Arquivo para dezembro, 2015
Esperança vem de esperançar
Enquanto o “The Economist” analisa a provável hecatombe do Brasil para 2016, fundamentalistas religiosos e políticos falam de esperança, esperem …. e verão.
Paulo Freire que foi entusiasta da perspectiva brasileira, explicou o que é esperança: “É preciso ter esperança, mas ter esperança do verbo esperançar; porque tem gente que tem esperança do verbo esperar. E esperança do verbo esperar não é esperança, é espera. Esperançar é se levantar, esperançar é ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir! Esperançar é levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro modo…” (Paulo Freire).
Mas o que é o Outro Modo é fazer com os outros, os diferentes de nós, não apenas a “nossa turma”, muitos desejaram unir o povo em torno de um projeto, infelizmente o que assistimos é uma bela teoria, que promete muito e faz pouco.
O pouco é a esmolinha para os brasileiros famélicos, porem qual o custo disto tudo ?
A sociedade parece não estar disposta a pagar, e a minoria branca de olhos azuis (não sei se é bem assim) a que é achincalhada nas ruas e chamada depois a cooperar e dialogar, de onde virão os tais investimentos? Não sou desta opinião, mas o diálogo não houve.
Ironicamente agora ameaçam os direitos dos trabalhadores, mais taxas e mais impostos, e pior numa economia aos frangalhos, isto pode ser ainda pior com juros altos e impostos.
Sim temos esperança, mas é hora de agir, os que se calam e os cumplices pagarão um preço alto, infelizmente muita gente boa por inocência ou análise política equivocada.
Feliz 2016, mas proteja-se, nada de dinheiro de crédito, de dívidas altas e especulações.
Retrospectiva mundial em 5 fotos
Seria difícil num blog colocar todos os fatos importantes no mundo: a guerra civil na Síria e o avanço do Estado Islâmico (agora com alguns recuos), o início do reatamento de Cuba e os EUA com uma discreta, mas efetiva participação do papa, os refugiados e a fome no mundo e outros.
Tudo é importante, mas resolvi ter um olhar com o dos inocentes destas guerras, eles não sabem da má gestão dos recursos e dinheiro público, as incompreensões com credos de refugiados ou a violência gratuita dos preconceitos.
A menina Hudea, de apenas 4 anos, no campo de refugiados Atmeh na Siria , confundiu a câmara fotográfica com uma arma e levantou as mãos para o alto, e levantou os braços rendida para o fotógrafo turco Osman Sağırlı, autor do clique.
O corpo do menino Alan Kurdi, de 3 anos, apareceu afogado numa praia da Turquia, a imagem de um policial turco carregando seu corpo, viralizou nas redes no início de setembro, chamando a atenção mundial para mortes de migrantes que tentam fugir das guerras.
Cinco amigos comemoravam o primeiro salário quando uma rajada de 111 tiros disparados pela Polícia Militar do Rio de Janeiro atingiu o carro e matou todos, é mais um número em 3.256 homicídios ocorridos de janeiro de 2010 a agosto de 2015 no Rio de Janeiro.
Ano que aconteceu a Conferencia de Paris que traz algum além sobre a grave problemática do clima mundial, o maior desastre ecológico ocorrido não Brasil não pode ser esquecido, a morte do rio doce que atinge economicamente toda a região, mas um povo de modo especial.
São os índios Krenak (ou Borun) que eram chamados pelos portugueses e por nossos livros de história de “Botucudos” no Leste de Minas, até o final do século 17 eles usavam botoques auriculares e labiais, são ao todo 128 famílias desamparadas, que dependem fundamentalmente do rio.
Ali descreve assim Geovani Krenak ““O rio é algo que a gente amava, agora é algo que nos causa medo e dor.” É uma “entidade que sempre cuidou do povo e que agora nos assombra por causa da lama.”
O olhar desolador do índio Kresnak para o peixe morto mostra a tragédia ecológica ali.
O terremoto acontecido em 25 de abril no Nepal desencadeou uma rede de auxílio internacional, mas também revelou uma rede de tráfico de crianças e diversas fotos e apelos falsos de ajuda foram feitos em todo mundo, quase um milhão de crianças ficaram a mercê da própria sorte, o país ainda está em reconstrução.
Os inocentes continuam a pagar pelos insensíveis, maus gestores e gananciosos mundiais.
Um 2015 para esquecer, nem tudo
Não podemos esquecer ainda que seja de triste lembrança, as corrupções ainda mal punidas, o desastre de Mariana e agora no final do ano para completar: o descaso com a saúde no Rio de Janeiro.
Mas queremos esquecer o desastre econômico de 2015, queda brutal no PIB, perda de alguns direitos trabalhistas (foi aprovada a aposentadoria aos 75 anos e a previdência está quebrada, para onde foi o dinheiro que pagamos e pagamos muito), a inflação acima de 10% que deve continuar este ano e a comédia política que assistimos nas duas casas: Senado e Câmara Federal, com direito ao líder do governo sair preso.
A economia é o ponto mais sensível, o ministro Levy até que tentou equilibrar as contas, mas não o deixaram, disparou quando saiu: “Nunca entendi porque o governo só fala de fiscal. Desde que entrei, até antes, sempre falei de um conjunto de reformas para mudar a economia. Se não mudar a economia, vamos continuar patinando.”
Afirmou ser necessário um conjunto de reformas, mas que o governo não sabia quais dessas reformas deve fazer, a própria troca de ministro opostos na filosofia é um sinal.
Então o que esperar: um ano mais duro, mas esperamos que ao menos sirva para um 2017 mais ameno, se a única política que o governo tem é gastar mais, será um desastre.
E o impeachment, também é um sinal duro, os presidentes das duas casas e a própria presidente tem possibilidade de ser impedido, se contarmos que a suprema corte também está perdendo credibilidade, o quadro do país é monstruoso, mas há os otimistas.
Os otimistas ou ficam na credulidade religiosa “ter esperança” sem explicar, ou dizem a crise passou e agora vamos começar a retomar o crescimento, sem qualquer sinal mínimo disto.
Os que não enxergam o Outro: o antidiálogo
O mundo todo conhece Paulo Freire, curiosamente para muitos brasileiros não, diálogo aqui é às vezes sinônimo de hipocrisia, de falsidade ou de mera oposição.
Mas relendo Paulo Freire encontramos até mesmo uma não separação entre sujeito e objeto, fato consumado do idealismo contemporâneo, dito assim pelo autor nacional :
“Toda conquista implica num sujeito que conquista e num objeto que é conquistado. O sujeito da conquista determina suas finalidades ao objeto conquistado, que passa, por isto mesmo, a ser algo possuído pelo conquistador. Este, por sua vez, imprime sua forma ao conquistado que, introjetando-o, se faz um ser ambíguo. Um ser, como dissemos já, “hospedeiro” do outro”. (FREIRE, 1983, p. 162).
Como este “hospedeiro” se instala na educação antidialógica, através de um recurso bastante comum que é o verbalismo, o opressor fala quanto quer e dá um tempo restrito de resposta ou apenas de pergunta, uma vez que o considera sem capacidade de responder, dito assim:
“Este modo de pensar, dissociado da ação que supõe um pensamento autêntico, perde-se em palavras falsas e ineficazes” (FREIRE, 1980, p. 87).
Para Freire a palavra autêntica é práxis44, deve manter o diálogo constante entre teoria e prática. Por isso, também a palavra que é só ação se transforma em ativismo. O diálogo é incompatível com as autossuficiências (as de grupo também) e exige um pensar autêntico: dialógico.
Pensar significa perceber uma realidade historicamente e assim deve-se superar a ignorância conhecendo a história e sendo capaz de superar a dicotomia homem-mundo, tornando-se um homem mundo, capaz de entender outras culturas.
Este homem-mundo, para Freire , diferente são seres do puro fazer (consciente):
“Os homens, pelo contrário, como seres do que fazer, ‘emergem’ dele e, objetivando-o, podem conhecê-lo e transformá-lo com seu trabalho” (FREIRE, 1983, p. 145).
Freire (ibid, p. 156) denuncia que a ideologia opressora promove a absolutização da ignorância.
Dessa forma, os opressores se reconhecem como os que nasceram para saber e sabem conviver com o oposto, no dizer do direito: o “contraditório”.
Assim o diálogo fica impossibilitado e a opressão, a heteronomia se mantém. A desmistificação dessa idéia de ignorância das massas deve ser fruto do processo de libertação, os opressores jamais vão fazer isso, pois eles se beneficiam dessa situação.
Aliás, o antidialógico, o dominador, quer conquistar aquele que lhe é oposto, o seu diálogo é proselitista.
Os bancos e as crises
No Brasil sai um funcionário de segundo escalão dos bancos e sobe um negociador com o dinheiro dos bancos, afinal ele é o inventor das “pedaladas”, dinheiro tomado de empréstimo dos bancos e pago a juros de agiotas.
Em 2013, curiosamente a Fundação Gates, da esposa de um dos milionários do mundo, fez um estudo informando como a fome convém aos bancos, e como eles as produzem (publicado no The Guardian).
O estudo explica como o controle dos preços de alimentos pelos bancos é feito por meio de fundos especulativos (hedge), quase da mesma forma que no mercado das “primes” faz com o mercado imobiliário, com o controle de estoques de alimentos, o estudo tem o título sugestivo de People die from hunger while banks make a killing on food (as pessoas morrem de fome, enquanto os bancos se enriquecem de repente), especulando com os alimentos.
O HSBC mundial, nas manches pelas corrupções do Brasil, teve a compra do Bamenrindus facilitada no governo FHC o Banco Bamerindus, pagou perto de 2 bilhões de dólares de multa, num acordo com governo norte-americano, por ter, comprovadamente, lavado dinheiro do tráfico de drogas.
O HSBC que tem no Brasil o seu terceiro mercado mais lucrativo do mundo, por que será ?
Os juros vão subir, o preço dos alimentos vai junto, mas a JBS espera uma venda recorde para 2016 para os norte-americanos, falam apenas um tramite burocrático, aqui o pobre vai comer “arroz sem carne” como disse um ex-presidente, só não explicou porque.
Quem controlará os bancos ? até ricaços do mundo reclamam.
A maior mensagem e sabedoria
No tempo histórico e sagrado de Jesus, vejam o post anterior, sua figura de homo sacer permaneceu estranha para os religiosos (os judeus da época) e para os sábios (os gregos no tempo de Jesus), afirma a Bíblia, em Coríntios: “22Porque tanto os judeus pedem sinais, como os gregos procuram sabedoria; 23nós, entretanto, proclamamos a Cristo crucificado, que é motivo de escândalo para os judeus e loucura para os gentios. …” (Corintios 1:22-23).
É ainda o problema de nosso tempo, poucos compreendem a profundidade histórica e filosófica, quanto mais em tempos de crise da modernidade, e poucos religiosos entendem a sacralidade do tempo que Jesus viveu na terra, com toda a condição humana.
Porque nem a sacralidade, as mensagens e feitos de Jesus (incluindo os milagres, como um cego de nascença enxergar, um paralítico andar e tantos outros) fizeram com que os fariseus e sábios do seu tempo entendessem.
Mas o menino nasce num estábulo, na cidade de Belém que era a cidade de David, mas nem os religiosos e doutores (da lei) do seu tempo entenderam, porque a mania de grandeza e a vaidade intelectual não permitem compreender uma mensagem humilde e realmente sacra.
Os sinais continuam a aparecer na humanidade, as pessoas humildes que se dedicam aos pobres, os que acolhem imigrantes pelo planeta que são milhões (os árabes, os haitianos, os africanos e muitos outros), os que se dedicam em hospitais, em locais de acolhimento de pessoas carentes, com câncer, com AIDS ou apenas doentes e velhinhos terminais.
Mas os poderosos, sejam eles religiosos (que querem sinais) ou pseudo-sábios que protagonizam a decadência ocidental não estão abertos a estes sinais, querem apenas a vaidade e a arrogância a qual estão presos, e esperam isto de um Deus que nasce pobre em um estábulo, pois o farisaísmo é para sempre e a ignorância de falsas teorias também.
Feliz Natalidade de Jesus.
Natal: o fato histórico e o divino
Como sabemos que este fato histórico é verdadeiro, que nasceu um menino em Belem e que de fato isto aconteceu, Maria e José deveriam ir a Belém terra natal de José pois um censo estava sendo realizado e cada morador da Judeia deveria ir para sua terra natal.
Este fato histórico foi previsto em escritos proféticos, o profeta Isaias que viveu nos anos IV a.C. escreveu: “Senhor mesmo dará a vocês um sinal: a virgem ficará grávida, dará à luz um filho e o chamará Emanuel.“ (Bíblia, Isaías 7:14)
O segundo sinal histórico é também divino, pois o fato que o Messias estava previsto para a Belém da Judéia, assim escrito pelo profeta Miqueias: “E tu, Belém de Efrata, posto que pequena entre as milhares de Judá, de ti sairá o que governará em Israel, e cujas saídas são desde os tempos antigos, desde os dias da eternidade” (Bíblia, Miquéias 5:2).
E o evangelista Lucas descreve o grande senso ordenado por Cesar Augusto, e cita que ocorreu quando Cirino era governador (da Judeia), assim narra o evangelista:
“E aconteceu naqueles dias que saiu um decreto da parte de César Augusto, para que todo o mundo se alistasse. (Este primeiro alistamento foi feito sendo Quirino presidente da Síria). E todos iam alistar-se, cada um à sua própria cidade.E subiu também José da Galiléia, da cidade de Nazaré, à Judéia, à cidade de Davi, chamada Belém (porque era da casa e família de Davi). A fim de alistar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida.“ (Lucas 2:1-5)
Mas houve outro censo que foi estudado pelo historiador judeu Josefo (Antiguidades XVIII, 26 [ii.1], que disse o fato ter ocorrido em 6 d.C.), este quando Cirino era governador da Siria, mas também está citado em Atos 5:34-37, e é deste que Josefo fala, vejamos a narração de Lucas:
“Levantou-se, porém, um membro do Grande Conselho. Era Gamaliel, um fariseu, doutor da lei, respeitado por todo o povo. Mandou que se retirassem aqueles homens por um momento, e então lhes disse: Homens de Israel, considerai bem o que ides fazer com estes homens.Faz algum tempo apareceu um certo Teudas, que se considerava um grande homem. A ele se associaram cerca de quatrocentos homens: foi morto e todos os seus partidários foram dispersados e reduzidos a nada. Depois deste, levantou-se Judas, o galileu, nos dias do recenseamento, e arrastou o povo consigo, mas também ele pereceu e todos quantos o seguiam foram dispersados.“ (Bíblia, Atos 5:34-37)
São fatos ocorridos depois da morte [e ressurreição] de Jesus, portanto após o ano 3 d.C., então o historiador Josefo está certo e Lucas, também, mas sabe-se que o calendário de fato sofreu interferência de datas quando de sua institucionalização por Júlio César, em 46 a.C., segundo historiador, houve um deslocamento de 3 anos, então daria os 6 d.C. que Josefo se refere.
O fato histórico, as profecias Bíblicas, que dizia que o messias nasceria em Belém, que viria da descendência de David (José foi a Belém para o censo porque David era de lá), que a virgem conceberia e o fato que dois censos foram realizados naquele período, comprovam a figura histórica do nascimento de Jesus, talvez a data não seja 25, entretanto é um nascimento que deve ser comemorado por todo ensinamento que este divino menino trouxe.
Acima o quadro de Pieter Brueghel, o Velho – o Censo de Belém: 1566.
Advento do Natal: sermões do Pe. Vieira
Pe. Padre Antônio Vieira nasceu em Lisboa, em 1608, e morreu na Bahia, em 1697, foi um Jesuíta e seu livros “Sermões” é bastante conhecido, vejam o que falou do Natal e sobre o que é um “Sermão”, ou seja um sermão sobre como devem ser os sermões:
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Por isso Cristo disse que o lavrador do Evangelho não semeara muitos gêneros de sementes, senão uma só: Exiit qui seminat seminare semen. Semeou uma semente só, e não muitas, porque o sermão há de ter uma só matéria, e não muitas matérias. Se o lavrador semeara primeiro trigo, e sobre o trigo semeara centeio, e sobre o centeio semeara milho grosso e miúdo, e sobre o milho semeara cevada, que havia de nascer? Uma mata brava, uma confusão verde. Eis aqui o que acontece aos sermões deste gênero.
Como semeiam tanta variedade, não podem colher coisa certa.
Quem semeia misturas, mal pode colher trigo. Se uma nave fizesse um bordo para o Norte, outro para o Sul, outro para Leste, outro para Oeste, como poderia fazer viagem? Por isso nos púlpitos se trabalha tanto e se navega tão pouco.
Um assunto vai para um vento, outro assunto vai para outro vento; que se há de colher senão vento? O Batista convertia muitos em Judéia; mas quantas matérias tomava? Uma só matéria: Parate viam Domini. A preparação para o reino do Senhor. Jonas converteu os ninivitas; mas quantos assuntos tomou? Um só assunto: Adhuc quadraginta dies, et Ninive subvertetur, a subversão da cidade. De maneira que Jonas em quarenta dias pregou um só assunto, e nós queremos pregar quarenta assuntos em uma hora?
Por isso não pregamos nenhum. O sermão há de ser de uma só cor, há de ter um só objeto, um só assunto, uma só matéria.
VEIRA, Pe. A. Sermões, ebooks Brasil, CJE USP, Brasil.
Um Natal mais pobre e santo
Se o Natal foi confundido com festas, luzes e o Papai Noel de uma empresa de refrigerantes, podendo até ter urso polar e neves, este Natal é diferente, primeiro por que as finanças estão curtas, e mesmo família abastadas e pessoas com possibilidade de gastar, vão economizar.
O quadro vem do clima em todo o país, lojas de departamentos fechando e um comércio em crise a olhos vistos, aqueles que não acreditavam que há de fato uma crise, agora basta sair nas ruas para comprar, mesmo que seja o necessário, vão perceber preços subindo e o consumidor cada vez comprando mesmo, pela falta de dinheiro ou de confiança.
Mas há o lado positivo disto tudo, talvez a festa religiosa seja lembrada, mesmo para aqueles que só pensam na política (a desonesta, porque a honesta está em falta), é tempo de silêncio.
É difícil silenciar uma sociedade ruidosa, há os que culpam o mundo digital por isto, mas isto já era assunto muito antes da internet nascer, filósofos e místicos falavam do “mundo ruidoso”.
Ruído é aquilo que inibe o sinal limpo e verdadeiro num sistema de comunicação, e na vida diária é tudo aquilo que não deveria ser confundido com religião, com sabedoria e até mesmo com a política, pois pólis é o local de todos e que foi indevidamente apropriado.
A partir do século VIII a.C., com o florescimento do comércio entre as nações, a paz torna-se importante para acabar com o isolamento das vilas e aldeias.
Aos poucos as cidades sofreram uma mudança radical passando a ser uma ágora, a praça pública, onde o comércio se desenvolve e as discussões sobre a vida e a sociedade acontecem e como diz Bakhtin: o homem moderno está a procura da praça pública, da sua ágora.
É Natal e o locus de sua celebração são as reuniões comunitárias, mas a necessidade de silêncio e respeito remete as igrejas, aqueles que entenderam isto serão ágora e as que não entenderam e ficam no discurso vazio dos problemas humanos insolúveis, se esvaziam.
Se Jesus é o homo sacer nascido num estábulo e colocado numa manjedoura, o locus sacer é aquele que consegue atrair esta presença sobrenatural de um Deus frágil e pobre.
Ciências, redes e relativismo
Via de regra, o pensamento sobre o relativismo caiu ele próprio num relativismo, porque é muito simples de dizer e difícil de explicar, porque pensamos que somos modernos, que há algum sentido dizer isto é científico ou isto é só uma crença.
Os que tentaram combate-la enveredaram para a pura ciência ou pura crença, por isto Bruno Latour em seu livro “Jamais fomos modernos”, explicou o princípio da assimetria, mas é possível ser simétrico, sem cair no dogma da neutralidade científica (que vai para a ciência)?
Precisamos entender o princípio das redes, no caso de Latour, as Redes Sociotécnicas, mas também é uma falsa oposição distingui-la das Redes Sociais, que são um aspecto daquelas.
As Redes Socioténicas de Latour referem-se “a teoria ator-rede, a noção de rede refere-se a fluxos, circulações, alianças, movimentos, em vez de remeter a uma entidade fixa.”
A rede de atores não é redutível a um único ator nem a uma rede (Social embora Latour não a chame assim), no seu dizer ela é composta de séries heterogêneas de elementos animados e inanimados, conectados e agenciados.
Os atores em Latour devem ser diferenciados da tradicional categoria sociológica de ator, que exclui qualquer componente não-humano” (Latour, ), e aqui liga-se as redes sociais de um modo geral.
Mas a grande definição, segundo o próprio Latour, está em Callon, ao defini-la assim: “uma rede de atores é simultaneamente um ator1, cuja atividade consiste em fazer alianças com novos elementos, e uma rede, capaz de redefinir e transformar seus componentes” (Callon, 1986, p. 93).
Ambos concluem que isto implica numa ontologia de morfologia variável, cujas consequências para as ciências devem ser seguidas a fim de não deixarmos escapar as contribuições da teoria ator-rede tanto em relação aos estudos sociais em ciências, quanto em relação aos estudos epistemológicos, eis a raiz do relativismo.
Mas seu desdobramento é perverso, “só é científico aquilo que rompe para sempre com a ideologia” (Latour, 1994, p. 92), e exemplifica dizendo: “é o que Racine fazia para o Rei-Sol sob o belo título de historiador, Canguilhem faz por Darwin, sob o rótulo, igualmente usurpado, de historiador das Ciências.” (Latour, 1994, p. 92).
O problema dos ocidentais, explica Latour, é que não coloca esta “sua cultura” (a modernidade, juntos das outros, tem a pretensão da universalidade, “Ela compara naturezas-culturas. Seriam estas realmente comparáveis. Semelhantes ? Iguais ? Talvez agora possamos resolver a insolúvel questão do relativismo.” (Latour, 1994, p. 96).
Callon, Michel 1986 ‘Society in the making: the study of technology as a tool for sociological analysis’. Em W. Bijker et alii (ed.). The social construction of technological systems. New directions in the sociology and history of technology. Cambridge, Mass., Mit Press, pp. 83-103. [ Links ]
Latour, Bruno 1994a Jamais fomos modernos. Rio de Janeiro, Ed. 34. [ Links ]