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Arquivo para fevereiro, 2020

Podres poderes e o Outro

28 fev

Há algo além da vontade de poder, sim há um não ser, que não despersonaliza nem implica em perda de identidade, mas em dialogia com o Outro, com aquele que não é meu espelho.
A afirmação, o empoderamento de pessoas e grupos em fechamentos lógica de identidade, não são nem originárias no sentido de preservar o diálogo com as tradições culturais, nem são de fato poder porque implica em submeter o Outro que é um a alguma identidade que não é a dele.
Assim a verdadeira identidade ontológica, ao contrário da lógica que é individualista ou de fechamento em grupos, muitos vezes criticamos o individualismo do Outro porque não admitimos sua identidade originária (aquela que vem de raças, culturas e tradições) e em última análise não admitimos o seu Ser, e para admiti-la é preciso um não Ser, ou seja, ver o Outro como ele é.
Os poderes na modernidade cresceram por causa das imposições que as leis do Estado, as regras de conduta e aquilo que historicamente se chamou de “Contrato” que não é senão tornar o direito a consciência algo que seja submetido as regras e leis do Estado.
Não se trata de anarquia, regras de convivência social existente desde o homem primitivo que já se sabia vivia originariamente em grupos: em cavernas, nômades ou estabelecidos em territórios.
O que leva a violência é sempre submeter o Outro a nossa própria vontade, as nossas culturas, olhando para a do Outro como menor, menos culta, menos “evoluída” ou outra justificativa para não entender e respeitar culturas, crenças e etnias diferentes, então chega-se a violência.
O culto do Estado, Hegel chegou a dizer que ele era eterno e não é, muitos se modificaram ao longo da história desde a Cidade-Estado grega até as modernas sociedades democráticas, agora num novo reboliço.
A passagem bíblica que o “diabo” oferece os poderes terrenos a Jesus e ele rejeita é esta (Mc 4,8-10): “novamente o diabo levou Jesus para um monte muito alto. Mostrou-lhe todos os reinos do mundo e sua glória, e lhe disse: “Eu te daria tudo isso, se te ajoelhares diante de mim, para me adorar”. Jesus lhe disse: “vai-te embora, Satanás, porque está escrito: ´Adorarás ao Senhor, teu Deus, e somente a Ele prestarás culto´.”.
Coloquei o diabo entre aspas, não para negá-la como existência ôntica, mas para ampliar a visão que se tem, onde os “reinos” que o diabo queria dar não são somente os Estados, mas também outras formas de Poder que estão dentro da humanidade, como Nietzsche afirmava em sua categoria “vontade de Poder”, que seria originária de todo homem e impossível de superá-la.

 

Coronavirus, eutanásia, mídias e poder

27 fev

Já pontuamos sobre o poder das novas mídias, o conceito de psicopoder foi também explorado por Byung Chul Han, escrevemos um post sobre isto, mas agora voltamos ao biopoder.

Conforme pensava Foucault o biopoder tem duas formas distintas: uma chamada anátomo-política do corpo e outro da biopolítica da população, a primeira são dispositivos disciplinares encarregados do extrair do corpo humano sua força produtiva, mediante controle de tempo e espaço, no interior das instituições (vejam quantas fazem isto, incluindo as educacionais) e a segunda forma volta-se a regulação das populações inutilizando taxas de natalidade, fluxos de migração, epidemias e aumento da longevidade.

Veja-se discussões do corona vírus, migrações na Europa e problemas de longevidade na previdência social dos idosos, mas agora o caso perverso da “morte assistida” que evita gastos com idosos e permite que morram “assistidos”, claro cadeira elétrica também tem assistência, mas é para criminosos, ao menos supostamente, pois há enganos.

O coronavirus ameaça fugir do controle e os controladores do poder se assustam, poderiam pensar morrer uns poucos, talvez a maioria pobres, mas não é o que acontece, atinge a todos, no Irã até um vice-ministro da Saúde está doente, e diversos eventos estão ameaçados, alguns já cancelados e os testes para as Olimpíadas já estão ameaçados e até podem ser canceladas.

O biopoder, portanto, está fora de controle e o próprio poder pode sofrer com isto, bolsas caem, economias entram em colapso, o turismo e as viagens caem, enfim o biopoder também tem limites, mas tanto ele quanto a psicopolítica estão ainda majoritariamente no controle do estado.

As redes sociais, e nem sempre suas mídias formam redes, estas sim podem protagonizar novo e poderes e empoderamento de grupos, culturas e etnias que estão sob a tutela do estado.

 

 

A ceia das cinzas

26 fev

O que define como o homem é por natureza é também entender o que é a natureza, ou a substância projetada num universo infinito. e um marco inicial na filosofia da Natureza é a obra de 1584 de Giordano Bruno, conectada a teoria copernicana, que descreve um universo infinito com um divisor onipresente, a matéria eterne e a mutação em troca permanente.

Bruno se declarou um copernicano “realista” em 1582 em Paris, e quando chegou a Londres no ano seguinte ele já se posiciona no nível cosmológico com ideias extravagantes para a época, na qual o universo é um ser vivo, e um tempo depois suas aulas são suspensas, devido tanto a um radicalismo teológico de seu público protestante, como do aristotelismo “ateu”.

Um aspecto curioso é Bruno chamar, como Leibniz e Spinoza o fizeram, seu personagem de Teófilo presente na Bíblia e que significa “filho de Deus” (teo-filo), o que o vai separar também de sua religião católica é o pensamento que a filosofia deve ser independente da religião, porém a passagem do heliocentrismo copernicano para um universo infinito devemos a Bruno.

Seu pensamento sobre a política e o poder envolve esta mudança infinita, afirmava:         “Que ingenuidade pedir para quem tem o poder pedir para mudar o poder”, que foi o seu embate com os donos do poder nas religiões e na nascente academia.

Em seu livro “A ceia das cinzas” fez uma afirmação extraordinária para a época: “A terra e os astros … como eles dispensam vida e alimento das coisas, restituindo toda matéria que emprestam, são eles próprios dotadas de vida, em uma medida bem maior ainda, e sendo vivos, é de maneira voluntária, ordenada e natural, segundo um princípio intrínseco, que eles se movem em direção as coisas e aos espaços que lhes convém”, um passo além do universo de Copérnico.

Não é importante a verdade ou não de Bruno, que também teve obras polêmicas sobre a Eucaristia e sobre a Virgindade de Maria, mas o importante para nosso tempo é restaurar um diálogo perdido de longa data, e para o qual ainda continuam a ter inquisidores e apóstatas.

Giordano Bruno deu um grande passo na ciência e queria que a filosofia fosse independente por causa do poder e incultura religiosa, ainda hoje é preciso superar o fundamentalismo e estabelecer o diálogo.

Bruno, G. The Ash Wednesday Supper. Lawrence s. Lerner  e Edward A. Gosselin (eds), Toronto (CAN): University of Toronto Press, 1995.

 

Influenciador digital, a potência nas novas mídias

25 fev

Influenciador digital é uma nova área de atuação nas mídias, desde os primeiros blogueiros eles existem, falam de coisas curiosas desde temas sérios, até culinária, fitness, esportes ou qualquer coisa que esteja em alta em determinado momento, os que fazem sucesso significam muito em termos de estatísticas e financiamentos, mas pouco em termos de conteúdos sérios e políticos.
Cito um brasileiro Felipe Neto, em torno dos 32 anos, não fui conferir apenas li em algum lugar, as vezes é inteligentes, as vezes comediante e irônico, fala de tudo em especial de fatos culturais inéditos, como a família Passos que formou uma “trupe” que ganhou com uma marchinha de sátira de carnaval “A culpa é do PT” que na rádio CBN venceu o concurso.
Dizem que ele tem milhões de seguidores, não fui conferir e pois também existem “robôs” e “influencers” capazes de produzirem valores juntos, mas as visualizações são mesmo astronômicas.
Você deve desconhecer Christian Figueiredo que tem em torno de 21 e já lançou um livro “Eu fico loko” e já fez marketing para Colacoca (algo assim) e Disney, e se for num shopping vai enlouquecer adolescentes, pergunte ao seu filho, sobrinho ou neto quem ele é, chance de 50% que saberão.
O catarinense Luba, Lucas Feurschütte. tem em torno de 25 anos, e já fez um vídeo de sucesso com Christian Figueredo perguntando: “Você é um gay”, tem um terceiro que não conheço que participa, mas talvez também seja de sucesso, o seu sucesso é o Luba TVGames (em torno de 230 mil seguidores), não vou esgotar a lista, apenas aponto um universo desconhecido de quem tem mais de 30 anos, pelo menos a imensa maioria, os jovens estão sob enorme influência deles.
Se seu filho é um adolescente preste atenção nestes nomes: Júlio Cocielo que se envolveu numa polêmica por fazer um comentário racista do jogador Mbappé, ah este você conhece, outro nome é Luccas Neto, 25 milhões de inscritos e bilhões de visualizações, Kéfera Buchmann do canal 5inco Minutos, não sei de é ironia com o programa americano 60 minutes, mas fala de beleza, esquetes, paródias e tem um humor bem fino e 11 milhões de seguidores, Whindersson Nunes, que uma vez em palestra fiz uma brincadeira com ele e todas adolescentes reagiram, e o adulto que dirigia a conversa não entendeu nada, e claro, o Felipe Neto.
De outros países tudo que sei é o youtuber PewDiePie, um comediante sueco em torno dos 30 anos, descobri que seu nome é Feliz Arvid Ulf Kjellberg, e também os do Instagram, mas lá surgem nomes “comuns” midiáticos como Cristiano Ronaldo e Messi jogadores de futebol, Beyoncé e Selena Gomez cantoras, Justin Bieber cantor e outros, pessoalmente sou seguidor de amigos e familiares.
É tudo que conheço, me dedico pouco a estas conversas, mas a vontade de potência me fez ir atrás do que os jovens estão preocupados, daqui 3 ou 4 anos estarão na faculdade e não quero perder a piada, ou a conversa, ou o “poder” que gente da nossa idade perdeu com os jovens.
Ah é tudo gente midiática, sim, mas também os novos filósofos das mídias não são outra coisa.

 

Vontade de poder ou de potência

24 fev

Um conceito pouco conhecido de Nietzsche é a vontade de poder, como uma força motriz “natural” do homem, de fato isto levou os povos a se expandirem desde o mundo primitivo, as guerras e impérios de Alexandre o Grande, do qual Aristóteles foi tutor e depois o Império Romano, e os impérios da modernidade: o português, o francês, o russo e o americano.

Há outros grandes impérios pouco citados na história: a grande dinastia manchu Qing, do norte da China invadiu e derrotou a dinastia Ming, era de uma etnia minoritária mas dominou toda a China e teve inclusive uma breve restauração em 1917 e o grande Império Mongol foi um dos maiores em extensão de área, chegando a Europa, nos séculos XIII e XIV.

Mas a potência refere-se também ao desejo individual de influência e de poder, hoje são os influenciadores digitais, que inclusive são financiados e recebem respeito e credibilidade e muitos deles são desconhecidos da grande mídia, por exemplo, o americano PewDiePie é o youtuber com maior número de seguidores, voltaremos ao assunto.

Pode-se pensar potência, como ato e potência, assim poder seria o objetivo atingida pelo potencia porém o próprio Nietzsche adverte que seu sentido é outro: “a vontade de poder não é nem um ser, nem um devir, é um pathos”, assim deve ser analisada na tríade ethos, pathos e logos.

Pathos é, portanto, aquele sentido também usado por Descartes, ainda que Nietzsche negue a razão como princípio, de ondem vem a ideia de patologia, o que se move na imperfeição.

Assim pode-se pensar vontade de poder (no sentido de Nietzsche) em três conceitos, o cosmogônico, o histórico ou o psicológico, cada um estabelece uma relação especial com os diversas propostas presentes na sociedade moderna, o cosmogônico usando terminologia de Nietzsche é uma lei originária, sem exceção, que advém da própria realidade das coisas.

Assim sua lei história não é nunca determinística nem tem nada de oculto, “… esse meu mundo dionisíaco do eternamente-criar-a-si-próprio, do eternamente-destruir-a-si-próprio, sem alvo, sem vontade…”, dito num fragmento escrito em 1885, significa que um conjunto de forças que atuam de modo difuso resultam num estado de eterno retorno, e portanto sem um fim.

Assim vontade de pode ser também entendido como o desejo insaciável de ser mais do que aquilo que se é, se visto sem um fim, pode-se entender o aspecto psicológico mais claro.

Pode parecer algo distante do pensamento moderno, mas basta olhar a realidade e se perceberá que fora do determinismo histórico, do fundamentalismo religioso, a proposta que resta parece ser esta, porém o próprio Nietzsche pode nos ajudar a organizar isto, se é possível pensar algo fora deste estado de “eterno retorno” que a vontade de potência criou.

 

Uma ontologia incompleta: a afirmação do Ser

21 fev

A roda da Fortuna é o acaso porque a lógica do laissez faire, o acaso levado à economia, é também a lógica da afirmação do Ser, no sentido clássico; o Ser é e o Não-Ser não é, não há um devir.

O não-Ser também é Ser, a afirmação, a vontade de Poder, leva consigo a lógica da guerra, o dualismo, o maniqueísmo e seu destino falta é a guerra, a dificuldade de compreensão do Outro, o diálogo feito como forma de hipocrisia, porque no fundo, é a negação do Outro e a afirmação do Ser, na lógica “nós temos a verdade”, mesmo que dita de forma religiosa, é sua negação.

A impossibilidade do convívio, de onde surge a violência física, até a violência psíquica e moral, o desejo inconsciente de desmoralizar e minar o Outro, que é nesta lógica não-Ser, e assim vive-se de modo falso o momento que passa, como fugaz e com o sentido de máximo afirmação do Ser.

Parece loucura dizer que o não-Ser também é, mas é justamente no seu exercício que negamos a guerra, negamos o conflito como necessário, fazemos o dualismo tornar-se diálogo sincero e podemos entrar na lógica do Outro e descobrir um complemento do Ser, enquanto não-Ser.

Afirmar que o Não-Ser é destrói a lógica do poder, da exclusão, do conflito, porque permite ao Outro sua existência, nega a psicopolítica porque não tem necessidade de opressão “psíquica” do Outro, para afirmação do Mesmo, do espelho, mesmo que exercido coletivamente, é um nós egoísta e vinculado exclusivamente ao próprio poder e prazer.

Assim dizem os discursos contemporâneos sobre a filosofia, que enchem plateias e enaltecem filósofos e eloquentes religiosos: “você veio para vencer, afirme-se, diga que é o melhor”, etc.

A ontologia completa, é oposta também ao fundamentalismo religioso e ao farisaico, porque é exercida também enquanto não-Ser, diz o evangelista Mateus sobe o ensinamento do Mestre aos seus discípulos (Mt 5.38-39): “Vós ouvistes o que foi dito (ainda o é em nossos dias): olho por outro e dente por dente!, Eu porém, vos digo: “não enfrenteis que é malvado” Pelo contrário se alguém te dá um tapa na face direita, oferece-lhe também a esquerda!”, eis a lógica “oculta” do não-Ser.

A meia ontologia da afirmação do Ser não é a vivência do momento presente, é só a vivência somente em momentos de euforia, não é “eudaimonia” no sentido grego, porque é alegria do Ser físico e não da alma, não experimenta o gaudio, a alegria do Ser em sua totalidade, corpo e alma.

 

Alegria ou felicidade, o gaudio e a euforia

20 fev

Alegria e felicidade não são a mesma coisa, embora um possa desembocar no outro e vice-versa, a alegria é um sentimento de satisfação, de completude ou até de plenitude em seu extremo, ao que chamo de gaudio, enquanto felicidade é o bem maior desejado pelo ser humano, assim afirmou Aristóteles, e embora possa ter nuances de valores é a melhor definição.
Neste sentido a felicidade é sim viver bem o momento que passa, até filósofos midiáticos e místicos concordam, porém o esforço “virtuoso” que faz com que a conquista seja um destes momentos, mas é claro cada um deste caminho virtuoso pode ser vivido com grandeza e esforço.
Aquela luta para na qual todo momento pode ser vivido com dignidade e até alegria, porém o gaudio e a felicidade verdadeira é conquistada com esforço, exercício virtuoso de um caminho digno, enquanto a euforia pode ser conquistada num momento fugaz, o gaudio e verdadeira felicidade não.
A alegria é então um exercício além do obstáculo e dos problemas cotidianos, a felicidade é a conquista possível depois de um longo caminho no qual a chegada ao cume depende dos últimos e decisivos passos, muitas vezes sem folego e sem clareza que o cume poderá ser atingido.
Os gregos diziam que a “eudemonia” (“bem” do “espírito”- daimon) era conquistada por arete, que tanto pode ser vista como “virtude” (a prática repetida do virtuos, do virtual) como também por “excelência”.
Também não é a fortuna, no sentido grego da palavra não é apenas dinheiro, mas o acaso ou a sorte, a deusa Fortuna tornou-se uma imagem iconográfica desde as iluminuras de manuscritos medievais até os vitrais das igrejas (foto*), era assim uma sorte lançada ao acaso, e seria predestinada.
A alegria é gaudio quando alcançada por pequenos esforços cotidianos e não é fugaz, enquanto a euforia não só é fugas como pode tornar-se tristeza profunda ou até depressão, por elaborados discursos viver o momento que passa, que é sábio, pode ser vivido com alegria ou com euforia.
*A deusa Fortuna com olhos vendados, chamada de “roda da Fortuna” foi pintado por Tadeuz Kuntze, em 1754, óleo sobre tela, Museu Nacional de Varsóvia.

 

Entre a fantasia e o imaginário

19 fev

O imaginário faz parte da cultura e da tradição popular, nela inúmeras culturas se expressam, parecem mitos e fantasias foram da realidade, mas diferencia-se desta por ter uma fonte originária, isto é, ser parte de uma cultura e expressão de anseios e perspectivas culturais de um povo.
O que Droysen, Heidegger e Gadamer especularam sobre o historicismo romântico, que Dilthey elaborou, não é senão o historicismo fantasioso, o futuro como puro sonho irrealizável enquanto o futuro vindouro é parte da tradição cultural e por isso é necessário o diálogo com a tradição.
A fantasia é inicialmente uma tentativa de fuga, a ausência de diálogo não no sentido prosaico de ouvir o Outro, de aceitar a diferença, mas sim de entender e dialogar verdadeiramente entrando nos conceitos e perspectivas presentes na tradição, sem compreende-la realizamos escuta e não o diálogo, a dialogia que falaram Martin Buber, Paulo Freire e mesmo Bakhtin.
As fantasias representam delírios da alma, desejos compulsivos incontroláveis, e que muitas vezes chegam a patologias, não se trata de uma fantasia infantil de contos de fadas ou super heróis, estas pertencem ao imaginário pois a criança ainda vê o mundo futuro como possibilidade.
O imaginário épico, tanto como historicismo quanto como literatura ressalta os feitos e glórias, onde o presente surge como um resultado de um passado mítico, mas que se projeta para o futuro, exprime a exaltação factual de acontecimentos memoráveis ou extraordinários.
O imaginário romântico é de um herói solitário deslocado no tempo, D. Quixote é uma boa expressão deste imaginário, representa uma reação a saturação filosófica do determinismo e do racionalismo, mas fica preso ao sensorial empírico ou as metáforas do real.
Estas fantasias em geral apelam para a criatividade, mas pouco dizem da realidade.

 

Felicidade e idealismo, entre sujeitos e objetos

18 fev

O desenvolvimento do pensamento idealista, o mais forte e profundo da modernidade, deu ao homem um sentimento de domínio não só sobre a natureza, mas também sobre suas próprias possibilidades e alcance de suas vontades, achando que poderia determinar o futuro da história e de sua existência.
Assim da exploração dos recursos naturais, agora com sinais de esgotamento, assim como a exploração de povos e das forças de trabalho fizeram empreendimentos humanos alçarem voos e pretendendo agora a conquista de planetas e do universo, mas descobrimos os limites humanos.
O primeiro e o principal deles é a finitude da vida, mesmo as culturas mais antigas elaboraram sempre alguma escatologia sobre a vida anterior e futura da humanidade, a modernidade entretanto tentou explorar ao máximo a sua finitude, o que vale é o máximo de felicidade na curta vida de todos nós, explorá-la ao máximo é o que basta neste ideário.
Mas o idealismo apontou limites, se é um projeto inacabado ou se já mergulhamos em outro projeto, modernidade tardia ou pós-modernidade pouco importa, a essência deste projeto era a finitude, e o que chamou-se de iluminação, felicidade, vontade e liberdade mostrou-se não apenas a finitude, como também os aspectos monstruosos desta concepção: ausência de imaginação (a subjetividade como é dito nesta forma de pensar), o desiquilíbrio humano e de forças naturais, e a ausência de paz.
O edifício idealista construiu uma sociedade cheia de objetividades, de construções maravilhosas, do alcance das forças produtivas quase até seu esgotamento, porém guerra e ódio cultural, religioso e principalmente ideológico, é parte importante neste edifício para manter a dualidade e com isto não se constrói a paz.
Separar o humano em dois pedaços, para depois esquadrinhá-lo, subjetividade e objetividade, não foi outra coisa senão apenas um edifício monumental que desconsiderou o essencial humano: a ausência de formas de felicidade reais que contemplem a todos e a busca de meios solidários de poder.
Não se trata que Deus morreu, mas que matamos ele, se não há um laço divino entre os homens, ele jamais poderá existir de forma transcendente (em uma verdadeira ascese), aliás, a transcendência idealista não é outra coisa que a separação entre sujeito e objetos, unificados por esta falácia da objetividade.
Sem recuperarmos os sonhos reais, a felicidade real, e os meios sociais para isto, andamos como sonâmbulos no escuro, como afirmou Edgar Morin.

 

A importância do legado de Droysen

17 fev

Afirmamos na semana anterior (ver o post) que tanto a perspectiva do helenismo de Droysen (ele cunhou o termo) quanto a perspectiva do verdadeiro significado da história sua eram mais amplas, muito antes das críticas de Gadamer ao historicismo “romântico”, este autor que foi aluno de Hegel, já o tinha feito e com muita propriedade pois além de aluno, penetrou neste conceito do qual Hegel é fundador na filosofia moderna.

Johann Gustav Droysen (1808-1884) questionava o princípio da historicidade, e, muito antes do seu tempo questionou os historiadores sobre os fundamentos “científicos” de um certo perspectivismo e relativismo, assim como também indiretamente questionava Dilthey na tentativa de usar a história para fundamentar as Ciências do Espírito.

Droysen em seu Compêndio sobre a História (Grundriss der Historik) que não era adequado à História, tendo esta a pretensão de ser ciência, tomar seu método emprestado de outra perspectiva do conhecimento, que é a ciência natural, mesmo que como “exemplo”.

A solução por ele apresentada, parecida a de Gadamer, sintetizável na noção metodológica de Compreensão Investigativa (forschendes Verstehen), visava dar a História a possibilidade de uma ciência autônoma, assim para ele existe algo que precede ao dualismo explicação x compreensão, que é a história, o que chamamos na semana passada de “forma” do pensar.

A sua obra Compêndio da Historia (Grundiss der Historik) de 1857/1858 está disponível em versão espanhola (1983) e versão italiana (1989), ainda ser versão em português.

É de interesse particular, pelo menos o foi para mim, o capítulo 3 que trata do problema hermenêutico da compreensão, que dá uma noção da aplicabilidade do seu método.

A ligação que podemos e devemos fazer com a questão moral, do tópico anterior, pode ser encontrada na página 386 de seu trabalho Teologia dela Storia (tradução italiana):

“… nós temos a necessidade de um Kant, que examinasse criticamente não a matéria histórica, mas o movimento teórico e prático diante e no interior da história, e que demonstrasse, a exemplo de qualquer coisa análoga a lei moral, um imperativo categoria da história, a fonte viva da qual jorra a vida histórica da humanidade. ” (DROYSEN, 1966, p. 386).

Droysen observa naquilo que chama de “Sistemática” três tipos de comunidades éticas: “as comunidades naturais”, “as comunidades ideais” e “as comunidades práticas” (figura acima), e a elas relaciona da história, dito assim: “a nossa sistemática resultou da noção de que o mundo história é o mundo ético, mas enquanto concebido sob um determinado ponto de vista; porque o mundo ético pode ser considerado sob outros pontos de visa …” (Droysen, 1994, p. 413).

O seu devir, portanto, está longe da dialética hegeliana, mas ao mesmo tempo dialoga com ela.

DROYSEN, J. G. Teologia dela Storia. Prefazione ala Storia dell´Ellenismo II – 1843. In: Istorica. Lezioni sula Encilopedia e Metodologia dela storia. Trad.: I. Milano – Napoli: Emery, 1966.

_______. Istorica. Lezioni di enciclopédia e metodologia dela storia. Trad. Silvia Caianiello. Napoli: Guida, 1994.