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Olhar os sinais dos tempos com serenidade
Apesar de todo cansaço, de um estímulo cada vez maior a vida activa, a sobrecarga de trabalhos e até de emoções, é possível encontrar atalhos para vida simples e bem vivida, ainda que em tempos bicudos.
O primeiro passo essencial é ter o diagnóstico certo, tantos livros de autoajuda, de boa alimentação, receitas de felicidade que parecem não mover as pessoas das crises de ansiedade, de medo, de angústia e com síndromes cada vez mais graves como a de Burnout.
O diagnóstico é uma sociedade que nos empurrou para um sobre trabalho, não apenas funcional que é necessário, mas com cargas suplementares de ativismo politico, social, religioso e até mesmo familiar como sendo “necessários” para se viver bem e enfrentar as dificuldades.
Não há espaço para contemplação, para repouso mesmo, para atividades de lazer, pois nelas também colocamos mais ativismo, filas intermináveis de carros para praias, campos ou outros retiros que nada mais são do que levar a agitação na mala.
Não sabemos ler os sinais dos tempos, e com isto o ativismo apenas aumenta o vazio e o senso de preocupação, o diagnóstico já apontado por Nietzsche tem uma receita em Kierkegaard voltar a ser o que somos, e dali caminhar para mudanças e evoluções com serenidade.
Os apocalípticos dirão sinais dos tempos, os pragmáticos dirão a humanidade é assim, sempre foi e sempre será, incapacidade de leitura dos tempos, a leitura não fundamentalista sobre o final dos tempos “Tomai cuidado para que vossos corações não fiquem insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da vida, e esse dia não caia de repente sobre vós” (Lc 21, 35), pode servir para nossos tempos, bem antes do final do mundo que vai demorar.
Não importa se isto seria o fim dos tempos, o problema é nos tornarmos insensíveis, ou ainda embriagados ou demasiado preocupados com a vida, ela se torna obscurecida.
Serenidade, diagnóstico e educação
A aparente causa de nossos problemas cotidianos parecem ser os avanços mais recentes, as inovações, a vida social, as “midias” de redes sociais e o sobre trabalho humano em diversas áreas, embarcamos no discurso fácil da liquidez, da hipercomunicação e do excesso de informação, este diagnóstico está correto.
Com diagnóstico errado receitamos o remédio errado, colocamos em nossas vidas mais exercícios, uma “vida de exercícios” diria Sloterdijk, mais alimentação natural e mais vida activa para isto, culpa do erro de diagnóstico e de ausência de um futuro claro.
A clareira só pode vir do pensamento, o apelo a prática é o pior remédio deixamos de ter um fim de semana de descanso e de atividades recreativas pois há assuntos “urgentes”.
O diagóstico deste drama atual estava já em Nietzsche (1834-1900), escreveu em Humano demasiado Humano: ‘’Por falta de repouso nossa civilização caminha para uma nova barbárie. Em nenhuma outra época os ativos, isto é, os inquietos, valeram tanto. Assim, pertence às correções necessárias a serem tomadas quanto ao caráter da humanidade fortalecer em grande medida o elemento contemplativo’’, uma mostra clara da datação do problema atual.
Pode ser até mesmo anterior, Kierkegaard (1813-1855) escreveu: “o remédio para a ansiedade é sermos como verdadeiramente somos”, apontando no início da modernidade o problema ontológico do qual padece grande parte da humanidade, querer ser o que não se é, ainda que seja bom a ousadia e a busca de novos horizontes, ela deve ser feita solidariamente com o Outro.
O diagnóstico, apontou o Padre Manuel Antunes, cujo nascimento comemorou 100 anos dia 3 de novembro, é contrapor o homo misericors ao homo mechanical, fruto da modernidade, que criou o que o sábio português chamou de “homem espuma”: ligeiro, sem consistência, sem fidelidades e sem convicções fortes.
A educação que deve decorrer daí precisa ser altamente dialógica, abrangente e transdisciplinar, defendeu isto o padre Manuel Antunes, defender Edgar Morin, Basarab Nicolescu e tantos outros, porém é necessário método para que não pare no discurso.
O método proposto por Gadamer, em sua leitura de Heidegger é o círculo hermenêutica, a possibilidade que a partir de pré-conceitos chegamos a uma fusão de horizontes e uma maior possibilidade de releitura da atualidade delineando caminhos para o futuro.
Serenidade e uma sonata a Kreutzer
Serenidade foi o tema de um discurso feito por Heidegger por ocasião de 175 anos do nascimento do compositor Conradin Kreutzer, em Messkirch, em 30 de outubro de 1955, mas o mesmo Kreutzer foi digno de um romance intitulado Sonata a Kreutzer, de Leon Tolstoi, que narra o dialogo sobre o casamento em uma viagem de trem, numa posição que é quase antagónica pois há um clima de suspense entre ambos que causa intriga e pessimismo.
O pensamento de Heidegger será demarcado por dois de seus escritos: Serenidade, de 1955, e outro a partir de uma conversa sobre o pensamento que teve lugar num caminho de campo, de 1945, onde Heidegger narra um longo diálogo entre três personagens, o Pesquisador, o Erudito e o Professor, sobre a questão do pensar.
O ponto de início sobre o pensamento pode ser o Que é metafísica?, escrito em 1929, onde Heidegger afirma: “de modo nenhum é o pensamento exato o pensamento mais rigoroso”, justamente por se prender ao objetivo último do cálculo, o qual “reduz todo o numerável ao enumerado, para utilizá-lo na próxima enumeração. O cálculo não admite outra coisa que o enumerável”, isto vem de encontro ao neologicismo do Circulo de Viena, e dos algoritmos.
O que causa no pensamento esta lógica é a pretenção de tudo abarcar e submeter, o pensamento calculador “não é capaz d suspeitar que todo o calculável do cãlculo já e, antes de suas somas e produtos, num todo cuja unidade, sem dúvida, pertence ao incalculável que se subtrai a si e sua estranheza das garras do cálculo” (Heidegger, 1943, p. 248 ).
Existem, portanto, dois tipos de pensamento, sendo ambos à sua maneira, respectivamente, legítimos e necessários: o pensamento que calcula e a reflexão (das Nachdenken) que medita. […] um pensamento que medita surge tão pouco espontaneamente quanto o pensamento que calcula. O pensamento que medita exige, por vezes, um grande esforço. Requer um treino demorado. Carece de cuidados ainda mais delicados do que qualquer outro verdadeiro ofício. Contudo, tal como o lavrador, também tem que saber aguardar que a semente desponte e amadureça.” (HEIDEGGER, 1955, p. 13-14)
O que Heidegger vai explicar nesta obra é que a relação entre pensamento e vontade, em conflito e de onde parte Nietzsche para suas reflexões, não é evocado segundo a tradição, o pensamento representacional que já tem, em si, uma das formas da vontade.
Segundo Heidegger, a forma de liberação do pensamento, que possibilita a forma (ela in-forma diríamos o pensamento) na aproximação das coisas, há uma aproximação não objetificadora, não apropriadora, marcada antes de tudo por um “estar desperto para a serenidade”.
Pode parecer, mas não é a passividade, pois o agir que se oculta no âmago da serenidade é de uma ordem mais elevada do que a das usuais maquinações humanas que envia a ação, ela não implica obrigatoriamente atividade, tal como esta é correntemente compreendida.
Para o pensador esta forma elevada, que embora não o dia está associada a meditação e a contemplação, erroneamente é associada a uma debilidade do querer, a serenidade pois seria fundamental este conter-se, como caminho do pensamento meditativo, é apresentada por Heidegger como a mais elevada forma do agir humano, tão necessárias nos dias de hoje.
Serenidade é antes um conter-se ao mero impulso, a ansiedade e ao agir compulsoriamente.
HEIDEGGER, Martin. Serenidade. Tradução de Maria Madalena Andrade e Olga Santos. Lisboa: Instituto Piaget, 1955.
HEIDEGGER, Martin. Que é metafísica? In: Os Pensadores. Tradução de Ernildo Stein. São Paulo: Abril Cultural, 1973.
Tempo de pausa: será que conseguimos
Ainda há um resto de novembro e dezembro já aparece no horizonte, em todo mundo é um tempo esperado para algo que deveríamos fazer sempre: pausa, espera e encontro com os amigos e familiares, a questão é: será que conseguimos?
Olhando o mundo os sinais sombrios continuam, maiores que os líquidos, pois se algo fosse realmente mudado de estado, do sólido para o líquido, até seria desejável porque algo estaria se movendo, mas parece a mesmice, tudo vai ficando com cara parecida.
Os protestos contra Macron e seus impostos, não é tão diferente de Portugal ou do Brasil, o Estado é enorme e pesa para a sociedade, quem pagará as contas, e os aposentados serão os que pagarão a conta ? incertezas e uma única coisa realmente clara: crise de época.
Há sinais de algum reflorescimento, palavra usada pela filósofa Martha Nussbaum, diria que sim, mas justamente onde as críticas mais pesadas caem: o mundo globalizado, a internet e o Estado “sólido” que vai tomando um feito mais sombrio, perigos à direita.
Participei de um evento de 100 anos do Padre Manuel Antunes, esse homem transdisciplinar, foi o tema de uma palestra escrita com um amigo, em sua obra Repensar Portugal, dizia que era preciso buscar em política, as “zonas temperadas” onde a natureza humana se sente mais confortável, porém a amostra de 2018 é de regiões mais radicalizadas, no sentido mal do termo.
É preciso pausa, ainda que forçada e no desconforto, olhar o futuro de modo que seja possível ter esperança, a paz e uma maior aproximação dos povos, o radicalismo nacional é perverso, a Europa costura um acordo possível para a saída da Inglaterra do bloco, o chamado Brexit.
Os EUA terminam o final do ano com o sonhado muro de Trump, e mexicanos pressionando do outro lado do muro, o que prova que não foi uma solução, mas o anúncio de uma crise.
Novos governos à direita no Brasil e na Colômbia, a esquerda no México vence depois de muitos anos de um partido monopolizar o poder, enquanto Nicarágua e Venezuela desfilam catastróficos governos de esquerda, Bolivia, Equador e Uruguai ficam em zonas temperadas.
Pensar um mundo mais integrado, a questão climática e a distribuição de renda se tornou mais difícil, o que se pode esperar é uma vigorosa reação do pensamento humano, o homem sempre foi capaz de enfrentar os desafios que apareceram, talvez o recuo seja uma retomada.
Simplicidade e profundidade: problemas modernos
Aprendi na infância com a simplicidade de meu pai que pode haver sabedoria e pensamento profundo onde não há cultura erudita, a razão é muito simples, algumas pessoas ficaram imunes a contaminação dos argumentos racionalistas, iluministas e idealistas.
Isto porque muita coisa no senso comum tem presente estes raciocínios, por exemplo, a visão mecanicista da relação causa e efeito, não vale mais com a física quântica, os argumentos muito usados como autoajuda contemporânea é contestado pelo poeta Fernando Pessoa: “querer não é poder”, pelo simples fato que existe o Outro, mas no argumento do poeta: “Quem pôde, quis antes de poder [para] só depois de poder”, mas conclui: “quem quer nunca há-de poder, porque se perde em querer”, poderia acrescentar à mansidão do post anterior.
Quanto a profundidade, não é pensador ou filósofo quem lê pensadores ou filosofia, mas quem aprendeu com treino de audição e leitura também, a meditar, pensar em contemplação, quase impossíveis em tempos ruidosos e ansiosos.
Pode pensar quando se tem tempo para isto, quando consegue sentir o Aroma do Tempo, diz no livro com este nome Byung-Chul Han: “o aroma não é de uma eternidade atemporal”, mas de estratégia de duração, diríamos de dilatação do tempo pela contemplação e aquietação do Ser, tão necessários a vida moderna.
Isto pode parecer por demais dispendioso, usar o tempo para em não “gastá-lo” em não “utilizá-lo”, é sim usar também o tempo de modo não consumista ou utilitarismo, como tempo do Ser.
E as pessoas simples, porque aprenderam na sua simplicidade a apreciar uma paisagem, uma flor ou mesmo uma boa música ou um belo quadro, na realidade estão educados a “ser”.
Lembro de meu pai na infância dizendo: “é melhor acender uma vela que amaldiçoar a escuridão”, parecia então provinciano e demasiado simplista, mas era pura sabedoria: a clareira.
Em termos bíblicos é minha interpretação hermenêutica dos “pobres de espírito”, num sentido que deixam passar fatos claramente e sem sentido e mergulham nos essenciais.
Disse o multifacetado artista Leonardo da Vinci: “A simplicidade é o último grau de sofisticação.”
O tempo do ser
Há um tempo do ser e um do não ser, reclama-se hoje da aceleração, mas o diagnóstico de Chul-Han em A sociedade do Cansaço não é tão distante daquele feito por Santo Agostinho 14 séculos atrás: “O que é o tempo? Como são o passado e o futuro, uma vez que o passado já não é e o futuro ainda não é?” e o presente? Mal dizemos “agora” e já caiu no passado”, isto num tempo em que nem a tecnologia da imprensa existia, o que muda hoje então ?
O direito ao esquecimento sancionado pela corte da União Europeia em 13 maio de 2014 dá o diagnóstico de uma “doença” moderna: a híper conectividade, na gíria brasileira: estar na “pilha”.
O auxílio de máquinas que nos deveria dar tempos de repouso ao transmitir parte de nosso trabalho a elas, e a poder executar tarefas longas mais rápido deveria nos dar descanso, mas não sabemos mais ter o período de contemplação e lazer, parece ser “um tempo perdido”.
Culpamos esta aceleração pela máquina do eficientismos, a concentração de capital, e outros fenômenos que são anteriores a internet, há inúmeros autores do século passado que tocam o assunto como a Paulicéia Desvairada, um conhecido romance de Mário de Andrade de 1922, o quadro d de Salvador Dali nos dá uma ideia sobre a “persistência da memória” ou os primeiros estudos da explosão da informação que fizeram Vannevar Bush pensar na máquina Memex na década de 40,
A mesmice do Mesmo que nunca é Outro, não é devido a tecnologia e sim ao não-futuro.
Diz Mário de Andrade sobre o ser artista, em seu poema dedicado a este:
O meu desejo é ser pintor – Lionardo.
cujo ideal em piedades te acrisola;
fazendo abrir-se ao mundo a ampla corola
do sonho ilustre que em meu peito aguardo.
Meu anseio é, trazendo ao fundo pardo da vida.
a cor da veneziana escola, dar tons de rosa e de ouro, por esmola.
a quanto houver de penedia ou cardo.
Quando encontrar o manancial das tintas
e os pincéis exaltados com que pintas,
Veronese! teus quadros e teus frisos.
irei morar onde as Desgraças moram;
e viverei de colorir sorrisos
nos lábios dos que imprecam ou que choram !
Talvez seja um tempo duro para fazer poesia, ou para contemplar, porém não podemos deixar o Ser morrer por causa de um Tempo cuja fragilidade do Ser sempre se esvai.
A expulsão do Outro
O olhar de Byung-Chul Han sobre a contemporaneidade não poderia ser mais autentico para o autor da Sociedade do Cansaço, da Salvação do Belo e do Aroma do Tempo, entre outros livros é claro, mas tem logo em suas primeiras páginas, a relação com tudo isto e com o belo: “Se uma flor tivesse em si mesma a sua plenitude ôntica, não teria necessidade de que a contemplassem” (Han, 2016, p. 13), parece paradoxal esta frase mas não é, está no seu livro “A expulsão do Outro” (HAN, 2016).
O autor analisa questão [em Max Scheler] de Santos Agostinho atribuir “de uma forma estranha e perigosa° uma necessidade às plantas:
“de que os homens as contemplem, como se, graças a um conhecimento do seu ser guiado pelo amor, experimentassem alguma coisa de análogo à redenção” [Han apud Scheler, 2016, p. 13).
Han esclarece que o conhecimento visto desta forma é redenção, mas note-se que não há como nesta forma separar sujeito de objeto na ação de contemplação, o que é longamente analisado em outro livro seu A sociedade do cansaço, aqui a relação amorosa com o objeto enquanto outro.
Nisto o autor distingue a simples notícia ou informação, “à qual falta por completo a dimensão de alteridade” (idem, pag. 13), aquela que seria capaz de revelar um mundo novo, uma nova compreensão daquilo que realmente é, fazendo de súbito que o novo apareça (idem).
Retomando Heidegger, afirma que todo esta falsa objetividade não significa outra coisa que “Senão esta cegueira aos acontecimentos” (Han, 2016, p. 14).
Embora sua visão seja excessivamente pessimista da rede e do digital, tem razão ao dizer que “a proximidade traz inscrita em si a distância como seu contrário dialético. A eliminação da distância não gera mais proximidade, antes a destrói” (Han, 2016, p. 15) e sentencia de modo categórico, que na falta de distância nem o idêntico que ela cria contém vida.
Retoma o tema de outro livro “A agonia do eros”, dizendo que “na pornografia todos os corpos se assemelham” e o corpo fica reduzido ao sexual não conhece outra coisa.
Faz uma rápida análise do filme de animação Anomalisa (figura acima) feito por Charlie Kaufman em 2015, que revela o inferno do idêntico, coloca o quadro Golconda de René Magritte, o surrealista belga, estilizado em seu livro “Enxame”.
O livro analisa ainda o terror da autenticidade, o medo e a alienação antes de analisar a linguagem e o pensamento do Outro, o pensamento moderno não é outra coisa como consequência do “esquecimento do ser”, da separação de sujeito e objeto, a expulsão do Outro.
HAN, Byung Chul. A Expulsão do Outro, Lisboa: Relógio d´água, 2016.
Luta pela paz, com mansidão e justiça
A história da humanidade é até os dias de hoje uma história de guerra do Mesmo contra o Outro, o livro A expulsão do outro de Byung-Chul Han não é senão a constatação desta realidade.
É nosso destino, uma fatalidade, penso que não, quando mais se falou de paz se fez a guerra, talvez quando mais se fale de guerra possa ser pensada a paz, a Terra como pátria humana.
Os desafios são imensos, e os medos crescem a cada novo governo autoritário, é bom que se diga também há ilhas de esquerda, e fortaleza de direita que não são senão pessoas “eleitas”.
Não penso em resistência nem em oposição, continuo a pensar em transformação, o grande retrocesso que acontece em toda humanidade, se fosse localizado seria fácil tem uma só leitura: não conseguimos ir a frente, os saudosistas dizem: “como era bom aquele tempo”, qual ?
Lutar pela paz deve ser também pela justiça e contra toda sorte de opressão, engrandecer a sabedoria simples e entender que é preciso profundidade para ser simples, uma “sofisticação” como disse Leonardo da Vinci, e estabelecer um espírito de mansidão onde seja possível pensar.
Sem deixar de perceber uma dose excessiva de autoritarismo é hora de perguntar, qual o lugar exato do estado na vida cotidiana? sua abrupta interferência até na vida pessoal não é senão uma forma de autoritarismo? temos câmaras e radares a cada quilômetro, não é exagero.
Armas para a paz, não faz o menor sentido, mais armas mais violência, nunca o contrário.
Lembram as bem-aventuranças bíblicas Mt 5,5: “bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra”, claro o que vejo hoje é o poder na mão de raivosos e autoritários, mas não é o fim.
O verso longo seguinte é praticamente um alerta para a justiça Mt 5,6: “Bem-aventurados os que têm fome e se de justiça, porque serão saciados”, e, mais a frente Mt 5,9: “os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus”, será que o humanismo morreu ?
O fato que todos, ou pelo menos uma grande parte da humanidade, tem uma percepção que algo precisa ser feito com urgência para superar os “perigos contra a humanidade” nos desafia.
É urgente uma governança mundial, e não menos urgência programas de distribuição de renda.
O colapso ecológico, e nas grandes metrópoles também o urbano pedem medidas mundiais.
Lembro as duas bem-aventuranças como estímulo para aqueles que lutando pela humanidade sofrem perseguições, injustiças e calúnias.
Mt 5,11 “Bem aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem, e, mentindo, disserem todo tipo de mal contra vós, por causa de mim”, isto é cristianismo, o resto maldade.
Porque andamos cansados visto como um tema geral
Um destes livros pequenos que a gente lê e descobre coisas incríveis, foi o livro de Kazuo Ishiguro, prêmio Nobel de Literatura em 2017, seu opúsculo Minha noite no século XX.
Seu discurso na Academia Sueca no recebimento do prêmio conta sua infância num distrito da Inglaterra, suas primeiras obras, a descoberta de Marcel Proust, sem dúvida uma influência em seus romances, mas algo me chamou a atenção, considerar-se um escritor cansado.
Já havia lido em A sociedade do cansaço de Byung-Chul Han as doenças contemporâneas como a depressão, a hiperatividade, a Síndrome de Bournout, ansiedade e outras que parecem ser a paisagem neste início de século XXI.
As receitas de Chul Han, são tentar recuperar a vitta contemplativa, Edgar Morin vai falar de conviviabilidade e educar para a vida, mas a questão de fundo é de onde vem este cansaço.
A resposta fácil é a tecnologia e a vida corrida do dia a dia, mas a primeira é uma resposta fácil para o que vem acontecendo a 20 anos no máximo e o problema é anterior, a segunda é simplista, talvez para o homem do início do século passado o dia-a-dia já era corrido e convivia com isto, no Japão do pós guerra as pessoas tiravam o stress em máquinas eletrônicas e o ritmo não era nem sombra do que é hoje.
Enfim parece que há um problema realmente de fundo, e isto está ligado a existência humana, podíamos ser felizes pensando na vida futura após a morte, isto hoje não basta, podíamos ser felizes pensando num bom casamento e num bom salário, isto hoje é pouco, falta algo mais.
A filosofia chamou este problema de existencial-ontológico, a religião e uma parte dos pensadores chama de ¨secular¨, Nietzsche chamou de nihilismo, e antes dele Kiegaard perguntou porque existe tudo e não o nada, ou perguntar sobre o que é o mal.
Kieekegaard escreveu em sua obra O Desespero Humano, vejam que isto é do século XIX, mais precisamente em 1849 com o pseudônimo Anti-Climacus, onde ele afirma que a origem do desespero está na imaginação, onde o homem pode criar uma relação fantasiosa consigo mesmo, e na minha modesta interpretação, justamente na sociedade que quis retirar de cena o imaginário, a fantasia e as crenças, segundo os iluministas todas no campo da “superstição”.
O pós-maniqueísta Agostinho de Hipona concordaria com Nietzsche dizer “aquilo que se faz por amor está sempre além do bem e do mal”, e, portanto, mais que a arte, a contemplação e a própria vida, é o Amor que pode dar sentido a tudo, e para isto precisamos de ter “alma”, ou “aura” ou alguma forma concreta de espiritualidade.
Não é algo fundamentalista ou puramente religioso, mas significa reconhecer que além do objetivo, do humano e do concreto precisamos de algo de sentido profundo para a vida, e sem dúvida isto deve estar de alguma forma ligado a um sentimento impossível de definir, porém tão concreto quanto qualquer coisa que se pretenda objetiva: o Amor dá sentido a vida.
Zero UI – interfaces do Futuro
Na definição simplificada de Andy Goodman Zero UI é o uso da percepção de um objeto para a manipulação de um objeto projetado em um outro ambiente – real ou virtual. Leia o resto deste post »