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Tradição e inovação tem alguma relação ?

28 jan

No âmbito cultural imagina-se muitas vezes que não, ou estabelece inovação apenas no âmbito estrito da cultura, enquanto ela tem relação com as crenças, valores, e principalmente com as formas de relações sociais que envolvem a produção de riquezas, o uso de técnicas, por exemplo, a passagem da cultura oral para a escrita, significou uma mudança profunda.
Inovação está ligada a alguma mudança cultural significativa, em geral, com influência de novas técnicas e modos de produção para consumo, mas o termo é mais amplo.
A mudança hoje é das mídias para as transmídias, isto é, as mídias se complementam pode-se fazer um vídeo a partir de um texto ou de uma exposição oral de determinada cultura, assim pode-se falar de narrativa de transmidia, ou de “storytelling”, ou seja, contar estórias.
O termo foi utilizado pela primeira vez pelo professor Marsha Kinder, da Universidade de Sourthern California (EUA), em 1991, mas em 2003 o professor Henry Jenkins criou uma definição que ficou consagrada em seu livro “Cultura da Convergência”, onde definiu-a como: “[…] uma nova estética que surgiu em resposta à convergência das mídias”.
Ao remeter a estética o termo, este ultrapassa a pura produção de produtos de consumo para atingir a arte, a cultura e de certa forma o sistema de crenças como um todo, mesmo que a rejeição em diversos âmbitos seja comum, o processo de “inovação” avança.
Também há uma redefinição de storytelling, a tradição da cultura oral de contar estórias, onde a tradição se perpetua muda para uma nova forma, agora torna-se o uso de recursos audiovisuais para transmitir uma história, que pode ser contada de improviso (como na tradição oral), mas pode também ser trabalhada e enriquecida com recursos visuais.
JENKINS, Henry. Convergence Culture: Where Old and New Media Collide. NY: New York University Press, 2006.

 

Phronesis e serenidade

28 nov

Não por acaso Gadamer adota a Phronesis como um dos elementos chave em seu discurso sobre Verdade e Método, incompletamente traduzida como prudência, o termo na verdade dever-se-ia ser confundido com “sabedoria” prática da serenidade, tradução livre.

Isto porque a nosso ver, Gadamer é reabilitador da filosofia prática, os que clamam por pratica, objetividade (sic! bem idealista), são pouco práticos por ausência de sabedoria, são impulsivos e activos (no sentido de vita activa de Chul-Han), típicos da sociedade do cansaço.

No sentido grego, está agregada a ética, mas não é um saber privado no sentido da moral e sim público e social, que visa minimizar exacerbações da impulsividade egocêntrica do eu, quando colocada numa perspectiva da obra de arte atinge um patamar de princípio universal.

Esta inclui a obra de arte porque foi a excessiva centralização no eu que reduziu a relação da ética com a estética, a amoralidade pública, o escrachado não é uma nova estética, nem mesmo a negatividade as vezes necessária a arte, é a sua ausência por falta de relação com a ética e o processo formativo.

Gadamer recupera a phronesis a partir da proposta de Aristóteles na Ética a Nicômaco, onde busca estabelecer a articulação entre o universal e o particular, mais ainda entre o indivíduo e a sociedade, dentro de formas históricas da vida, mas com um ethos comum.

Pode-se assim estabelecer uma relação com a educação, num momento que se fala em escola sem partido é preciso pensar que há um outro, sem desejar a neutralidade porque ela será uma ilusão, exploramos num post a seguir.

Falta estabelecer a relação da phonesis com a techné e a episteme, que é o saber teórico e o saber fazer da techné, que está ligada etimologicamente a arte (τέχνη) e ao artesanato.

A harmonia entre as três formas de sabedoria resulta numa sabedoria prática, a práxis.

 

O dasein e a razão

17 out

Antes de penetrar no conceito de ser-no-mundo, tradução provisória de dasein, é preciso compreender em que ponto a ontologia se distancia do racionalismo cartesiano, em que ponto se aproxima, para quem deseja um mergulho mais profundo “Meditações Cartesianas” é muito recomendável (post), já quem Husserl foi professor de Heidegger e este guardou alguns conceitos.

As duas categorias cartesianas bem conhecidas para “coisa” são a res extensa e a res cogitans, sobre as quais escreveu Heidegger: “Sem dúvida esse ente [com relação a Deus] necessita de produção e conservação, mas dentro dos entes criados [ou só considerando estes] … existe algo que não necessita de outro ente, no tocante a produção e conservação das criaturas, por exemplo do homem. Tais substâncias são duas: o res cogitans e o res extensa” (Heidegger, 2015, p. 144).

Assim o dualismo cartesiano não é só entre duas substâncias finitas, que são naturalmente distintas, mas entre as duas finitas e o infinito, e Heidegger esclarece logo a seguir retomando a ontologia medieval, as vezes chamada de fundamental ou ontoteologia por outros autores, a questão de como o ser é designado como “ente cada vez referido” (Heidegger, 2015,p. 145), ou seja, “nas afirmações Deus é ou o mundo é, predicamos o ser … a palavra ´é´ não pode indicar o ente cada vez referido no mesmo sentido (αυυωυúς, unívoce), já que entre ambos existe uma diferença infinita do ser, se a significação do ´é´ fosse unívoca, então o criado teria o mesmo sentido do não criado ou o não criado seria rebaixado a um criado” (idem).

Resolve a querela do universal, entre realistas e nominalistas, “Ser não desempenha a função de um simples nome [pensavam os nominalistas] pois em ambos casos compreende-se ´ser´ “ (ibidem), explicita e supera a escolástica que “apreende o sentido positivo de significação do ´ser´ como significação ”analógica” para distingui-la da significação unívoca ou meramente sinônima” (ibidem).

As aspas são do próprio Heidegger para indicar a analogia do ser enquanto substância, e estendendo para o contemporaneidade nem o analógico nem digital são ser, pertencem só ao ôntico, ou em nossa denominação aos artefactos. 

Finalmente rebaixa a ontologia cartesiana que “fica muito aquém da escolástica” que deixou sem discussão o sentido do ser e o caráter da ´universalidade´ desse significado contido na ideia da substancialidade” (ibidem), embora reconheça que mesmo a ontologia medieval questionou muito pouco este sentido.

Embora vá recuperar em alguns aspectos Descartes, constata para o seu tempo e vale ainda hoje, sequer nos libertamos da crise do pensamento europeu do século passado, “a ontologia cartesiana do mundo ainda é hoje vigente em seus princípios fundamentais”, a materialidade.

Heidegger, M. Ser e tempo, 10a. edição, Trad. Revisada de Marcia Sá Cavalcante, Bragança Paulista, SP: Editora Universitária São Francisco, 2015.

 

Desaceleração e a técnica

18 jul

Depois de criticar de modo convincente Baudrillard e de afirmar de modo categórico que “a mera velocidade não supõe grande influência na produção do sentido histórico” (p. 36).

O que conta sobretudo é a instabilidade da trajetória, o desaparecimento da própria gravitação, as irritações (irritationen) ou oscilações temporais.” (pag. 36), Byung-Chul Han cede a tentação de Baudrillard de que é a moderna tecnologia responsável por isto, ora, mas qual a origem disto?

O livro Cultura e Simulacro de Baudrillard é da década de 70, a internet era nascente com usuários acadêmicos, o Mal-estar na civilização de Freud é da década de 30, isto sem falar de Nietzsche que faleceu no início do século passado, mais precisamente em 25 de agosto de 1900.

Portanto é preciso retornar aos primeiros argumentos de Han que são mais sólidos, “a aceleração não é a única explicação plausível do desaparecimento do sentido” (pag. 35), e a “expressão ´átomos de sentido´ também conduz a um erro,  porque o sentido não é nuclear” (idem), dá um pequeno passo na direção correta: “o repouso não é causado pela aceleração e pelo movimento de trocas, mas pelo já não-se-saber-para-onde” (pag. 38), uma falta de metas.

Vai criticar também Bauman, para quem o homem moderno é um peregrino no deserto, que pratica uma “vida a caminho” (pag. 43), e num relance retorna ao sentido afirmando “a secularização não comporta uma desnarrativização (Demarratovosoerimg)”, mas volta a trás e diz que a modernidade continua a ser uma narrativa, porém a cultura impressa e reprodução não tem o caráter mítico e escatológico da cultura oral, é outra narrativa, a romântica, já esclareceu Gadamer.

A crítica a técnica e ao progresso técnico é a tentação comum, apontá-la como religiosa é no mínimo contraditório já que ela é herdeira legítima das luzes e da razão, não é história como história da salvação, mas como determinismo histórico romântico a moda de Dilthey.

A imersão na cultura digital, ou na cibercultura, não desterritorializou (o rádio, a TV e o cinema o fizeram antes) nem secularizou, quem o fez foram as luzes e o capital financeiro que não reconhece pátria nem lugar, a narrativa que omite o processo de produção de vídeos, imagens, fotografias e também de código digital em todo planeta não é só uma inversão técnica ou tecnológica, é uma inversão cultural, graças a elas culturas e povos renasceram.

Não é preciso andar pelo mundo, porque o mundo anda por você, e isto é o que estimula jovens a conhecer outros países e lugares, o enraizamento pátrio que é anti-evolutivo e conservador, o homem andou pelo mundo antes de fixar fronteiras, quem fixou foram os impérios, que agora erguem muros e discursos pátrios radicais, o mundo já é uma aldeia global, o que há agora é um sentimento saudosista de um mundo que não volta mais.

 

O aroma e a significação

17 jul

Assim como a arte, o aroma requer apreciação e sensibilidade, mas isto mais tempo do que significação, isto nos diz Byung-Chul Han: “o mundo está carregado de sentido. Os deuses não são mais do que portadores de sentido”. (HAN, 2016, p. 25).

Penetra no significado verdadeiro da narrativa, do oral primitivo e contemporâneo: “a narrativa cria o mundo do nada” (p. 25), mas não a deixa de liga-la a imagem: “o mundo pode se ler como uma imagem” (idem).

Sem citá-las Han parece penetrar na arte rupestre, ao desvelar a relação: “aqui tudo que tem sentido é a eterna repetição do mesmo, a reprodução do já sido, da verdade imperecível. É assim que o homem pré-histórico vive num presente que perdura.” (HAN, 2016, p. 26)

A cosmogonia de Han penetra no escatológico: “distingue de qualquer forma do tempo histórico que promete progresso … o eskáton indica o fim dos tempos … o tempo escatológico não admite ação alguma, projeto algum.” (HAN, 2016, p. 27).

Desvela também o sentido mais profundo da pós-verdade, “o tempo será desfactizado (defaktiziert) e, ao mesmo tempo, desnaturalizado (entnaturalisier)” (pag. 28), ao apontá-la já nas Luzes (o iluminismo): “a revolução refere-se a um tempo desfactizado. Livre de todo ser/estar lançado, de qualquer força natural ou teológica, o mundo, como um colosso a vapor, solta-se em direção ao futuro, onde espera encontrar a salvação” (pag. 29).

Cita Robespierre falando na cerimônia constitucional de 1793: “Les progrès de la raíson humaine ont préparé cette grande révolution, et c´est à vous que´est spécialement imposé le devoir le l´accélérer” (citado na página 29), era o triunfo da razão, também comenta a mesma experiência em “A morte de Danton” escrito por Büchner, ao citar Camille: “As ideias fixas comuns que passam por ser o senso comum são insuportavelmente aborrecidas.” (cit. P. 29).

Byung-Chul separa o tempo oral do histórico ao compreender “o mítico que funciona como uma imagem”, e vê a história da galáxia de Gutenberg como aquela que “cede lugar às informações” (p. 30), para dar a estas uma definição inédita: “na realidade, a informação apresenta um outro paradigma. No seu interior, habita outra temporalidade muito diferente. É uma manifestação do tempo atomizado, de um tempo de pontos (Punkt-Zeit).” (pag. 31).

Volto a página anterior para entender seu conceito de aroma: “A história ilumina … impõe uma trajetória narrativa linear … não tem aroma” (HAN, 2016, p. 30).

Contra a tese de Baudrillard, “a informação não se relaciona com a história como a simulação sempre perfeita do original ou da origem” (pag. 31), dirá por isto é um novo paradigma.

 Dirá ao final deste capítulo que o tempo “precipita-se, apinha-se para equilibrar uma falta do Ser essencial”, fazendo que “a falta do Ser se torne ainda mais penetrante” (p. 32).

HAN, Byung-Chul. O Aroma do Tempo: um ensaio Filosófico sobre a Arte da Demora, Lisboa. Relógio d´Água, 2016.

 

Porque é preciso pensar?

09 jul

Sonhava em escrever um livro de filosofia, não o escreverei mais, talvez faça considerações, como as que farei aqui, mas ao encontrar inesperadamente o autor Thomas Nagel em: “Que quer dizer tudo isto? Uma introdução à filosofia” em sua 5ª. edição (Gradiva, 2018) penso que ele fez o trivial: apresentar questões fundamentais em palavras do cotidiano.

Assim, farei apenas comentários, não é um resumo, são apenas apontamentos, e talvez seja interessante dizer como o encontrei, foi até de outra obra: Como é ser um morcego? (The Philosophical Review LXXXIII, pp. 435-50, 1974), onde diz que esta pergunta pode fazer sentido, mas não faz sentido perguntar como é ser um tostadeira, atualizando para os dias de hoje como é ser a Robô Sophia, embora hajam pessoas fazendo esta pergunta.

Não é esta questão que responde diretamente, mas questões atuais que estão no pensamento cotidiano, ou seja: Como sabemos seja o que for, o que são as outras mentes, o significado das palavras, a liberdade (o livre arbítrio), a morte e o sentido da vida.

A filosofia parece não tratar disto, mas trata só que em diálogo com outros pensadores, esclarece o autor logo no início do livro: “a filosofia é diferente da ciência e da matemática … não se assenta em experimentações nem na observação, mas apenas no pensamento.” (p. 8).

Todos nós pensamos, é equivocado pensar que só filósofos e cientistas pensam, a questão da filosofia é; “questionarmos e compreendermos ideias muito comuns que usamos todos os dias sem pensar nelas” (p. 8), e ao fazermos isto somos levados “na onda” para onde ela queira nos levar, em tempos de crise e profundas mudanças isto pode ser fatal.

Explica o autor, entre outras coisas duas perguntas que considero essenciais: “Um físico perguntará de que são constituídos os átomos ou o que explica a gravidade, mas um filósofo irá perguntar como podemos saber que existe qualquer coisa fora das nossas mentes” (p. 9),

Isto é essencial porque esta é a pergunta idealista contemporânea, e o idealismo é a grande filosofia de nosso tempo, ele é a base do que convencionou-se chamar de modernidade.

NAGEL, T. Que quer dizer tudo isto? Uma iniciação a filosofia. 5a. ed., Lisboa: Gradiva, 2018.

 

Simplicidade e Sabedoria

06 jul

Simplificar não é reduzir conceitos ou coisas que são naturalmente profundas, entre elas, o amor, a sabedoria e o próprio conhecimento são difíceis de serem tratados de modo simples, e não devem ser vistos com simplismos e pouca sabedoria, porém é possível com a vida e com exemplos do dia a dia muito concretos mostrar e demonstrar o que é o conhecer humano.

Porém em tempos de pós-verdades e de acesso livro a produção e difusão do conhecimento, os equívocos do simplismo e da cultura rasa podem ter efeitos devastados, o que não significa confundir e tornar complexo desnecessariamente aquilo que se explica ou que se demonstra.

Assim como o conhecimento reduzido de determinado assunto ou objeto de estudo pode e em geral leva a um reducionismo, termo usado em termos científicos para dizer que a redução da complexidade não explicou o fenômeno que se propunha estudar, é uma das maiores causas do empobrecimento cultural contemporâneo, ao qual a Web é apenas um “meio” de difusão.

Estudos que levam a uma melhor estruturação do conhecimento como as Ontologias, a Web Semântica e agora um novo alvorecer da Inteligência artificial, levam sem dúvida a um maior progresso do pensamento humano e do conhecimento científico.

É preciso, volta-se a enfatizar não complicar além do necessário e também não reduzir além do possível para a essência de um fenômeno ou objeto de estudo não seja perdida ao estudá-la.

Em termos sociais, geralmente se impõe pela autoridade muito mais pela forma que de fato pelo conteúdo, a pompa que tem determinados conhecimentos não significa necessariamente a sabedoria ou profundidade de conhecimento, muitas vezes troca-se a forma pelo conteúdo.

Assim, se alguma divindade ou suprema sabedoria estivesse entre nós dificilmente seria reconhecida, como na cultura cristã a passagem bíblica de Marcos 6,3 reflete: ´Este homem não é o carpinteiro, filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? Suas irmãs não moram aqui conosco?´ E ficaram escandalizados por causa dele.”

Não se escandalizem pela simplicidade, mas justamente pela ausência dela entre aqueles que se arrogam conhecimento e sabedoria.

 

Unidade, complexidade e simplicidade

04 jul

Aparentemente irreconciliáveis, há quem diga que o paradigma do mundo contemporâneo, a complexidade se opõe ao da simplicidade, mas analisemos bem melhor esta interpretação do pensamento de Edgar Morin, ao afirmar “… parte dos fenômenos, ao mesmo tempo, complementares, concorrentes e antagonistas, respeita as coerências diversas que se unem em dialógicas e polilógicas e, com isso enfrenta a contradição por várias vias.  Assim sendo, utiliza o conceito básico de ´sistema auto-organizado complexo” (Morin, 2000, p. 387) que remete a ideia de unidade como uma noção chave.

Esta complexidade necessidade de novas estratégias e modos coerente de dialogar para penetrar nos mistérios, observa Morin: “ (…) a necessidade, na sua coerência e no seu antagonismo as nações de ordem, de desordem e de organização obriga-nos a respeitar a complexidade física, biológica, humana” (Morin 2000, p. 180-181).

Compreendendo a complexidade da cultura que para ele envolve: juvenilização, cerebralização, Culturalização, o que está explicado em um de seus livros básicos O paradigma perdido e a natureza humana, cuja edição portuguesa é de 1973.

Embora hajam outras ideias de complexidade, Morin afirma que a palavra complexidade: “nos empurra para que exploremos tudo e o pensamento complexo é o pensamento que, armado dos princípios de ordem, leis, algoritmos, certezas, ideias claras, patrulha no nevoeiro o incerto, o confuso, o Indizível” (MORIN, 2000, p. 180-181).

A ideia que complexidade não pode conviver com a simplicidade é a incompreensão não só da dialógica, mas da polilógica, que consubstancia e une os dois conceitos: “distinguir e fazer comunicar, em vez de isolar e de disjuntar, a reconhecer os traços singulares, originais, históricos do fenômeno em vez de liga-los pura e simplesmente a determinações ou leis gerais, a conceber a unidade-multiplicidade …” (MORIN, 2000, p. 354).

Esta alternativa de unidade na diversidade, é explicada pelo autor recorrendo a exemplos no campo biológico, que é na prática o exercício da simplicidade, onde a diversidade da natureza compõe a vida.

MORIN, E. Ciência com consciência. Rio de Janeiro: Bertrand, 2000.

 

A lei, o farisaísmo e a figueira

01 jun

O excesso de legalismo e de regras mata a vida, a figueira é uma árvore que fica muito tempo “seca” e depois saem as folhas e os frutos, mas por algum tempo parece morta.

O farisaísmo são aquelas regras morais, religiosas e em nosso tempo “do estado” que se tornou um deus, que mata a vida no desejo de controla-la, Petr Sloterdijk escreveu sobre isto em “Regras para o parque humano”, embora não concorde com tudo, em essência o diagnósticos dele é correto, exceto pelo fato que fez dista contestação uma “religião”.

Suas propostas, que eram uma resposta a Cartas sobre o Humanismo de Heidegger, que me fez deplorá-lo por muito tempo, aos poucos entenderam filósofos e teólogos, que estavam uma conferência em Elmaus, na Basiléia, que depois fez uma compilação e transformou em livro.

O diagnóstico de Sloterdijk que a figueira humana secou devido “a domesticação”, pode ser lida claramente no trecho de seu livro:
“O que ainda domestica o homem se o humanismo naufragou como escola da domesticação humana? O que domestica o homem se seus esforços prévios de autodomesticação só conduziram, no fundo, à sua tomada de poder sobre todos os seres? O que domestica o homem se em todas as experiências prévias com a educação do gênero humano permaneceu obscuro quem ou o quê educa os educadores, e para quê? Ou será que a pergunta pelo cuidado e formação do ser humano não se deixa mais formular de modo pertinente no campo das meras teorias da domesticação e educação?” (Sloterdijk, 1999a, p. 32).

Eis a figueira humana, eis o farisaísmo e suas regras “religiosas” ou “estatais”, depois de retomar a leitura, leio logo no início uma frase de Jean-Paul que Sloterdijk cita escrevendo a Heidegger “livros são cartas dirigidas a amigos, apenas mais longa”, e entendi que no fundo é um Heideggeriano, mas com uma crítica justa e bem colocada: onde está o humanismo ?

Nosso saber é antropocêntrico, rejeita até mesmo a técnica que é produção humana como “estranha”, temos no fundo um desprezo por processos de mudanças, os que o criticam como fascista devem lembrar que foi a ideia de estado “forte” que motivou o fascismo e ditaduras.

A ideia de autoridade farisaica que assustava Jesus nos escritos bíblicos, embora Sloterdijk critique também a religião recupera-a ao dizer que existe uma “ascese desespiritualizada” , que transformou os templos em locais de roubos e de imundices, não é diferente do estado moderno, a todos que o cultuam e reverenciam, há uma desconfiança geral sobre políticos.

Sloterdijk, Petr. Regeln für Menschenpark, Frankfurt/M. Suhrkamp (1999).  Tradução brasileira: Regras para o parque humano – uma resposta à carta de Heidegger sobre humanismo, São Paulo, Estação liberdade, 2000.

 

História do algoritmo

07 mai

A ideia que podemos resolver problemas propondo um número finito de interações entre diversas tarefas (ou comandos como são chamados em linguagens de computação) para diversos problemas tem origem na Aritmética.
Ainda que a máquina de Charles Babbage (1791-1871), e a Álgebra de Boole (1815-1864) tenham uma enorme contribuição para os modernos computadores, a maioria dos lógicos e historiadores do nascimento do mundo digital, concorda que o problema de fato foi levantado pelo segundo problema de David Hilbert (1962-1943), numa conferência de 1900, em Paris.
Entre 23 problemas para a matemática resolver, alguns resolvidos recentemente como o Conjectura de Goldbach (veja nosso post), e outros a resolver, o segundo problema se propunha a provar que a aritmética é consistente, livre de qualquer contradição interna.
Nos anos de 1930, dois lógicos matemáticos, Kurt Gödel (1906-1975) e Gerhard Gentzen (1909-1945) provaram dois resultados que chamavam de novo atenção ao problema proposto, ambos se referiam a Hilbert, então de fato, ali está a origem da questão, grosso modo, se um problema enumerável é resolvido por um conjunto finito de passos.
Na verdade, a solução de Gentzen era uma prova da consistência dos axiomas de Peano, publicada em 1936, mostrava que a prova de consistência pode ser obtida em um sistema mais fraco do que a teoria de Zermelo-Fraenkel, usava axiomas da aritmética primitiva recursiva, não sendo portanto uma prova geral.
Já a prova da inconsistência da aritmética, chamada de segundo teorema da incompletude de Gödel, é mais completa e mostra que não é possível alguma prova da consistência dos axiomas de Peano ser desenvolvida sem essa própria aritmética.
Esse teorema afirma: se os únicos procedimentos de prova aceitáveis são aqueles que podem ser formalizados dentro da aritmética, então o problema de Hilbert não pode ser resolvido, dito de outra forma mais direta, se ou o sistema é completo ou consistente.
Há polêmicas levantadas sobre estes resultados, como Kreisel (1976) que afirmou que as provas eram sintáticas para problemas semânticos, Detlefsen(1990) que diz que o teorema não proíbe a existência de uma prova de consistência, e Dawson(2006) que afirmou que a prova da consistência é errônea usando a prova dada por Gentzen e do próprio Gödel em trabalho de 1958.
Polêmicas a parte, a participação de Kurt Gödel no importante circulo de Viena na década de 20 antes da guerra explodir, e as posteriores discussões de seus teorema por Alain Turing (1912-1954) e Claude Shannon (1916-2001) atentam sua importância para a história dos algoritmos e dos modernos computadores digitais.