Arquivo para a ‘Ciência da Informação’ Categoria
Cegueira, lucidez e serenidade
O que pode ser chamado de cegueira na literatura, quase sempre ultrapassa a simples dificuldade de funções visuais, ao menos uma deve ser considerada que é a das faculdades cognitivas que em última análise desenvolvem e adaptam o pensamento às percepções visuais.
Assim há uma cegueira civilizatória, aquela que não percebe os obstáculos e até abismos que podem se abrir no processo civilizatório contemporâneo, as forças e o domínio das forças da natureza, como pensava Heidegger sobre as técnicas, que impedem um pensamento reflexivo.
Olhar para a cegueira apenas como a dificuldade do campo visual, a realidade imediata é assim a pior das cegueiras, incapaz de contemplar a essência do Ser, aquilo que é designo de cada homem durante a sua vida pessoal e social.
Assim ao desenvolver as funções cognitivas o homem pode ganhar lucidez, olhar com clareza para a própria vida e a de sua sociedade e cultura, pode leva-lo além desta clareza a uma vida de serenidade e de paz, ainda que esteja numa vida social em conflito.
Não é a paz cômoda ou individualizada, mas aquela que é capaz de lidar com contradições, oposições e incompreensões, comuns em um processo de crise civilizatória.
A realidade que vivemos pode levar mais rapidamente a uma ruptura de lucidez e serenidade e quanto mais longe delas, mais dificuldades para encontrar caminhos e veredas de retorno a paz.
Uma das passagens mais elucidativa da leitura bíblica cristã sobre a cegueira, é a cura de um cego de nascença, que, portanto, não desenvolveu o aparato cognitivo para enxergar e assim teria dificuldade de perceber os objetos, cores e seres a sua volta, mais do que ter a função da visão, ele compreende cognitivamente o que está vendo.
Diz a passagem os fariseus questionavam a cura do cego (Jo 9,10-12): “Então lhe perguntaram: ‘Como é que se abriram os teus olhos?’ Ele respondeu: ‘Aquele homem chamado Jesus fez lama, colocou-a nos meus olhos e disse-me: ‘Vai a Siloé e lava-te’. Então fui, lavei-me e comecei a ver.’ Perguntaram-lhe: ‘Onde está ele?’ Respondeu: ‘Não sei.’”
E os contemporâneos de Jesus continuaram na cegueira sem entender a cura do cego.
Serenidade e o pensamento que calcula
O livro “A Serenidade” de Heidegger vai dividir o pensamento contemporâneo entre o que calcula e o que medita, sobre o que calcula afirma:
“O pensamento que calcula (das rechnende Denken) faz cálculos. Faz cálculos com possibilidades continuamente novas, sempre com maiores perspectivas e simultaneamente mais econômicas. O pensamento que calcula vai de oportunidade em oportunidade. O pensamento que calcula nunca para, nunca chega a meditar.” (p. 13).
Ele argumenta que não se trata de uma meditação “elevada”, todo homem pensa e o pensamento pode levar a meditação, basta meditar sobre o aqui e agora que está a nossa volta.
Heidegger lembra que todos devemos pensar sobre nossas raízes, dito de modo mais contemporâneo não negar nossas origens e suas influências em nossa visão de mundo, mesmo que limitada, afirma: “o enraizamento (die Bodentändigkeit) do Homem actual está ameaçado na sua mais íntima essência. Mais: a perda do enraizamento não é provocada somente por circunstâncias externas e fatalidades do destino, nem é o efeito da negligência e do modo superficial dos Homens. A perda do enraizamento provém do espírito da época no qual todos nós nascemos” (p. 17).
É isto que faz Heidegger e outros filósofos atuais analisar os fundamentos do pensamento atual, Edgar Morin também fala desta necessidade de superar este pensamento alertando para a visão contemporânea da educação.
A mais atual e surpreendente visão de Heidegger, publicada em 1955, é a característica de nossa época onde “a mais atormentadora é a bomba atômica”, ele percebe que o pensamento que calcula vê apenas as possibilidades industriais e liberação das energias da natureza, porém o filósofo medita sobre o que significa este domínio.
“O poder oculto na técnica contemporânea determina a relação do Homem com aquilo que existe. Domina a Terra inteira. O Homem começa já a sair da Terra em direção ao espaço cósmico …” (p. 19), que além de ser incrivelmente atual tinha também um presságio sobre o futuro.
Mas não deixou de ver o perigo destas “grandes energias atómicas”, e assim: “assegura à humanidade que tais energias colossais, subitamente, em qualquer parte – mesmo sem ações bélicas -, não fogem ao nosso controle, e “tomam o freio nos dentes” e aniquilam tudo ?” (p.20).
Vimos os acidentes de Chernobyl e Fukushima (foto) esta perda de controle, agora vemos a uma guerra que aponta para o uso bélico destas forças, Heidegger tem razão ao pedir serenidade e meditação.
HEIDEGGER, M. Serenidade. trad. Tradução de Maria Madalena Andrade e Olga Santos. Lisboa: Instituto Piaget, s/d.
Da lucidez à serenidade
Se a clareza (ou claridade) é propriedade da lucidez, a lucidez precede a serenidade, ou seja, pode-se ter lucidez sem que se atinja a serenidade, este estado de espírito é algo muito atual, é uma busca do homem na modernidade.
A obra “Serenidade” de Heidegger, publicada em 1955, mas como meditação foi feita em 1949, por ocasião do centenário de morte de Conradin Kreutzer, compositor conterrâneo de Heidegger, ambos nascidos na cidade de Messkirch, porém em épocas diferentes.
Heidegger neste opúsculo vai diferenciar o pensamento reflexivo (ou meditativo) do pensamento calculador (ou maquínico) próprio de nosso tempo, assim vai comparar o pensamento de nosso tempo com a música, “limitamo-nos a ser entretidos por um discurso. Não é necessário pensar enquanto ouvimos a narração, isto é, meditar (besinnen) sobre algo que, na sua essência sobre algo que, na sua essência diz respeito a cada um de nós direta e continuamento” (p. 11)
Assim “A crescente ausência-de-pensamentos assenta, por isso, num processo que corrói o âmago mais profundo do homem atual: “o Homem atual ´está em fuga´ do pensamento” (p. 12)
Por outro lado, o pensamento maquínico assenta-se na técnica (veja que o texto é de 1955), onde “o pensamento que calcula não é um pensamento que medita, não é um pensamento que reflete sobre o sentido que reina em tudo que existe” (p. 13)
Heidegger sabe que um dos argumentos sobre a reflexão é que “a pura reflexão, a meditação persistente, é demasiado ´elevada´ para o entendimento comum” (p. 14), diz ao homenagear seu conterrâneo músico, que bastaria pensar no que significava naquele momento a sua terra natal, onde surgiu a música extraordinária de Kreutzer, lembro de um conto de conto de Leon Tostoi que falava desta dinâmica dos sentimentos justamente num conto chamado “Sonata a Kreutzer”.
Propõe assim aos presentes “o que nos sugere esta celebração, se estivermos dispostos a meditar? neste caso, atentamos que, do solo da terra natal medrou (gedieben) uma obra de arte. (p. 15)
Assim não é preciso um pensar elevado, mas apenas uma pequena pausa, um silêncio na alma.
HEIDEGGER, M. Serenidade. trad. Tradução de Maria Madalena Andrade e Olga Santos. Lisboa: Instituto Piaget, s/d.
Sobre a lucidez
Já postamos sobre a cegueira, em alguns ensaios (sobre o ensaio de José Saramago que virou filme do brasileiro Fernando Meirelles em 2008) e também fizemos relação com A peste de Albert Camus, fazendo uma relação com a guerra, 3 coisas relacionadas e analisadas foram de nosso tempo (a Pandemia, a cegueira da visão na Pandemia e a Guerra), também postamos a semana passada sobre a clareira.
Agora fazemos o movimento inverso, analisemos a lucidez e o que ela significa na história da humanidade, partindo novamente de Saramago olhemos seu Ensaio sobre a Lucidez, isto porque ele faz um jogo interessante para nosso desenvolvimento aqui, uma alegoria entre claro e escuro.
É importante esta relação porque Saramago recupera elementos do primeiro ensaio da cegueira (a cor branca como símbolo, por exemplo, as personagens e a epidemia de gueira) pode-se dizer que é um prolongamento da primeira narrativa.
A lucidez fala de uma eleição onde dois partidos ficaram com apenas cerca de 8% dos votos, com uma expressiva votação em branco, ao contrário de muitos argumentos sobre esta possível despolitização, Saramago faz um contraponto curioso, ele não viveu a polarização atual:
“… é porque aqueles votos em branco, que vieram desferir um golpe brutal contra anormalidade democrática em que decorria a nossa vida pessoal e colectiva, não caíram das nuvens nem subiram das entranhas da terra, estiveram no bolso de oitenta e três em cada cem eleitores desta cidade, os quais, por sua própria, mas não patriótica mão, os despuseram nas urnas.”
Resolve-se fazer uma pesquisa, mas os 83% não se manifestaram até que uma pessoa resolve enviar uma carta aos líderes, e foi esta carta que deu rumo novo a investigação e por mais resistência que houvesse, o governo não cederia tão fácil, pode-se perceber onde está o problema.
Essa leitura às avessas do nosso cenário político, que não é muito diferente dos EUA e Itália, só para dar dois exemplos, é muito interessante para se compreender a lucidez política, que parece andar na contramão na política contemporânea.
SARAMAGO, J. “Ensaio sobre a lucidez”. Ed.: Companhia das Letras, 2004.
A floresta que limita a clareira
O homem moderno, vítima de ideologias, culturas e apostasias religiosas vivem apenas com a consciência da liberdade individual, sem compreender de fato quem é o Outro que não é igual, o filósofo coreano/germânico Byung Chul Han desenvolveu isto em “A expulsão do outro: Sociedade, percepção” (Editora Vozes) no qual fala do vazio adiposo da plenitude.
Este vazio, nada tem a ver com o epoché fenomenológico, abertura da mente e da alma para dialogar e receber o Outro, o diferente, o discurso e a narrativa contrária a nossa, para depois fundir os horizontes no “circulo hermenêutico”, o vazio de alma é positivo, nos eleva.
Através de sucessivas tragédias, a pandemia foi a primeira e não será a última, e aqui não se trata de discurso apocalíptico, e sim da constatação social de uma crise civilizatória em processo cada vez mais profundo e perigoso, não apenas nos governantes, mas também na consciência pessoal.
Chul Han chega a falar estes processos são obscenos na “hipervisibilidade, a hipercomunicação, a hiperprodução, o hiperconsumo, que levam a uma rápida estagnação do igual. Obscena é a ‘ligação do igual com o igual” (Han, 2022) enfim tudo de traduz numa mesmice obscena.
Cita um exemplo muito ilustrativo que é a animação Anomalisa de Charlie Kaufmann (foto), que fala de uma palestrante Michael que vai a Cincinnati para uma palestra e lá se aproxima de uma pessoa por sua voz, Lia é uma pessoa que já o conhece e veio para ver sua palestra e se apaixonam.
Mas o inferno do igual são os funcionários do Hotel, todos iguais e que querem seduzir Michael.
O ensaio dá ênfase ao amor erótico, porém isto serve também para o amor agápico, sem se apaixonar e dialogar com o diferente, vivemos no inferno do igual, no nosso circulo vicioso, em um ambiente cheio de vícios e de obscenidades, no pior sentido da palavra.
Na narrativa bíblica, Moisés que tentava levar seu povo a um caminho novo, queriam apedrejá-lo e blasfemavam contra a proposta de uma vida diferente (Êxodo 17,3-7), chegam a pedir a volta da escravidão egípcia (qualquer semelhança com a política atual não é coincidência), e também no capítulo 4 de João, Jesus vai ao encontro da samaritana, mulher e “pagã” e dialoga com ela.
Na semana que se comemorou o dia da mulher, é importante isto que não é um detalhe bíblico, mas a essência de sua mensagem, Jesus ao encontrar-se com ela que estranha seu interesse e diz “Como é que tu, sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou uma mulher samaritana?” (Jo 5,9).
A obscenidade e a mesmice do igual não só empobrecem cada um, mas limita o processo civilizatório que é enriquecedor quanto mais o diferente possa existir com dignidade.
HAN, B. C. A expulsão do outro: sociedade, percepção. Trad. Lucas Machado.Petrópolis, Vozes, 2022.
A consciência social e a individual
Não há consciência social, sem passar pela individual, ela está vinculada a visão de mundo (cosmovisão), aqui que na filosofia idealista é vista como dois seres separados: o ser-em-si e o ser´para-si, se olharmos do ponto de vista ontológico, isto significa como as coisas se apresentam para nós na nossa consciência, há então o fenômeno (aparição) ou não daquilo que existe aí no mundo (Dasein).
A consciência social, vista pelo idealismo como para-si, elaborada primeiro por Hegel, mas depois fundida com a ontologia existencial de Jean Paul Sartre, é vista assim: “é a consciência que ao se defrontar com o mundo torna-se um processo dinâmico (contrastando com a inércia do em-si) e faz com que o em-si se desvele” (CABRAL, 2023).
Porém na cosmovisão heideggeriana a questão do ser-no-mundo, como fundamento do ser-aí, deixa de ter significado de um juízo estético e passa a ser uma indicação ontológico-hermeneutica, dado que aponta à pergunta pelo sentido de ser do ser-aí, como toda boa filosofia é uma questão.
Que visão temos do mundo individualmente, é claro que sobre a influência de nossa cultura e de nossa adesão a filosofias, ideologias e religiões, não está descolada de nosso Ser, enquanto um estatuto ontológico, e assim precede a visão do ser para-si no sentido idealista, podendo ter um sentido transcendente que vimos no post anterior.
Um para-si além do humano é aquele que encontra o Outro, que não é nosso espelho, porém com ele travamos uma fusão de horizontes (no sentido do círculo hermenêutico) onde podemos realizar uma dialogia, nisto se fundamenta qualquer sentido religioso ou cultural verdadeiro.
É possível por algum tipo de isolamento pessoal, não se trata do autismo é bom que se diga, não ter consciência social, porém ela passa necessariamente pela consciência do Outro, assim cabe a pergunta sociológica e também ontológica: quem é o Outro na consciência individual.
O resultado de uma consciência individual que passa pela percepção do Outro é uma consciência social límpida, sem distorções de culturas, filosofias e religiões, estas vistas aqui como negativas, isto é, ausência de culturas, filosofias ou religiões dignamente compreendidas e elaboradas.
CABRAL, João Francisco Pereira. “Consciência e suas relações com o outro e o ser-em-si, segundo Sartre” em texto para o Brasil Escola. 2023. http: Brasil Escola,
Clareira: método e contestação
É através da fenomenologia que é possível retomar a positividade do ente em relação à única transcendentalidade possível, onde a coisa se abre na dimensão do transcendental aquela que no post da semana passada desenvolvemos e que de certa forma é oposta ao transcendente de Kant, que vai em direção ao conhecimento do objeto e por isto se confunde com a subjetividade.
Na fenomenologia há uma consciência intencional em seu “a priori”, tomado de forma parecida ao subjetivo (próprio do sujeito), porém a consciência como fenômeno deixa transparecer o que está encoberto, o que os gregos chamavam de “alétheia”, porém naquele momento a ciência e toda a consciência dela era inicial.
Na experiência fenomenal da clareira (lichtung) ocorre a verdade do ser que se doa com uma espécie de “arqui-fenômeno” (Ereignis), esta é a coisa mesma da fenomenologia, onde está a sua intencionalidade, mas também esta permanece oculta.
Se fazemos um vazio na consciência de forma fenomenal (o époche fenomenológico), nos abrimos a nossa verdade podemos entrar numa clareia antes mesmo de uma evento externo nos aclarar, esta é a razão do humanismo tanto em Heidegger como em Sloterdijk estarem presos ao histórico, presos a nossa cosmovisão limitada.
Foi Hans Georg Gadamer que desenvolveu “A questão da consciência histórica” em sua contestação da verdade histórica romântica que é uma quase-determinismo defendido por muitas variantes do pensamento de esquerda (Marx não a defendia), porém há a questão do “tempo natural” em oposição ao “tempo humano”, uma autopercepção da própria consciência.
O método do círculo hermenêutico é uma forma de romper esta concepção de consciência apenas “temporal”, porém se esbarra no que deve ser o “além do humano”, envolto de mistério e vícios de interpretação histórica.
Diz Rüsen (2011) que há um tipo de consciência histórica feita por meio da “transformação intelectual do tempo natural em tempo humano”, entendendo o tempo natural como eventos contingentes e tempo humano como representações humanas da própria vida.
Poucos conseguem ver nas próprias representações falseamentos da verdade, interpretações e sentimentos reprimidos que não “clareiam” a consciência, isto visto num panorama civilizatório transforma conceitos autoritários, desumanos e destrutivos em obscurecencia da consciência, para não usar novamente a alethéia grega.
RÜSEN, Jörn. Razão histórica: teoria da história: os fundamentos da ciência histórica. Tradução Estevão de Rezende Martins. Brasília, DF: Universidade de Brasília, 2001.
A civilização e a clareira
O mérito de Heidegger ter escrito sobre a clareira em pleno período pós guerras mundiais, foi o de voltar a contemplar aquilo que essencialmente estava obscurecido: O Ser, não só o ser humano, já que suas Cartas sobre o Humanismo foi polemizada por Peter Sloterdijk (bem mais tarde), mas principalmente por retomar a questão da Vida do Ser.
Diz a leitura Heideggeriana: “O destino se apropria como a clareira do ser, que é, enquanto clareira. É a clareira que outorga a proximidade do ser. Nessa proximidade, na clareira do Da lugar, mora o homem como ex-sistente, sem que ele já possa hoje experimentar e assumir esse morar” (em Cartas sobre o Humanismo, 1967).
Esta clareira é diferente de qualquer ideia sobre a modernidade, como iluminismo ou algum processo místico de iluminação, diz Heidegger: “”… o claro, no sentido do livre aberto, não possui nada de comum, nem sob o ponto de vista linguístico, nem no atinente à coisa que é expressa com o adjetivo luminoso’, que significa ‘claro'”, em outro escrito seu sobre a tarefa do pensamento.
Volta a ser importante em meio a ameaças de guerra (veja nosso post anterior), o pensar e o desejo de transformação política e social não pode deixar submergir a ideia do “Ser”, o fato que somos e que a morte e a guerra escondem este verdadeiro propósito, que é a vida do Ser.
Este livre aberto significa que podemos diante de uma situação de negação do Ser, ter a visão do que é ex-sistente, não como iluminação, mas coo visão real daquilo que está em nossa presença, na filosofia grega o nosso “ón”
Não se trata de revelação, mas sim de “desvelação”, isto é, algo que está sempre presente em nós, mas oculto e quase dormente, retomando a leitura de Parmênides sobre o Ser, escreveu Heidegger: “Na medida em que o ser vige a partir da alétheia, pertence a ele o emergir auto-desvelante. Nós denominamos isso a ação de auto-iluminar-se e a iluminação, a clareira “, entendendo iluminação aqui como visão e não como “esclarecimento” e aletéia como não-esquecimento (a-lethe).
A crescente barbárie não é fruto só das questões sociais emergentes ou da disputa política territorial, mas da ocultação do Ser.
HEIDEGGER, Martin. Carta sobre o humanismo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1967, p. 61.
Guerra e o fim do inverno
A estratégia russa era “congelar” os ucranianos e seus aliados da Europa no inverno, assim não só limitou o envio de gás como também bombardeou várias fontes energéticas na Ucrânia, com a Europa estoca gás antes e sabendo da estratégia russa, foi buscar gás natural em outras fontes, como na África, e agora estamos no fim do inverno lá (e verão aqui no hemisfério sul).
Uma possível tática de guerra agora seria uso de armas biológicas, já há denuncias que isto tenha ocorrido na Ucrânia, elas são proibidas por acordos internacionais, porém um confronto direto com a Otan traria um desgaste enorme além da possibilidade de uma catástrofe nuclear.
A votação e a intervenção do Brasil para a paz tiveram reação negativa na Rússia, que já alertou o Brasil para uma posição de confronto, o Brasil foi o único país a votar contra a intervenção russa na ultima votação que aumentou a rejeição a intervenção russa, não há outro nome para o fato.
O final do inverno trás um período de grandes alagamentos e terrenos movediços e o avanço de forças terrestres não é possível, os jovens recrutados para a guerra na Rússia não tem habilidades para armamentos pesados e aviação em sua grande maioria.
Qual o caminho para a paz no momento, o Brasil tenta formar um bloco “neutro” que dialogue com os dois lados, porém a OTAN é parte fundamental da guerra na Ucrânia e aí está a dificuldade.
O jornal alemão Der Spiegel afirmou que a chefe da Comissão Européia, Ursula von der Leyen disse que o tempo de paz acabou na Europa, é uma declaração grave, que veio em resposta as ameaças russas, também já há um movimento visível (tenho conhecimento de alguns casos) de serviços que podem ser feitos home office estarem se deslocando para fora da Europa.
No caso de uma guerra biológica, claro esperamos que jamais chegue a este ponto, a evacuação de muitos serviços seria inevitável e um clima totalmente bélico se instalaria no continente.
Esperamos e sempre acreditamos que a paz possível, e os homens desejarem.
A narrativa eletrônica
A rápida evolução da Inteligência Artificial, depois de uma séria crise até o final do milênio, trás no cenário da divulgação científica e às vezes até mesmo na própria investigação científica, tanto um aspecto mistificador que a vê além das possibilidades reais ou aquém do que é capaz.
Por isso apontamos no post anterior a evolução real e sofisticação dos algoritmos de Machine Learning e o crescimento da tecnologia de Deep Learning, esta é a evolução rápida atual, a evolução dos assistentes eletrônicos (já estão no mercado vários deles como o Siri e a Alexa) é ainda limitada e comentamos num post sobre a máquina LaMBDA que teria capacidade “senciente”.
Senciente é diferente de consciência, porque é a capacidade dos seres de perceberem sensações e sentimentos através dos sentidos, isto significaria no caso das máquinas terem algo “subjetivo” (já falamos da limitação do termo e sua diferença da alma), embora elas sejam capazes de narrativas.
Esta narrativa or mais complexa que seja é uma narrativa eletrônica, um algorítmica, com a interação de homem e máquina através de um “deep learning” é possível que ela confunda e até mesmo surpreenda o ser humano com narrativas e elaborações de falas, porem dependerá sempre das narrativas humanas das quais são alimentadas e criam uma narrativa eletrônica.
Cito um exemplo do chatGPT que empolga o discurso mistificador e cria um alarme no discurso tecnófobo e cria especulações até mesmo sobre os limites transumanos da máquina.
Uma lista de filmes considerados extraordinários, exemplifica o limite da narrativa eletrônica, devido a sua alimentação humana, a lista dava os seguintes filmes: “Cidadão Kane” (1941), “O Poderoso Chefão” (1972), “De Volta para o Futuro” (1985), “Casablanca” (1942), “2001: Uma Odisseia no Espaço” (1968), “O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel” (2001), “Um Sonho de Liberdade” (1994), “Psicose” (1960), “Star Wars: Episódio V – O Império Contra-Ataca” (1980) e “Pulp Fiction” (1994).
Nenhuma menção do japonês Akira Kurosawa, do alemão Werner Herzog ou do italiano Frederico Felini, só para citar alguns, sobre ficção não deixaria fora da lista Blade Runner – o caçador de androides, bem conectado as tecnologias do “open AI” ou o histórico Metrópolis (de 1927 do austríaco Fritz Lang).
A narrativa eletrônica tem a limitação daquilo que a alimenta que é a narrativa humana, mesmo sendo feita pelo mais sábio humano, terá limitações contextuais e históricas.