Arquivo para outubro, 2016
A Web 4.0 emerge ?
O impulso inicial de Tim Berners-Lee para criar em meados dos anos 90 um protocolo sobre a internet, o HTTP (Web e Internet são camadas diferentes) foi para difundir de modo mais rápido a informação científica, podemos dizer então que era uma Web centrada na informação.
A Web rapidamente se popularizou, então o crescimento da preocupação com a semântica da Web fez Berners-Lee, James Hendler e Ora Lassila publicaram o paper inaugural Semantic Web: new form of Web content that is meaningful to computers will unleash a revolution of new possibilities, e uma grande parte do desenvolvimento posterior da Web Semântica estava lá projetado como a representação do conhecimento, ontologias, agentes inteligentes e finalmente uma “evolução do conhecimento”.
A Web 2.0 teve como característica inicial a interatividade (O´Reilly, 2005) onde os usuários se tornam mais livres para interagir em páginas da Web e podem marcar, comentar e compartilhar documentos encontrados online.
O artigo apontava o caminho das ontologias, como caminho “natural” para o desenvolvimento e agregar significado a informação na Web Semântica, com metodologias vindo da Inteligência Artificial, que no olhar de James Hendler (Web 3.0) passava por um “inverno” criativo.
Mas três ferramentas integradas acabaram indicando um novo caminho: as ontologias ajudaram a construção de esquemas de organização simples do conhecimento chamado (SKOS – Simple Organization of Knowledge System), um banco de dados para consulta, com uma linguagem chamada SPARQL e aquilo que já era básico na Web Semântica, que era o RDF (Resource DEscription Framework) em sua linguagem descritiva simples: o XML.
O primeiro grande projeto foi o DBpedia, um Banco de Dados proposto pela Free University of Berlin e a University of Leipzig em colaboração com o projeto OpenLink Software, em 2007, que se estruturou em torno do Wikipedia, usando os 3.4 bilhões de conceitos para formar 2.46 de triplas RDF (recurso, propriedade e valor) ou de modo mais simples sujeito-predicado-objeto, indicando uma relação semântica.
Há diversos tipos de Agentes Inteligentes em desenvolvimento, pouco ou quase nada usam a “inteligência” da Web 3.0, haverá no futuro novos desenvolvimentos ? apontamos em artigo recente a ferramenta Semantic Scholar da Fundação Paul Allen, mas ainda a conexão com a Web 3.0 (projetos ligados ao linked data) não é clara.
2016 decididamente ainda não foi o ano da Web Inteligente, ou se quiserem a Web 4.0, mas estamos nos aproximando, os assistentes pessoais (Siri, Cortana, o “M” do Facebook), a domótica (Apple Homekit, Nest), o reconhecimento de imagem e os carros sem motoristas estão logo ali, virando a esquina.
Domótica são os recursos inteligentes caseiros, neste campo a AI cresce rápido.
A hermeneutica em Paul Ricoeur
Depois de tentar entender a hermenêutica numa linha: F. Scheleimacher (1768-1834), Martin Heidegger (1889-1976) e Hans-Georg Gadamer (1900-2002), me perguntei qual era a visão de Paul Ricoeur (1913-2005) ?
Encontrei-a em um único livro, que alívio, O conflito das Interpretações, em uma excelente publicação portuguesa da Rés-Editora, embora outras obras de Ricoeur façam referencia ao tema: Teoria da Interpretação e um ensaio sobre Freud.
Começa apresentando o problema de modo claro: “Se um texto pode ter vários sentidos […] é preciso recorrer a uma noção de significação muito mais complexa do que a dos signos ditos unívocos que uma lógica da argumentação requer […]. Por consequência, a hermenêutica não poderia permanecer uma técnica de especialistas […], ela põe em jogo o problema geral da compreensão.” ( RICOEUR, s/a, p. 6) lembro a “interpretação de texto” na escola primária.
Ao contrário de Dilthey que via a interpretação como “o transporte entre duas vidas psíquicas” Ricoeur vai além da vida vivida aos “modos de compreensão disponíveis numa época: mito, alegoria, metáfora” (RICOEUR, s/a, p.) permitindo uma hermenêutica mais “completa”.
Vai além também da “via curta” adotada por Heidegger em Ser e Tempo, para formular uma ontologia da compreensão que “não se chega a ela gradualmente, aprofundando as exigências metodológicas da exegese (sic), da história ou da psicanálise: transportamo-nos até ela através de uma súbita inversão da problemática.” (RICOEUR, s/a, p.8)
Faço a observação da exegese, porque mesmo que se faça a análise minuciosa de uma palavra, sua etimologia e até mesmo sua contextualização histórica, faltará a experiência vivida, eis a única e verdadeira hermenêutica universal e filosófica, a que brota da vida, mas “vivida”.
Na visão de Ricoeur, Heidegger nunca teve a pretensão de analisar um ente particular, “ele quis reeducar o nosso olho e reorientar o nosso olhar; ele quis que subordinássemos o conhecimento histórico à compreensão ontológica, como uma forma derivada de uma forma originária” (RICOEUR, s/a, p.12), fazendo uma metáfora como gosta Ricoeur, trocar os óculos.
Outramente (outro livro de Ricoeur), sua ontologia é uma ontologia militante que, partindo do conhecimento histórico, chegará por meio da interpretação, ao plano ontológico, e não só do ser, mas do Outro Ser.
Podemos chamar a via de Ricoeur de via longa, parte da compreensão pela linguagem, ou seja, pretende compreender os signos que compõe a cultura antes de compreender o seu próprio estatuto ontológico, mas deve-se ter o cuidado da reflexão como intermediário entre estes dois estágios, “a reflexão é uma intuição cega se não é mediatizada por aquilo a que Dilthey chamava as expressões nas quais a vida se objetiva” (RICOEUR, s/a, p.19), dito assim:
“O sujeito que se interpreta ao interpretar os sinais já não é o Cogito: é um existente que descobre, pela exegese da sua vida, que está posto no ser mesmo antes de se pôr e de se possuir. Assim, a hermenêutica descobriria uma maneira de existir que permaneceria de ponta a ponta ser–interpretado.” (RICOEUR, s/a, p. 13)
RICOEUR, P. O Conflito das Interpretações: Ensaios de Hermenêutica. trad. port. Artur Morão. Porto: Rés-Editora, s/a.
Pontos da IoT para 2017
A empresa de previsões tecnológicas Gartner, analisa porque a IoT (Internet das Coisas) ainda não deslanchou, e aponta alguns pontos que podem fazer esta internet acontecer em 2017:
IoT segurança
A Internet das coisas introduziu uma gama de novos riscos de segurança e desafios para os dispositivos, suas plataformas e sistemas operacionais, comunicações e até mesmo quais sistemas podem ou devem estar ligados.
A Segurança será uma coisa complicada pelo fato que “coisas” terão processadores individuais e seus próprios sistemas, como baterias, sistemas operacionais e dispositivos que aquecem.
IoT Analytics
Analisar desempenho e funções em “coisas” é diferente de fazer em computadores ou smartphones, porque o modelo de negócio se modifica na medida em que vai analisar informações coletadas por coisas e não por cliente que em ultima instância são pessoas, novas ferramentas e algoritmos de análise estão em desenvolvimento, mas acredita-se que será estável por volta do ano 2021, até devem ir se desenvolvendo conforme a necessidade.
IoT Gestão
“coisas” delonga duração não são triviais, exigem gestão e monitorização. Isto inclui dispositivos de monitoramento, atualização de software e firmware, diagnósticos, análises de acidentes e relatórios, o que poderão trazer problemas em escala para a tarefa de gestão.
Destacamos estes três aspectos essenciais, mas agora terão outros que a Gartner observa: Processadores para gerenciamento em áreas mais amplas com conexão de internet, processos e processadores de baixo consumo de energia, Plataformas e Sistemas Operacionais para a IoT, e finalmente, Normas e Ecossistemas para a IoT
Análise mais detalhada está no relatório da Gartner “Top 10 IoT Technologies for 2017 and 2018.”
Scholar Semantic é uma novidade ?
A Google poderá perder terreno, desde novembro está online uma versão BETA do Scholar Semantic, que faz busca semântica na Web através de artigos envolvendo autores e suas referências.
Quando se trata de literatura científica faz algumas décadas que vivemos uma sobrecarga de artigos científicos, áreas como a Ciência da Informação já estudam este fenômeno a anos, mas agora a Google parece querem abalar os alicerces das “buscas” no ambiente da Web.
Mas o número agora é astronômico, mais de 100 milhões de papers acadêmicos estão online, e o crescimento é de cerca de 5.00 artigos por dia, como tratar este volume de dados.
O Instituto Allen, dedicado a Paul Allen promete balançar este “mercado” com o lançamento da ferramenta já disponível Scholar Semantic, fiz uma busca no meu nome e já achei alguma coisa.
Lançado em novembro de 2015, e ainda com uma versão beta, o buscador online procura abranger a área de informática, limitada ainda a cerca de 3 milhões de artigos, portanto 3% do universo atual, mas a área de Neurociência já está disponível em 2016, e outras áreas médicas começaram a aparecer.
Oren Etzioni, o chefe do projeto de Inteligência Artificial intitulado de EA2, disse em entrevista que é “impossível não se incomodar com tudo que estamos descobrindo estes dias”.
Deverão avançar mais agora na área médica, porque ela é “tão visceral”, disse Etzioni, e comparando com os serviços de Google Scholar ou PubMed, a capacidade de destacar os papers mais importantes e suas ligações com outros papers, poderão direcionar as pesquisas num futuro muito próximo.
Em quanto tempo este futuro chegará até nós ? Etzione responde: “Eu acho que os primeiros serviços de “assistentes científicos” vão surgir nos próximos 10 anos e eles estão poderão ficar melhores a cada dia, “Nós não estamos falando muito além do horizonte, veremos isto em muito breve”.
Pode já acessar o programa EA2 Semantic Scholar ou pelo site semanticscholar.org , já há vermos também para iOs e Android.
e-Estônia: um pais digital
Desde sua independência da antiga União Soviética (20 de agosto de 1991), a Estônia decidiu que seria um país que se manteria conectado, descentralizado, em uma plataforma aberta de infraestrutura e num processo continuo de continuar melhorando, chamando isto de 4 princípios no seu site.
Os dois pontos chaves desta e-cidadania são o cartão de Identidade ou e-ID e a conexão descentralizada da infraestrutura chamada X-Road, estes abrem as portas para todos os serviços do estado, os dados sociais e econômicos, sendo o eID a identificação capaz de verificar a identidade de uma pessoa em todo o ambiente online.
Os povos da Estônia são de origem dos Fenícios, mas estão intima e etnicamente ligados aos finlandeses e lapões (norte da Noruega), portanto com ligações históricas com toda a Escandinávia, tendo o porto de Tallinn, como sua capital e maior cidade, tendo o país todo cerca de 1 milhão e meio de habitantes.
Com isto a economia se beneficiou com a força dos setores de eletrônica e telecomunicações e dos fortes laços comerciais com a Finlândia, a Suécia, a Rússia e a Alemanha
O sistema de governo é o parlamentarismo, com um congresso com 101 deputados eleitos diretamente pelo voto dos cidadãos.
A Estônia entrou na União Européia em 1 de maio de 2004, ao mesmo tempo que Letônia e Lituânia, tem um PIB de US$ 35.398, que dá uma renda per capita de US$ 26.000.
A Web pode mudar mais?
As novas mudanças em torno de instituições paralelas, vamos comentar uma delas hoje, a JQuery, parece apontar para mudanças mais profundas na Web que as Web 3.0 (linked data) e Web 4.0 (agentes inteligentes).
A JQuery passou a se transformar em Fundação JS, para dar apoio e governança aos projetos que são desenvolvidos a partir do JavaScript, a fundação é uma iniciativa Linux mas que conta com empresas como IBM, Samsung e Sauce Labs e muitas outras.
O diretor executivo da JS, Kris Borchers, afirmou que “por um longo tempo, temos oferecido suporte à comunidade JQuery, e a nova marca tem o objetivo de refletir essa realidade”, mas agora segundo suas palavras “o centro de gravidade” é o padrão aberto JavaScript.
As mudanças virão porque os projetos (ao total de 23), entre eles os frameworks de teste Appium e Mocha, o Dojo Toolkit, o utilitário de linting (verificação de código para identificação de erros e problemas) ESLint, o JerryScript.
Esta nova instituição irá promover a ampla adoção e desenvolvimento permanente de soluções JavaScript, e em tecnologias relacionadas, facilitando a colaboração com a comunidade.
Os membros fundadores da JS, como antigos membros da JQuery, foram IBM, Samsung, Sauce Labs, Bocoup, Ripple, Sense Tecnic Systems, SitePen, StackPath, a Universidade de Westminster e o WebsiteSetup.
O Brasil tem uma comunidade JS bastante ativa e seus projetos podem ser vistos no seu site.
É possível uma hermenêutica hoje ?
Difundem-se teorias e semi-teorias, estas últimas em maior parte, chamo de semi-teoria não aquela que é incapaz da hermenêutica para não cair no erro tautológico, aquela que é capaz de interpretar uma teoria o mais próximo do que o autor quis dizer.
Semi-teoria é simplesmente a leitura de parte de uma teoria fazendo um recorte por aspectos periféricos e desconsiderando centrais, por exemplo, uma leitura de Hegel a partir apenas da Fenomenologia do Espírito sem os Elementos (ou Princípios) de Filosofia do Direito, como se não formassem um todo, ou ainda desconsiderando uma parte importante de seu trabalho em Ciência e Lógica (1812-1816) e Enciclopédia das Ciências Filosóficas (1817-1830).
A hermenêutica referia-se classicamente na interpretação da Bíblia, pode parecer que foi por isto que a hermenêutica filosófica, iniciado em Heidegger e fundamentada em Gadamer, tenha buscado em Scheliermacher, hermenêutica bíblico, que afirmava que: “O sentimento da imortalidade e da fé na imortalidade fundam-se na “imortalidade da união da essência de Deus com a natureza humana na pessoa de Cristo”.
Isto pareceria um vínculo oportunista entre religião e filosofia, mas não é exatamente isto, embora o vínculo exista, mas o fato que para Scheleiermacher a religião é a relação do homem com a Totalidade (com o Todo), e se o Todo se relacionam também com a metafísica e a moral, a interpretação de textos não bíblicos também podem ser feitas nesta relação com o Todo.
Os propósitos de Scheleiermacher são universais, e por isto ele pode falar de uma hermenêutica universal que se supôs acima das hermenêuticas particulares: a bíblica, do direito e das ciências sociais; assim: “pressupõe que o mal entendido é um resultado costumeiro (SCHELEIERMACHER, 2005, p. 22), tem como objetivo: “compreender o enunciado no começo tão bem quanto seu ator, e depois melhor que ele” (Scheliermacher, 2005, p. 23) e ela “depende do talento para a linguagem e do talento para o conhecimento de pessoas individuais (Scheleiermacher, 2005, p. 11).
Compreender melhor que o autor ao explicitarmos o que está inconsciente no processo de criação do autor, sendo preciso colocar tanto a posição objetiva quanto a subjetiva em sua fala ou escrita, objetivamente aprendendo a linguagem como o autor a possuía, e, subjetivamente aprendendo sobre a vida e as condições contextuais de vida do autor.
Scheleiermacher saliente que há dois tipos de talentos que raramente se encontram em uma única pessoa: a precisão gramatical e suas possibilidades de expressão, por exemplo, no uso de analogias e metáforas.
Podemos perguntar agora se é possível a um interprete reconstruir o processo criativo do autor, ele precisará primeiro descobrir o processo que motivou o autor e que com o processo criativo constitui uma unidade, e, ao discutir a interpretação identificar o processo divinatório e comparativo que levaram o autor a determinado texto.
Entendamos o processo divinatório como aquele que “em nós, por assim dizer, nos transformamos na outra pessoa e tentamos compreender o elemento individual diretamente (Schileimacher, 2005, p. 92).
Scheleimacher, F. Hermeneutica e crítica. Vol 1. Ijuí: Unijuí, 205.
Que é hermenêutica
Se tivesse que a definir de modo simples, diria que é uma interpretação verdade, a palavra interpretação é mais comum no português que hermenêutica, sendo ligada a correção interpretação bíblica feita por Schleiermacher (1768-1834), pois ele pretendeu ser o primeiro a unificar as várias teorias hermenêuticas de disciplinas específica numa hermenêutica universal.
Para Schleiermacher, a hermenêutica é a arte de compreender a linguagem falada e escrita, e ela pressupõe que erros de interpretação constantemente ocorrem, e uma vez que a escrita fica ligada a língua do autor, ele fez uma divisão em duas partes: a interpretação gramatical que trata a compreensão semântica e sintática da linguagem, e a interpretação técnica ou psicológica que trata do pensar do autor, como ele desenvolveu seus pensamentos.
Foi uma influencia decisiva no pensamento de Georg-Hans Gadamer, sendo o segundo também ligado a hermenêutica Wilhelm Dilthey (1833-1911) estudioso de Schleiermacher, mas cujo projeto central era criar uma metodologia única para as ciências humanas, visto que o método das assim chamadas “ciências naturais” não é apropriado pelas ciências humanas.
Martin Heidegger (1889-1976) combina o método de pesquisa fenomenológica de Husserl com aspectos da teoria da compreensão da vida de Dilthey, além das influencias citadas em posts anteriores (Platão, Aristóteles, Mestre Eckhard e Leibniz) queremos também salientar agora, uma vez visto a importância de Hegel, fora do âmbito da razão, Sφren Kierkegaard e Friedrich Nietzsche, já afirmamos Heidegger dirá que é preciso conhecer o significado do Ser, e particularmente do ser dos seres humanos antes de discutir nossos conhecimentos sobre as entidades.
A descrição cuidadosa do que são os seres humanos na vida real, não admite um projeto idealista ou num recorte materialista ou mesmo consumista, é saber o que temos como auto compreensão interpretativa de que temos de nossa ida.
O projeto da hermenêutica é abandonado em o Ser e o Tempo, mas o circulo hermenêutico do qual Hans-Georg Gadamer (1900-2002), que diz de modo provocativo que a hermenêutica de Heidegger tem estruturas prévias de compreensão, que são “preconceitos”, mas podemos pensar então que há também preconceitos positivos que levam a interpretação correta.
A compreensão hermenêutica ocorre quando o horizonte passado do texto com o horizonte presente daquele que o interpreta e compreende se fundem, trata-se do horizonte do interprete agora expandido, está em germe em Heidegger e em método em Gadamer.
O que é ser em Heidegger
A questão que Gadamer põe ao final de sua interpretação de Heidegger é se é possível ir além do “acirramento dialético-especulativo de Hegel das contradições do entendimento, dirigindo- se até mesmo para uma superação da lógica e da linguagem da metafísica ?” (Gadamer, p. 309), e a questão do nada, tal como formulada em Parmênides, de modo parecido a determinação do divino por meio da energia (do ato) sem potência como em Aristóteles, apareça como a total destituição do nada (idem).
No entanto, agora entrará em cena, estendendo o nada até Hegel e Husserl, que já formula- mos “porque há antes o ente e não antes nada?”, como me sugeriu uma adolescente: “o que fez Deus antes de criar o mundo”, “e porque não criou antes” ou ainda “poderia não ter criado e nos salvaria de muitos problemas”, claro para quem crê é que a questão é parecida.
O Ser que se desvela em Heidegger está ligado a consciência histórica, digo assim por Gadamer “ … o ponto de partida transcendental em Heidegger é o ente cujo ser está em jogo e que a doutrina dos existenciais em o Ser e tempo carregam consigo a ilusão transcendental, como se o pensamento de Heidegger não fosse outra coisa senão, para falar com Oskar Becker, a elaboração de outros horizontes, até aqui não estabelecidos, da fenomenologia transcendental, horizontes esses que dizem respeito à historicidade do ser-aí” (Gadamer, p. 311).
Mas o ser completamente elabora em Heidegger é novo: “a verdade do ser é a não verdade, isto é, o encobrimento do ser na ‘errância´, não há mais como desconsiderar a mudança decisiva no conceito da ´essência´, que se segue da destruição da tradição grega da metafísica, na medida em que ele deixa para trás o conceito tradicional da essência do mesmo modo que o conceito tradicional do fundamento essencial” (Gadamer, p. 311)
Assim nesse novo conceito de essência “a partir do ser do utensílio, que não tem sua essência em sua impertinência objetiva, mas em seu estar à mão que alguém já sempre deixa ser para além dele em meio ao trabalho, a partir do ser da obra de arte, que abriga de tal modo sua verdade em si, que essa verdade não se torna manifesta de qualquer maneira senão na obra …” (Gadamer, p. 311).’
Ele distingue a essência por sua “insubstancialidade do conceito de objeto de consumo, tal como esse objeto pertence à produção industrial.” (Gadamer, p. 312).
Mas não há mais o dualismo nominalista, “a partir da palavra: também a palavra não possui a sua ´essência´ em ter sido totalmente expressa, mas naquilo que ela deixa sem ser dito, tal como é demonstrado no caso do emudecimento e do silêncio” (Gadamer, p. 312).
Agora “um segundo grande complexo de problemas, que entra em cena agora sob uma nova luz, é o tu e o nós” (Gadamer, 313) que anunciou seus re-leitores Ricoeur, Levinas e o próprio Gadamer.
GADAMER, H.G. Hegel, Husserl, Heidegger. Petrópolis, RJ: Vozes, 201
Metafísica e filosofia da história
O aprofundamento de Heidegger na antiguidade clássica,
Platão e Aristóteles, na escolástica de Agostinho de Santo Tomás, e a releitura de Kant, Hegel e até seu idolatrado mestre Husserl, fazia a academia alemã dos anos 1950, no final da 2ª. Guerra mundial, “começar de maneira totalmente e não reter nada daquilo que até então se mostrava como válido” (Gadamer, p. 306), e isto aconteceu “na medida em que Heidegger acolher a crítica aristotélica à ideia do bem e a transformara de maneira frutífera, sublinhando particularmente o conceito aristotélico de analogia” (Gadamer, p. 307).
Não se deve fazer isto sem a necessária atualização histórica sobre a questão da consciência histórica introduzida por Hegel, onde: “a concepção hegeliana de uma história da filosofia já se mostrava completamente como filosofia, como uma parte isolada no interior da filosofia da história, que procurava demonstrar por sua vez a presença da razão também na História (Gadamer, 399).
A retomada ontológica de Heidegger, devia retomar a linguagem da metafísica como questão, e de certa forma se confunde com Hegel, pergunta assim Gadamer: “será que a nova radicalidade com a qual Heidegger despertou as mais antigas questões da filosofia para uma nova atualidade a figura conclusiva da metafísica ocidental … ? ou serão que foi o círculo da filosofia da reflexão que paralisou toda esperança de liberdade e de liberação e obrigou o pensamento heideggeriano a retomar a sua vida ?” (Gadamer, p. 307).
Deve-se conforme responde Gadamer, por um lado compartilhar com Hegel o acolhimento da história no próprio ponto de partida filosófico, e por outro “a dialética secreta e não desvendada, que está entranhada em todos os enunciados essenciais de Heidegger” (Gadamer, p. 308).
No pensamento de Heidegger temporal do homem, ele “parece pretender para si uma genuína autoconsciência histórica, sim, mesmo uma autoconsciência escotologicamente* marcada” (Gadamer, p. 308).
O segundo tema crítico, apontado por Gadamer na obra de Heidegger, é o que denomina como “o ser” e busca interpretar a tautologia do ser que é mediação do imediato, que segundo Gadamer seria uma “segunda imediatidade escamoteada” (Gadamer, p. 309)
Mas a questão central que remete ao tema da linguagem da metafísica, é retomar a questão aristotélica de Leibniz e Schelling: “o que é o ser do ente?” refazendo-a como “porque há antes o ente e não antes nada?” questão fundamental para o existencialismo ontológico atual.
GADAMER, H.G. Hegel, Husserl, Heidegger. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012.
Escatológico – aquilo que o é fim último da humanidade, ou o que se tem como fim último na autoconsciência como pretendeu Heidegger.