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Guerra declarada e perigos
Após a Rússia declarar abertamente que está em guerra com a Ucrânia em uma semana de fortes ataques com mísseis sobre Kiev, usando inclusive o espaço aéreo da Polônia, que gerou tensão, a Ucrânia respondeu com outro grande ataque a Criméia e as refinarias de petróleo.
O ocidente ficou em alerta porque o preço do petróleo deverá subir, e a tensão com a Otan e a Europa já está em níveis elevados, as declarações de Putin e Macron com provocações de ambas partes, a colocação de tropas russas na fronteira da Finlândia, e um atentado do Estado Islâmico a uma casa de shows em Moscou.
Desde o início o clima de tensão é o mais alto nesta semana da semana santa, não faltarão os falsos profetas e insufladores de ódio para piorar a situação, como disse Eduardo Galeano sobre a guerra aquilo que o ódio da guerra não fez a mídia completa, sempre houve analistas frios que pensam a guerra como política desde Sun Tzu sobre a arte da guerra, até Carl von Clausewitz foi ressuscitado para justificar a injustificável “arte” da Guerra.
O pequeno território autônomo da Transnístria (imagem) foi abalado pela derrubada de um helicóptero militar, está dentro da Moldávia e governado por forças pró-Rússia e é causa de temor da Moldávia que é membro da OTAN.
No outro fronte perigoso, dentre as muitas guerras pelo planeta é a crise na Palestina, é outra guerra de forte polarização, onde a solução da crise parece distante, com ódio cada vez maior de parte a parte e que pode se alastrar por todo oriente médio.
Além do problema do petróleo, o crescente perigoso na circulação marítima de grãos e produtos industrializados pode gerar uma crise de abastecimento e afetar o problema da fome que já é comum em muitas áreas do planeta.
Não se trata de visão apocalíptica nem profética, se ela existe é para poucos e a maioria são charlatães e especuladores, porém a crise civilizatória já tem um horizonte bastante visível.
Edgar Morin e outros analistas serenos e com bom senso clamam pela “resistência do espírito”, não deixar-se contaminar por este clima de ódio, violência e terror que assola quase todos os 4 cantos do planeta.
Conservar a alma e o coração puros e um espírito forte que enfrente as tempestades.
Ameaças de guerra total
As declarações de Macron e Putin assustam a Europa, embora a neutralidade não seja o termo exato para o envolvimento devido a presença da OTAN em vários países, agora Suécia e Finlândia, fronteiras com a Rússia.
Em entrevista ao jornal Le Parisien, publicada sábado passado (16/03), Macron declarou: “Prepare-se para todos os cenários possíveis” na e acrescentou “talvez em algum momento isso tenha que ser feito”, e “todos assumirão suas responsabilidades”, provocando reações de diversos tipos, umas contra e outras a favor.
Em resposta, Putin disse que, caso algum país do |Ocidente envie tropas à Ucrania, uma guerra entre a Rússia e a Otan seria inevitável, e ameaçou usar armas nucleares “capazes de destruir a civilização”.
Putin tem uma maleta com um comando e controle eletrônico altamente secreta chamada de “Kazbek”, acredita-se que também o ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu, e o chefe do Estado-Maior russo Valery Gerasimov, também tenham estas maletas, elas controlariam mais de 4300 ogivas nucleares.
Também os planos da OTAN para implementar um modelo rotativo de defesa aérea na Lituânia estão tomando forma, de acordo com o ministro da Defesa lituano, Arvydas Anušauskas.
A eleição da Rússia com 87% dos votos para Putin foram criticadas no Ocidente, a Alemanha chamou de “pseudo-eleições”, os jornais franceses de “simulacro”, enfim opositores presos ou mortos e muita repressão a oposição.
Putin afirmou que a Russia consideraria testar uma arma nuclear caso os Estados Unidos o fizessem, em 2023 o presidente russo retirou a Rússia do Tratado de Proibição Total de Testes Nucleares (CTBT, em inglês), embora seja noticiado que a Rússia não realizou nenhum teste, recentemente, testou o míssel Bulava (SS-NX-30 na classificação da Otan) pode ser equipado com dez ogivas nucleares.
O tom subiu, mas também a resistência do espírito e da esperança não diminuiu, a paz é possível.
Vozes solitárias pela paz
O escritor uruguaio Eduardo Galeano se posicionou contra a guerra, famoso por ter escrito “As veias abertas da América Latina”, que foi autor de mais de 40 livros, destaco entre eles O livro dos Abraços, tem uma gravação que voltou a ser divulgado no youtube pelo impacto que tem.
Começa sua fala dizendo: “Nenhuma guerra tem a honestidade de confessar: eu mato para roubar” e depois vai desmascarar os vários falsos motivos pelos quais tentam justificar suas atitudes, “as guerras sempre invocam nobres motivos, matam em nome da Paz, em nome de Deus, em nome do progresso” e outros, mas se não conseguem tem as mídias para ajudar, e não se tratam apenas das novas mídias, falava em seu tempo da grande imprensa.
A cultura tóxica de que alguém tem a solução para os grandes problemas do mundo, que há algum grupo “iluminado” evita a abertura ao diálogo, a encontrar os caminhos da paz.
Os antigos modelos propostos: a pax romana que submete os povos, a paz eterna que é o modelo idealista, a paz que resolve os problemas de justiça social, todas elas invocam a guerra em última instância.
Houve um tempo que era possível os povos saírem as ruas e reivindicarem a paz, e chamarem as autoridades para a insanidade de suas posições provocativas e insufladoras da guerra, ainda que disfarçadas em promessas de paz como dizia Galeano, e todas elas escondem o roubo, a ganância por riqueza e a pilhéria dos povos e dos pobres.
Também de pouco vale os espíritos “elevados” que fazem belas frases românticas e ideais, que nada tem de realidade ou de serenidade, são apenas alienação consciente ou inconsciente, são vozes que fogem dos problemas reais que a humanidade enfrenta: uma crise civilizatória.
O papa é uma destas vozes, também não deixam de haver vozes solitárias na ONU, pequenos países que apesar de estarem em esferas de influência, tem a sabedoria e discernimento que também sofrerão se a guerra prospera.
Eduardo Galeano chama a atenção em seu vídeo, que os países que compõe o Conselho de Segurança da ONU são justamente aqueles que mais armas tem, e a indústria armamentista é também uma fonte econômica para quem a detém, mas gera riqueza de grupos isolados.
Faltam vozes inequívocas para a paz, vozes que não ignorem a conjuntura e as posições reais.
Serenidade e paz
O livro “A Serenidade” de Heidegger vai dividir o pensamento contemporâneo entre o que calcula e o que medita, sobre o que calcula afirma:
“O pensamento que calcula (das rechnende Denken) faz cálculos. Faz cálculos com possibilidades continuamente novas, sempre com maiores perspectivas e simultaneamente mais econômicas. O pensamento que calcula vai de oportunidade em oportunidade. O pensamento que calcula nunca para, nunca chega a meditar.” (p. 13).
Reflete no texto que não há nenhuma meditação “elevada”, todo homem pensa e o pensamento pode levar a meditação, mas o cálculo não e ameaça este intimo do Ser:
Heidegger lembra que para pensar de verdade todos devemos pensar sobre nossas raízes, dito de modo mais contemporâneo não negar nossas origens e suas influências em nossa visão de mundo, mesmo que limitada, afirma: “o enraizamento (die Bodentändigkeit) do Homem actual está ameaçado na sua mais íntima essência. Mais: a perda do enraizamento não é provocada somente por circunstâncias externas e fatalidades do destino, nem é o efeito da negligência e do modo superficial dos Homens. A perda do enraizamento provém do espírito da época no qual todos nós nascemos” (p. 17).
O mais surpreendente neste texto que é de 1995, é que a característica “mais atormentadora é a bomba atômica”, não podemos esquecer que temos 440 usinas atômicas mais 23 em construção (na foto o acidente de Fukushima), ele percebe que o pensamento que calcula vê apenas as possibilidades industriais e a necessidade das energias da natureza, porém medita o que significa de fato este domínio da natureza.
“O poder oculto na técnica contemporânea determina a relação do Homem com aquilo que existe. Domina a Terra inteira. O Homem começa já a sair da Terra em direção ao espaço cósmico …” (p. 19), que além de ser incrivelmente atual tinha também um presságio sobre o futuro.
Mas não deixou de ver o perigo destas “grandes energias atómicas”, e assim: “assegura à humanidade que tais energias colossais, subitamente, em qualquer parte – mesmo sem ações bélicas -, não fogem ao nosso controle, e “tomam o freio nos dentes” e aniquilam tudo ?” (p.20).
Além de Fukushima há o fatídico acidente de Chernobyl, justamente na Ucrânia e feita com a colaboração russa, e a guerra atual há batalhas bem próxima da maior usina atômica de Zaporizhzhia, construída entre 1984 e 1995, é a maior usina nuclear da Europa e a nona maior do mundo.
As ameaças da Rússia devem ser levadas a sério, uma guerra nuclear coloca em cheque todo o processo civilizatória e talvez a própria humanidade, é preciso serenidade e paz.
O pensamento ocidental se submeteu ao frio e calculista pensamento matemático e físico, que até mesmo ele está em cheque.
HEIDEGGER, M. Serenidade. trad.de Maria Madalena Andrade e Olga Santos. Lisboa: Instituto Piaget, s/d.
Rússia acuada e Israel questionado
O panorama das duas principais guerras que preocupam as lideranças mundiais continua tendo lances e episódios tristes no seu desenrolar, na Rússia a morte de um ativista em prisão da Sibéria e em Gaza as dificuldades de ajuda humanitária.
Enquanto vencem no campo de batalha, estas duas superpotências perdem no campo diplomático já que para muitas autoridades a situação é de desumanidade e ameaça a civis.
Na Rússia a morte de Alexei Navalny na prisão levou milhares de pessoas ao seu enterro (foto), o advogado, ativista e blogueiro tinha uma atividade intensa e era respeitado por grande parte da população, segundo fontes russas 67 pessoas foram presas no enterro, e também a entrada da Suécia para a OTAN expõe o enfrentamento a guerra.
Putin ameaça retaliação a Suécia enquanto aumenta o tom com o Ocidente afirmando que uma entrada de tropas ocidentais na guerra da Ucrânia levaria a um caos nuclear, em resposta ao presidente Macron da França que disse que não hesitaria enviar tropas, porém outros países refutaram esta ameaça afirmando que não o fariam.
O envio de apoio humanitário a faixa de Gaza cria polêmica com Israel que diz facilitar, porém a reação internacional pedindo o fim das hostilidades, sem deixar de exigir a liberação de reféns que ainda estão em controle do Hamas, aparece em destaque na imprensa mundial.
Quem subiu o tom com Israel foi o presidente da Turquia, Erdogan que afirmou que Israel comete uma “tentativa de genocídio” com a operação militar na faixa de Gaza.
Inúmeros países já se manifestaram pelo fim da guerra, também o papa já se pronunciou recentemente afirmando “carrego no meu coração todos os dias, com dor, o sofrimento da população na Palestina e em Israel, e pedindo acesso seguro para a ajuda humanitária.
A escalada perigosa destas duas guerras pode levar a uma tragédia civilizatória e é preciso sabedoria e serenidade das lideranças mundiais.
2 anos de Guerra e a diplomacia
Dia 24 de fevereiro completou 2 anos da guerra da Rússia com a Ucrânia, que o governo russo chama de “operação especial”, que já matou milhares de civis na Ucrânia, que provocou uma ruptura com o Ocidente e que não tem perspectivas de trégua e pode escalar para a Europa.
Apesar do enfraquecimento o discurso de Zelensky foi de promessa de vitória, embora tenha sofrido revezes neste início de ano em vários fronts, o discurso de Putin é cada vez mais feroz e eloquente e não é impossível um enfrentamento direto com as forças da Otan, o que seria uma tragédia para todo o planeta pelo potencial bélico e nuclear que estaria envolvido.
Na Palestina Israel continua com bombardeios já chegando a cidade fronteiriça com o Egito de Rafah, no subúrbio de Shaboura, segundo o ministério da Saúde de Gaza, 97 pessoas foram mortas e também em algumas aldeias vizinhas houve ataques.
O Catar sediará uma reunião entre o Hamas e Israel com objetivo de finalizar um acordo de trégua esta semana, segundo fontes egípcias, os Estados Unidos consideram sempre possível o acordo definitivo de paz, porém continuam dando apoio a Israel e seguem conflitos com os Houthis do Iêmen que impede a passagem de navios cargueiros de bandeira americana.
Uma nova estratégia no Iemen tem sido forças táticas, lideradas pelo Reino Unido (foto) que auxiliam tanto o mapeamento como o bombardeiro das bases terrestres dos Houthis, já que eles não têm embarcações, fazendo ataques aos navios a partir de bases terrestres.
O presidente brasileiro Lula causou uma grave crise com Israel comparando a atual guerra de Israel com o período nazista, justamente o maior genocídio e a mais cruel guerra contra o povo judeu e provocou reações do governo de Netanyaho, de seus aliados e de brasileiros judeus que reclamam um tratamento igualitário ao dado aos palestinos refugiados.
O conjunto das guerras e retaliações endurecem os corações e põe em combate as forças que polarizam o poder ao redor do mundo, poucos são os países que não se alinham embora a esperança de paz resista de maneira heroica.
Como diz o centenário educador e filósofo Edgar Morin, é preciso uma resistência do espírito.
Perspectiva de guerra e embriaguez do espírito
O tom e as ações de uma guerra sem escalas se ampliam, poucas são as nações e vozes que não estão sobre aquilo que o filósofo centenário Edgar Morin chama de “embriaguezes coletivas”, e clama que haja resistência capaz de reagir a todas as mentiras espalhadas.
O comandante das forças da OTAN Chris Cavoli, anunciou um exército de 90 mil homens, e um exercício chamado de Steadfast Defender 2024, que deverão ocorrer em maio, dele participarão 50 navios, de porta-aviões a destroieres, 80 caças, helicópteros e drones e mais de 1.100 veículos de combate, incluindo 133 tanques e 533 veículos de infantaria.
A Rússia despista e diz que não invadiria a Letônia e a Polônia, tomou de vez a cidade de Avdviika (foto), um dos frontes estratégicos e onde a guerra está mais violenta, Zelensky diminui a perda afirmando que recuou para “salvar vidas”, entretanto a guerra continua sangrenta.
Em entrevista neste domingo (18/02) Putin diz que a Ucrânia “é uma questão de vida ou morte” para o país, a morte do opositor Navalny repercutiu no mundo inteiro e será um divisor de águas para saber aqueles que apoiam um regime claramente bélico e autoritário.
Na faixa de Gaza, a cidade de Rafah com milhões de refugiados palestinos segue sob ameaça israelense, um hospital foi invadido pois haveria uma notícia que “reféns estariam ali”, porém não foram encontrados, somente armamentos e com a invasão pacientes na UTI morreram.
Seguem os apelos internacionais para que Israel não coloque em risco civis que na sua maioria estão refugiados em Rafah e o Egito ergueu um enorme muro de modo que não podem fugir dali para o Egito e isto coloca em risco milhares de mulheres, crianças e outros civis que estão lá e não tem para onde fugir.
As negociações ficam mais difíceis em cada ação de Israel e o envolvimento do Irã e outros países árabes vai se tornando cada dia mais inevitável, será neste front que uma possível 3ª. guerra ocorrerá, a resistência do espírito reivindicada pelo centenário filósofo e educador Edgar Morin deve lutar contra os fanatismos e ódios que só disseminam a morte e a guerra.
Em uma entrevista anterior a publicada no jornal italiano La Reppublica, Morin havia dito: “toda a guerra encarna o maniqueísmo, a propaganda unilateral, a histeria bélica, a espionagem, a mentira, a preparação de armas cada vez mais mortíferas, os erros e as ilusões, inesperados e surpresas”, é preciso uma resistência do Espírito para a Paz.
Fragilidade humana diante do Infinito
Uma das obras importantes para entender a viragem linguística do ponto de vista da ontologia é a obra de Emmanuel Levinas, destacando aqui uma obra que toda a questão da impossibilidade de objetivação do Outro e da limitação humana diante de debilidades como os vícios, as dificuldades éticas e a guerra.
Levinas tira parte de sua experiência do que viveu na segunda guerra mundial, onde foi mantido preso pelo regime nazista, além de ter seus pais e irmãos executados, viu as atrocidades da então dita “razão esclarecida” que se mostrou violenta e totalitária, estas experiências estão em tensão em seu pensamento, e são importantes num contexto de ameaça de uma nova guerra mundial.
A ontologia tem seu papel dentro da metafísica segundo o autor, mas não seu primado como o de filosofia primeira, a transcendência do âmbito do “si” e do “ser”, uma vez que este movimento desvelou-se (as categorias de re-velar é um novo velamento) retornando o movimento ao si mesmo, ao idêntico, ao ser e e sua preservação, não ao reconhecimento do Outro.
Em contraposição a Heidegger, para quem a relação do ser com outrem é subordinada a uma relação com o ser em geral e nada interfere no surgimento do eu, Levinas entende que o eu não se deve ao Ser, mas ao Outro, e assim esta relação é fundamental como em Paul Ricoeur.
O autor propõe em Totalidade e Infinito uma nova escolha para a compreensão do ser em que a exterioridade não seja sacrificada, assim a relação com o Outro e com o “mundo” exterior é reflexo e caminho para a interioridade, nela encontra uma relação com o todo e infinito.
Esta relação do eu com o rosto do Outro que apresenta uma resistência ética, para o autor, é pela sua epifania, pela sua “aparição” (categoria fundamental na fenomenologia), que a exterioridade do ser infinito pode se manifestar como resistência.
O seu pensamento é mais complexo, mas podemos entender que a debilidade e limitação do eu, se mantida em tensão com a exterioridade e com o Outro, desvela o infinito e nossa relação com ele, que não pode ser outra que o reconhecimento de sua “transcendência”.
Levinas, E. Totalidade e infinito. Lisboa : 70, 1988.
Estratégia russa e israelense
De um lado uma potência a esquerda, que não negocia com opositores e não abre mão do poder, de outro uma potência ocidental onde a guerra pode ajudar a manter no poder as forças de direita em coalisão.
As guerras são políticas e não podemos vê-las apenas pela ótica de ditadores e genocidas, ainda que qualquer guerra se fundamente na ilegitimidade de matança de civis e mesmo dentro dos parâmetros de acordos internacionais sobre a guerra, eles sejam ultrapassados.
Qualquer narrativa que haja esconde o ódio e a vingança contra opositores, a ira e a violência como fundamento, usando para isto discursos de virilidade, ideologias do pensamento único e até mesmo apelos humanísticos que são ultrapassados a partir da primeira batalha.
A análise crítica é que não haverão recuos, em recente discurso Putin declarou que não há possibilidade de derrota na Ucrânia, isto é, usaria as catastróficas armas nucleares ou recursos próximos disto, porém atenua dizendo que não há interesses de invasão na Polônia e Letônia.
Apesar de terem eleições próximas, o único opositor russo que Putin respeita, outros já estão presos ou desaparecem presos ou mortos, não há possibilidade de qualquer mudança no poder.
Em Israel, o presidente Netanyahu ameaça mandar tropas a Rafah, campo de refugiados na fronteira com o Egito, que tem um tratado de paz com Israel a 45 anos, também o presidente americano Biden pediu que não sejam enviadas tropas para lá, mas a proximidade das eleições israelenses exige um aceno para a direita mais radical em Israel.
A diretora executiva da UNICEF, Catherine Russel, disse que os civis em Rafah devem ser protegidos, pois não tem para onde ir: “cerca de 1.3 milhão de civis estão encurralados, vivendo nas ruas ou em abrigos. Eles precisam ser protegidos. Eles não têm nenhum lugar seguro para onde ir”, disse segundo a imprensa internacional.
A lógica da guerra é que favorece os ditadores e não permite que qualquer princípio mais humano e democrático seja respeitado, é a ausência de serenidade e tolerância a opositores.
A cura de mentes e corações
É cada vez mais comum o apelo aos bens materiais, ao fecharmos em si e uma falsa ideia sobre o que é a felicidade, almas e corações feridos que buscam a felicidade onde não está, podem ter uma consolação temporária, mas não é gaudio, felicidade equilibrada e paz.
Outro livro de Sêneca bastante fundamental para seu pensamento é da tranquilidade da alma, o homem moderno vive a exterioridade, erroneamente chamada de objetividade ou materialidade, porque as coisas (os entes) são parte de aspectos ontológicos e devem ser pensados e cultivados adequadamente na interioridade, que não é a subjetividade, mas alma.
Disse o filósofo Romano, que postamos ontem sobre a Ira, agora sobre a alma:
“Se o homem tivesse a oportunidade de olhar para dentro de si próprio, como se torturaria, confessaria a verdade e diria: “Tudo que tenho feito até agora, preferia que não tivesse sido feito; quando penso em tudo o que disse, invejo os mudos; tudo o quanto desejei, a maldição de meus inimigos; tudo o que temi. Ó deuses justos! Melhor não tivesse desejado. Fiz muitas inimizades, e o ódio substituiu a amizade (se é que há amizade entre os maus), e nem sou amigo de mim mesmo.
Embora escrito no início da era cristã, o autor Da tranquilidade da alma, reflete a dificuldade que é para o homem comum e também para o sábio manter a sua serenidade, perante um espetáculo de injustiça e de baixeza (vejam como é antigo isto), do qual é testemunha todos os dias, é justamente o contraponto da Ira, do ódio e do confronto.
O texto começa com uma carta imaginária escrita por Sereno (claro é de propósito o nome): “eu te direi o que está me acontecendo, e tu encontrarás um nome para essa doença”, e ao final afirma: “Às vezes, a minha alma se eleva com a magnitude do pensamento, torna-se ávida por palavras e aspira às alturas. Assim o discurso já não é mais meu [grifo nosso]. Esquecido das normas e dos critérios rigorosos, elevo-me e falo com a boca que não é mais minha”.
A partir de então refletirá sobre a maneira de contornar obstáculos que impedem a paz.
Embora o discurso seja moralista e ético, e não é menos importante por isto, a elevação que Sêneca almejou não pode encontrar outro lugar senão numa ascese espiritual, também está em outras culturas, o budismo é um elevação no caminho das virtudes, Ghandi usou a paz como um exercício política para liderar a Índia, e no caso do cristianismo são as “curas” de Jesus.
Diz o texto Bíblico, ao verem a cura de um surdo-mudo (Mc 7,37): “Ele faz bem todas as coisas. Aos surdos faz ouvir e aos mudos falar”, e também curou leprosos “impuros”.
Sêneca. Da Tranquilidade da Alma (wordpress.com) . trad. Lucia Sá Rebello e Ellen Itanajara Neves Vranas. Porto Alegre, RS: LP&M Pocket. 2009.