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Uma ontologia incompleta: a afirmação do Ser
A roda da Fortuna é o acaso porque a lógica do laissez faire, o acaso levado à economia, é também a lógica da afirmação do Ser, no sentido clássico; o Ser é e o Não-Ser não é, não há um devir.
O não-Ser também é Ser, a afirmação, a vontade de Poder, leva consigo a lógica da guerra, o dualismo, o maniqueísmo e seu destino falta é a guerra, a dificuldade de compreensão do Outro, o diálogo feito como forma de hipocrisia, porque no fundo, é a negação do Outro e a afirmação do Ser, na lógica “nós temos a verdade”, mesmo que dita de forma religiosa, é sua negação.
A impossibilidade do convívio, de onde surge a violência física, até a violência psíquica e moral, o desejo inconsciente de desmoralizar e minar o Outro, que é nesta lógica não-Ser, e assim vive-se de modo falso o momento que passa, como fugaz e com o sentido de máximo afirmação do Ser.
Parece loucura dizer que o não-Ser também é, mas é justamente no seu exercício que negamos a guerra, negamos o conflito como necessário, fazemos o dualismo tornar-se diálogo sincero e podemos entrar na lógica do Outro e descobrir um complemento do Ser, enquanto não-Ser.
Afirmar que o Não-Ser é destrói a lógica do poder, da exclusão, do conflito, porque permite ao Outro sua existência, nega a psicopolítica porque não tem necessidade de opressão “psíquica” do Outro, para afirmação do Mesmo, do espelho, mesmo que exercido coletivamente, é um nós egoísta e vinculado exclusivamente ao próprio poder e prazer.
Assim dizem os discursos contemporâneos sobre a filosofia, que enchem plateias e enaltecem filósofos e eloquentes religiosos: “você veio para vencer, afirme-se, diga que é o melhor”, etc.
A ontologia completa, é oposta também ao fundamentalismo religioso e ao farisaico, porque é exercida também enquanto não-Ser, diz o evangelista Mateus sobe o ensinamento do Mestre aos seus discípulos (Mt 5.38-39): “Vós ouvistes o que foi dito (ainda o é em nossos dias): olho por outro e dente por dente!, Eu porém, vos digo: “não enfrenteis que é malvado” Pelo contrário se alguém te dá um tapa na face direita, oferece-lhe também a esquerda!”, eis a lógica “oculta” do não-Ser.
A meia ontologia da afirmação do Ser não é a vivência do momento presente, é só a vivência somente em momentos de euforia, não é “eudaimonia” no sentido grego, porque é alegria do Ser físico e não da alma, não experimenta o gaudio, a alegria do Ser em sua totalidade, corpo e alma.
Felicidade e idealismo, entre sujeitos e objetos
O desenvolvimento do pensamento idealista, o mais forte e profundo da modernidade, deu ao homem um sentimento de domínio não só sobre a natureza, mas também sobre suas próprias possibilidades e alcance de suas vontades, achando que poderia determinar o futuro da história e de sua existência.
Assim da exploração dos recursos naturais, agora com sinais de esgotamento, assim como a exploração de povos e das forças de trabalho fizeram empreendimentos humanos alçarem voos e pretendendo agora a conquista de planetas e do universo, mas descobrimos os limites humanos.
O primeiro e o principal deles é a finitude da vida, mesmo as culturas mais antigas elaboraram sempre alguma escatologia sobre a vida anterior e futura da humanidade, a modernidade entretanto tentou explorar ao máximo a sua finitude, o que vale é o máximo de felicidade na curta vida de todos nós, explorá-la ao máximo é o que basta neste ideário.
Mas o idealismo apontou limites, se é um projeto inacabado ou se já mergulhamos em outro projeto, modernidade tardia ou pós-modernidade pouco importa, a essência deste projeto era a finitude, e o que chamou-se de iluminação, felicidade, vontade e liberdade mostrou-se não apenas a finitude, como também os aspectos monstruosos desta concepção: ausência de imaginação (a subjetividade como é dito nesta forma de pensar), o desiquilíbrio humano e de forças naturais, e a ausência de paz.
O edifício idealista construiu uma sociedade cheia de objetividades, de construções maravilhosas, do alcance das forças produtivas quase até seu esgotamento, porém guerra e ódio cultural, religioso e principalmente ideológico, é parte importante neste edifício para manter a dualidade e com isto não se constrói a paz.
Separar o humano em dois pedaços, para depois esquadrinhá-lo, subjetividade e objetividade, não foi outra coisa senão apenas um edifício monumental que desconsiderou o essencial humano: a ausência de formas de felicidade reais que contemplem a todos e a busca de meios solidários de poder.
Não se trata que Deus morreu, mas que matamos ele, se não há um laço divino entre os homens, ele jamais poderá existir de forma transcendente (em uma verdadeira ascese), aliás, a transcendência idealista não é outra coisa que a separação entre sujeito e objetos, unificados por esta falácia da objetividade.
Sem recuperarmos os sonhos reais, a felicidade real, e os meios sociais para isto, andamos como sonâmbulos no escuro, como afirmou Edgar Morin.
A importância do legado de Droysen
Afirmamos na semana anterior (ver o post) que tanto a perspectiva do helenismo de Droysen (ele cunhou o termo) quanto a perspectiva do verdadeiro significado da história sua eram mais amplas, muito antes das críticas de Gadamer ao historicismo “romântico”, este autor que foi aluno de Hegel, já o tinha feito e com muita propriedade pois além de aluno, penetrou neste conceito do qual Hegel é fundador na filosofia moderna.
Johann Gustav Droysen (1808-1884) questionava o princípio da historicidade, e, muito antes do seu tempo questionou os historiadores sobre os fundamentos “científicos” de um certo perspectivismo e relativismo, assim como também indiretamente questionava Dilthey na tentativa de usar a história para fundamentar as Ciências do Espírito.
Droysen em seu Compêndio sobre a História (Grundriss der Historik) que não era adequado à História, tendo esta a pretensão de ser ciência, tomar seu método emprestado de outra perspectiva do conhecimento, que é a ciência natural, mesmo que como “exemplo”.
A solução por ele apresentada, parecida a de Gadamer, sintetizável na noção metodológica de Compreensão Investigativa (forschendes Verstehen), visava dar a História a possibilidade de uma ciência autônoma, assim para ele existe algo que precede ao dualismo explicação x compreensão, que é a história, o que chamamos na semana passada de “forma” do pensar.
A sua obra Compêndio da Historia (Grundiss der Historik) de 1857/1858 está disponível em versão espanhola (1983) e versão italiana (1989), ainda ser versão em português.
É de interesse particular, pelo menos o foi para mim, o capítulo 3 que trata do problema hermenêutico da compreensão, que dá uma noção da aplicabilidade do seu método.
A ligação que podemos e devemos fazer com a questão moral, do tópico anterior, pode ser encontrada na página 386 de seu trabalho Teologia dela Storia (tradução italiana):
“… nós temos a necessidade de um Kant, que examinasse criticamente não a matéria histórica, mas o movimento teórico e prático diante e no interior da história, e que demonstrasse, a exemplo de qualquer coisa análoga a lei moral, um imperativo categoria da história, a fonte viva da qual jorra a vida histórica da humanidade. ” (DROYSEN, 1966, p. 386).
Droysen observa naquilo que chama de “Sistemática” três tipos de comunidades éticas: “as comunidades naturais”, “as comunidades ideais” e “as comunidades práticas” (figura acima), e a elas relaciona da história, dito assim: “a nossa sistemática resultou da noção de que o mundo história é o mundo ético, mas enquanto concebido sob um determinado ponto de vista; porque o mundo ético pode ser considerado sob outros pontos de visa …” (Droysen, 1994, p. 413).
O seu devir, portanto, está longe da dialética hegeliana, mas ao mesmo tempo dialoga com ela.
DROYSEN, J. G. Teologia dela Storia. Prefazione ala Storia dell´Ellenismo II – 1843. In: Istorica. Lezioni sula Encilopedia e Metodologia dela storia. Trad.: I. Milano – Napoli: Emery, 1966.
_______. Istorica. Lezioni di enciclopédia e metodologia dela storia. Trad. Silvia Caianiello. Napoli: Guida, 1994.
O estado moderno e a in-formação
É impossível pensar o estado moderno, sem pensar em suas leis e o contrato social que se estabelece a partir delas, e não por acaso elas surgem após a prensa de Gutenberg (e o livro).
Pode-se pensar de modo igualmente ingênuo que isto é apenas teoria, é fácil demonstrar que não é a forma-ação da polis é impossível de se pensar sem a polis grega, e os pensamentos que vão desde os pré-socráticos até os contratualistas modernos: Thomas Hobbes, John Locke e o suíço (não era francês não) Jean Jacques Rousseau.
A in-formação do estado moderno vem da ideia básica destes pensadores é que a relação entre governantes e governos devem se estabelecer na forma de um contrato, e que discutem de fundo é que o homem é lobo do homem Thomas Hobbes, o homem é determinado pela relação social John Locke, isto é nasce bom e o meio o molda, e homem é um bom selvagem que o meio o corrompeu, o pensamento de Rousseau.
O que alguns autores contemporâneos vão dizer é que estas formas, ou estas regras de dominação social entraram em colapso, quer seja pela emancipação do espectador como advoga Jacques Rancière, quer seja pela falência das regras do parque humano como explora Peter Sloterdijk, claro há outras interpretações possível, como a conservadora em moda, retomar o estado sólido.
O Oscar do Parasita
Estava convencido que a Academia daria este ano o Oscar ao Coringa, mas não
por razões políticas, parecia por retornar a valores nacionalistas e autoritários pelos filmes.violentos e autocráticos.
Diferenciando autocracia difere da ditadura, quando o poder (Kratos) é exercício por si próprio (auto) significa o poder pelo poder, enquanto ditadura é a negação da democracia, e o que emergiu no mundo contemporâneo é uma mistura das dois pessoas, em eleições livres.O Coringa teve o premio justo é uma boa atuação, é razoável que se dê o Oscar de melhor ator, embora o personagem seja uma mistura patológica de ingredientes maldosos, com a indicação a 11 categorias e foi um sinal de certo “exagero” pelo filme, mas foi o que resultou foi justo, e a Academia provou que está viva e mantém o senso crítico.
Lembro que A Malvada (1950) e Titanic, além do recente La la Land que tiveram 14 indicações.
Os Dois prêmios dados, por critério exclusivamente artístico (esquecendo o ético e o político), para mim seria apenas de ator mas ganhou também melhor trilha sonora.
Barbadas foram Brad Pitt melhor ator coadjuvante, melhor roteiro adaptado Taika Waititi em Jojo Habbit e Bong Joon Ho diretor de Parasita.
Tinha decidido não comentar, mas a indicação de Dois Papas (do brasileiro Fernando Meirelles) e o polêmico documentário A democracia em vertigem, a propósito do que afirmo aqui, ia na contramão do Coringa, mas O Parasita ganhou e mereceu as 4 estatuetas, e premio de consolação para roteiro adaptado de Dois Papas.
Deixo meu protesto, sem dúvida 1917 (3 estatuetas) tem grandes qualidades e poderia ganhar mais, e parabenizo quem assistiu Parasita (Oscar de direção) sabe que merecia, o filme quase nos hipnotiza e Era uma vez em Hollywood (2 estatuetas) mereciam mais, surpresa a melhor atriz para Renné Zellweger em Judy: Muito Além do arco-íris.
Por último como animação a estatueta foi para Toy Story 4 que julgo merecido.
Fazer a diferença
Fazer a diferença não e portanto, perder a identidade,somente o conceito idealista de auto identidade vê assim, por isto criamos um mundo da mesmice em que tudo é muito parecido, antes de ser um elemento da cultura foi um elemento do pensamento, o imperativo categórico kantiano: “age de tal forma que seja modelo para os outros”.
Depois a indústria cultural, os meios de comunicação em massa radio e televisão desenvolveram isto criaram padrões de beleza, de consumo e até de moral, a moral do estado antes de ser uma moral individual, é uma moral “coletiva” de valores e costumes, que não significam uma ética e uma identidade “sólida”, isto inclui o amor aos símbolos pátrios e valores patrimoniais.
Fazer a diferença significa sim ter uma identidade com princípio éticos e morais, que inclui crenças e até mesmo comportamento (ver post anterior), mas que admite o diálogo e os costumes culturais diferentes do nosso, para que possa indicar para os outros um comportamento e uma ação capaz de incluí-los e mostrar a dignidade humana e social assim influenciar culturalmente mostrando a “diferença” de valores verdadeiros e eternos que beneficiam a sociedade toda.
Verdadeiras culturas e filosofias devem incentivar isto, devem fazer a diferença não de modo a impor opiniões e costumes, mas de modo a que inclua o Outro, por isto jamais acompanha o ar superior, a arrogância e a ideia de que o diferente é errado, isto é maniqueísmo e nunca amor.
A ideia Bíblia que a cultura do Amor deveria fazer a diferença, isto é ser “sal e fermento”, traz junto a ideia de que para fazer a diferença é preciso pouco, mas o sal e o fermento não podem estar estragados pois o efeito sobre os alimentos não será notada.
A verdadeira cultura cristã estabelece em Mateus (Mt 5,13): “Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se tornar insosso, como salgaremos? Ele não servirá para mais nada, senão para ser pisado pelos homens e para ser jogado fora.”.
A identidade como auto afirmação, como arrogância não é outra coisa senão sal insosso.
As primárias americanas
Depois de um fiasco tecnológico, curioso que isto aconteça nos EUA e aqui duvidem das urnas, sai os primeiros resultados com 62%, mais curioso ainda é o sistema de contagem pois embora Bernie Sanders lidere, de fato um candidato a esquerda, os resultados até a noite de ontem eram:
Pete Buttigieg lidera com 26,9% dos delegados do estado para indicarem o candidato, enquanto Sanders logo atrás em 25,1% dos valores, seguem a senadora Elizabeth Warren com 18,3%, Joe Biden com 15,6% e Amy Klobuchar com 12,6%, um deles irá disputar com Trump que ganhou lá.
Pode-se especular sobre os verdadeiros motivos do atraso, suspeitas a parte, o crescimento de Bernie Sanders pode significar uma polarização futura nas eleições uma direita radical contra uma esquerda (nos moldes americanos) também radical, é quase uma tendência mundial.
O importante é entender por que isto ocorre, e claro se espalha por toda a sociedade, primeiro a dificuldade em situações extremas de pensar sobre situações políticas quando os discursos foram para extremos e segundo porque a imposição de um presidente radicalizado desperta reação.
É possível retomar a serenidade e voltar a refletir sobre os urgentes e dramáticos problemas mundiais, da ecologia a distribuição de renda, seria saudável para a democracia, para os cidadãos e para a cultura conforme refletimos ontem sobre os indicados para o Oscar que tem o dedo de dois diretores brasileiros, porém o cenário americano e mundial preocupa.
Radicalização favorecem a ditadores, nunca a democracia, creio que quando Alexis Tocqueville escreveu “Democracy in America” (1832) não poderia supor uma radicalização deste tipo.
Estética, cultura e espiritualidade
A desordem que a sociedade contemporânea avança não é só a econômica, social e cultural, o reflexo estético é uma sociedade que pretende eliminar o imperfeito, a dor e a co-imunidade (busca-se a todo custo todo tipo de imunidade retirando a diversidade da natureza), é a tentativa da ausência da tragédia, no sentido cultural e estético, da mudança, mas a vida passa pela morte.
O resultado ao contrário da estética que admite a tragédia é justamente caminhar para aquilo que tenta eliminar, é a sociedade da morte, da obscuridade, enquanto se pretende a perfeição, a estética do liso do perfeito e retilíneo, mas eles são contrários a natureza, e ao homem que é parte dela.
A expansão do corona vírus, outros vírus já vieram como a gripe asiática a pouco tempo atrás, é uma mostra que devemos conviver com isto, recentes descobertas nas geleiras de vírus que não conhecíamos significam que eles sempre existiram e sempre tiveram mutações.
Mas as mutações transgênicas, de plantas e animais que não tem nenhum tipo de doença, tem o paradoxo de serem justamente elas que geram doenças potentes ao mesmo tempo que destroem a diversidade natural do complexo sistema natural, aliás, a simplificação também é isto.
No plano social e religioso significa abolir a divergência, caminhar para uma identidade que não é outra coisa que a negação do Outro, do diverso e a imposição de sistemas autoritários, assim ao mesmo tempo que faz um discurso contra o individualismo e o autoritarismo, favorece-os, veja-se a lei da Entropia (foto).
O contraditório, assim como o diverso caminha e continua evoluindo em meio as crises, porque sabe que a tragédia é parte da vida e pode ser superada se encarada com preocupação e com naturalidade de quem conduz a vida e a sociedade para o futuro.
A passagem bíblica na qual fala da vida natural de Jesus, o tempo de pregação dele foi de 3 anos, e durante 30 viveu uma vida normal, vejam a relação de 10 para 1, os fariseus e fundamentalistas de nosso tempo vivem o inverso, está assim narrado pelo evangelista Lucas (Lc 2,39-40):
“Depois de cumprirem tudo, conforme a Lei do Senhor, voltaram à Galileia, para Nazaré, sua cidade. O menino crescia e tornava-se forte, cheio de sabedoria; e a graça de Deus estava com ele”.
Aliás lei neste caso eram as leis do judaísmo, ou seja, sua relação com a tradição de sua época.
Que lugar ocupa a estética em nosso tempo
Imaginava que seria difícil até mesmo impossível abordar o tema, já que dele se ocupam críticos da arte de diversos tipos, psicanalistas freudianos e muito raramente alguém com nosso de estética de fato, no sentido do belo grego, ou da contemplação de que fala Byung Chull Han (que critica a cultura idealista do “liso”).
Encontrei num pequeno texto de Jacques Rancière, cada vez me encontro mais com este autor que conheci sua obra quase por acaso (A emancipação do espectador), ao referir-se ao tema como o inconsciente estético, mas ele próprio explica logo no início fora do aspecto psicológico do tema.
Encontro logo no início do livro: “estética não se ocupa da ciência ou da disciplina que se ocupa da arte. Estética designa um modo de pensamento que se ocupa das coisas da arte” (Rancière, 2009, p. 11) e isto já bastaria, mas complementa seu pensamento e que elas procuram: “dizer em que elas consistem enquanto coisas do pensamento.” (Rancière, 2009, p. 12)
É um achado, mas não poderia ser de modo diferente em dialogar com a “tradição” kantiana, segue logo o complemento que se segue dizendo que arte enquanto pensamento é uma referência recente e refere-se tanto a obra Genealogia da arte de Baumgarten de 1790 quanto a crítica da Faculdade de Julgar de Kant.
De Baumgarten bastaria a simples referência em sua obra onde refere-se a união dos objetos que “devem ser pensados de modo belo com as causas e efeitos, à medida que esta união deve ser conhecida sensitivamente através do análogo da Razão” (Baumgarten, 1933, p. 127) e assim tanto ele quanto Kant estabelecerão um “pensamento confuso” sobre a definição da estética.
Dirá Rancière que ambos ao chamarem de pensamento confuso ou de sensível heterogêneo de Kant, ambos farão da arte “não mais que um conhecimento menor, mas um conhecimento daquilo que não se pensa” (Rancière, 2009, p. 13) e a nota do autor vai uni-la ao iluminismo e liberalismo.
Não há referência explícita ao pensamento de Nietzsche sobre a arte, mas ao discorrer sobre Édipo, a tragédia grega mais típica e Nietzsche defende o papel desta na arte, diz sobre o uso freudiano desta tragédia como “universal”, que ela ao mesmo tempo engloba três aspectos: “uma tendência geral do psiquismo humano, um material ficcional determinado e um esquema dramático considerado exemplar.” (Rancière, 2009, p. 15).
Claro isto é apenas introdutório, o que Ranciére quer explicar é que não se trata de subjetivo ou de “conhecimento confuso”, mas de “união paradoxal de doença e de medicina que se trata, de união paradoxal das duas” (p. 26) em uma referência a “O nascimento da tragédia” de Nietzsche, aquilo que o idealismo como pensamento e o romantismo como “estética” quiserem negar.
Rancière, J. O inconsciente estético. trad. Monica Costa Netto. São Paulo: ed. 34, 2009.
Tradição e inovação tem alguma relação ?
No âmbito cultural imagina-se muitas vezes que não, ou estabelece inovação apenas no âmbito estrito da cultura, enquanto ela tem relação com as crenças, valores, e principalmente com as formas de relações sociais que envolvem a produção de riquezas, o uso de técnicas, por exemplo, a passagem da cultura oral para a escrita, significou uma mudança profunda.
Inovação está ligada a alguma mudança cultural significativa, em geral, com influência de novas técnicas e modos de produção para consumo, mas o termo é mais amplo.
A mudança hoje é das mídias para as transmídias, isto é, as mídias se complementam pode-se fazer um vídeo a partir de um texto ou de uma exposição oral de determinada cultura, assim pode-se falar de narrativa de transmidia, ou de “storytelling”, ou seja, contar estórias.
O termo foi utilizado pela primeira vez pelo professor Marsha Kinder, da Universidade de Sourthern California (EUA), em 1991, mas em 2003 o professor Henry Jenkins criou uma definição que ficou consagrada em seu livro “Cultura da Convergência”, onde definiu-a como: “[…] uma nova estética que surgiu em resposta à convergência das mídias”.
Ao remeter a estética o termo, este ultrapassa a pura produção de produtos de consumo para atingir a arte, a cultura e de certa forma o sistema de crenças como um todo, mesmo que a rejeição em diversos âmbitos seja comum, o processo de “inovação” avança.
Também há uma redefinição de storytelling, a tradição da cultura oral de contar estórias, onde a tradição se perpetua muda para uma nova forma, agora torna-se o uso de recursos audiovisuais para transmitir uma história, que pode ser contada de improviso (como na tradição oral), mas pode também ser trabalhada e enriquecida com recursos visuais.
JENKINS, Henry. Convergence Culture: Where Old and New Media Collide. NY: New York University Press, 2006.