Ser além do todo universo que é locus, já que na física moderna o tempo é uma abstração, diz o físico italiano Carlo Rovelli, que está entre os mais respeitados.
Para os cristãos a entrada de Deus na physis acontece com Jesus, diz a passagem que Jesus pergunta quem dizem ser “o filho do homem” (Ele assim fala de uma de suas duas naturezas: divina e humana), e vai perguntar aos apóstolos o quem dizem que Ele é.
Os apóstolos respondem (Mt 16,14-16) {a questão do mestre: “Alguns dizem que é João Batista; outros que é Elias; outros ainda, que é Jeremias ou algum dos profetas”. Então Jesus lhes perguntou: “E vós, quem dizeis que eu sou?” Simão Pedro respondeu: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo”, e Jesus diz que ele é feliz porque foi Deus que o revelou.
Entre o Ser, o Nada e a interioridade
A primeira sensação ontológica, diante da racionalidade foi uma tentativa de confinar o Ser em sua subjetividade (que vem de sujeito) para tornar a relação com o Ente uma “objetividade” que existe fora do Ser (para a modernidade fora do sujeito).
Como ambas negam a a ex-sistência, aqui significa ex “sair de” e o verbo sistere “ser colocado”, assim existir é o que está colocado fora do ente, mais que a subjetividade é a própria essência do Ser, além do imaginário e do simbólico, do imaginário porque é o irrepresentável e o simbólico porque significa o não-sentido, mas aí estão toda essência e existência do Ser.
A concepção de negar a existência do ser, que tem que negar até mesmo a razão que a concebe, vem de Górgias (485-380 a.C.), sofista que Platão refutou em um livro, para ele não havia verdade e pode-se dizer que é o princípio longínquo para o relativismo.
A existência e realidade do Ser, embora velada, está na possibilidade de uma clareira, dela depende a abertura do Dasein, sua relação com a physis (a natureza no sentido geral dos gregos) e para a qual deve ser retirado o véu que cobre o ser, e assim a relação com o ente e a interioridade.
Se nos vemos apenas como vemos num espelho vemos a imagem do nosso ente, se vemos como somos significa que temos capacidade de ver além dele nossa interioridade, nossa complexidade e a partir delas como nos relacionamos com o todo do qual somos parte.
A projeção sobre a exterioridade e negação da interioridade é parte do esvaziamento do Ser na modernidade, somos o que fazemos e não importa muito o que somos de fato interiormente.
Deste esvaziamento nasceu o niilismo (nihil – nada), o solipsismo (o eu e minhas sensações) e de certa forma o subjetivismo (considerações só sobre o que é pessoal, uma interioridade vazia) e boa parte das teorizações prezas as dicotomias infernais (subjeito x objeto) e (natureza x Cultura).
Numa interpretação mais atual, na Sociedade do Cansaço, Byung Chul Han fala da interioridade, em outro livro A Sociedade da Transparência ele afirma: “hoje o mundo não é um teatro no qual são representadas e lidas ações e sentimentos, mas um mercado onde se expõem, vende e consomem intimidades” (HAN, 2017, p. 80).
HAN, Byung-Chul. Sociedade da Transparência Trad. Enio Paulo Giachini. Petrópolis, Vozes, 2017.