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Tendência de elevação da Covid 19
Em número publicados pelo próprio ministério da saúde, de variação nos dias 4 para 5 de maio, sábado e domingo em geral há subnotificação, o boletim epidemiológico já registra uma alta em torno de 8,9% com 21.682 novas infecções e 137 mortes pela doença.
Esta tendência vem se mantendo desde o início do mês e atingindo a taxa de 15% será considerada uma nova alta e uma nova onda, embora o número de mortes seja menor e se mantém uma média móvel abaixo de 100 mortes diárias, sendo média e tendo número acima de 100 poderá tornar a elevar-se, já que a média das infecções é maior e de mortes menor porque a cepa é menos letal que as anteriores.
O cálculo de médias móveis é feito por especialistas usando os registros dos últimos 14 dias e dividindo o total por 14, é possível assim ter uma visão mais ampla do atual momento da Covid.
Não há uma análise clara desta leve alta, talvez um efeito sazonal da chegada do frio que favorece as infecções respiratória, porém isto seria muito prematuro porque está acontecendo no hemisfério sul a menor de uma semana, talvez a maior capacidade de infecções da ômicron de segunda linhagem, a BA.2, o preocupante é que favorece a circulação do vírus e o perigo de novas variantes.
Exceto setores especializados que alertam para a questão, pouca atenção é dada a informação mais precisa sobre este futuro da SARS-Covid, apenas a situação da China que segue grave e agora até mesmo com denúncias de desumanidades devido a uma #lockdown excessivo e rigoroso.
Também o início do período eleitoral não favorece uma maior transparência da situação.
O Ser e a escuta na hermenêutica
Qualquer pessoa que tenha audição pode ouvir, porém é cada vez menos comum escutar com atenção o Outro, isto depende da concepção de Ser que intuitivamente temos, que em termos mais genéricos significam escutar com a alma e o coração aquilo que está sendo dito.
Toda a perspectiva da filosofia hermenêutica vai neste sentido e não por acaso tem como referência a obra Ser e Tempo de Heidegger, que entre outras coisas identifica a linguagem como “casa do ser”, assim escutar é ouvir com atenção o Outro, ou no caso da hermenêutica: o texto.
Esta desenvolvimento quando se trata de uma interpretação de texto (mas pode ser usado de modo mais amplo também para a comunicação oral) está expresso como círculo hermenêutico e foi mais completamente explicitado por Gadamer em sua obra “Verdade e método”.
Entre as etapas de “diálogo” hermenêutico está o reconhecimento de pré-conceitos, não no sentido negativo que é empregado no dia a dia, mas no sentido que temos um conjunto de conceitos pré-estabelecidos quando iniciamos uma leitura ou uma conversa, a leitura é uma escuta do autor pelo leitor.
A imediatez e os círculos viciosos das novas mídias impedem esta circulação e aceleram o processo que é chamado de “enxame” por Byung-Chull Han ou por “efeito manada” em diversos autores que não falam especificamente das novas mídias, mas de perigos decorrentes de processos como a guerra e o negacionismo diante de uma Pandemia ou perigos de contaminações diversos.
Na perspectiva bíblica isto significa “minhas escutam minha voz e me seguem” (Jo 10,27), no sentido atual é exatamente a leitura e interpretação de um texto, e a metodologia hermenêutica se aplica a isto, inclusive foi usada em seu início por Scheiermacher, mesmo antes de Husserl.
No caso bíblico é preciso atentar para a parte final do texto (Jo, 10, 29) onde se lê que o Pai (Deus) é que vai arrebata-las e “ninguém vai arrebata-las da mão do Pai”, neste sentido escutar é também ouvir o Espírito Santo através do qual entendemos melhor decisões e caminhos adotados.
O Ser, a interpretação e o diálogo
O conceito essencial da hermenêutica filosófica desenvolvida por Hans-Georg Gadamer critica o modelo do conhecimento tanto da interpretação histórica romântica, que visa apenas criticar ou aderir a uma reconstrução da intenção do autor (ela é feita principalmente relativa ao texto) e tem função tanto normativa quando teológica, quando olha-se para o Ser enquanto linguagem.
Assim corresponde à uma exigência de sentido do texto, aceita o vínculo com seu conteúdo, não visa explicitar o tema ou o conteúdo de um texto, aceita o caráter vinculativo do conteúdo, ou seja, tem uma orientação essencial ao modo humano de habitar o mundo, vinculante a cultura.
Compreender é nesta perspectiva aplicar, não de modo mecânico ou lógico (no sentido dual), e sim traduzir o texto para a própria linguagem da sua situação concreta, em sua totalidade.
Compreender é assim antes de tudo o ato compreendido, aplicado àquela situação ou aquele algo e assim nada tem a ver com um fazer e um saber técnico, ou seja, este última nada acrescenta ao modo de ser e á situação do intérprete, que é mera habilidade automática e causa-efeito.
Deve-se colocar em jogo então as regras dos preconceitos próprios, abrindo o diálogo que por eles são proporcionados, ocorre assim uma fusão de horizontes, depois em novo passo de ouvir o texto, e só então é possível aplicar um sentido ao texto e interrogar-se.
Neste contexto o diálogo é possível, senão há um fechamento dogmático sem a capacidade de ouvir o Outro além dos pré-conceitos e das intencionalidades dos leitores e/ou autores.
É preciso acentuar a necessidade de mediação que se faz através de ideários comuns que são transmitidos pela tradição histórica ou literária, para Gadamer, tal mediação é que faz pensar e transmitir práticas de relacionamento e de comunicação, e sem elas há dificuldade de diálogo.
A fenomenologia como método para o diálogo
A fenomenologia é essencial para um verdadeiro diálogo porque ela pressupõe um partir do zero, dito de forma filosófica, pressupõe um epoché (uma suspensão de juízo no sentido grego) porém a epoché fenomenológica é um colocar entre parêntesis, isto é, admite o diálogo com a tradição ou com o leitor ou interpretante do texto.
Ela surgiu como método em contraposição ao pensamento positivista, através dos estudos de Edmund Husserl (1859-1938), e como método de investigação filosófico vai captar a essência e o significado de determinada coisa, dito por Husserl: “não há consciência, apenas consciência de algo”, e isto vem de uma subcategoria que é a intencionalidade, Franz Brentano e Tomás de Aquino havia trabalho isto porém apenas com sentido psicológico ou mental.
Dito por Husserl ela é: “a descrição daquilo que aparece ou ciência que tem como objetivo ou projeto essa descrição”, assim parte da ideia que projetamos nossa intencionalidade ao descrever.
Heidegger vai colocá-la retomando a ontologia agora num plano diferente do psicológico e colocando-a como um método: “a expressão ‘fenomenologia’ significa, antes de tudo, um conceito de método”, neste sentido será também uma ruptura com o idealismo e o racionalismo tradicional.
“Uma das contribuições da fenomenologia para a filosofia está no modo de tratamento de juízos e significados. Martín Heidegger não separa a razão da emoção, nem o sujeito do objeto”.
A questão da existência do Ser volta-se para a preocupação com o modo de vivência humana, ou nossos pré-conceitos ou ainda nossas racionalizações, ela não pode isolar-se do relacionamento com o mundo e com os Outros, toda filosofia contemporânea busca um modo de Ser coisificado, isolado, seja objetivo ou subjetivo, pois também no campo da poética, da subjetividade e da religião este desvio é observado.
O Ser deve representar uma presença, um manifesto, ou uma relação com o Outro, e uma exigência é a simetria desta relação, onde cada um é capaz de fazer um “vazio” para conter o Outro, um epoché de seus pré-conceitos, sem o qual não há diálogo.
Uma primeira vista sobre este diálogo, está o círculo hermenêutico proposto na figura acima.
A paz dos pacíficos
Há diversos equívocos sobre a paz, alguns foram apontados por Kant tais como pactos que escondem futuros conflitos, a justa revolta contra regimes totalitários, porém não há como se construir a paz sem pacíficos, as ideias que se deseja a paz prepare-se para a guerra é um equivoco ou com os violentos haja como violento, etc. escondem pequenas e grandes guerras.
Todo exercício de poder é assimétrico aponta Byung-Chull Han (O enxame), no livro que faz um ensaio exatamente sobre as novas mídias, e que diz que só há simetria se há respeito.
Então o respeito as culturas, a diversidade de opiniões e ideias, de liberdade religiosa, de opções pessoais de diversos tipos, claro que não impliquem no desrespeito ao Outro, é um ponto de partida para a paz, assim é preciso que haja pacíficos para se construir a paz.
A ideia de mais armas, de mais agressões que possam intimidar adversários escondem que não há princípio pacífico nestas atitudes, que não há respeito como pede Chul Han, e para aqueles povos, países e nações que tem princípios pacíficos, como Finlândia e Índia por exemplo, é preocupante ver atitudes belicistas evoluindo.
Por outro lado, a vitória de Makron na França é um alento principalmente devido a derrota de um pensamento totalitário no país que é fonte da democracia republicana moderna.
A paz deve ser também a base de qualquer pensamento religioso, admitir que há algo ou alguém superior deveria nos despir de orgulho de se julgar superior a alguém, a algum povo, raça ou gênero, mas a história mostra que não foi sempre assim, lembro aqui o Paz da Vestfália que foi um pacto para que as religiões não incentivassem o ódio entre os estados, com isto a ideia de estado laical.
Em várias passagens bíblicas Jesus faz a primeira saudação aos seus discípulos: “A paz esteja convosco”, claro fala da paz dos pacíficos, e no versículo das bem-aventuranças diz que serão chamados de “filhos de Deus” (Mt 5,9), ou seja, não são cristãos se não desejam a paz.
Também para seus discípulos Jesus que aparece ressuscitado em sua terceira aparição e pergunta insistentemente a Pedro (Jo 21, 15-17): “Depois de comerem, Jesus perguntou a Simão Pedro: “Simão, filho de João, tu me amas mais do que estes?” Pedro respondeu: “Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo”. Jesus disse: “Apascenta os meus cordeiros”. E disse de novo a Pedro: “Simão, filho de João, tu me amas?” Pedro disse: “Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo”. Jesus lhe disse: “Apascenta as minhas ovelhas”. Pela terceira vez, perguntou a Pedro: “Simão, filho de João, tu me amas?” e Pedro chega a ficar triste e diz “tu sabes tudo”.
Sim Jesus sabia que mesmo entre religiosos haveria dificuldade de entender a paz e a unidade.
O idealismo da Paz perpétua
A Paz Perpétua era a proposta política de Kant de certa forma ela está expressa na visão liberal do pensamento sobre a paz, com algumas nuances em países vindos do período soviético, porém via de regra o normal lá é a visão romana da pax romana que era a submissão dos inimigos.
Conforme vimos no post anterior, para Kant, esperto como as serpentes e falso como as pombas, também Maquiavel de um modo muito diferente em seu “Príncipe” falava em dividir para reinar, princípio que é analisado por Kant ( Divide et impera, p. 39), neste caso para como uma falsa liberdade de ideias opostas quando o chefe supremo “desune-as e isola-as do povo”.
A obra À paz perpétua foi escrita pelo filósofo alemão Immanuel Kant, em 1795. A singularidade da contribuição de Kant está na sua fé em uma paz perpétua que se constrói porque a razão tem mais força do que o poder, “ … visto que a razão, do trono do máximo poder legislativo moral, condena a guerra como via jurídica e faz, em contrapartida, do estado de paz um dever imediato, o qual não pode todavia estabelecer-se ou garantir-se sem um pacto entre os povos: – tem, pois, de existir uma federação de tipo especial, a que se pode dar o nome de federação da paz (foedus pacificum), que se distinguiria do pacto de paz (pactum pacis), uma vez que este tentaria acabar com uma guerra … “ (KANT, 2008, p. 17-18).
Mas quando seria então justo fazer a guerra? Qual seria o limite da razão? Kant fala primeiro da revolta no interior de uma nação submetida a um tirano: “Será a revolta o meio legítimo para que um povo rejeite o poder opressivo do chamado tirano [non titulo, sed exercitio talis (‘tirano no exercício do poder, não na sua denominação’)]? Os direitos do povo são conculcados e a ele (ao tirano) não se faz injustiça alguma por meio da destronização; a este respeito não há qualquer dúvida. No entanto, é sumamente injusto, por parte dos súbditos, reivindicar assim o seu direito, e não podem também queixar-se da injustiça se nesta luta forem vencidos e tiverem, depois, de suportar as mais duras penas” (Kant, 2008, p. 47).
Conforme vimos no post anterior, para Kant, esperto como as serpentes e falso como as pombas, também Maquiavel de um modo muito diferente em seu “Príncipe” falava em dividir para reinar, princípio que é analisado por Kant (. Divide et impera, p. 39, neste caso para como uma falsa liberdade de ideias opostas quando o chefe supremo “desune-as e isola-as do povo”.
Há pontos interessantes em sua proposta dividida em artigos: uma constituição civil republicana (hoje há povos com outras formas de governo e que nem sempre são tiranias), uma “federação de nações livres” como o princípio da hospitalidade (o problema dos migrantes hoje) e depois faz uma série de “suplementos” para a paz perpétua, mas basicamente é uma defesa da razão.
Toca também na interessante, já dissemos referentes isto às guerras mundiais, que a paz não deve se fundar em possibilidades que podem abrir novas guerras futuras.
Hoje deve-se analisar a luz da cultura originária dos povos, não apenas indígenas e diversas nações pré ou pós iluministas (onde impera certa forma de razão, lembre do Estado Grego e do direito Romano), e também o desequilíbrio econômico, bélico e agora também cibernético.
A paz perpétua não é uma paz eterne nem paz duradoura, esta deve atentar para uma civilização mais humana e fraterna, sem a qual qualquer argumento para a guerra é possível.
KANT, I. A paz perpétua. Trad. Artur Mourão. Portugal: Universidade da Beira Interior Covilhã, 2008
Twitter, Cibercultura e Paz Perpétua
A compra do Twitter por Elon Musk por U$ 44 bilhões, o bilionário da Space X e da Tesla, tornam as mídias de redes sociais cada vez mais atreladas ao campo político e balança o império das mídias tradicionais.
Uma das ideias básicas de Musk é tornar a rede menos controlada (a função de moderador) e com mais possibilidade de texto, no lançamento em 2006 era de 140, em 2017 foi ampliado para 280 e provavelmente acrescentará textos maiores, Musk é proprietário da ferramenta Revue.
A NetFlix perdeu 200 mil assinantes (pouco para 100 milhões de assinantes, mas uma tendência), CNN enfrenta fortes problemas com um discurso editorial (7 em cada 10 telespectadores) tenta mudar o enfoque, é a grande mídia sofrendo com o avanço das novas mídias, e tudo indica que a guerra no campo bélico e ideológico vai se deslocar para o campo cibernético, os drones praticamente aposentam a ideia de uso de tanques e aviões com autonomia de voo e de voo tornaram a guerra desigual em força e material bélico mais igual.
Mas a liberação da arbitragem no Twitter preocupa, embora a proposta de algoritmo de código aberto seja interessante, mas a grande questão são as ideias sobre a guerra de Musk.
Claro tudo isto é condenável pelo número de vítimas civis que causam, pelas tragédias humanas que ali se desenvolvem também entre militares que estão num campo de batalham onde muitos não gostariam de estar.
A Paz Perpétua de Kant trazia a proposta de um preceito da razão sobre o poder, porém um estranho ditado aparece no meio de seu texto (analisaremos o texto no próximo post), que é prudentes como as serpentes e suave como as pombas, no texto bíblico (Mt 10:16)é possível também se traduzir “simples como as pombas, porém a interpretação kantiana é divergente:
“…Sede prudentes como a serpente»; a moral acrescenta (como condição limitativa): «e sem falsidade como as pombas” (Kant, 2008, p.34), e o próprio Kant aponta que “as duas coisas não podem coexistir num preceito” uma contradição evidente, a Paz Perpétua é mais complexa, claro.
Este é o problema das novas mídias, é preciso usar o recurso muito usado na política de certa “falsidade”, ou dubiedade quer seja para despistar os opositores, quer seja para iludir o povo.
Não há como estabelecer a paz se não há respeito de culturas e valores conflitantes, claro dentro de limites humanitários razoáveis, o primeiro é a própria vida posta em cheque na guerra e o segundo é possibilitar a sobrevivência e autodeterminação dos povos para decidir seu destino.
KANT, I. A paz perpétua. Trad. Artur Mourão. Portugal: Universidade da Beira Interior Covilhã, 2008
Razão, crença e a guerra 2
A relação da ciência e da crença na lição de Bourdieu: “O empreendimento paradoxal que consiste em usar de uma posição de autoridade para dizer com autoridade, para dar uma aula, mas uma aula de liberdade … seria simplesmente inconsequente, ou mesmo autodestrutivo, se a própria ambição de fazer uma ciência da crença não supusesse a crença na ciência” (Bourdieu, 1994, p. 62), pode ser melhor expresso pelo princípio da transdisciplinaridade.
Estabelece a Carta da Transdisciplinaridade de Arrábida em um de seus princípios: “Considerando que a rutura [ruptura no Brasil] contemporânea entre um saber cada vez mais cumulativo e um ser interior cada vez mais empobrecido leva à ascensão de um novo obscurantismo, cujas consequências, no plano individual e social, são incalculáveis”. (Freitas, Nicolescu e Morin, 1994)
A ideia da ciência fundamentada num cálculo (incluindo o econômico) ou a físico que permite avançar no mistério do infinito universo, com wormholes (caminhos de minhoca), buracos negros e matéria escura, não podem prescindir do mistério que está além daquilo que o homem já conquistou.
Do lado político a crença no estado moderno que substituiria Deus e poderia estabelecer uma paz perpétua (o projeto filosófico de Kant) assim como a ciência como cume da “razão” já mostraram seus limites, também a fé fundamentalista, que já o era com os fariseus no tempo de vida terra de jesus, tem limites de ignorar a ciência, mesmo querendo uma ciência da crença, o paradoxo apresentado por Bourdieu.
Nem a paz perpétua de Kant nem os avançados estudos científicos permitiram evitar a guerra e o mundo está de novo a beira de uma nova catástrofe humanitária, e também é que que se ressalte também o fundamentalismo religioso não consegue aboli-la como o “Decálogo de Assis para a Paz” assinada em Assis em 4 de março de 2002, ainda que a defendam isto até hoje.
Os fariseus queriam o envolvimento de Jesus com a guerra contra Roma, que acontecerá nos anos 70 da era cristã, com a destruição de Jerusalém e de seu templo Santo como era previsto nas profecias, não porque Jesus o desejava, mas pela guerra que os homens desejavam.
Após a Pascoa judaica, e a Paixão e Ressurreição de Jesus que foi nossa Páscoa, Jesus aparece aos discípulos e o apóstolo que não acreditava Tomé estava com eles, a primeira saudação de Jesus é: “A paz esteja convosco” (Mt 20, 21), sopra o Espírito Santo sobre eles e diz a Tomé que queria provas materiais de sua ressurreição: “Põe o teu dedo aqui e olha as minhas mãos. Estende a tua mão e coloca-a no meu lado. E não sejas incrédulo, mas fiel” (Mt 20,27) e após dirá que s]ao felizes os que acreditam sem terem visto.
KANT, I. A paz perpétua: um projecto filosófico. Trad. Artur Mourão. Ed. Universidade da Beira Interior. Portugal: Covilhã, 2008.
FREITAS, L., Nicolescu, B. e Morin, E. Carta da Transdisciplinaridade. Portugal: Convento de Arrábida. 1994.
Razão, crença e a guerra
A evidência de duas guerras mundiais, onde a racionalidade foi desafiada pelas barbáries dos campos de concentração, das atrocidades cometidas, e inclui-se também a bomba de Hiroshima, dão provas que é preciso examinar com profundidade aquilo que construiu o que chamou-se de razão passando pela crítica da razão pura de Kant e pelo seu desenvolvimento da razão prática.
Na abertura do livro “Desencantamento do Mundo”, Pierre Bourdieu introduz sua análise das estruturas econômicas e temporais assim: “Aqueles que colocam a pergunta ritual dos obstáculos culturais ao desenvolvimento econômico interessam-se de modo exclusivo (isto e, abstrato) pela “racionalização” das condutas , econômicas e descrevem como resistências, imputável somente a herança cultural (ou, pior ainda, a tal ou tal de seus aspectos, o Islã por exemplo), todas as omissões para com 0 modelo abstrato da “racionalidade” tal como a define a teoria econômica.” (BOURDIEU, 1979, p. 11).
A história recente de nosso processo civilizatório desenvolve o aspecto físico (e portanto apenas material) e o cálculo matemático, em especial as racionalizações das estruturas econômicas, ao citar Max Weber explica o autor: “o caráter próprio a época capitalista [escreve Max Weber] e – um na raiz da outra – a importância da teoria da utilidade marginal (assim como de toda a teoria do valor) para a compreensão desta época consistem em que. do mesmo modo como a história económica de um sem-número de épocas do passado) foi chamada acertadamente de «a história do não econômico”, nas condições presentes da vida, a aproximação desta teoria e da vida era, é, e pelo que se pede julgar, será cada vez maior e devera determinar 0 destino de camadas cada vez mais amplas da humanidade. E deste fato histórico-cultural que deriva 0 significado heurístico da teoria da utilidade marginal” (BOURDIEU, 1979, p. 17).
Sua análise é bastante extensa e quase completa (explico a frente) para ser sintetizada aqui, porém o aspecto que nos interessa da cosmovisão cultural “não-econômica” que é o da crença e pode ser explicitado numa frase sua sobre como vê a relação da ciência e da crença: “O empreendimento paradoxal que consiste em usar de uma posição de autoridade para dizer com autoridade, para dar uma aula, mas uma aula de liberdade … seria simplesmente inconse- quente, ou mesmo autodestrutivo, se a própria ambição de fazer uma ciência da crença não supusesse a crença na ciência” (Bourdieu, (1994, p. 62), que significa que é preciso conjugar razão e crença.
A guerra atual envolve estas crenças econômicas (e ideológicas, e incluem crenças religiosas), e não é assim nem uma razão prática, nem teórica, a paz é possível se limitarmos as crenças ao princípio comum de defender a paz para o processo civilizatório (já que o conceito de progresso é também uma crença em determinado sentido da “histórica econômica”).
BOURDIEU, P. O desencantamento do mundo: as estruturas econômicas e estruturas temporais. Trad. Silvia Mazza, São Paulo: Editora perspectiva, 1979.
BOURDIEU, Pierre. Lições da aula. São Paulo: Ática, 1994.
A sociedade paliativa ou a ausência da dor
A sociedade paliativa explica Byung Chul Han nada tem a ver com a medicina paliativa, pois explica o filósofo coreano-alemão: “Assim, cada crítica da sociedade tem de levar a cabo uma hermenêutica da dor. Caso se deixe a dor apenas a cargo da medicina, deixamos escapar o seu caráter de signo” (Han, 2021).
Lembra um ditado de Ernest Jünger: “Dize tua relação com a dor, e te direi quem és!”, assim não é possível uma crítica sociedade sem uma hermenêutica da dor, a relação com cada sofrimento não só o produzido pela história, mas aquele que está na particularidade de cada Outro.
“A sociedade da sobrevivência perde inteiramente o sentido para a boa vida. Também o desfrute é sacrificado à saúde elevada a um fim em si mesmo” (Han, 2021, p. 34).
Lembra e cita Agamben na sua visão de homo sacer e via nua: “Sem resistência sujeitamo-nos ao o estado de exceção que reduz a vida à vida nua” (Han, 2021, idem).
Na sociedade paliativa “A arte de sofrer a dor se perdeu inteiramente para nós … A dor é agora, um mal sem sentido, que deve ser combatido com analgésicos. Como mera aflição corporal, ela cai inteiramente fora da ordem simbólica” (Han, 2021, p. 41), os grifos são do autor.
Assim hoje remove-se a dor qualquer possibilidade de expressão, ela está condenada a calar-se, e “a sociedade paliativa não permite avivar, verbalizar a dor em uma paixão” (p. 14), grifo do autor.
HAN, Byung-Chul. A sociedade paliativa: a dor hoje. Trad. Lucas Machado. Petrópolis: Vozes, 2021.
VARGAS, Cecília. Systems of Pain/Networks of Resilience project in one gallery. Curated by Cecilia Vargas, Dickson Center at Waubonsee Community College, June 2018 (foto).