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Substância do universo: o corpo sagrado

15 jun

Ao contrário do que se supõe, substância é aquilo que há de permanente nas AlfaOmegacoisas que mudam e, portanto, o fundamento de todo acidente, e tudo está em mudança no universo então qual a substância primordial, qual a gênese de todo universo ?

As interpretações podem se dividir em três correntes: há aqueles que reconhecem apenas uma substância (monistas) destacam-se Spinoza e Leibniz, os que reconhecem duas substâncias (dualistas) que é fundamento do idealismo moderno, ou a mais comum que são os pluralistas, as correntes “puras” que vem do platonismo e do aristotelismo.

Tudo que existe é ser para monistas e pluralistas, então o ser é constituído de uma pluralidade de elementos que o fundam como substâncias, mas para estes elas podem ser hierarquizadas ontologicamente, para monistas há somente uma hierarquia que é a monada inicial, na interpretação de Spinoza e Leibniz ela é Deus, na concepção da ciência moderna, um corpúsculo de concentração eletromagnética onde ocorreu o Big Bang.

Há quem conteste o Big Bang, o filósofo Nick Bostrom de Oxford afirmou que “A probabilidade de estarmos vivendo dentro de uma simulação é próxima de 100%”, algo parecido ao Matrix, mas negar a substancialidade do universo é negar uma evidencia apodítica (aquela que se aceitar sem demonstração).

O filósofo Franz Brentano, recuperou uma categoria da escolástica chamada intencionalidade, para definir o que é consciência como aquilo que é dirigido a algo, seu aluno Edmund Husserl usou isto para definir consciência como algo intencional.

Se pensamos assim, mas importante que existir o universo, e ele ter sua substancialidade (o seu corpus), é que algo ou alguém teve intencionalidade deste primeiro objeto, ou seja, o criou de maneira “consciente” e chame-o como quiser, ele é um Ser, pois existe.

Se admitirmos sua materialidade, mesmo a luz pode ser observada em sua influência num corpo gravitacional (veja nosso post sobre a observação da Nasa), mesmo as existências do homem podem ser demonstradas em sua evolução agora sabemos de mais de 300 mil anos, temos que admitir a substancialidade e considerar como plausível a ideia da mônada inicial, então há um “corpo” formado deste Ser original consciente.

Teilhard Chardin, paleontólogo e padre jesuíta, considerava todo o universo o Corpo de Cristo, mais que um corpo místico, um corpo cósmico substancial, se de alguma coisa é feita este universo, ela está guardada na sua fonte e consciência primária inicial;

As evidências apodíticas que precisamos para admitir um Corpus Divino, alfa e ômega, princípio e fim, talvez precise pouco para ser admitido, mas na falta deste pouco ainda resta aquilo que chamamos de fé, nunca cega e nem contrária a razão.

 

A crise, as coisas e o nada

07 jun

A crise, as coisas e o nada separamos agora com as coisas, e faz a perguntaNada essencial: entre as coisas existe o nada ?

Alguém desavisado poderia fazer a falsa perguntar não deveria perguntar antes pelo Ser do que pelas coisas e pelo nada? Sim o nosso filósofo esclarecerá isto, mas a modernidade coloca a questão da relação entre as coisas e nela nasce o dualismo de separação entre as coisas.

Esclarece Mário Ferreira, que “os escolásticos como Tomás de Aquino que seguem a linha aristotélica, afirmavam que tempo e espaço são entes da razão (entia rationis), mas fundados nas coisas com fundamento in re [coisa], pois há entre as coisas distâncias e suceder, que permitem generalizar os esquemas da experiência, até formar os conceitos abstratos de tempo e espaço, que o racionalismo moderno separou totalmente dos fatos, esvaziando-os destes, que neles se dão.” (pag. 32)

Esclareceu que espaço e tempo serão conceitos fundamentais para o pensamento moderno: “mas esvaziados de todo conteúdo fáctico, são entes conceituais, cujo conteúdo implica o despojamento de tudo que acontece facticamente … “ (idem).

Para analisar estes esquemas Mario Ferreira recorre a psicogênese, porque dirá que o fato que os esquemas serem construídos, pela experiência, à posteriori irá remeter no esquema Kantiano conforme sua psicogênese, a existência de positividade à priori, “o que é inegavelmente uma positividade do pensamento Kantiano.” (idem)

Então fará a pergunta essencial sobre o nada: “se as coisas se dão no espaço e elas se separam, como o limite o revela, entre elas se interpõe o espaço. Mas que espaço?”

Aqui se separa conforme afirma o modelo de Demócrito em há um vazio entre as coisas e o de Lorentz, um espaço cheio.  Também no início da modernidade Leibniz propôs a monadologia.

Estamos, portanto entre duas afirmativas (pag. 33) uma que afirma a presença do nada, de um ausente absoluto, e outra que afirma a presença do ser, no qual não há interstícios nem fronteiras, porque enche tudo, e esta psicogênese cria “um esquema de relacionamento das coisas, sem que se lhe dê uma presença real, de per si.” (idem).

Assim esta é a tensão, não o dualismo, entre o nada e o ser, ou se preferirmos a separação entre as coisas e a relação entre elas, a primeira é racionalista e “é um agravamento da crisis”.

Descobrindo a relação entre o finito que “a finitude só se pode dar onde há alguma coisa, pois permite medir. O nada é imensurável, o nada seria um abismo sem fim.” (pag. 34)

Em nota de rodapé esclarece: a impossibilidade de um nada absoluto, entre ilhas do ser, é por nós demonstrada apoditicamente (por evidência), em Filosofia Concreta.

O importante deste argumento, é que por ele pode-se afirmar “a eterna presença do ser, no qual estamos imersos e que nos sustente, o qual nos permite comunicação …” (pag. 35) e então a crise não é tão profunda, ela tem graus, afirma nosso filósofo.

SANTOS, Mario Ferreira dos. Filosofia da crise, São Paulo: É realizações, 2017.

 

Crise, os limites e o conhecer

06 jun

Estamos lendo Mário Ferreira dos Santos, e no final do primeiro capítulo da IsleOcean“Filosofia da Crise”, aponta que temos consciência do limite que há com o Outro e o nós, para apontar 5 pontos desta separação antes de mergulhar sobre o que é o nada entre as coisas (e seres).

Sobre esta separação, afirma que “as coisas também sofrem dos seus limites, mas caladas, intrinsecamente caladas, silenciosas até ante si mesmas, porque nelas, não há um que que perscrute a si mesmo. ” (pag. 20)

Temos consciência da crise, as coisas também sofrem a separação, e a crise se agrava “se aceitarmos essa separação como irremediável, um abismo insuplantável, traçado entre nós e os outros”,  o quarto limite é o da individualidade, o em si de outros filósofos, e deste se origina o quinto limite: “do eu ante o limite da individualidade.” (pag. 29)

“E não há em nós algo que sempre coloca além de todo o nosso conhecimento, algo qe conhecemos, sempre distante, sempre cada vez mais distantes, que marca uma presença sempre se separa de tudo quanto delimitamos, pois conhecer é sempre delimitar? ” (pag. 29), termina a longa reflexão sobre a separação e a crise com uma questão cognitiva central.

É algo como afirmava o filósofo Ludwig Wittgenstein (1889-1951): “o conhecimento é uma ilha cercada por um oceano de mistério. Prefiro o oceano à ilha”, para indicar que a crise é na maioria das vezes um ir além, e penetrar no oceano do mistério.

Termina o capítulo de conceito da crise com duas constatações: “entre os limites de todo o nosso conhecer, não há sempre em nós, algo que conhece, que os vence, porque deles não se deixa apreender? E que sempre se separa, distante, sempre o mesmo?” (pag. 30), e que mesmo em crisis, “há também já um apontar de uma vitória que vivemos em nós.” (idem)

Finaliza o capítulo com esperança: “Portanto, não há razão para não desesperar. Mas é preciso encontrar o caminho prometido.” (idem)

SANTOS, Mario Ferreira dos. Filosofia da crise, São Paulo: É realizações, 2017.

 

Epistemologia e crise do pensamento

01 jun

O filósofo britânico David Hume, no século XVIII, escreve no Tratado da naturezaQuestionar humana, um questionamento da indução como mecanismo válido para a descoberta científica, foi a parte desta questão que Karl R. Popper, em A lógica da pesquisa científica, de Karl R. Popper (1902-1994), trouxe a “novidade” no debate da filosofia da ciência repetindo a ideia humeana.

O problema formulado por Popper tinha em sua base a separação, já feita também em todo idealismo, entre a metafísica (pseudociência) e a verdadeira ciência, a “ciência empírica”, mas Thomas Khun (1922-1996) em A estrutura das revoluções científicas vai questionar isto.

A história da ciência já demonstraria isto, ou seja, que periodicamente, um paradigma era substituído por outro, entretanto isto não se dá por uma simples observação incompatível com a teoria, conforme atestava o princípio da falseabilidade popperiano, o que ocorre é uma mudança de pensamento, ele cita Copérnico, mas Heisenberg com o princípio quântico e Albert Einstein com a Teoria da Relatividade são mais gerais.

O matemático e filósofo húngaro Imre Lakatos (1922-1974) seguiu as ideias de Popper, e o princípio da falseabilidade, amenizando-o: a história da ciência demonstraria que as teorias nunca eram completamente abandonadas, mesmo quando refutadas.

Paul Feyerabend (1924-1994) desenvolveu uma argumentação radicalmente inovadora em sua obra sugestivamente intitulada Contra o método, afirmando que nunca houve a possibilidade de estabelecer critérios objetivos para a avaliação das teorias científicas. Negando todo o método  do positivismo lógico, que defendeu um padrão metodológico único.

Entretanto esta crise já se aprofundou, já citamos Edmund Husserl, que perscrutava a crise das ciências europeias no desenvolvimento de sua fenomenologia, entre várias afirmações encontramos: “Com o despertar da reflexão da relação entre o conhecimento e o objeto, abrem-se obstáculos abissais.  O conhecimento, a coisa mais óbvia no pensamento natural, aparece de repente como um mistério”, e terá entre notáveis influencias posteriores como Heidegger e Gadamer, que retomam a questão ontológica, onde a consciência é essencial.

O sociólogo português Boaventura de Souza Santos, em seu escrito Um discurso sobre as ciências, revaloriza a polêmica introduzindo que a atenuação da distinção entre orgânico e inorgânico, humano e não-humano seria inútil, mas a questão da consciência não é tocada.

Edgar Morin, H.G. Gadamer, Lévinas e Ricoeur, além de outros pensadores contemporâneos concordam que é preciso uma virada no pensamento, envolto em complexidade e vivências

 

Epistemologia e ciências humanas

31 mai

Do meio do século XIX até o início do século XX, as ciências humanas CienciaNaturalptviveram uma verdadeira transformação na busca de uma alternativa para os fundamentos epistemológicos do conhecimento científico, pois os velhos modelos “positivista” e “naturalista” estavam em cheque.

Dilthey, sucessor de Schleiermacher que propôs o método hermenêutico, buscou fundamentos filosóficos para uma epistemologia do conhecimento científico, assim dizia: “As ciências que têm a realidade sócio histórica como seu objeto de estudo buscam, mais intensamente do que antes, as relações sistemáticas entre elas e com os seus fundamentos.” (DILTHEY, 1989, p.59).

Gadamer vai diferenciar a paridade com as ciências naturais com as ciências humanas (Geistewissenchaften), propondo que o que ocorre com uma interpretação artística, é diferente da leitura, pois “A leitura, enquanto distintas de um ´recital´, não se coloca por si mesma; ela não é uma atualização autônoma de um padrão de pensamento, mas permanece subordinada ao texto restaurado pelo processo de leitura. ” (GADAMER, 2012, p. 11).

O modelo ideal é romântico, como chamado por Gadamer, trata consequências para a epistemologia, pois “O seu ideal é decodificar o Livro da História. Esse é o método pelo qual Dilthey espera pode justificar a auto compreensão das ciências interpretativas e sua objetividade científica. ”  (idem)

Assim como os textos possuem um “sentido puro”, também a história o teria, na análise de Gadamer entretanto ”a sua auto compreensão com relação às ciências não é “verdadeiramente consoante com a sua posição fundamental em termos da Lebesphilosophie “ (filosofia da vida) (GADAMER, 2012, p. 12).

Esclarece que ela se encontra sempre “na conexão entre ´vida´, que sempre implica consciência e reflexividade (Besinung) , e ´ciência´, que se desenvolve a partir da vida como uma das suas possibilidades” (idem).

Assim, a implicação epistemológica clara: “As ciências humanas adquirem assim uma valência ´ontológica´ que não poderia permanecer sem consequências para a sua auto compreensão metodológica.” (idem)

Assim, as ciências humanas “encontram-se mais próximas da auto compreensão humana do que as ciências naturais. A objetividade destas últimas não é mais um ideal de conhecimento inequívoco e obrigatório.” (idem).

Irá buscar na Ética a Nicômacos os fundamentos perdidos, quando no livro sexto Aristóteles distingue: “do conhecimento teórico e técnico o modo do conhecimento prático, ele exprime, a meu ver, uma das maiores verdade que permitem ao pensamento grego trazer à luz a ´mistificação´ científica da sociedade moderna em que reina a especialização.” (GADAMER, 2012, pag. 13).

Referências

DILTHEY, W. Introduction to the Human Sciences. Ed. by R. A. Makkreel & F. Rodi; trad. Michael Neville. New Jersey: Princeton University Press, 1989.

GADAMER, H.G. O problema da consciência histórica, 3ª. edição, 3ª. reimpressão, Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2012.

 

Hermenêutica e fanatismo

29 mai

Desde a filosofia platônica, que foi uma superação do discurso dos sofistas queComunicaçãoNãoViolenta serviam unicamente a retórica de poder, o dualismo do conhecimento entre a Doxa que é a opinião e a Episteme que seria o conhecimento verdadeiro, mas alguns autores veem a Doxa como primeiro conhecimento.

Todo o discurso e a lógica Socrática, que Platão a usa abundantemente, não é senão o diálogo entre o conhecimento como se apresenta e a sua elaboração através de perguntas.

O fato que caímos num labirinto de dúvidas e crises na modernidade, mesmo com o conhecimento sistematizado não é senão o retorno ao que de fato é a episteme, como a vida muda, a lógica da vida também seria de se esperar, deve mudar e assim muda o método de investiga-la.

Chamo a esta exigência de nosso tempo de “abertura epistemológica”, permitir que novos sistemas e novas formas de pensar sejam possíveis e passíveis de análise, assim a doxa ou a simples opinião pode não ser apenas uma forma moderna de sofisma, mas um “desvelar”.

O fanatismo é de modo geral a recusa a uma “abertura epistemológica”, é o fechamento em um esquema “que deu certo” por um período, mas pode não mais servir a lógica da vida hoje.

Claro que há diversos níveis de fanatismo, mas em essência é um fechamento ao discurso do Outro, ao circulo hermenêutico onde é possível alguma forma de fusão de horizontes, como o chama o filósofo Gadamer.

Por assim dizer é a comunicação de que outro discurso diferente ao do meu circulo epistêmico não é aceito, não é tolerável e deve ser banido, daí a chegar-se a formas violentas de comunicação não é um passo, mas é um caminho quase inevitável.

Não é um fechamento epistêmico, uma ajuda é o livro de Marshall Rosenberg “Comunicação não-violenta” vai desde a autoajuda para libertar-se de condicionamentos e experiências negativas, até os esquemas filosóficos e problemas de posicionamentos políticos tão comuns em todas esferas de nossa vida hoje.

 

O espírito da Verdade no idealismo

16 mai

O idealismo moderno iniciado com Fichte (1762-1814) e Schelling IdealismTruth(1775-1854), como certa oposição a filosofia kantiana que é também idealista, terá seu ápice com Hegel (1770-1831), que afirma existir um “espírito absoluto” e que é ele com o qual o homem se relaciona mais profundamente, podendo se conhecer e que pode ser desdobrado em três níveis relevantes: a arte, a religião e a filosofia.

Parece forte e até verdadeiro, mas há críticos severos que dizem que a morte da arte acontece com Hegel, Marx de certa forma tenta anunciar o fim da filosofia ao afirmar que “os filósofos agora devem transformar o mundo”, e por último, a religião de Hegel não é senão a mais pura filosofia de Deus, não podendo alcançar o mundo e o homem concreto.

Claro a culpa não é exclusiva de Hegel, mas filosofia, arte e religião estão decididamente em crise atestam quase todos filósofos e teólogos, lendo o “último testamento de Bento XVI”, ele afirma que desde 1956 já ocorre um processo de “desmundialização” da religião, ou seja, a perda de sua universalidade.

Sobre o objeto da arte, lembro o texto de Heidegger sobre a questão da técnica, mas cuja crítica mais profunda é a da arte ao afirmar questionando-se sobre verdade, liberdade e acontecimento do ser e do ente, afirmará que “a arte é histórica no sentido essencial [… visto que] deixa a verdade brotar.  A arte, enquanto um conservar que funda, deixa brotar a verdade do ente na obra”, mas vê que ela hoje necessita de um desvelar.

A filosofia idealista expressa o “espírito absoluto” assim em Hegel: “O espírito só é espírito, na medida em que é para o espírito; e na religião absoluta é o espírito absoluto que se manifesta, não mais seus momentos abstratos, mas a si mesmo”. (HEGEL, 1980, p.346).

È um fechamento do espírito em si em um puro espiritualismo, sem uma para si que seja a abertura ao outro, esta é a religião contemporânea que quando manifesta-se em relação ao objeto externo não o vê dentro de si em sua subjetividade, Hegel expressa isto assim: “A filosofia se determina de modo a ser um conhecimento da necessidade do conteúdo da representação absoluta, como também da necessidade das duas formas: de um lado, da intuição imediata e de sua poesia, e da representação, que pressupõe da revelação objetiva e exterior; de outro lado, primeiro, do adentrar em si subjetivo, depois do movimento para fora subjetivo e do identificar da com a pressuposição.” (HEGEL, 1980, p.351).

A filosofia contemporânea, a partir de Heidegger com Gadamer, Paul Ricoeur e Emmanuel Lévinas, abre-a com a hermenêutica presente na Questão da consciência da história de Gadamer, no Outro de Paul Ricoeur e em Totalidade e Infinito de Emmanuel Lévinas.

 

HEGEL, G.W.F.  Fenomenologia do Espírito. Tradução Henrique Cláudio de Lima Vaz, Orlando Vitorino, Antônio Pinto de Carvalho. 2. ed. São Paulo: Vozes, 1980.

Nectarios G. Limnatis, German Idealism and the Problem of Knowledge: Kant, Fichte, Schelling, and Hegel, Springer, 2008.

 

Consciência histórica efeitual, a dor e o Outro

12 abr

Nesse sentido, fala-se numa inversão da consciência, mas a consciência em Hegel e Ooutroem todo iluminismo, segue como sendo a experiência se traduz num movimento dialético da consciência consigo mesma., ou seja em última instância, no saber absoluto percebe-se uma identidade de sujeito e objeto, mas na lógica da fusão e não da distinção entre sujeito e objeto. Isso retira toda a possibilidade e a legitimidade da experiência, já que o homem tem de estar no próprio conteúdo para aceitá-lo e a consciência adquirir certeza de si mesma;

Na lógica de Gadamer, “a essência da experiência é pensada aqui, desde o princípio, a partir de algo no qual a experiência já está superada. Pois a própria experiência jamais pode ser ciência“, ademais, Heidegger adverte que Hegel não pensa a experiência como dialética; pelo contrário, visualiza a dialética a partir da experiência, dir-se-ia não é a consciência do mundo, mas o mundo da consciência.

Se da experiência jamais se faz ciência por haver “uma oposição insuperável com o saber e com aquele ensinamento que flui de um saber teórico ou téncico”, objeto de vários estudos nossos, pois fica-se sempre diante de uma abertura para outras experiências. Deve-se aceitar o fato de que certezas e dogmas não perduram eternamente e são passíveis de alteração. A única certeza plausível é impossibilidade de se conhecer tudo. Quanto mais experimentado é um indivíduo, mais consciência tem das infinitas possibilidades do ser humano e mais tem consciência do seu Ser.   

Assim o caminho feito Gadamer possui elementos para concluir que a experiência é a consciência da própria finitude humana e das limitações, uma referência a filosofia clássica, em Ésquilo é bastante ilustrativa: “aprender com o sofrer”, ou seja, de forma dolorosa, o homem torna-se ciente da sua separação da divindade e da temporalidade de sua existência.  

Toda experiência, por mais que se pense consumada ou exaurida, constitui sempre abertura. Nem mesmo o próprio homem possui uma essência. O ser significa um poder ser si mesmo, pois tem por características a indefinição e as infinitas possibilidades. Dessa forma, torna-se incoerente falar da experiência no sentido teleológico, à semelhança de Husserl e Bacon, e da forma descaracterizada de Hegel.

A tradição precisa alcançar a experiência, assim como linguagem é complementar e dela vem à fala, que é um tu, deve-se diferenciar a experiência do tu da experiência verdadeiramente hermenêutica, vejam-se trabalhos de Paul Ricoeur e Emmanuel Lévinas, enquanto a primeira pode se dar sob a forma de conhecimento de pessoas, tornando o tu um objeto de análise, ou reconhecendo-o como pessoa, porém ainda permanece com referência ao próprio intérprete, a hermenêutica permite o outro como interprete é portanto um passo a frente no conhecimento da verdade.

A experiência hermenêutica é aquela que assume a consciência da história efeitual. A tradição precisa ser compreendida verdadeiramente como um tu. Toda alteridade tem algo a dizer e deve ser respeitada sua condição de outro. Não se pode impor pretensões ou concepções prévias. A abertura se dá de forma mútua, isto é, entre quem “escuta” e aquele que “fala algo”, inclusive com a possibilidade de que seja contrário ao intérprete, conforme Gadamer:

“A consciência hermenêutica tem sua consumação não na certeza metodológica sobre si mesma, mas na pronta disposição do homem experimentado ao que está preso dogmaticamente. É isto que caracteriza a consciência da história efeitual, como poderemos pronunciar mais detalhadamente a partir do conceito de experiência”.

 

 A consciência efeitual e a questão da experiência

11 abr

A consciência efeitual é o reconhecimento de que ela se estrutura sob a forma de Conscienciaefeitualexperiência em Gadamer, mas é preciso compreender a experiência hermenêutica, especialmente por se tratar de um conceito de difícil entendimento, pois a supervalorização do conhecimento científico, notadamente no século XIX, levou a uma distorção do seu real valor.    

Na ótica científica, experiência é tudo aquilo que pode ser repetido por quem quer que deseje a qualquer tempo, ou seja, liga-se fundamentalmente a um “caminho” objetivador do conhecimento, as vezes chamado de prática, mas qual prática ? . Gadamer foi revisitar justamente os que diversos matizes filosóficos entendem por verdade científico e método, não é uma conclusão apenas um “desvelar”.

Para Francis Bacon, todo conhecimento deveria vir da experiência.  Foi deste modo de certa forma despretensioso de encarar a experiência que depois chegou a uma generalização válida até que seja contraposta, propondo a interpretatio natura, via de acesso “gradual as generalidades verdadeiras e sustentáveis“ e que depois mais tarde foi sistematizado e tornado “método” por Hume, considerado o pai (talvez o avô) do empirismo, assim por meio da observação da natureza, o método indutivo permite o acesso ao geral, elevado a essa categoria após a organização racional dos dados obtidos e a comprovação das hipóteses, mas o empirismo também gerou contradições.

Husserl tentou livrar-se desta experiência parcialidade da vinculação com a ciência de toda experimentação, alegando que esta ocorre no mundo da vida, portanto, é anterior à sua idealização. Aqui no sentido da Crítica da Razão Pura de Kant, que tentou conciliar racionalismo e empirismo. Como se sabe, inspirado por Descartes, o fenômeno era algo que demonstrava “repúdio pelas ciências empíricas”, o que denota a falta de apreço pelas experiências tentando fazer toda interpretação pela “razão”. Se só pode ser verdadeiro aquilo que se torna evidente na consciência, certamente os sentidos levam a enganos. Contudo, Husserl permaneceu preso àquilo de que queria se libertar, mas Heidegger e Gadamer deram os passos necessários.

Gadamer se opusesse a objeção de simplificar o processo de produção da experiência, focando-se em sua relação com a ciência e com a formação dos conceitos. O processo de experiência verdadeiramente se dá em seu lado negativo, ou seja, desconstrói generalidades e tipicidades, não corresponde às expectativas, conforme afirma em Verdade e Método “a negatividade da experiência possui, por conseguinte, um particular sentido produtivo. Não é simplesmente um engano que se torna visível e, por consequência, uma correção, mas o que se adquire é um saber abrangente ”. 

O sentido negativo da experiência e a abertura constante a novas possibilidades remetem à dialética, questionamento este elaborado por Hegel, para quem a experiência representa uma manifestação do ceticismo, j amais se refaz uma experiência conforme a máxima de Heráclito de Éfeso: “não podes passar o mesmo rio duas vezes, as águas correm sobre ti”.

 

O problema da consciência histórica

15 mar

Em 1957 Hans-Georg Gadamer foi convidado a lecionar por um trimestre na HermeneuticaRomantica2Universidade de Louvain, em 1963 apareceu em francês com o título Le probleme de la conscience historique, e ainda não havia a obra maior do filósofo hermeneuta “Verdade e Método”.

Depois dela apareceu em 1969 uma versão italiana do texto, mas foi na versão inglesa de 1975, que conforme afirma Gadamer ele se “reencontrou consigo mesmo” revendo o texto original para publicação em inglês, desta edição foi feita a tradução para o português, como primeira edição em 1998, e a edição que leio é de 2006, 3ª. edição feita pela FGV.

O livro é, portanto um poderoso preâmbulo para quem deseja ler Verdade e Método, onde o problema da consciência histórica e sua relação com o método remonta a Schleiermacher e sua releitura feita por Dilthey, sendo Gadamer “seu ideal é decodificar o Livro da História” (Gadamer, 2006, p. 11).

As conferências de Gadamer que foram base a este opúsculo, refletem o “problema de introduzir o problema hermenêutico a partir da perspectiva de Husserl e Heidegger” (pag. 10), problema que foi portanto tratado de modo especial na Alemanha, onde graças a Wilhelm Dilthey e ao que se chama sua Lebensphilosophie” (idem), a filosofia da vida.

O problema da interpretação conforme as leis da natureza, em alemão Geisteswissenschaften*, Gadamer esclarece que em Verdade e Método ele começou deliberadamente a invocar outro exemplo, “representado pela experiência da arte e a dimensão hermenêutica, que intervém, com toda certeza, no estudo científico da arte, mas antes de tudo na própria experiência da arte.” (pag. 10)

Ele vai com isto se distanciar de Dilthey, que se propôs a construir uma base epistêmica para as Geiteswissenchaften, mas não se via como o filólogo, esclarece, mas como “um teórico do método de uma escola história que não via “a compreensão de textos e outros fragmentos do passado como seu objetivo último”, escreveu Gadamer citando Dilthey.

O que Dilthey esperava era conciliar as ciências interpretativas com sua objetividade científica, a ideia inicial era dar a hermenêutica um método universal.

Gadamer esclarece qual é sua posição: “mostrar que a autocompreensão com relação às ciências não é verdadeiramente consoante com a sua posição fundamental em termos da Lebensphilosophie” (pag. 12), e esclarece que a possibilidade humana do pensamento reflexivo, “não coincide em verdade com a objetivação do reconhecimento através do método científico.” (idem)

Vai esclarecer que a conexão entre a “vida” quando se fala de consciência e reflexividade e “ciência” (ele pôs entre parêntesis), desenvolver-se a partir da vida é uma das possibilidades.

*A tradução segundo o próprio Gadamer é “Ciências Humanas”, no Brasil “Humanidades”.